D.E. Publicado em 06/02/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Relator para o acórdão
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EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0010842-44.2010.4.03.9999/MS
VOTO CONDUTOR
A sentença de fls. 129/133 revela que foi julgado improcedente o pedido de concessão do benefício de Amparo Social, previsto no art. 20, §3º, da Lei n. 8.742/93. Interposto o recurso de apelação pela parte autora, foi proferida decisão com fundamento no art. 557 do CPC, tendo-lhe sido dado parcial provimento, para julgar procedente o pedido. Na sequência, manejado recurso de agravo pelo INSS, foi prolatado acórdão pela 9ª Turma deste Tribunal, que, por maioria, negou provimento ao aludido recurso, mantendo a r. decisão monocrática, tendo os integrantes da Turma Julgadora se posicionado da seguinte forma:
Pelo voto vencedor de fls. 178/179, foi negado provimento ao recurso de agravo interposto pela autarquia previdenciária, sob o fundamento de que restou demonstrado o preenchimento dos requisitos necessários para a concessão do benefício em epígrafe, pois "...No laudo médico (fls. 96/99) constatou o perito judicial que a requerente é portadora de males que a incapacitam de forma total e permanente para o trabalho..", bem como "... a autora residia com sua filha, menor impúbere...", sendo que "...A renda familiar era constituída do trabalho esporádico da autora, como cabo eleitoral, e da quantia recebida do programa Bolsa-Família..". Assinalou, ainda, que "...o companheiro Juvelino voltou a integrar o núcleo familiar posteriormente...", tendo este mantido "...dois vínculos empregatícios de curta duração (nos períodos de 12/01/2009 a 02/03/2009 e de 16/03/2009 a 09/06/2009), o que, por si só, assinala a precariedade dos referidos contratos de trabalho...".
Já pelo voto vencido de fls. 186, foi dado provimento ao agravo legal interposto pela autarquia previdenciária, para negar provimento à apelação da autora, mantendo a r. sentença que julgou improcedente o pedido, sob o argumento de que "... a autora reside com a filha e o companheiro, Jovelino Rodrigues de Almeida....", sendo que "...a renda da família advém do trabalho do companheiro, na condição de diarista, recebendo o valor de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais) mensais..". Conclui, por fim, que "...a renda familiar per capita correspondia a 33% do salário mínimo e, portanto, superior àquela determinada pelo §3º do art. 20 da Lei 8.742/93...".
Na sessão do dia 22.01.2015, a i. Relatora Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, em seu brilhante voto (fls. 302/309), houve por bem dar provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, para o fim de fazer prevalecer o voto vencido, da lavra da Desembargadora Federal Marisa Santos, por entender que a autora "...encontrava-se inserida em núcleo familiar composta por ela, o companheiro e uma filha adolescente; residiam em imóvel próprio, desonerado de custos, localizado em Costa Rica/MS; valiam-se todos da remuneração por ele auferida quer seja como diarista, conforme revelado pela prova testemunhal, quer seja como empregado no mercado formal, segundo registros constantes do CNIS, sendo contemplados ainda por programa de transferência de renda mantido pelo Governo Federal e mais os rendimentos obtidos pela própria requerente com serviços prestados durante período eleitoral, a colocar em questionamento estar-se diante de grupo de baixíssimo poder aquisitivo, não tendo sido sequer informados os gastos mensais da unidade familiar, inexistente, de resto, menção a gastos com aquisição de remédios...". Em síntese, conclui pelo não enquadramento da autora como hipossuficiente econômica, de modo a não ensejar a concessão do benefício assistencial.
Penso que deve prevalecer o voto vencedor.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência, constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, o laudo médico de fls. 96/99, realizado em 13.11.2008, atestou que a autora era portadora de cifose, lordose, escoliose, diabetes e hipertensão, que a tornavam incapacitada de forma total e permanente para o trabalho.
Insta salientar que a autora veio a falecer em 23.05.2010 (fls. 275), tendo como causas da morte enfermidades indicadas no laudo médico judicial, tais como distúrbio metabólico e diabetes mellitus descompensado.
Com fundamento na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que se incorporou no ordenamento jurídico com status constitucional, é de se reconhecer a deficiência da autora, tendo em vista que possui impedimentos de longo prazo de natureza física. Notadamente, tal condição obstruiu sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Há que se reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas'.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de "inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 19.08.2008 (fl. 91/93) constatou que o núcleo familiar da autora é formado por ela e sua filha menor, sendo que, naquele momento, estava separada de seu companheiro, o Sr. Jovelino. Assinalou que a casa em que ambas residiam é própria, padrão simples. A renda familiar totalizava R$ 120,00 (cento e vinte reais), decorrente de um programa social governamental e de eventuais serviços prestados pela autora, como cabo eleitoral, com vencimentos de R$ 200,00 (duzentos reais) mensais.
Destarte, não obstante o retorno de seu companheiro ao lar, consoante depoimento pessoal (fl. 123), e a existência de vínculos empregatícios em nome do companheiro, desde fevereiro de 2010, com renda equivalente a um salário mínimo, segundo extrato do CNIS (fl. 186vº), a situação fática ora examinada permite concluir pela absoluta insuficiência de recursos, tendo em vista a gravidade das doenças de que era portadora a autora, que acabaram culminando com sua morte.
Portanto, resta comprovado que a autora era portadora de deficiência e que não possuía meios para prover sua manutenção ou tê-la provida por sua família, fazendo jus a concessão do benefício assistencial.
Diante do exposto, nego provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, para que prevaleça o voto vencedor.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Relator para o acórdão
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EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0010842-44.2010.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
A Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora). Embargos infringentes (fls. 191/199) interpostos contra julgado, abaixo resumido (fl. 180), que conservou decisão monocrática na qual provida apelação interposta pela parte autora contra sentença de mérito que reconhecera a improcedência de pedido de concessão de benefício assistencial de prestação continuada:
Requer, o INSS, a prevalência do voto proferido pela Desembargadora Federal Marisa Santos, sob o argumento de que "a autora não comprovou o requisito da hipossuficiência econômica, pois a prova documental acostada aos autos, e o seu depoimento pessoal em Juízo, dão conta da existência de renda mensal familiar 'per capita' superior a ¼ do salário mínimo".
Recurso não respondido (certidão de fl. 201, verso), admitido (fl. 206) e redistribuído a minha relatoria (fl. 208).
Parecer da Procuradoria Regional da República "pelo conhecimento e rejeição dos Embargos Infringentes" (fl. 205).
Constatada, em razão do óbito da autora, a cessação do pagamento do amparo assistencial, implantado via tutela específica concedida no bojo do pronunciamento monocrático da Relatora no âmbito da Turma julgadora, e requerida a habilitação dos herdeiros, sobreveio decisão de seguinte teor (290):
É o relatório.
À revisão.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
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EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0010842-44.2010.4.03.9999/MS
VOTO
A Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora). Do voto condutor da à época Juíza Federal Convocada Monica Nobre, extrai-se (fls. 178/179):
O pronunciamento minoritário, a seu turno, da lavra da Desembargadora Federal Marisa Santos, veio consubstanciado nos seguintes termos (fl. 186):
O benefício perseguido tem caráter assistencial, devendo ser prestado pelo Estado a quem dele necessitar, independentemente de contribuição.
Antes da Constituição da República de 1988, a proteção social era restrita àqueles que estiveram, em algum instante, vinculados ao sistema previdenciário, o qual tem caráter contributivo.
Com o advento da Carta Constitucional atual, expressamente restou autorizada, no artigo 203, inciso V, a implementação do amparo social às pessoas idosas ou com deficiência que comprovem não possuir condições econômicas e financeiras para prover sua manutenção nem de tê-la provida por algum membro de sua família.
Assim, o benefício assistencial hoje vigente destina-se a amparar os hipossuficientes, dispensando qualquer espécie de contribuição.
O aludido dispositivo constitucional condicionou o regramento desse benefício à elaboração de lei, dando ensejo à conclusão de se tratar de norma de eficácia limitada.
Após a publicação da Constituição de 1988, foi promulgada a Lei n° 8.213/91, que, em seu artigo 139, manteve a renda mensal vitalícia como benefício previdenciário, enquanto não regulado o artigo 203, inciso V, do Estatuto Supremo.
A fim de regulamentar a referida norma constitucional, surgiu, no ordenamento jurídico brasileiro, a Lei nº 8.742/93, que disciplinou os requisitos necessários à implementação do benefício em questão. O artigo 20, em sua redação original, estabelecia a idade mínima para aferição do benefício, em se tratando de pessoa idosa, e assentava, para os efeitos dessa lei, os conceitos de família, de pessoa portadora de deficiência e de miserabilidade, nos seguintes termos, in verbis:
A Lei n.º 9.720, de 30.11.98, alterou a redação do artigo 20 da Lei n.º 8.742/93, no que pertine à idade mínima para auferir o benefício, reduzindo-a para 67 (sessenta e sete) anos, a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento da Lei nº 10.741, de 01.10.2003 (Estatuto do Idoso), houve nova redução no requisito etário, para 65 (sessenta e cinco) anos, a partir de 1º de janeiro de 2004.
A Lei nº 12.435, de 06 de julho de 2011, por sua vez, alterou diversos dispositivos da Lei Orgânica da Assistência Social, passando a apresentar, o artigo 20 dessa lei, a seguinte redação:
Como se vê, no tocante à definição de família, privilegiou-se entendimento mais extensivo acerca do grupo familiar, desvinculando-se da classificação restrita do artigo 16 da Lei de Benefícios.
Quanto ao conceito de pessoa com deficiência, o legislador inspirou-se na definição contida no artigo 1º da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo. Assinados em Nova York na data de 30 de março de 2007, foram aprovados pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 09 de julho de 2008, e posteriormente promulgados pelo Presidente da República (Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009).
O critério objetivo para aferição da miserabilidade não foi alterado pela Lei nº 12.435/2011, restando mantida a exigência de que a renda familiar per capita deve ser inferior a ¼ do salário mínimo para efeito de concessão do benefício.
Acrescente-se que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADI nº 1.232/DF, reconheceu a constitucionalidade desse parâmetro, previsto no artigo 20, §3º, da Lei n° 8.742/93.
É de se notar, contudo, que em observância ao princípio do livre convencimento motivado, a jurisprudência pátria tem entendido que a condição de miserabilidade pode ser aferida por outros meios de prova. Nesse sentido, o julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.112.557/MG:
Cabe ao magistrado avaliar, em cada caso concreto, as condições apresentadas pelo pleiteante, seja no que diz respeito à renda familiar, seja no tocante ao conjunto de pessoas que lhe dão suporte. Decerto que não só a existência de miserabilidade, mas também a ausência dessa situação pode ser aferida por meio da análise do conjunto probatório. Do contrário, teríamos decisões desarrazoadas, apartadas da realidade, distantes dos objetivos almejados pelo legislador.
Conectado a essa realidade dos Tribunais, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 18 de abril de 2013 - ocasião em que apreciados conjuntamente também a Reclamação 4.374/PE e o Recurso Extraordinário 580.963PR, ambos de relatoria do Ministro Gilmar Mendes -, ao concluir o julgamento do Recurso Extraordinário 567.985/MT, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, em que reconhecida a existência de repercussão geral da questão versada na hipótese, acabou por declarar a inconstitucionalidade por omissão parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, nos termos do voto do Ministro Gilmar Mendes, revisitando a matéria nos termos seguintes, assim redigidos ementa e extrato de ata:
Mantido em vigor o comando previsto no § 3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 no que diz respeito ao critério lá estabelecido para verificação da condição ensejadora da concessão do benefício assistencial, e no pressuposto de que não é a previsão contida no dispositivo em tela que por si só padece de inconstitucionalidade, mas sim naquilo que não disciplinou, ao se fiar em critério objetivo e único a tanto, assentou, a Suprema Corte, a possibilidade, justamente a partir da incompletude da norma, de aplicação de outros parâmetros para aferição da miserabilidade, até que se tenha solução para a omissão legislativa quanto ao efetivo cumprimento do artigo 203, inciso V, da Constituição.
Cumpre destacar, nesse ínterim, a menção ao patamar de ½ (meio) salário mínimo como possível critério de aplicação prática, até que sobrevenha novo comando legislativo, e ante a constatação da insuficiência do parâmetro anterior, de ¼ (um quarto) do salário mínimo.
Do voto do Relator, Ministro Gilmar Mendes, extrai-se:
De todo modo, o Supremo não determinou a incidência taxativa deste ou daquele critério e sim, consoante se observa de excertos dos debates lá travados, chancelou, por ora, a atuação das instâncias ordinárias, que já aplicam nos julgamentos, remarque-se, a depender da particularidade em que se encontra cada situação trazida a exame, os parâmetros que reputam razoáveis à luz do caso concreto.
Confira-se, a propósito:
Como exposto, para a concessão do benefício assistencial, mister se faz a conjugação de dois requisitos: alternativamente, a comprovação da idade avançada ou da condição de pessoa com deficiência e, cumulativamente, a miserabilidade, caracterizada pela inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou de tê-lo provido por alguém da família.
Ainda que se tenha por superada a discussão envolvendo o estado de deficiência de Neiva de Almeida Souza, à vista da conclusão posta na perícia médica a que submetida, de "incapacidade total e permanente para o trabalho" (fl. 98) em razão do quadro caracterizado por "Cifose, Lordose, Escoliose, Diabete, Hipertensão" (fl. 96), nem sequer objeto de questionamento pelo ora embargante, cujas razões recursais limitam-se à "ausência do requisito da hipossuficiência econômica" (fl. 193), vindo a requerente a falecer justamente em decorrência de "DISTÚRBIO METABÓLICO INSUFICIÊNCIA RENAL SEPSE DIABETES MELLITUS DESCOMPENSADO PROVAVEL ENCEFALITE" (fl. 235); no que concerne ao outro requisito exigido para a hipótese a existência de meios de ter provida sua manutenção impõe o reconhecimento da improcedência da pretensão formulada em seu nome.
Segundo consta do estudo social realizado em 19.8.2008 (fls. 92/93), "A Sra. Neiva 45 anos de idade, relatava que vivia em união estável com o Sr. Jovelino, e que no momento estão separados, sendo a composição familiar no momento, somente ela e a filha, Joana Jaqueline de Almeida 12 anos idade, estudante. Menciona que tem um outro filho, casado, com vida independente e sem condições financeiras de ajuda-la, devido sua situação financeira não ser favorável. A casa em que ambas residem, é própria, de padrão simples, composta por: 01 sala, 01 cozinha, 02 quartos, banheiro e áreas externas, a mobília existente na casa é a básica. A renda familiar segundo a requerente, é de R$ 120,00 vinda de um programa social governamental, e de alguns serviços periódicos que a Sra. Neiva realiza, que no momento, está trabalhando como cabo eleitoral, com vencimentos de R$ 200,00 mês, sendo esta, uma renda temporária. A Sra. Neiva relata que é hipertensa e portadora de diabetes, necessitando de medicação insulina todos os dias, menciona que, não consegue realizar atividades que exijam muito esforço físico".
O parecer em questão conclui que "conforme o que dispõe a Lei 8.742/93, em seu Art. 20, a requerente não possui idade e nem deficiência física, que a incapacite de exercer sua rotina diária, para efeito da Lei supra, embora, percebe-se a existência de uma situação sócio-econômica desfavorável, seguida de um quadro de saúde fragilizado, que impede a requerente de realizar atividades laborais que exijam esforço físico", sem ao menos discriminar, entretanto, as despesas mensais usuais ou mesmo excepcionais do grupo familiar, nem sequer eventuais dispêndios de soma com medicamentos, inexistindo ao longo de todo o processado quaisquer elementos de prova documental ou mesmo menção a gastos ocorridos a esse respeito.
Da prova oral colhida em audiência realizada pelo juízo a quo em 7.7.2009, a seu turno, extrai-se o seguinte:
De igual modo, consoante asseverado no voto vencido, "em consulta ao CNIS, verifica-se que o companheiro da autora tem vários vínculos de trabalho e, desde fevereiro de 2010, com SANVA COMERCIO DE PEÇAS E FERRAGENS LTDA, recebendo um salário mínimo ao mês" (fl. 186, verso).
De todo o amealhado, o que os autos revelam é que a autora originária, em que pese o problema de saúde que a afligia, encontrava-se inserida em núcleo familiar composta por ela, o companheiro e uma filha adolescente; residiam em imóvel próprio, desonerado de custos, localizado em Costa Rica/MS; valiam-se todos da remuneração por ele auferida quer seja como diarista, conforme revelado pela prova testemunhal, quer seja como empregado no mercado formal, segundo registros constantes do CNIS, sendo contemplados ainda por programa de transferência de renda mantido pelo Governo Federal e mais os rendimentos obtidos pela própria requerente com serviços prestados durante período eleitoral, a colocar em questionamento estar-se diante de grupo de baixíssimo poder aquisitivo, não tendo sido sequer informados os gastos mensais da unidade familiar, inexistente, de resto, menção a gastos com aquisição de remédios.
Tudo isso sopesado, convém não ignorar, por último, que o benefício assistencial não visa à complementação de renda. Destina-se àquelas pessoas que sejam, de fato, necessitadas, que vivam em condições indignas, em situação de notória miserabilidade, circunstância, insista-se, ausente na hipótese presente, em que possível concluir que a família da requerente, enquanto viva, reunia meios de se manter independentemente do amparo estatal almejado.
Posto isso, dou provimento aos embargos infringentes, a fim de fazer prevalecer o voto da lavra da Desembargadora Federal Marisa Santos, que dava provimento ao agravo legal do INSS para reconhecer a improcedência do pedido formulado.
Por se tratarem, também os sucessores que assumiram a titularidade da polaridade ativa nesta demanda, de beneficiários da assistência judiciária gratuita, deixa-se de condená-los ao pagamento da verba honorária e custas processuais.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
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