D.E. Publicado em 07/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso interposto pelo INSS, para reconhecer como atividades especiais apenas os períodos de 02.01.1986 a 31/07/1987, 01/09/1989 a 29.07.1992, 23/02/1995 a 31/12/2000 e 19/11/2003 a 08/07/2014, mantendo, de todo o modo, o benefício concedido, desde a data do requerimento administrativo, com antecipação de tutela, e, de ofício, especificar a forma de cálculos dos juros e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
Data e Hora: | 29/11/2018 19:08:46 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001661-38.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra a sentença de fls. 236/241, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial por ADIERSON GILMAR SOARES, reconhecendo tempo de período trabalhado em condições especiais, concedendo-lhe aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (08/07/2014), da seguinte maneira:
O réu apelou argumentando que o PPP relativo à empresa Motores Búfalo S/A não aponta a técnica utilizada para aferição do nível de ruído no local de trabalho, além de estar faltando folhas. Não é possível, também, saber se havia respon´savel pela monitoração ambiental e não houve apresentação do LTCAT. Com relação à empresa Gulliver Brinquedos LTDA, alega que não é possível aceitar a medição do nível de ruído, que aponta grande variação. Ademais, há indicação de utilização de EPI eficaz, o que afasta a nocividade do agente, não há responsável pelos registrso ambientaris no período de labor do recorrido, não foi apresentado LTCAT e o laudo é extemporâneo. Com relação à empresa Ford Motors Brasil Ltda, foi apontado o uso de EPI eficaz, sendo o ruído registrado no PPP inferior ao mínimo determinado pela Lei, além disso, o LTCAT é extemporâneo. Subsidiariamente, requer seja o benefício pago apenas a partir do afastamento da atividade, tendo em vista que após a DER o autor continuou trabalhando nas mesmas condições, o que é vedado pela legislação previdenciária.
Com contrarrazões, os autos subiram para esta Corte Regional.
Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma que a apelação foi interposta dentro do prazo legal.
O autor é benefíciário da Justiça Gratuita.
É o relatório.
VOTO
EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Inicialmente, recebo a apelação interposta pelo INSS sob a égide do Código de Processo Civil/ 2015, e, em razão da regularidade formal, conforme certidão de fl. 198, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
DO AGENTE NOCIVO - RUÍDO
A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.
Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.
Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especilaidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.
Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Feitas tais ponderações iniciais, já se pode analisar o caso dos autos, em que a questão controvertida refere-se aos períodos em que o autor alega ter trabalhado em condições especiais, ou seja, exposto a ruído acima do limite legal: 20.01.1976 a 30.04.1981, 02.01.1986 a 29.07.1992 e 23.02.1995 a 08.07.2014.
1) período de 20.01.1976 a 30.04.1981- empresa Motores Búfalo S/A (fls. 16)-
O PPP de fls. 59 revela que nos períodos de 20/01/1976 a 30/06/1978 e de 01/07/1978 a 30/04/1984, a parte autora se expôs a ruídos acima de 91 dB e 85 dB, respectivamente, estando, portanto, exposto a níveis acima do tolerado pela respectiva legislação de regência.
Não houve utilização de EPI.
Não foram discriminadas as técnicas para mensuração do risco.
Nesses períodos o autor trabalhou no setor de enrolamento de motores e almoxarifado, nos cargos de aprendiz de arrolamento e auxiliar de almoxarifado.
2) período de 02.01.1986 a 29.07.1992 - empresa Gulliver Brinquedos Ltda (fls. 17)-
O PPPde fls. 49/51, expedido aos 09/06/2014, revela que a parte autora se expôs, no período requerido, de forma habitual e permanente, a ruído (pressão sonora) da seguinte maneira:
- de 02/01/1986 a 31/07/1987 - 80 a 89 DB;
- de 01/08/1987 a 31/08/1989 - 79 a 87 dB;
- de 01/09/1989 a 28/02/1991 - 83 a 89 dB;
- 01/03/1991 a 31/05/1991 - 81 a 87 dB;
- 01/06/1991 a 29/07/1992 - 80 a 87 dB.
Nesse período o autor trabalhou no setor de serraria e manutenção geral de fábrica, nos cargos de ajudante geral, embalador, montador, líder operador de serra e 1/2 oficial eletricista/manutenção. Suas atividades, em síntese, eram relativas a pinturas decorativas em componentes, embalagem e acondicionamento do produto final, montagem de componentes, organização da área de serviço e manutenção elétrica.
Houve o uso de protetor auricular e a técnica utilizada para análise do fator de risco foi: Lutron SL 401 e Simpson 886-2.
O profissional legalmente habilitado pelos registros ambientais, no período de 1999 a 2005, foi o Engenheiro Irton T Cardoso, Nit 10057264799, registro no Conselho de Classe nº 110981 D.
Nas observações do PPP constou que "o maquinário, processo de trabalho e as condições ambientais da época de admissão do segurado até a ocasião da primeira verificação ambiental, permaneceram as mesmas das atuais, confomre informado nos laudos ocupacionais recentes ao passo de que não houve alterações signficativas no lay out desse ambiente e local de trabalho."
3) período de 23.02.1995 a 08.07.2014 - empresa Ford Motors Brasil Ltda (fls. 43/44)-
O PPP de fls. 53/56, 61/64 e 173/178, expedidos aos 12/05/2014 e 17/05/2016, revelam que a parte autora se expôs a ruído, no período de 23/02/1995 a 30/09/2002, da seguinte maneira:
- de 23/02/1995 a 31/12/2000 - 91 dB (técnica: dosimetria), com uso de EPI eficaz;
- de 01/01/2001 a 30/09/2002 - 88,8 dB (técnica: dosimetria), com uso de EPI eficaz;
- 01/10/2002 a 30/04/2012 - 88,8 (técnica: dosimetria), com uso de EPI eficaz;
- 01/05/2012 a 31/12/2012l - 90,7 (técnica: dosimetria), com uso de EPI eficaz;
- 01/01/2013 a 02/10/2015 - 87,1 (técnica: dosimetria), com uso de EPI eficaz.
Nesses períodos o autor trabalhou no setor de submontagem, caçamba e deck do motor, nos cargos de prático, ponteador e montador de produção.
Os profissionais legalmente habilitados pelos registros ambientais, nos períodos de 01/10/1985 a 07/08/2001, 04/07/195 a 28/09/2001, 01/02/1995 a 02/05/2006, 28/12/2001 e 01/06/2010 em diante, estão relacionados no item 16 do PPP, com os respectivos registros no Conselho de Classe.
Realizado Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho LTCAT (fls. 169/178), concluiu-se que o ruído era contínuo, e que os valores encontrados para ruído estavam acima do limite de tolerância. Constatou que a empresa fornecia e fiscalizava o uso efetivo de todos os equipamentos de proteção individual (EPI), capazes de atenuar o ruído em 21 dB.
Pois bem.
Não se olvida que os PPP's forrnecidos pelas empresas Gulliver Brinquedos Ltda e Ford Motors Brasil Ltda atestam que os EPI's fornecidos ao autor eram eficazes.
Isso, contudo, não afasta a especialidade do labor.
Consoante já destacado, apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
Noutras palavras, o fato de o PPP consignar que o EPI era "eficaz" (para atenuar os efeitos do agente nocivo) não significa que tal equipamento era capaz de "neutralizar a nocividade". Logo, não se pode, com base nisso, afastar a especialidade do labor, até porque, nos termos do artigo 264 § 5º, do RPS, "sempre que julgar necessário, o INSS poderá solicitar documentos para confirmar ou complementar as informações contidas no PPP, de acordo com § 7º do art. 68 e inciso III do art. 225, ambos do RPS", o que não foi levado a efeito, in casu, de molde a não deixar dúvidas acerca da neutralização da nocividade.
Isso é o que se infere da jurisprudência desta C. Corte:
Dessa forma, embora o PPP consigne que fora fornecido EPI eficaz a atenuar o efeito nocivo do agente, não há provas de que tal EPI era capaz de neutralizar a insalubridade a que o segurado estava exposto.
Noutro giro, o artigo 58, da Lei nº 8.213/91, dispõe sobre os agentes nocivos que autorizam o reconhecimento do labor especial, bem assim da comprovação à respectiva exposição.
A inteligência de tal dispositivo revela o seguinte: (i) a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por meio do PPP; (ii) o PPP deve ser emitido pela empresa, na forma estabelecida pelo INSS, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; (iii) o empregador deve manter atualizado o PPP abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a cópia desse documento; (iv) a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista em lei.
Pelos documentos comprobatórios acima, percebe-se que os PPP's colacionados aos autos demonstram de forma satisfatória os níveis de ruído a que o autor estava exposto, bem como os nomes dos responsáveis técnicos pelos registros ambientais, com o devido registro no órgão de classe para todos os períodos em questão.
O item referente à exposição a fatores de riscos atesta a medição ambiental e a técnica utilizada, concluindo-se, pelas descrições das atividades desempenhadas pelo autor, que sua exposição a agentes nocivos era inerente à atividade que desenvolvia, donde se conclui que tal exposição deve ser considerada permanente, nos termos do artigo 65, do RPS, o qual, consoante já destacado, reputa trabalho permanente"aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço".
Vale registrar que o INSS não demonstrou que a metodologia utilizada pela empresa empregadora do autor teria ensejado uma aferição incorreta do nível de ruído a que estava exposto, tampouco a legislação de regência exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O art. 58, § 1º, da Lei 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica.
Nesse sentido, já se manifestou o seguinte julgado:
Registro, também, que apesar de não constar dos PPP's campo específico referente à efetiva exposição do segurado durante sua jornada de trabalho a agente nocivo, de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, há que se considerar que a responsabilidade pela elaboração do documento é do empregador, na forma determinada pelo INSS, o qual não prevê tal anotação, não podendo ser transferido ao trabalhador o ônus decorrente da ausência desta observação.
Ressalto que pelo cargo, pela função e pelas atividades desempenhadas, tudo isso constante dos PPP's, fica evidente que a parte autora exercia seu labor exposta de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, ao agente nocivo ruído na maioria dos períodos requeridos, conforme discriminarei adiante.
Esta Colenda Turma já se pronunciou a respeito do tema, exatamente nos termos traçados neste voto:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. CONVERSÃO DA aposentadoria POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO EM aposentadoria ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. ruído . USO DE EPI. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL E LEI Nº 11.960/2009. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.(...) 7. O Perfil Profissiográfico Previdenciário - ppp não contempla campo específico para a anotação sobre a caraterização da "exposição aos agentes nocivos, de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente", tal qual ocorria nos formulários anteriores. Entretanto, a formatação do documento é de responsabilidade do INSS, de modo ser desproporcional admitir que a autarquia transfira ao segurado o ônus decorrente da ausência desta informação. (...) 11. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora provida.(AC nº 0003503-42.2012.4.03.6126, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Paulo Domingues, DE 18/04/2018)
Do Laudo extemporâneo
O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
Nesse sentido é o entendimento desta Egrégia Corte Regional, conforme se verifica dos seguintes julgados:
PREVIDENCIÁRIO. ESPECIAL. RUÍDO. CONTEMPORANEIDADE DO LAUDO PARA PROVA DE ATIVIDADE ESPECIAL. DESNECESSIDADE. HONORÁRIOS. DANOS MORAIS.
(...)Quanto à extemporaneidade do laudo, observo que a jurisprudência desta Corte destaca a desnecessidade de contemporaneidade do laudo/PPP para que sejam consideradas válidas suas conclusões, tanto porque não há tal previsão em lei quanto porque a evolução tecnológica faz presumir serem as condições ambientais de trabalho pretéritas mais agressivas do que quando da execução dos serviços. (...)
- Recurso de apelação a que se dá parcial provimento. (AC 0012334-39.2011.4.03.6183, 8ª Turma, Desembargador Federal Luiz Stefanini, DE 19/03/2018)
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISIONAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. SERRALHEIRO. FUNÇÃO ANÁLOGA À DE ESMERILHADOR. CATEGORIA PROFISSIONAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. COMPROVAÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI VIGENTE À ÉPOCA PRESTAÇÃO DA ATIVIDADE. EPI. PPP EXTEMPORÂNEO. IRRELEVANTE. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
(...) VI - O fato de os PPP"s ou laudo técnico terem sido elaborados posteriormente à prestação do serviço não afasta a validade de suas conclusões, vez que tal requisito não está previsto em lei e, além disso, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços. (...)
XII - Apelação do réu e remessa oficial parcialmente providas. (AC/ReO 0027585-63.2013.4.03.6301, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO / CONTRIBUIÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. CONVERSÃO INVERSA
(...) - A apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador. A extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais. (...)
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, e negado provimento à apelação da parte Autora. (AC/ReO 0012008-74.2014.4.03.6183, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Fausto de Sanctis, DE 17/10/2017)
Na mesma linha, temos a Súmula nº 68, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, publicada no dia Diário Oficial da União aos 24/09/2012, cujo enunciado é o seguinte:
"O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado."
Diante das provas e fundamentações expostas, faço as seguintes considerações:
a) com relação ao período de 20.01.1976 a 30.04.1981- empresa Motores Búfalo S/A, o PPP está incompleto, não há informação do responsável legalmente habilitado pelos registros ambientais, tampouco assinatura do responsável pela expedição do documento ou indicação da técnica utilizada para mensuração do ruído.
Assim, tal período não pode ser reconhecido como especial.
b) com relação ao período de 02.01.1986 a 29.07.1992 - empresa Gulliver Brinquedos Ltda, restou induvidoso que o autor se expôs a fator de risco acima do limite de tolerância, de forma habitual, nos períodos de 02/01/1986 a 31/07/1987 (80 a 89 DB), 01/09/1989 a 28/02/1991 (83 a 89 dB), 01/03/1991 a 31/05/1991 (81 a 87 dB), 01/06/1991 a 29/07/1992 (80 a 87 dB), devendo tais períodos serem reconhecido como especiais.
Nota-se, no entanto, que em um dos períodos discriminados para esta empresa (de 01/08/1987 a 31/08/1989) houve oscilação de ruído de 79 a 87 dB, portanto, para abaixo do limite de tolerância definido pela jurisprudência, restando inviabilizado, para este período, o acolhimento do período como de natureza especial, vez que o nível de ruído apto a caracterizar a especialidade teria que ser superior a 80,0 dB, de forma permanente.
Em caso que guarda similaridade com o presente - no qual o nível de ruído a que esteve o segurado exposto oscilou durante a jornada, ficando em parte dela abaixo do nível de tolerância -, assim já decidiu esta Colenda Turma, em acórdão que porta a seguinte ementa:
c) com relação ao período de 23.02.1995 a 08.07.2014 - empresa Ford Motors Brasil Ltda, é necessário dividir o período em duas etapas.
c.1) de 23/02/1995 a 31/12/2000 - ruído de 91 dB, portanto acima do limite máximo exigível na época (80dB), devendo ser reconhecido como especial;
c.2) de 01/01/2001 a 18/11/2003 - nível de 88,8 dB,portanto abaixo do nível máximo exigível na época (90dB), não podendo ser reconhecido como especial;
c3) de 19/11/2003 a 08/07/2014 - nível de 88,8 dB e 90 dB, portanto acima do limite máximo exigível na época (85, dB), devendo ser reconhecido como especial.
Em resumo, reconheço que o autor estave exposto a situação de risco, apenas nos períodos de 02.01.1986 a 31/07/1987, 01/09/1989 a 29/07/1992, 23/02/1995 a 31/12/2000 e 19/11/2003 a 08/07/2014, devendo apenas esses períodos serem reconhecido como atividades exercidas em condições especiais e convertidos em períodos comuns.
E com essas considerações, nos termos da tabela anexa, somando-se os períodos incontestáveis com os períodos exercidos em atividades especiais, verifica-se que o autor, na data do requerimento administrativo (08/07/2014), somava 44 anos, 11 meses e 10 dias de contribuição, fazendo jus, portanto, ao benefício concedido na sentença.
A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica à hipótese dos autos, em que a aposentadoria especial foi deferida apenas judicialmente.
Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei 8.231/91, determina que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei 8.231/91, revela que o segurado que estiver recebendo aposentadoria especial terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente ao exercício da atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício e, consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a continuidade do exercício da atividade especial se houver (i) a concessão do benefício e, posteriormente, (ii) o retorno ao labor especial.
No caso, não houve a concessão da aposentadoria especial, tampouco o posterior retorno ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o INSS o indeferiu na esfera administrativa, circunstância que, evidentemente, levou o segurado a continuar a trabalhar, até mesmo para poder prover a sua subsistência e da sua família.
Considerando que a aposentadoria especial só foi concedida na esfera judicial e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas sim continuou nele trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não se amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra o trânsito em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
Destaque-se que esta C. Turma, ao interpretar tal dispositivo, já decidiu que "Não há que se falar na impossibilidade do beneficiário continuar exercendo atividade especial, pois diferentemente do benefício por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é incompatível com a própria natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor sob condições especiais na pendência de ação judicial, na qual postula justamente o respectivo enquadramento, revela cautela do segurado e não atenta contra os princípios gerais de direito; pelo contrário, privilegia a norma protetiva do trabalhador". (ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1928650 / SP 0002680-43.2012.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS).
Não se pode olvidar, ainda, que o entendimento que, com base numa interpretação extensiva, aplica o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, a casos em que a aposentadoria especial é concedida apenas judicialmente, impedindo o pagamento dos valores correspondentes à aposentadoria especial no período em que o segurado continuou trabalhando em ambiente nocivo, não se coaduna com a interpretação teleológica, tampouco com o postulado da proporcionalidade e com a proibição do venire contra factum proprium (manifestação da boa-fé objetiva).
De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger a saúde do trabalhador, vedando que o beneficiário de uma aposentadoria especial continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria especial do período em que ele, após o indevido indeferimento do benefício pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente nocivo significa, a um só tempo, beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a autarquia deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se viu na contingência de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando já tinha direito ao benefício que fora indevidamente indeferido pelo INSS - o que colide com os princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva (venire contra factum proprium).
Por tais razões, reconheço que o disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica ao caso dos autos, não havendo, por conseguinte, que se falar em descontos, na fase de liquidação, das parcelas atrasadas dos períodos em que a parte autora permaneceu exercendo atividades consideradas especiais.
Vale ressaltar, que a limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica à hipótese dos autos, em que a aposentadoria foi deferida apenas judicialmente.
Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei 8.231/91, determina que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei 8.231/91, revela que o segurado que estiver recebendo aposentadoria especial terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente ao exercício da atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício e, consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a continuidade do exercício da atividade especial se houver (i) a concessão do benefício e, posteriormente, (ii) o retorno ao labor especial.
No caso, não houve a concessão administrativa da aposentadoria especial, tampouco o retorno ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o INSS o indeferiu na esfera administrativa, circunstância que, evidentemente, levou o segurado a continuar a trabalhar, até mesmo para poder prover a sua subsistência e da sua família.
Considerando que a aposentadoria só foi concedida na esfera judicial e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas sim continuou nele trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não se amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra o trânsito em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
Destaque-se que esta C. Turma, ao interpretar tal dispositivo, já decidiu que "Não há que se falar na impossibilidade do beneficiário continuar exercendo atividade especial, pois diferentemente do benefício por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é incompatível com a própria natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor sob condições especiais na pendência de ação judicial, na qual postula justamente o respectivo enquadramento, revela cautela do segurado e não atenta contra os princípios gerais de direito; pelo contrário, privilegia a norma protetiva do trabalhador". (ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1928650 / SP 0002680-43.2012.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS).
Não se pode olvidar, ainda, que o entendimento que, com base numa interpretação extensiva, aplica o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, a casos em que a aposentadoria especial é concedida apenas judicialmente, impedindo o pagamento dos valores correspondentes à aposentadoria especial no período em que o segurado continuou trabalhando em ambiente nocivo, não se coaduna com a interpretação teleológica, tampouco com o postulado da proporcionalidade e com a proibição do venire contra factum proprium (manifestação da boa-fé objetiva).
De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger a saúde do trabalhador, vedando que o beneficiário de uma aposentadoria especial continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria especial do período em que ele, após o indevido indeferimento do benefício pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente nocivo significa, a um só tempo, beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a autarquia deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se viu na contingência de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando já tinha direito ao benefício que fora indevidamente indeferido pelo INSS - o que colide com os princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva (venire contra factum proprium).
Por tais razões, reconheço que o disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica ao caso dos autos, ao menos até que ocorra o trânsito em julgado da decisão que concedeu o benefício e que este seja implantado. Por conseguinte, não há que se falar em descontos, na fase de liquidação, das parcelas atrasadas dos períodos em que a parte autora permaneceu exercendo atividades consideradas especiais.
Vencido o INSS na maior parte, deve arcar integralmente com a verba honorária, que deve ser mantida nos termos da sentença, conforme entendimento adotado por esta C. Turma e diante da moderada dificuldade da questão.
Observo que provido em parte o apelo do INSS interposto na vigência do CPC/2015 (art. 85, § 11) , descabida a sua condenação em "honorários recursais".
Sobre os consectários legais, obsevo que, foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.941/2009, não podendo subsistir o critério adotado pela sentença, tampouco o requerido pelo INSS, porque em confronto com o índice declarado aplicável pelo Egrégio STF, em sede de repercussão geral, impondo-se, assim, a modificação do julgado, inclusive, de ofício.
Assim, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam: juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e correção monetária segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado.
Por fim, considerando as evidências coligidas nos autos, nos termos supra fundamentado, bem como o caráter alimentar do benefício, que está relacionado à sobrevivência de quem o pleiteia, deve ser mantida a tutela antecipada requerida expressamente pelo autor e concedida pelo Juízo "a quo".
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso inteposto pelo INSS, para reconhecer como atividades especiais apenas os períodos de 02.01.1986 a 31/07/1987, 01/09/1989 a 29.07.1992, 23/02/1995 a 31/12/2000 e 19/11/2003 a 08/07/2014, mantendo, de todo o modo, o benefício concedido, desde a data do requerimento administrativo, com antecipação de tutela, e, de ofício, especifico a forma de cálculos dos juros e correção monetária.
É o voto.
Desembargadora Federal
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