
D.E. Publicado em 12/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do autor e parcial provimento ao recurso do réu, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Nº de Série do Certificado: | 11A21709124EAE41 |
Data e Hora: | 25/10/2018 18:09:45 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000803-70.2015.4.03.6132/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de períodos comum e especial, para fins de revisão de aposentadoria.
A r. sentença acolheu em parte o pedido para: (i) computar os intervalos comuns de 2/3/1978 a 8/5/1978, 1/2/2005 a 9/1/2006 e março a julho de 2007; (ii) enquadrar o lapso especial de 1/6/1983 a 8/7/1989; (iii) condenar o INSS a revisar a aposentadoria do autor desde a DIB. Ademais, fixou os consectários legais e a sucumbência em reciprocidade.
Decisão não submetida ao reexame necessário, à luz do NCPC.
Irresignada, apela a parte autora, exorando o reconhecimento dos períodos afastados pelo r. julgado, a autorizar o recálculo do benefício nos termos da exordial.
Também inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual, exora inicialmente reexame de toda matéria desfavorável à Fazenda; invoca a prescrição quinquenal e eventual efeito financeiro a contar da citação; no mérito, sustenta a impossibilidade de reconhecimento dos períodos comuns e especial, à míngua de comprovação. Eventualmente, pugna por ajustes nos consectários. Por fim, prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: conheço das apelações interpostas, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
De início, não se cogita de remessa oficial, como entende o réu, por ter sido proferida a sentença na vigência do NCPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço anotado em CTPS
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
As anotações lançadas em Carteira de Trabalho gozam de presunção legal de veracidade "juris tantum", recaindo sobre o réu os ônus de comprovar a falsidade de suas anotações (Enunciado n. 12 do E. Tribunal Superior do Trabalho).
Confira-se:
No mesmo sentido, o seguinte precedente:
Acrescento que, em se tratando de relação empregatícia, é inexigível a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias pelo trabalhador urbano, pois o encargo desse recolhimento incumbe ao empregador de forma compulsória, sob fiscalização do órgão previdenciário.
Nesse sentido é a jurisprudência de que é exemplo o acórdão abaixo transcrito:
A controvérsia cinge-se na possibilidade de inclusão do vínculo formal de trabalho mantido pela parte autora entre 2/3/1978 e 8/5/1978 e de 1/2/2005 a 9/1/2006.
Com efeito, restou demonstrada, à saciedade, via anotação em CTPS contemporânea, a atividade perseguida, com as respectivas anotações salariais e recolhimento sindical (f. 76, 287 e 289).
Por outro lado, cabia ao réu, na condição de passividade processual, impugnar o conteúdo de tais documentos, mediante, inclusive, produção de prova em contrário; porém, limitou-se a afirmar não haver registro no CNIS, de sorte que os reputo válidos.
O autor busca, ainda, a inclusão das competências novembro de 2006 a julho de 2007 como contribuinte individual.
O CNIS juntado a f. 247 revela a pontualidade dos recolhimentos previdenciários relativos às competências de março a julho de 2007 e a extemporaneidade em relação às competências novembro de 2006 a fevereiro de 2007, tendo como tomador dos serviços a pessoa jurídica PIRACILK UNIFORMES LTDA./ME.
Em regra, a responsabilidade pelo recolhimento das respectivas contribuições cabe ao próprio segurado contribuinte individual, à luz do art. 30, II, da Lei nº 8.212/91; entrementes, essa mesma lei de custeio (artigos 31 e 32) contempla a possibilidade de a empresa tomadora do serviço reter a contribuição a cargo do segurado e repassá-la, juntamente com sua parte, aos cofres da previdência.
Cuida-se de contribuinte individual por equiparação a de empregado, de modo que não pode ser penalizado por eventual impontualidade ou ausência de repasse do tomador, ao INSS, do montante a título de contribuição previdenciária; ônus que recai exclusivamente sobre o contratante dos serviços.
Nesse sentido é a iterativa jurisprudência desta E. Corte (em destaque):
Portanto, as competências de novembro de 2006 a julho de 2007 - como contribuinte individual - devem compor a contagem de tempo do segurado, a autorizar a necessária revisão.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no C. STJ, assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, 2T, julgado em 6/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 dB era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 dB (artigo 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Nesse sentido, o STJ, ao julgar o Recurso especial n. 1.398.260, sob o regime do antigo artigo 543-C do CPC/73, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso, o autor reivindica o enquadramento dos lapsos executados em condições insalutíferas (nas funções de encarregado de carpintaria, mestre de obras e serviços gerais, esta no ramo metalúrgico), de 5/5/1980 a 16/3/1981, de 4/5/1981 a 8/5/1983, de 1/6/1983 a 8/7/1989 e de 6/8/1990 a 5/3/1997.
Nesse diapasão, em relação aos intervalos de 5/5/1980 a 16/3/1981, de 4/5/1981 a 8/5/1983 e de 6/8/1990 a 5/3/1997, constam formulários, acompanhados de laudos técnicos, que informam a exposição - habitual e permanente - da parte autora a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância para a época de prestação do serviço (80 dB), fato que possibilita o enquadramento no código 1.1.6 do anexo ao Decreto n. 53.831/64.
Não obstante extemporâneo, o laudo técnico das condições ambientais fora firmado por engenheiro de segurança do trabalho dos quadros da empresa empregadora do autor, de modo que se mostra idôneo ao fim colimado a autorizar a contagem diferenciada.
Outrossim, em relação ao intervalo de 1/6/1983 a 8/7/1989 exercido pelo autor na empresa PAOLI, PAOLI & CIA. LTDA., como "serviços gerais", depreende-se do formulário coligido (f. 200), exposição habitual a agentes químicos hidrocarbonetos, como soda cáustica, bem como nitrito, nitrato e cianeto de sódio, situação que se encaixa nos códigos 1.1.3 e 1.2.11 do anexo ao Decreto n. 53.831/64.
Ademais, diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, concluo que, na hipótese, a utilização de EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade do agente.
Em suma, entendo comprovada a especialidade perseguida em relação aos intervalos vindicados à prefacial.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
Não se cogita de carência, porque o autor já percebe benefício previdenciário.
Quanto ao quesito temporal, a parte autora satisfaz as condições à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral, haja vista o implemento de mais de 40 anos de profissão na entrada administrativa - 29/4/2008.
Nesse aspecto, não prospera o inconformismo do instituto-réu quanto ao termo inicial dos efeitos financeiros, porquanto, apesar de parcialmente instruído o P.A. com laudos certificadores das condições agressivas à saúde, o segurado já contava à época do requerimento com tempo suficiente à aposentação integral (cerca de 37 anos), de modo que a complementação dos documentos à inicial não altera o panorama, senão a possibilitar a majoração temporal da integralidade já reconhecida.
Dos consectários
O termo de início da revisão conta-se da DER 29/4/2008, respeitada, obviamente, a prescrição quinquenal.
Quanto à correção monetária, deve ser adotada nos termos da Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (cf. Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux), ressalvada a possibilidade de, em fase de execução, operar-se a modulação de efeitos, por força de eventual decisão do Supremo Tribunal Federal.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente, observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Diante da sucumbência, fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação deste acordão, consoante orientação desta Turma e verbete da Súmula n. 111 do STJ.
Com relação às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Quanto ao prequestionamento suscitado, não se vislumbra contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, conheço das apelações das partes; dou provimento ao apelo do autor e parcial provimento ao recurso do réu para, nos termos da fundamentação desta decisão: (i) computar o período, como contribuinte individual, de novembro de 2006 a julho de 2007; (ii) enquadrar os períodos especiais de 5/5/1980 a 16/3/1981, de 4/5/1981 a 8/5/1983 e de 6/8/1990 a 5/3/1997; (iii) reconhecer o direito à revisão, mediante concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a DER, respeitada a prescrição quinquenal e abatidos os proventos percebidos acumuladamente; (iv) ajustar, por consequência, os critérios de incidência dos consectários. Mantidos, no mais, os demais termos da r. decisão recorrida.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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