D.E. Publicado em 10/05/2017 |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALARIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. DIARISTA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000116-09.2014.4.03.6139/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação previdenciária objetivando a concessão de salário maternidade de trabalhadora rural.
A sentença julgou procedente o pedido, condenando a autarquia a conceder-lhe o benefício previdenciário de salário-maternidade, a partir da data do requerimento administrativo (25.02.2015 fl. 41), com prestações vencidas corrigidas com correção monetária e juros de mora. Condenou, ainda, a requerida ao pagamento dos honorários advocatícios em percentual a ser definido após a liquidação, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ. Submeteu a decisão ao reexame necessário (fls. 51-61).
O INSS interpôs apelação e aduziu, em síntese, que a autora não preencheu os requisitos ensejadores à obtenção do salário-maternidade, motivo pelo qual requer a improcedência do pedido (fls. 67-69).
Com as contrarrazões, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000116-09.2014.4.03.6139/SP
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS :
DA REMESSA OFICIAL
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo trânsito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC - vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferiores a 1000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrario, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal ) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal. Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por, a remessa oficial, implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, não produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Publico, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Isso posto, não conheço da remessa oficial.
Passo à análise do mérito.
Trata-se de ação previdenciária proposta com vistas à concessão do benefício de salário-maternidade à trabalhadora rural.
O salário-maternidade está previsto no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988, nos arts. 71 a 73 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e nos arts. 93 a 103 do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, consistindo, segundo Sérgio Pinto Martins, "na remuneração paga pelo INSS à segurada gestante durante seu afastamento, de acordo com o período estabelecido por lei e mediante comprovação médica" (Direito da Seguridade Social. 19ª ed., São Paulo: Atlas, 2003, p. 387).
O benefício é devido à segurada da Previdência Social durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, nos termos do art. 71, caput, da Lei nº 8.213/91.
Depreende-se que para a concessão do referido benefício é necessário que a beneficiária possua a qualidade de segurada e comprove a maternidade.
O artigo 71 da Lei Previdenciária, em sua redação original, apenas contemplava a empregada, urbana ou rural, a trabalhadora avulsa e a empregada doméstica como beneficiárias do salário-maternidade. Este rol foi acrescido da segurada especial pela Lei n.º 8.861, de 25 de março de 1994 e posteriormente, com a edição da Lei n.º 9.876, de 26 de novembro de 1999, foram contempladas as demais seguradas da Previdência Social.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é:
Apenas as seguradas contribuintes individuais (autônomas, eventuais, empresárias etc.) devem comprovar o recolhimento de pelo menos 10 (dez) contribuições para a concessão do salário-maternidade. No caso de empregada rural ou urbana, trabalhadora avulsa e empregada doméstica tal benefício independe de carência.
Ressalte-se que a trabalhadora rural, diarista, é empregada e segurada da Previdência Social, enquadrada no inciso I, do artigo 11, da Lei 8.213/91. Sua atividade tem características de subordinação e habitualidade, dada a realidade do campo, distintas das que se verificam em atividades urbanas, pois na cidade, onde o trabalho não depende de alterações climáticas e de períodos de entressafra, ao contrário, é possível manter o trabalho regido por horário fixo e por dias certos e determinados.
A trabalhadora em regime de economia familiar, considerada segurada especial, não necessita comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias, bastando apenas demonstrar o exercício da referida atividade nos 12 (doze) meses anteriores ao início do benefício, ainda que de forma descontínua, nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.
Neste sentido o entendimento de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari:
O vínculo com a Previdência Social, contudo, não se extingue com a extinção da relação de emprego. Nas hipóteses do art. 15 da lei nº 8.213/91, se mantém por um período de graça, dentro do qual o trabalhador continua sendo segurado da Previdência Social e, portanto, tem direito aos benefícios dela decorrentes, entre eles o salário - maternidade.
Saliento que o Regulamento da Previdência Social foi introduzido no ordenamento jurídico pelo decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, antes, portanto, do advento da lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, que alterou a redação do artigo 71 da lei nº 8.213/91. Quando foi editado, o artigo 97 do decreto nº 3.048/99 não era ilegal, considerando-se a redação anterior do artigo 71. Com a alteração do dispositivo legal, no entanto, perdeu seu suporte de validade e eficácia, não podendo mais ser aplicado pela autarquia previdenciária.
Não há que se falar em criação de novo benefício sem a correspondente fonte de custeio. Pelo que foi exposto até aqui, verifica-se que de novo benefício não se trata, haja vista a expressa previsão legal para concessão do benefício.
Quanto à fonte de custeio, o salário - maternidade, no caso de segurados que estejam no período de graça, será custeado da mesma forma que os demais benefícios concedidos a pessoas que se encontrem em período de graça. Aliás, essa é a própria essência do período de graça previsto na lei - deferir benefícios a pessoas que já contribuíram, mas que não estejam contribuindo no momento da concessão, respeitado o limite de tempo previsto na lei. A se aceitar a tese defendida pelo INSS, perderia o sentido o próprio artigo 15 da lei nº 8.213/91.
No mesmo sentido aqui esposado, admitindo o pagamento do salário - maternidade independentemente da manutenção de relação de emprego, vejam-se os seguintes arestos:
Do caso concreto.
Alega a parte autora que exerce atividade rural, na condição de trabalhadora rural e que permaneceu trabalhando até o nascimento de seu filho, em 11.06.2012, conforme certidão de nascimento de fls. 16.
Para comprovar a atividade rural, a autora colacionou aos autos, cópias de notas fiscais de produtos agrícolas, emitidas em nome do genitor da autora em 12.09.2013, em 27.01.2014 e em 07.03.2014 (fls. 18-21).
Ressalto que o reconhecimento da qualidade de segurada especial apta a receber o específico benefício tratado nos autos desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida, a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal e, finalmente, para obtenção do salário maternidade ora questionado, a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício, como define o § 2º do art. 93 do Decreto 3.048 /99.
Ante as disposições contidas no art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213 /91, os documentos apresentados pela parte autora, para que sirvam como início de prova material do labor rural; devem ser dotados de integridade probante autorizadora de sua utilização, não se enquadrando em tal situação aqueles documentos não contemporâneos ou posteriores ao nascimento do filho em razão do qual o benefício é requerido.
Com efeito, as notas fiscais trazidas aos autos para comprovar a sua condição de rurícola foram emitidas após o nascimento do filho da parte autora e trata-se de prova isolada e não corroborada por qualquer outro documento que qualifique a autora como lavradora, não sendo hábil a constituir início de prova material do labor rural da parte autora.
O início de prova material colacionado aos autos não é suficiente à formação do convencimento acerca da qualidade de segurada especial (trabalhadora rural) da autora.
Portanto, não há se falar em deferimento de salário-maternidade à parte autora.
Dessa forma, não preenchidos os requisitos legais, é indevido o benefício pleiteado.
Na espécie, sendo a parte autora beneficiária da justiça gratuita, é indevida sua condenação nas verbas de sucumbência, mesmo porque, segundo decidido pelo E. STF, descabe ao julgador proferir decisões condicionais, tocando-lhe avaliar a situação de pobreza quando do julgamento (RE 313348 AgR/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 15/04/2003, v.u., DJ 16/05/2003, p. 104).
Ante o exposto NÃO CONHEÇO DA REMESSA OFICIAL E DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido.
É como voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 25/04/2017 17:28:34 |