EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0006855-87.2011.4.03.0000/SP
VOTO CONDUTOR
O Exmo. Senhor Desembargador Federal Sérgio Nascimento: Trata-se de ação rescisória ajuizada pela parte autora, com fundamento no art. 485, incisos VII e IX, do CPC, objetivando desconstituir acórdão que dera provimento à apelação do INSS, julgando prejudicado o recurso da parte autora e improcedente seu pedido de concessão de aposentadoria rural por idade.
Sustenta, em síntese, a autora que carreou aos presentes autos documentos novos, com aptidão para lhe assegurar pronunciamento favorável, consistentes nas certidões de nascimento de dois filhos, nascidos nos anos de 1961 e 1963, expedidas em 07.12.2010 e nas quais ela e seu marido ostentam a profissão de lavradores. Aduz, ainda, que o julgado rescindendo incorreu em erro de fato, por não ter sido considerado como prova hábil à comprovação de sua atividade rural documento de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, em que o companheiro figuraria como meeiro.
Em sessão realizada em 10.10.2013, os integrantes da Seção Julgadora se posicionaram da seguinte forma:
Pelo voto vencedor de fls. 161/163, da lavra do Desembargador Federal Baptista Pereira, foi rejeitada a matéria preliminar e, no mérito, foi julgado procedente o pedido de desconstituição do julgado, com fundamento no art. 485, inciso VII, do CPC, e, em novo julgamento, foi julgado procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, por entender "...que as certidões apresentadas anteriormente, expedidas nas respectivas datas de 25/10/1988 e 25/04/1965, não traziam a qualificação profissional da postulante, nem a de seu cônjuge (fls. 46-47)...", sendo que "...Somente nesse momento, mediante os documentos ora juntados, tem-se o conhecimento de que nos termos dos assentos de nascimento dos filhos Luiz Donizette Rodrigues e José Severino Rodrigues, nascidos em 02/06/1961 e 03/02/1963 (fls. 100-101), consta a profissão dos genitores como lavradores, não se podendo questionar a preexistência de tais lançamentos, nem sua validade como prova indiciária em favor das alegações da autora...".
De outra parte, não houve declaração de voto vencido, proferido pela Desembargadora Marisa Santos, que instaurou a divergência, julgando improcedente o pedido formulado na presente rescisória.
Na sessão do dia 14.05.2015, a i. Relatora Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, em seu brilhante voto (fls. 189/196), houve por bem conhecer parcialmente dos embargos infringentes interpostos pela autarquia previdenciária e, na parte conhecida, dar-lhes provimento, a fim de fazer prevalecer os votos vencidos, que julgavam improcedente o pedido de rescisão, sob o fundamento de que "...as vias das certidões de nascimento dos filhos da autora Luiz Donizette Rodrigues (2.6.1961) e José Severino Rodrigues (3.2.1963), registrados, respectivamente, em 6.6.1961 e 24.4.1965, em princípio, porque posteriores ao acórdão da 8ª Turma de 10.5.2010, já que ambas datadas de 7.12.2010, não podem, neste caso, ser aproveitas na condição de documentos novos..", além do que "... Tratando-se de fato inscrito em cadastro público, acessível a qualquer do povo, de conhecimento geral, e específico da autora, inimaginável qualquer dificuldade no seu aproveitamento ou ignorância de sua existência...". Conclui, por fim, que "...Sobretudo por representarem apenas versões renovadas de certidões que acompanharam a demanda originária, incluindo-se informação constante dos assentos correspondentes relativamente à profissão dos pais, a impossibilidade de aproveitamento sob a condição de documentos novos advém da circunstância de a exordial desta rescisória não ter explicitado o que teria impedido o manuseio a tempo e modo...".
Penso que deve prevalecer o voto vencedor.
Com efeito, o cerne da divergência reside na avaliação da força probante das certidões de nascimento de Luiz Donizete Rodrigues (02.06.1961; fl. 100) e de José Severino Rodrigues (03.02.1963; fl. 101), em que a autora e seu marido estão qualificados como lavradores, vale dizer, saber se os aludidos documentos possuem aptidão para assegurar, por si sós, pronunciamento jurisdicional favorável, podendo ser classificados como "documentos novos".
De fato, como bem destacado pelo voto do i. Relator do acórdão embargado, os documentos ora mencionados trazem novidade para o deslinde da causa subjacente, na medida em que se reportam diretamente à autora, atribuindo-lhe a profissão de lavradora em período contemporâneo aos fatos que se quer demonstrar.
De outra parte, não obstante as certidões de nascimento tenham sido expedidas em 07.12.2010, posteriores ao trânsito em julgado da decisão rescindenda (27.07.2010), cabe ponderar que os dados ali lançados foram extraídos de registros realizados no Livro "A" do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais à época dos fatos, preservando, assim, a contemporaneidade exigida legalmente.
Relembre-se, ainda, que nas hipóteses em que o(a) trabalhador(a) campesino(a) objetiva comprovar o exercício de atividade rural, como no caso vertente, os documentos acima mencionados poderiam ser admitidos como novos, conforme pacífica jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, conforme se constata do julgado que a seguir transcrevo:
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA . RURÍCOLA. PROVA MATERIAL. DOCUMENTO NOVO PREEXISTENTE À PROPOSITURA DA AÇÃO ORIGINÁRIA. ART. 485, VII, DO CPC. ADOÇÃO DA SOLUÇÃO PRO MISERO. |
1. Está consolidado, no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento de que, considerada a condição desigual experimentada pelo trabalhador volante ou bóia-fria nas atividades rurais, é de se adotar a solução pro misero para reconhecer como razoável prova material o documento novo, ainda que preexistente à propositura da ação originária. Precedentes. Inteligência do art. 485, VII, do CPC. |
2. Título Eleitoral do qual conste como profissão do autor a de lavrador, preexistente ao tempo da ação originária, é documento novo e constitui razoável prova material da atividade rurícola. |
3. Ação rescisória procedente. |
(AR 551/SP, DJ 02.02.2004, P. 266, Rel. Min. Paulo Gallotti) |
Insta esclarecer, ainda, que malgrado as certidões de nascimento acostadas aos autos subjacentes não tivessem feito menção à profissão dos genitores (autora e seu esposo), importante anotar que o art. 54 da Lei n. 6.015, de 31.12.1973, com a redação dada pela Lei n. 6.216/1975, estabelecia a necessidade de se declinar a profissão dos pais, in verbis:
Art. 54. O assento do nascimento deverá conter: |
(...) |
7º) Os nomes e prenomes, a naturalidade, a profissão dos pais, o lugar e cartório onde se casaram, a idade da genitora, do registrando em anos completos, na ocasião do parto, e o domicílio ou a residência do casal. |
(...). |
(grifo nosso) |
Portanto, penso ser absolutamente verossímil a tese de que a profissão dos pais já se encontrava registrada, tendo havido uma omissão na expedição das certidões que instruíram a ação subjacente.
Outrossim, a certidão de nascimento constitui documento público, em que os dados nela constantes foram lançados por oficial público, dotado de fé pública. Assim sendo, tais informações presumem-se verdadeiras, até que se prove o contrário pela parte adversa, sendo que, no caso vertente, não trouxe o INSS qualquer elemento probatório que pudesse infirmá-las.
Nesse sentido, confira-se a jurisprudência:
RECURSO ESPECIAL. CERTIDÃO RETIFICADA PELO ESCRIVÃO COM BASE EM NOTAS CARTORÁRIAS. FÉ PÚBLICA. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. |
(...) |
2. As certidões emanadas dos escrivães do Juízo, em razão de seu ofício, revestem-se de presunção juris tantum de legitimidade e de veracidade, em razão da fé pública de que gozam tais agentes auxiliares do Juízo. |
(...) |
4. A mera alegação deduzida nas razões recursais, sem a apresentação de qualquer comprovação que infirme as informações certificadas, não pode prevalecer sobre a presunção de legitimidade e veracidade que gozam as certidões emanadas dos escrivães do Juízo. |
(...) |
(STJ; REsp 1002702/BA - 2007/0259116-6; 4ª Turma; Rel. Ministro Luís Felipe Salomão; j. 26.10.2010; DJe 04.11.2010) |
Diante do exposto, nego provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, para que prevaleça o voto vencedor.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Relator para o acórdão
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D.E. Publicado em 12/06/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Relator para Acórdão
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EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0006855-87.2011.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora). Embargos infringentes (fls. 167/172) tirados de julgado proferido nesta Seção especializada, assim resumido (fl. 163):
Aduz-se, de saída, a inexistência do alegado erro de fato, porquanto "a r. decisão rescindenda não somente se manifestou acerca de todas as provas produzidas, mas fez uma lúcida análise de todo o conjunto probatório, concluindo pela improcedência do pedido"; assim, "resta evidenciada a inocorrência do erro apontado, razão pela qual deve ser rejeitado o pedido também com relação a esse ponto".
Alega-se, outrossim, que "no caso em debate, não houve a apresentação de qualquer documento novo", a tanto não se prestando as certidões de nascimento de dois filhos da autora, "ocorridos em 02.06.61 e 03.02.63, emitidas em 07.02.2010, documentos públicos nos quais ela e seu companheiro, encontram-se profissionalmente qualificados como lavradores", na medida em que "em face de seu cunho eminentemente particular, não há como se entender que a Autora desconhecia a existência do documento ora anexado, eis que no curso da lide primitiva, a Autora fez juntar cópia da certidão de nascimento de seu filho, Luiz Donizette Rodrigues e de seu filho José Severino Rodrigues, ou seja, documentos já apresentados no curso da lide subjacente".
Sustenta-se, ainda, "que os documentos definidos pela Autora como 'novos' não são suficientes para garantir a inversão do julgado", "pretendendo, apenas, a rediscussão do quadro fático-probatório produzido nos autos originários, utilizando-se da presente demanda como sucedâneo de recurso".
Requer-se, pois, seja "provido o recurso, de molde a prevalecer o r. voto-vencido, rejeitando-se a demanda, condenando-se a Autarquia nas verbas de sucumbência e demais cominações de estilo".
Sem contrarrazões (certidão de fl. 174, verso), sucederam-se admissão (fl. 175) e redistribuição a minha relatoria (fl. 175, verso), oportunizando-se, então, manifestação ao Ministério Público Federal, que reiterou o parecer de fls. 142/148 pela procedência do pleito de rescisão (fl. 177).
É o relatório, à revisão.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
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EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0006855-87.2011.4.03.0000/SP
VOTO
A Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora). O resultado da decisão objeto dos presentes embargos infringentes, colhida na rescisória apreciada em 10.10.2013, espelhado na certidão de julgamento de fls. 158/159, teve registrado o seguinte teor:
Nesse ínterim, no que concerne ao excerto destacado, sobreleva notar que a declaração do resultado do julgamento levou em consideração o voto proferido pela Desembargadora Federal Marisa Santos apenas quanto à proposição de expedição de ofício ao cartório de registros, deixando de proclamá-lo em relação ao juízo emitido por Sua Excelência no que diz respeito ao mérito propriamente dito da rescisória, consoante se permite constatar cotejando-se a minuta supra com a transcrição dos debates a partir dos registros daquela sessão anotados pela Taquigrafia.
Veja-se:
Cediço que "verificando-se que a proclamação do resultado do julgamento não se compatibiliza com a fundamentação desenvolvida, correta a retificação do erro pelo colegiado. Nos termos do art. 463, inciso I, inexatidões materiais podem ser corrigidas de ofício pelo julgador" (STJ, REsp 90.205/RJ, 5ª Turma, rel. Ministro Felix Fischer, DJ de 14.06.1999), passado desapercebido, à ocasião, o equívoco em questão, impõe-se de rigor sua correção.
Evidente a inexatidão material, a exigir a devida retificação, ainda que insuficiente a ensejar qualquer mudança na conclusão deste Colegiado quanto ao desfecho dado à pretensão de desconstituição, em nada repercutindo, pois, na transferência de sucumbência ou no próprio interesse recursal.
Encaminho, assim, a presente questão de ordem, a teor do disposto no artigo 33, inciso III, do Regimento Interno desta Casa, para correção da inconsistência apontada, propondo a retificação da proclamação do resultado do julgamento e conseqüente alteração da certidão encartada às fls. 158/159, de modo a ter por consignada, na parte sublinhada do texto do aludido documento, a inclusão, em todos os seus termos, do voto proferido pela Desembargadora Federal Marisa Santos, acompanhado pelos demais pronunciamentos que, na terminologia adotada, julgavam improcedente a ação rescisória.
Ultrapassada tal questão, mas ainda previamente ao exame efetivo da matéria recursal, quadra ressaltar que a hipótese aceita conhecimento apenas parcial da insurgência autárquica.
Ausente interesse acerca da reforma do acórdão quanto ao fundamento da possível ocorrência de erro de fato no julgamento levado a efeito na demanda subjacente, não atingido, como se vê do voto do Relator, infra, pelo decreto de rescisão, carecem, portanto, os embargos infringentes de pressuposto básico à aceitação, restando, nesse aspecto, vedada sua análise pelo mérito, limitada ao tema referente ao aproveitamento como documentos novos das certidões de nascimento de dois filhos da autora, ora embargada.
Do voto condutor do Desembargador Federal Baptista Pereira, extrai-se (fls. 161/162):
A tese minoritária que se quer fazer prevalecer, a seu turno, consubstancia-se no reconhecimento da improcedência do pleito de desconstituição do acórdão rescindendo, tirado do julgamento de apelação cível no âmbito da 8ª Turma.
A despeito de o inteiro teor do julgado ora embargado não ter vindo acompanhado da declaração dos pronunciamentos vencidos, inexiste óbice algum à aceitação do recurso, eis que, para além da inexistência, na legislação pátria, de norma que obrigue o dissidente a declinar por escrito os fundamentos de seu voto, possível dimensionar a discordância pelo exame das conclusões das manifestações de cada votante constantes da ata de julgamento - agora retificada nos moldes da questão de ordem retro -, na esteira de remansoso entendimento doutrinário e jurisprudencial:
Quanto ao mérito verdadeiramente posto, a matéria é de conhecimento e a prevalência dos votos vencidos, em detrimento do entendimento manifestado majoritariamente no âmbito desta 3ª Seção à ocasião, impõe-se de rigor.
A rescisória é ação que objetiva derrubar a coisa julgada já formada. Busca impugnar decisão atingida pela coisa julgada material. Passada em julgado e a salvo de qualquer recurso. Sua finalidade não é rescindir todo e qualquer julgado. As hipóteses são restritas e taxativas, por se estar diante da autoridade da coisa julgada, de decisão que produziu, a todas as luzes, eficácia completa, no dizer de Pontes de Miranda, "como se não fosse rescindível" (In: Comentários ao código de processo civil, t. VI. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 177). Medida excepcional e cabível apenas dentro das hipóteses restritas trazidas pela lei processual (Ada Pellegrini Grinover, Ação rescisória e divergência de interpretação em matéria constitucional, Revista de Processo 87/37), porquanto esgotados os recursos, chega-se à imutabilidade da decisão de mérito, sem que se possa declará-la justa ou injusta, daí se permitindo, tudo isso, no dizer de Sálvio de Figueiredo Teixeira, "um imperativo da própria sociedade para evitar o fenômeno da perpetuidade dos litígios, causa de intranqüilidade social que afastaria o fim primário do Direito, que é a paz social" (In: Ação rescisória, Apontamentos, RT 646/7).
O inciso VII do artigo 485 do Código de Processo Civil, em sua primeira parte, dispõe que a decisão de mérito, após o trânsito, pode ser rescindida quando "depois da sentença, o autor obtiver documento, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso".
Tomando em consideração a situação peculiar do trabalhador rural, seu parco grau de instrução e a impossibilidade de compreensão, quando do ingresso em juízo, da relevância da documentação a alcançar a desejosa aposentadoria, presumindo-se, outrossim, ausentes desídia ou negligência, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (AR 3429/SP, AR 2478/SP, AR 789/SP), afastando-se do rigor conceitual da lei de regência, evoluiu no sentido de permitir ao rurícola o manuseio de documentos que, em teoria, eram de seu conhecimento anteriormente à propositura da demanda originária, entendimento esse abraçado, inclusive, no âmbito da 3ª Seção deste Tribunal, considerando as condições desiguais vivenciadas no campo e adotando a solução pro misero.
Nada obstante, conforme o disposto na parte final do dispositivo em questão, a superveniência da prova produzida, na maneira mencionada, não foge à obrigação de se mostrar "capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável", ou seja, a documentação apresentada, então desconhecida nos autos, deve ser hábil a alterar a posição do órgão julgador.
Consoante o ensinamento de José Carlos Barbosa, "o documento deve ser tal que a respectiva produção, por si só, fosse capaz de assegurar à parte pronunciamento favorável. Em outras palavras: há de tratar-se de prova documental suficiente, a admitir-se a hipótese de que tivesse sido produzida a tempo, para levar o órgão julgador a convicção diversa daquela a que chegou. Vale dizer que tem de existir nexo de causalidade entre o fato de não se haver produzido o documento e o de se ter julgado como se julgou". E prossegue: "Por 'pronunciamento favorável' entende-se decisão mais vantajosa para a parte do que a proferida: não apenas, necessariamente decisão que lhe desse vitória total. Tanto pode pedir a rescisão, com base no inciso VII, o litigante que obteve parte do que pretendia e teria obtido tudo se houvesse usado o documento, quanto o que nada obteve e teria obtido ao menos parte usando o documento" (Comentários ao código de processo civil. 10ª ed. V.V. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 148-149).
In casu, a requerente pretende utilizar, na condição de novos, os documentos de fls. 100/101, a saber, conforme discriminados na inicial, "Certidões de nascimento de seus filhos Luiz Donizeti Rodrigues, nascido em 02 de junho de 1961, José Severino Rodrigues, nascido em 03 de fevereiro de 1963, onde consta expressamente a profissão da Autora e de seu Companheiro, como lavradores" (fl. 08).
Apesar de no curso da instrução desenvolvida no feito subjacente ter sido promovida a juntada, a pedido do patrono da ora embargada, em número de 5 (cinco), "das inclusas certidões de nascimento de seus filhos, a comprovar sua união marital com Ari Rodrigues" (fl. 45), entre elas os registros da dupla que ora se repete (fls. 46/47), ambos os documentos admitem análise, até porque a decisão cuja desconstituição se almeja nem ao menos se pronunciou sobre as certidões então acostadas, apresentadas em forma mais simplificada, sem a menção constante dos respectivos termos da profissão dos genitores, informação acrescida nas vias atualizadas trazidas com a rescisória.
Segundo a anotação na obra de Theotonio Negrão (Código de processo civil e legislação processual em vigor. 41. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 642), "por documento novo, entende-se aquele 'cuja existência o autor da rescisória ignorava ou do qual não pôde fazer uso, no curso do processo de que resultou o aresto rescindendo' (RTJ 158/774). Ou seja, 'é aquele que já existia ao tempo da prolação do julgado rescindendo, mas que não foi apresentado em juízo por não ter o autor da rescisória conhecimento da existência do documento ao tempo do processo primitivo ou por não lhe ter sido possível juntá-lo aos autos em virtude de motivo estranho a sua vontade' (STJ-3ª Seção, AR 3.450, Min. Hamilton Carvalhido, j. 12.12.07, DJU 25.3.08). No mesmo sentido: STJ-3ª T., REsp 743.011, Min. Gomes de Barros, j. 14.2.08, DJU 5.3.08; STJ-RT 652/159, RT 675/151".
Nesse sentido, "o adjetivo 'novo' expressa o fato de só agora ser ele utilizado, não a ocasião em que veio a formar-se. Ao contrário: em princípio, para admitir-se a rescisória, é preciso que o documento já existisse ao tempo do processo em que se proferiu a sentença" (STJ, 1ª Turma, REsp 240.949-PR, rel. Ministro José Delgado, j. 15.2.2000, v.u., DJU de 13.3.2000).
Em suma, documento novo é, em realidade, "velho": além de referir-se a fatos passados, sua produção também é pretérita. A "'novidade' exigida pela lei diz respeito à ausência de tal documento no processo em que se formou a sentença que se quer rescindir. Portanto, a 'novidade' está ligada à apresentação do documento - e não à sua formação. Na concepção tradicional, documento novo para os efeitos do art. 485, VII, não é propriamente aquele que se formou depois do processo anterior. Nesse sentido, o documento 'novo' ensejador da ação rescisória é 'antigo' no que tange ao momento de sua formação. Essa constatação é diretamente extraível da lei. O inciso VII do art. 485 alude à existência e à anterior impossibilidade de uso do documento no passado (...) - deixando clara a preexistência do 'documento novo'" (Eduardo Talamini, Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: RT, 2005, p. 179).
A esse propósito, as vias das certidões de nascimento dos filhos da autora Luiz Donizette Rodrigues (2.6.1961) e José Severino Rodrigues (3.2.1963), registrados, respectivamente, em 6.6.1961 e 24.4.1965, em princípio, porque posteriores ao acórdão da 8ª Turma de 10.5.2010, já que ambas datadas de 7.12.2010, não podem, neste caso, ser aproveitas na condição de documentos novos.
Pelo simples fato de não satisfazerem o requisito legal da preexistência, não se enquadrariam ao permissivo processual, pois, ainda que se considere a antecedência do registro a que se reporta a certificação, intransponível a ausência da peculiaridade exigida pela lei, consistente na impossibilidade de sua utilização ou no desconhecimento de sua existência.
Tratando-se de fato inscrito em cadastro público, acessível a qualquer do povo, de conhecimento geral, e específico da autora, inimaginável qualquer dificuldade no seu aproveitamento ou ignorância de sua existência.
Sobretudo por representarem apenas versões renovadas de certidões que acompanharam a demanda originária, incluindo-se informação constante dos assentos correspondentes relativamente à profissão dos pais, a impossibilidade de aproveitamento sob a condição de documentos novos advém da circunstância de a exordial desta rescisória não ter explicitado o que teria impedido o manuseio a tempo e modo.
Na esteira do exposto, confira-se:
Ressalte-se que nem sequer se está a cuidar, na hipótese, de obtenção de tipo distinto de certidão, como prevê a lei que dispõe sobre os registros públicos, não se tratando, os aqui apresentados, de documentos em inteiro teor - espécie em que tudo que consta do registro é reproduzido, da primeira à ultima palavra, verbo ad verbum, autorizada inclusive cópia reprográfica (artigo 19, § 1º, da Lei 6.015/1973); mas sim, tais como as reproduzidas no feito subjacente, de certidões em resumo, contendo as indicações essenciais do assento.
Nem se diga, ainda, que haveria de se estender, aqui, o entendimento pro misero outorgado pela jurisprudência.
O fato de se valer de boa vontade para com os rurícolas não pode resultar em distorções que, sob pena de banalizar o próprio instituto e torná-lo recurso ordinário com prazo alargado de dois anos, permitam alcançar, na via excepcional da ação rescisória, medida que fizesse as vezes de providência não adotada por desídia ou negligência da parte, de resto a cargo do advogado constituído - o mesmo na demanda originária e na ação rescisória -, a quem competiria, por deter o conhecimento técnico necessário ao patrocínio da causa, compreender desde logo a relevância do documento em tela para o sucesso do pleito formulado, inexistente, pois, in casu, a excepcionalidade própria aos trabalhadores rurais a que vêm se reportando os julgados.
Mesmo assim não se entendesse, ou seja, ainda que se admitisse, aplicando-se a construção pretoriana que considera as condições desiguais vivenciadas no campo, também a utilização, em versões atualizadas e acrescidas de novas informações, de certidões que poderiam ser obtidas anteriormente e juntadas durante a instrução do processo em que proferido o acórdão rescindendo, apresentando-se possível a aceitação e o eventual aproveitamento de tais documentos, no caso concreto não trariam melhor sorte à demandante.
O julgado rescindendo, no que se refere à análise da prova, está posto do seguinte modo (fls. 91/92):
Ao querer se aproveitar, em prol do reconhecimento do labor rural de Maria do Carmo Carvalho, da qualificação sua e de seu companheiro registrada nos termos de nascimento dos filhos Luiz Donizette Rodrigues e José Severino Rodrigues, datados do início da década de 60, reproduzidos nas certidões de fls. 100/101, apostando na demonstração da condição de lavradora da autora a partir de documentos bastante remotos, não contemporâneos ao período de carência para o benefício em tela, a pretensão formulada na inicial da presente demanda esbarra nas conclusões a que chegou a Turma julgadora acerca da imprescindibilidade, remarque-se, de apresentação de indicativo material do desempenho de atividade no campo "contemporâneo ao período de trabalho alegado pela demandante" (fl. 92), extrapolado sobremaneira, na medida em que a própria prova testemunhal, colhida em audiência realizada em fevereiro de 2009, limitou-se a reconhecê-lo "há quarenta anos" (fls. 42/43).
Nesse sentido, apresenta-se no mínimo curiosa a opção de não oferecer a versão atualizada, contendo os dados profissionais dos genitores, das certidões de nascimento dos filhos mais novos - as quais deixariam a autora em situação mais favorável para pleitear a desconstituição do julgado, caso repetida a condição de rurícola informada nos documentos ora apresentados -, notadamente de Orlando Rodrigues, que, embora nascido em 15.7.1967, só veio a ter o assento lavrado em 19.5.1992 (fl. 48), e Alex Sandro Rodrigues, nascido em 29.4.1987 e registrado em 6.11.1987 (fl. 50).
Em verdade, o que se deseja é nova análise do caso, incrementado, agora, o cenário probatório, com a documentação supra, manifestamente insuficiente, porém, para qualificação da autora como trabalhadora rural, ao menos para fins previdenciários, porquanto, embora apresentados como novos, não se apresentam hábeis à modificação do aresto hostilizado, de sorte que pudessem habilitá-la ao recebimento da benesse perseguida.
Muito pouco, na verdade, a viabilizar o manejo da rescisória com fundamento no inciso VII do artigo 485 do Código de Processo Civil, em que se exigem novos elementos, ausentes na prova documental produzida originariamente, e que foram a causa da negativa do pedido inicial.
Enfim, não resta outro destino à pretensão que não seja o decreto de insucesso, na medida em que os documentos novos argüidos pela autora não têm o condão de imprimir ao julgamento pronunciamento diverso daquele levado a efeito no processo originário.
Dito isso, conheço parcialmente dos embargos infringentes e, na parte conhecida, dou-lhes provimento, a fim de fazer prevalecer os votos vencidos, que julgavam improcedente o pedido de rescisão.
À vista da assistência judiciária gratuita deferida à ora embargada, deixa-se de condená-la ao pagamento da verba honorária e custas processuais.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
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Data e Hora: | 22/05/2015 11:03:16 |