D.E. Publicado em 26/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0036944-30.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, onde a autora pleiteia a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de seu filho Wallison em 07/03/2013.
A inicial sustenta que a autora é trabalhadora rural, atividade que exerce como diarista/bóia-fria, sem registro em CTPS.
Juntou documentos.
Concedidos os benefícios da justiça gratuita.
Citado, o INSS contestou o feito.
Concedida a justiça gratuita.
Citação/contestação.
Após anulação da sentença proferida, os autos baixaram à vara de origem, onde ouvidas as testemunhas.
Proferida nova sentença em 13/11/2017, julgando procedente o pedido e concedendo o benefício de salário-maternidade, a partir do indeferimento administrativo. Pagamento das parcelas em atraso com correção monetária e juros nos termos da Lei 11.960/2009. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação. Sentença não submetida ao reexame necessário.
O INSS apela, alegando que a autora não cumpriu os requisitos para a obtenção do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Instada a autora a apresentar cópia integral da CTPS do marido às fls. 109, sem manifestação.
É o relatório.
VOTO
Os arts. 7º, XVIII, e 201, II, da Constituição, asseguram proteção à gestante. A proteção constitucional está regulada pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
A carência para a concessão do benefício está prevista nos arts. 25 e 26 da mesma lei, com a redação dada pela Lei 9.876/99, sendo necessário o correto enquadramento da segurada - empregada, contribuinte individual ou segurada especial:
As alterações introduzidas pela Lei 9.876/99 em relação à carência para as seguradas contribuinte individual, facultativa e especial são objeto das ADIs 2.110/DF e 2.111/DF, ao fundamento da violação ao princípio da isonomia, cuja liminar foi negada pelo STF.
Tratando-se de trabalhadora rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto enquadramento previdenciário.
Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina jurídica.
A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social exclusivo para os trabalhadores rurais.
O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas, tarefeiros e boias-frias.
A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:
Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.
Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao salário-maternidade.
Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.
A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados, entendimento sufragado pela jurisprudência:
O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas posteriores.
Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:
Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
Tratando-se de segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência.
Conforme o art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento do filho, a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
A autora alega ser trabalhadora rural.
As certidões de casamento e de nascimento não trazem profissão da autora ou do marido.
O sistema CNIS/Dataprev indica vínculo do marido da autora (Mário Nunes Mendes) com Theodoro Duarte do Valle de 01/11/2010 a 01/01/2014, CBO 6201 (supervisores na exploração agropecuária).
A CTPS do marido da autora traz a informação de que o vínculo do período de 01/11/2010 a 01/01/2014 teria o CBO 621005 (trabalhador agropecuário em geral - vínculo posterior descreve a atividade como campeiro/encarregado). A anotação do vínculo remete às fls. 43 da CTPS, folha que não foi apresentada.
Contudo, a situação dos autos remete à atividade do marido como rurícola, à época do nascimento. É caso da extensão da atividade, nos termos de iterativa jurisprudência.
O sistema CNIS/Dataprev não indica vínculos empregatícios em nome da autora antes do nascimento.A autora junta CTPS em nome próprio, fls. 91, constando anotação de vínculo como caseira (CBO 622005), admissão em 01/04/2015.
A atividade de caseira da autora foi comprovada após o nascimento e, por isso, o início de prova material em nome próprio não pode ser aproveitado.
A TNU já decidiu pela flexibilização do início de prova material para concessão do salário-maternidade, nos termos que seguem:
Vinha eu decidindo que o ano do documento mais remoto, onde conste a qualificação de lavrador, era o marco inicial dessa atividade, ainda que a prova testemunhal se reportasse a período anterior. Contudo, com o julgamento do Recurso Especial n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ evoluiu no sentido de admitir o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo, desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa.
As testemunhas confirmaram o exercício da atividade rural pela autora à época exigida, corroborando, assim, o início de prova material.
Mantida a concessão do benefício.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (27/07/2016), nos termos do pedido inicial.
As parcelas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária a partir dos respectivos vencimentos e de juros moratórios a partir da citação.
A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE 870.947, em 20/09/2017, ressalvada a possibilidade de, em fase de execução do julgado, operar-se a modulação de efeitos, por força de decisão a ser proferida pelo STF.
NEGO PROVIMENTO à apelação.
Correção monetária nos termos da fundamentação.
É o voto.
MARISA SANTOS
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