APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003431-26.2014.4.03.6113
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: PEDRO MARQUES HERRERO
Advogado do(a) APELANTE: TAMARA RITA SERVILHA DONADELI NEIVA - SP209394-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ELIANA GONCALVES SILVEIRA - SP118391-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003431-26.2014.4.03.6113
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: PEDRO MARQUES HERRERO
Advogado do(a) APELANTE: TAMARA RITA SERVILHA DONADELI NEIVA - SP209394-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR):
Trata-se de ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo, mediante o reconhecimento do caráter especial das atividades mencionadas na exordial, em indústrias calçadistas. Requer, ainda, indenização por danos morais.Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
A parte autora requereu a produção de prova pericial, a fim de comprovar a especialidade dos períodos laborados como sapateiro e funções correlatas (ID: 102730775 - Pág. 63).
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido.
Inconformada, apelou a parte autora, alegando, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, sendo necessária a produção da prova pericial requerida, a fim de comprovar a especialidade dos períodos de
1/10/76 a 15/5/77, 1/6/77 a 31/8/78, 12/9/78 a 6/6/79, 1/8/79 a 12/12/79, 1/2/80 a 17/2/81, 18/5/81 a 16/6/81, 7/10/81 a 28/2/82, 22/3/82 a 31/8/83,19/9/83 a 1/6/88, 27/6/88 a 28/11/89, 4/4/97 a 30/9/00, 2/4/01 a 30/12/01, 20/5/02 a 5/10/04, 1/2/05 a 30/12/05, 2/5/06 a 15/8/08, 3/11/09 a 15/11/113/9/12 a 28/2/13, 9/4/13 a 28/6/13 e 14/8/13 a 20/6/14
. No mérito, pleiteou a especialidade de períodos pleiteados, bem como a concessão da aposentadoria especial, bem como indenização por danos morais.Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003431-26.2014.4.03.6113
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: PEDRO MARQUES HERRERO
Advogado do(a) APELANTE: TAMARA RITA SERVILHA DONADELI NEIVA - SP209394-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ELIANA GONCALVES SILVEIRA - SP118391-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR):
Consoante entendimento pacífico do C. Superior Tribunal de Justiça, configura cerceamento de defesa a prolação de sentença de improcedência por falta de provas, quando indeferido, no curso do processo, o requerimento de produção de provas potencialmente aptas a comprovar o fato constitutivo do direito postulado em juízo. A respeito:"PROCESSUAL CIVIL . PRODUÇÃO DE PROVAS NECESSÁRIAS PARA O EXAME DA CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA
(...)
2. Na hipótese dos autos, houve pedido da parte recorrida para provar a existência de danos morais pelo fato de ter sido impedida de exercer sua atividade laboral por erro de órgão público, questão essa grave e que tem potencialidade de gerar danos morais, sendo que o fundamento da sentença diverge e não abrange tudo que a parte requerente pretendia demonstrar com a produção de prova testemunhal.
3. Há cerceamento de defesa quando o juiz indefere a realização de prova oral e pericial, requeridas oportuna e justificadamente pela parte autora, com o fito de comprovar suas alegações, e o pedido é julgado improcedente por falta de provas. (AgRg no REsp 1415970/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, terceira turma, julgado em 7/8/2014, DJe 15/8/2014; (AgRg no AgRg no AREsp 35.795/CE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 16/6/2014, DJe 4/8/2014; (AgRg no Ag 710.145/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 5/6/2014, DJe 25/6/2014).
4. Agravo Regimental não provido."
(AgRg no AREsp nº 613.390/MG, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, v.u., j. 25/08/15, DJe 18/05/16, grifos meus)
"RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. VIOLAÇÃO DO ART. 557 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 471 DO CPC. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. CERCEAMENTO DE DEFESA. CONFIGURAÇÃO.
(...)
4. Segundo a jurisprudência desta Corte, há cerceamento do direito de defesa quando a parte é impedida de produzir a prova postulada com o fito de comprovar as suas alegações e a sua pretensão é negada com fundamento na falta de provas. Precedentes.
5. Recurso especial provido."
(REsp nº 1.524.120/RJ, Terceira Turma, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, v.u., j. 23/02/16, DJe 03/03/16, grifos meus)
No presente caso a parte autora foi prejudicada pelo julgamento antecipado do feito, em razão da insuficiência dos documentos juntados aos autos para a comprovação dos períodos pleiteados.
Dessa forma, o julgamento antecipado do feito causou efetivo prejuízo à parte autora, por impedir a comprovação do caráter especial das atividades exercidas, o que obsta concessão do benefício, nos termos em que pleiteado na exordial.
É de se recordar que o princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Eduardo Couture, revelando profunda visão sobre o aspecto constitucional do direito processual, enunciou que "A lei instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
Sobre o direito à prova, esclarece Cândido Rangel Dinamarco:
"Direito à prova é o conjunto de oportunidades oferecidas à parte pela Constituição e pela lei, para que possa demonstrar no processo a veracidade do que afirmam em relação aos fatos relevantes para o julgamento. (...)
A imensa importância da prova na experiência do processo erigiu o direito à prova em um dos mais respeitados postulados inerentes à garantia política do devido processo legal, a ponto de se constituir em um dos fundamentais pilares do sistema processual contemporâneo. Sem sua efetividade não seria efetiva a própria garantia constitucional do direito ao processo. (...)
No plano infraconstitucional o direito à prova está indiretamente afirmado pelo art. 332 do Código de Processo Civil (...)
Na Constituição, o direito à prova é inerência do conjunto de garantias do justo processo, que ela oferece ao enunciar os princípios do contraditório e ampla defesa, culminando por assegurar a própria observância destes quando garante a todos o due processo of law (art. 5º, incs. LIV e LV - supra, nn. 94 e 97). Pelo aspecto constitucional, direito à prova é a liberdade de acesso às fontes e meios segundo o disposto em lei e sem restrições que maculem ou descaracterizem o justo processo."
Devido registrar, outrossim, que o C. STJ
também admite que o caráter especial do trabalho exercido seja comprovado por meio de prova pericial, por similaridade
, realizada em empresa com características semelhantes àquela em que se deu a prestação da atividade, quando não for possível a apuração das condições de trabalho no ambiente onde, efetivamente, foi prestado o labor. Neste sentido, os seguintes precedentes:"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CABIMENTO.
(...)
2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.
3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica.
4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente prestou seus serviços.
5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.
6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.
7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto.
8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido."
(REsp nº 1.370.229, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, v.u., j. 25/02/14, DJe 11/03/14, grifos meus)
"PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE.
1 . 'Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica'.
2. Agravo Regimental não provido."
(AgRg no REsp nº 1.422.399, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, v.u., j. 18/03/14, DJe 27/03/14, grifos meus)
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora para anular a sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à Vara de Origem para fins de produção da prova pericial requerida.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROVA PERICIAL. INDEFERIMENTO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE APOSENTADORIA ESPECIAL POR FALTA DE PROVAS. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO.
I- Consoante entendimento pacífico do C. Superior Tribunal de Justiça, configura cerceamento de defesa a prolação de sentença de improcedência por falta de provas, quando indeferido no curso do processo o requerimento de produção de provas potencialmente aptas a comprovar o fato constitutivo do direito postulado em juízo.
II- "Segundo a jurisprudência desta Corte, há cerceamento do direito de defesa quando a parte é impedida de produzir a prova postulada com o fito de comprovar as suas alegações e a sua pretensão é negada com fundamento na falta de provas. Precedentes." (C. STJ, REsp nº 1.524.120/RJ, Terceira Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, v.u., j. 23/02/16, DJe 03/03/16).
III- O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
IV- Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.