Apelação Cível Nº 5027299-68.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR) E OUTRO
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas contra sentença proferida em Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do INSS buscando a condenação da Autarquia a delimitar e cumprir os seguintes prazos: (i) agendamento de atendimento para requerimento de salário-maternidade para até 10 (dez) dias subsequentes ao comparecimento do beneficiário na agência ou ao seu pedido de agendamento por meio eletrônico e/ou telefônico; (ii) o prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados a partir do requerimento, para a concessão e início do pagamento do benefício de salário-maternidade.
O MPF alegou, em síntese, que, a partir das investigações levadas a cabo no Inquérito Civil nº 1.25.000.000294/2016-1, a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão concluiu pela excessiva demora na concessão e pagamento do benefício de salário-maternidade que, não raro, supera os 120 (cento e vinte) dias de duração da licença-maternidade.
Relatou que expediu a Recomendação nº 31/2016, orientando o ora réu a cumprir integralmente o contido no artigo 71 da Lei dos Benefícios Previdenciários, observando o prazo máximo de 30 (trinta) dias, a partir do requerimento, para a concessão e início do pagamento do benefício salário-maternidade, mas que, sob justificativas insatisfatórias, a Previdência Social se recusou a respeitar a Recomendação.
Resumidamente, argumentou o INSS: (i) que responde a Ação Civil Pública nº 5000702.09.2010.404.7000, cujo objeto é a redução no prazo de realização de perícia médica por parte do INSS, exigindo mais dos servidores administrativos e peritos médicos; (ii) que, na maior parte dos casos, o responsável pelo pagamento do benefício é a própria empresa-empregadora, de modo que não seria necessário o envolvimento do Instituto a priori; (iii) e que haveria problemas causados pela quantidade insatisfatória de pessoal, tendo em vista constantes aposentadorias e exonerações, bem como as medidas de contingenciamento orçamentário por parte do governo federal e a demanda de requerimentos além da capacidade de atendimento, tudo agravado pelas greves de 2015 e 2016.
Sustentou o MPF, também, que o cumprimento de deveres impostos por decisão judicial (Ação Civil Pública nº 5000702.09.2010.404.7000) não justifica a demora no atendimento aos cidadãos que dele necessitam, bem como que o argumento de que, na maioria dos casos, o Instituto só precisaria se envolver posteriormente - uma vez que o pagamento seria realizado diretamente pela empresa-empregadora - não autoriza que aqueles que recebem o benefício diretamente do INSS recebam tratamento diferenciado.
Aduziu que o salário-maternidade dispensa uma complexa análise e a necessidade de perícia, a qual é excepcional nesses casos, para ser concedido, porquanto a lei faz apenas duas exigências para as seguradas poderem obter o benefício: (a) o afastamento do trabalho ou atividade desempenhada e (b) o fato gerador do direito ao benefício - que pode ser o parto, inclusive do natimorto, o aborto não criminoso, a adoção ou a guarda judicial para fins de adoção.
Por fim, asseverou que a alta demanda e os problemas com pessoal não impedem justificadamente que o atendimento das solicitações deste benefício seja rápido, nada havendo que justifique satisfatoriamente a espera de seis meses para só então ser iniciado o atendimento de gestantes ou mães de recém-nascidos que fazem jus ao benefício.
Foi concedida, em parte, a antecipação dos efeitos da tutela, nos seguintes termos (evento 14, originário):
"(...)
2. Assiste razão ao MPF nesta analise perfunctória de medida liminar.
Inicialmente, cumpre ressaltar a importante e diligente atuação do Ministério Público Federal na defesa de interesse coletivo de proteção de direitos à previdência e à assistência dos segurados e seus dependentes, com status de direitos fundamentais sociais, em situações geradoras de necessidades e concessão do mínimo existencial (arts. 201 e 203, da CF).
Da mesma forma, a complexidade e a diversidade do funcionamento do sistema previdenciário nacional apontam dificuldades na simples solução de deferimento automático do pleito, mormente por envolver grande volume de benefícios e compreensão do funcionamento da máquina estatal.
Nesse sentido, sabe-se da necessidade do Poder Público observar o devido processo administrativo, em atenção aos princípios da legalidade, probidade e preservação do interesse público. Ao mesmo tempo, se o caminhar administrativo deve seguir uma ritualidade, com atendimento a preceitos constitucionais e legais para motivar o ato administrativo, seja concessivo ou indeferitório de direito, também deve atender a razoabilidade e a eficiência administrativa. Essa relação de razoabilidade também deve pautar eventual intervenção judicial na esfera própria da Administração, sob pena de lesão ao princípio da separação dos poderes. Isso porque, eventual determinação deve vir em consonância com a lei e a proporcionalidade.
Outrossim, não se pode olvidar que a razão de ser do auxílio é a extrema delicadeza da situação na qual ele é concedido. Envolve a proteção a maternidade e ao nasciturno. Seu sustento essencial e tranquilo, Isso porque, aquele que possui o direito de recebê-lo está afastado de sua fonte de renda justamente para poder disponibilizar melhor atenção ao infante no início de sua vida, momento tão frágil e tão importante para o desenvolvimento saudável da criança. Assim, sem poder exercer atividade remuneratória, é imprescindível que os genitores do recém-nascido recebam auxílio para poderem subsistir e garantir uma boa e saudável estrutura para o crescimento deste. Tal situação se mostra mais extrema em momentos de crise como o atual, com alta taxa de desemprego, como é o caso de um dos cidadãos que noticiaram o não recebimento do benefício de salário-maternidade durante o prazo da licença maternidade de 120 dias (evento 02, AUTO2, fl. 01, e AUTO3, fl. 20).
Verifico que o Ministério da Previdência Social e o INSS têm demonstrado maior diligência na melhoria desses serviços, seja com medidas de priorização da política de seguridade social, seja com incremento de melhor estrutura material e humana para atender a demanda, como foi relatado ao MPF (evento 02, AUTO2, fls. 27/30).
Mesmo assim, mostram-se insuficientes as medidas adotadas pela Autarquia até o momento, demonstrando encontrar limite de saneamento das debilidades funcionais, pelo menos em parte, pela demora de conclusão dos concursos públicos, prazos de nomeação e posse, greves etc. Esse fato é de conhecimento público, onde de regra não atendem os chamados de nomeação por questões de remuneração, local de residência.
Logo, esse contexto remete à adoção de providências com maior agilidade, flexibilidade e eficiência para solucionar a demanda de pedidos de benefício tão importante e, ao mesmo tempo, de fácil análise, como bem ressaltou o MPF.
A respeito do benefício de salário-maternidade, dispõe a Lei nº 8.213/91:
artigo71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
Assim, não se mostra razoável o agendamento para requisição do benefício e o pagamento após escoados o prazo de 120 dias dias, no qual a mãe ficou privada de sua remuneração. Acrescida de toda a angustia de passar sua licença sem salario. Uma verdadeira punição por ser mãe!
Ainda mais em tempos de internet, em que varios processos administrativos do Estado podem ser iniciados pelo proprio cidadão (Exemplos eproc e passaporte) com o comparecimento somente para mostrar os documentos originais, e que poupa cidadão e Estado da mora que inviabiliza direitos. Nada impede, que em prol de uma solução destes prazos cada vez mais longos, o INSS passe a pensar em uma primeira fase pela internet com o comparecimento pessoal ja com dados encaminhados. Falta de pessoal não é desculpa.
Enfim, entendo que o prazo de 30 (trinta) dias para deferir ou indeferir o benefício, como requerido na inicial, mostra-se razoável considerando os bens jurídicos em conflito: direito do segurado ao benefício previdenciário e a reserva do possível diante das limitações materiais da Administração. Não é somente a falta de pessoal, mas a falta de outras alternativas que fazem ver quo o INSS mais do que mora, parece ter conforto na sua situação, que comparada a muitas mães em peurpério, é desesperadora sem seu salário. è uma situação injusta que pela sua própria injustiça deve ser revista e reajustada.
Note-se que é o mesmo prazo fixado pela Lei nº 9.784/99 para a decisão da Administração uma vez concluída a instrução do processo administrativo:
artigo49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.
Dessa forma, defiro o pedido de tutela de evidência, nos termos do artigo311 do CPC, para determinar que o INSS decida sobre a concessão ou não dos benefícios de salário-maternidade no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do efetivo agendamento de atendimento para requisição do benefício ou meio eletrônico ou telefônico. Fixo multa de R$ 1.000,00 diários para o caso de descumprimento.
(...)"
Contra essa decisão, o INSS opôs embargos de declaração (evento 11), aos quais foi dado parcial provimento, para fixar que a decisão abrangeria os requerimentos de benefícios feitos nas agências localizadas na subseção judiciária de Curitiba (evento 13, originário).
O MPF interpôs Agravo de Instrumento, ao qual foi dado provimento, determinando esta Corte que a decisão proferida na ação civil pública originária deveria abranger todo território nacional (evento 19, originário). Essa questão encontra-se sub judice, por conta de Recurso Especial interposto pelo INSS.
O INSS contestou o feito (evento 24, originário), alegando, em síntese, que não se lhe poderia imputar a obrigação pleiteada nesta ação, sendo fundamental que se considere suas condições estruturais, os métodos de gerenciamento de suas atividades finalísticas e a demanda a ele apresentada diariamente, não havendo falar em falha na prestação de seus serviços. Sustentou que vem implementando medidas para diminuir o tempo médio de concessão dos benefícios. Asseverou que os efeitos da decisão devem se limitar à Subseção Judiciária de Curitiba, e que o prazo para concessão do benefício deve ser fixado em 45 dias, além de ser descabida a fixação de multa por descumprimento.
O INSS comprovou o cumprimento da tutela (evento 50, originário).
Sobreveio sentença de parcial procedência (evento 126, originário), decidindo o Juízo Singular pela confirmação da decisão que antecipara os efeitos da tutela, nos termos do artigo487, I, do CPC, a fim de que o INSS decida sobre a concessão ou não dos benefícios de salário-maternidade no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do efetivo agendamento de atendimento para requisição do benefício ou meio eletrônico ou telefônico, sob pena de multa de R$ 1.000,00 diários para o caso de descumprimento. No que tange ao alcance terrotorial de tal decisão, restou decidido que a abrangência compreenderia apenas os requerimentos de benefícios feitos nas agências localizadas na subseção judiciária de Curitiba, pois, embora tenha sido provido o Agravo de Instrumento interposto pelo MPF, para definir que a decisão deve abranger todo o território nacional, ainda não houvera àquela altura o trânsito em julgado da decisão. Por fim, o INSS foi condenado, ainda, ao pagamento integral dos honorários de sucumbência, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, § 3°, do Novo Código de Processo Civil, dependendo da apuração do montante em eventual cumprimento de sentença, sempre observando o § 5° do artigo 85 do CPC, tendo sido considerado, para tanto, o moderado grau de zelo do procurador do autor, o fato de a cidade da prestação de serviço ser a mesma em que o i. causídico tem escritório, além da importância da causa e finalmente que a causa não demandou tempo extraordinário do i. causídico. A base de cálculo foi estabelecida como "o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4)".
Após a rejeição (evento 66, originário) dos embargos de declaração opostos no evento 62, foram interpostas as apelações:
O Ministério Público Federal, em suas razões (evento 71, originário), apelou exclusivamente quanto ao trecho da sentença que circunscreveu os efeitos da decisão aos limites da competência territorial do Juízo a quo. Afirmou que, em se tratando de "pagamento de salário maternidade em tempo razoável - de direito com nítidos contornos individuais homogêneos", seria caso de ampliar a eficácia da decisão para beneficiar todas as gestantes/parturientes do território nacional. Pediu, pois, a reforma da sentença quanto a este particular, e, subsidiariamente, pediu fossem os efeitos estendidos, pelo menos, a todo o Estado do Paraná.
Já o INSS (evento 72, originário), após relatar os principais andamentos da demanda, repisou os termos da contestação, dizendo, inicialmente, que não se lhe poderia imputar falha na prestação do serviço. Após colacionar trechos das considerações produzidas por diversos de seu setores internos, disse que pretende a reforma da sentença, asseverando que a prestação dos serviços por aquele órgão precisa se dar dentro das suas possibilidades materiais e financeiras. Ressaltou, também, que a sentença deve ser reformada, pois a Autarquia vem exercendo suas atividades da melhor maneira possível, tomando todas as medidas dentro de seu alcance para aprimorar tais atividades, não havendo justa causa para a condenação contra a qual ora se insuge. Sucessivamente, pediu o INSS a aplicação do artigo 41-A da Lei 8.213/91, segundo o qual o prazo para concessão ou indeferimento do benefício seria de 45 (quarenta e cinco) dias, a contar da data da apresentação da documentação instrutória do pedido ou, no pior dos casos, a contar da data do requerimento administrativo. Por fim, insurgiu-se quanto à imposição da multa diária pelo descumprimento, que pretende ver afastada. Destacou, também, que deve ser afastada a condenação ao pagamento de honorários advocatícios destinados ao MPF, medida essa que estaria a contrariar o artigo 128, §5º, II "a" e "b", da Constituição Federal. Nesses termos, pugnou pela improcedência da demanda.
É o Relatório.
Dispensada a revisão na forma do artigo37, inc. IX, do Regimento Interno desta Corte.
VOTO
Insurgem-se as partes contra a sentença que, em ação civil pública, reconheceu o direito dos substituídos pelo Ministério Público Federal a terem examinados e decididos pelo INSS os pedidos de salário-maternidade no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do efetivo agendamento de atendimento para requisição do amparo, por meio eletrônico ou telefônico, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 para os casos de descumprimento.
1. Ministério Público. Legitimidade ativa.
Inicialmente, cumpre tecer as seguintes considerações acerca da legitimidade do Ministério Público para figurar no polo ativo desta demanda.
A ação civil pública tem por finalidade, dentre outras, como indicado no artigo 1º da Lei 7.347/85, apurar a responsabilidade por danos morais e patrimoniais "IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo", competindo ao Ministério Público "instaurar o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos direitos e interesses difusos ou coletivos, individuais indisponíveis e individuais homogêneos do idoso" (art. 74, inc. I, Lei 10.741/03), como ainda poderá propor "ações civis públicas destinadas à proteção de interesses coletivos ou difusos das pessoas portadoras de deficiência..." (art. 3º da Lei 7.853/89).
Ademais, na esteira da previsão do artigo 31 da Lei 8.742/93, "cabe ao Ministério Público zelar pelo efetivo respeito aos direitos estabelecidos nesta lei", nisso compreendido o benefício assistencial previsto no artigo 20 do mesmo diploma legal.
A isso deve ser acrescida a acentuada busca dos cidadãos pelos direitos e garantias assegurados pela Constituição Federal. Para isso, as ações coletivas, como a própria ação civil pública, assumem papel de extrema relevância. Sem embargo, vem contribuir sobremodo para a agilização da prestação jurisdicional, evitando o ajuizamento de centenas ou mesmo milhares de ações individuais, para perseguição dos mesmos direitos.
Portanto, é plenamente justificada essa tendência de prestigiar a atuação do Ministério Público como Instituição à qual atribuída a utilização da ação civil pública na proteção aos direitos sociais, sejam difusos ou coletivos, ou ainda, em defesa de direitos individuais homogêneos, desde que esteja configurado interesse social relevante.
Em abono a esse entendimento, cabe trazer ensinamento de Teori Albino Zavascki, verbis:
"Questão mais delicada é a de saber se o Ministério Público tem legitimação para defender coletivamente outros direitos individuais além daqueles expressamente previstos pelo legislador ordinário. Enfrentando o tema no estudo antes referido, concluímos que não cabe ao Ministério Público bater-se em defesa de direitos ou interesses individuais, ainda que, por terem origem comum, possam ser classificados como homogêneos. Aliás, esta tem sido a orientação do Superior Tribunal de Justiça. Entretanto, em casos excepcionais, devidamente justificados e demonstrados, em que a eventual lesão a um conjunto de direitos individuais possa ser qualificada, à luz dos valores jurídicos estabelecidos, como lesão a interesses relevantes da comunidade, ter-se-ia presente hipótese de lesão a interesse social, para cuja defesa está o Ministério Público legitimado pelo art. 127 da Constituição. Também nestas hipóteses - cuja configuração estará evidentemente sujeita ao crivo do Poder Judiciário - a atuação do Ministério Público, necessariamente em forma de substituição processual autônoma, limitar-se-á à obtenção dos provimentos genéricos indispensáveis à restauração dos valores sociais comprometidos, sendo-lhe vedado deduzir pretensões que signifiquem, simplesmente, tutela de interesses particulares, ainda que homogêneos, ou de grupo." (Defesa de Direito Coletivos e Defesa Coletiva de Direitos - Revista AJUFE nº 48, ano 1996, p. 7-21).
Finalmente, em recente decisão monocrática, exarada pelo Ministro Celso de Mello, RE nº 472.489-RS, perante o Excelso Supremo Tribunal Rederal, foi reafirmado que:
"... Esse entendimento - que reconhece legitimidade ativa ao Ministério Público para a defesa, em juízo, dos direitos e interesses individuais homogêneos impregnados de relevante natureza social - reflete-se na jurisprudência firmada por esta Suprema Corte (RTJ 185/302, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI 491.195-AgR/SC, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RE 213.015/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - RE 255.207/MA, Rel. Min. CEZAR PELUSO - RE 394.180-AgR/CE, Rel. Min. ELLEN GRACIE - RE 424.048-AgR/SC, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RE 441.318/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - RE 470.135-AgR-ED/MT..." (publicada no DJE de 28.11.2007 - destaquei).
Assim, resta seguramente confirmada a legitimidade do Ministério Público Federal para figurar no polo ativo da presente ação.
2. Mérito
Como se vê do Relatório, trata-se de apelações contra sentença que impôs ao INSS a obrigação de, no prazo de 30 (trinta) dias, solucionar os pedidos de salário-maternidade a ele dirigidos, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (mil reais).
No que tange estritamente ao mérito da presente ação civil pública, a sentença examinou e decidiu com precisão os pontos relevantes da lide, ora devolvidos à apreciação do Tribunal, assim como o respectivo conjunto probatório produzido nos autos. Evidenciando-se, assim, a desnecessidade da construção de nova fundamentação jurídica, destinada à confirmação da bem lançada sentença, da lavra da MM. Juíza Federal, Dra. Luciana Dias Bauer, transcrevo e adoto como razões de decidir os seus fundamentos, que ora reproduzo in verbis:
"(...)
Inicialmente, cumpre ressaltar a importante e diligente atuação do Ministério Público Federal na defesa de interesse coletivo de proteção de direitos à previdência e à assistência dos segurados e seus dependentes, com status de direitos fundamentais sociais, em situações geradoras de necessidades e concessão do mínimo existencial (arts. 201 e 203, da CF).
Da mesma forma, a complexidade e a diversidade do funcionamento do sistema previdenciário nacional apontam dificuldades na simples solução de deferimento automático do pleito, mormente por envolver grande volume de benefícios e compreensão do funcionamento da máquina estatal.
Nesse sentido, sabe-se da necessidade do Poder Público observar o devido processo administrativo, em atenção aos princípios da legalidade, probidade e preservação do interesse público. Ao mesmo tempo, se o caminhar administrativo deve seguir uma ritualidade, com atendimento a preceitos constitucionais e legais para motivar o ato administrativo, seja concessivo ou indeferitório de direito, também deve atender a razoabilidade e a eficiência administrativa. Essa relação de razoabilidade também deve pautar eventual intervenção judicial na esfera própria da Administração, sob pena de lesão ao princípio da separação dos poderes. Isso porque, eventual determinação deve vir em consonância com a lei e a proporcionalidade.
Outrossim, não se pode olvidar que a razão de ser do auxílio é a extrema delicadeza da situação na qual ele é concedido. Envolve a proteção a maternidade e ao nasciturno. Seu sustento essencial e tranquilo, Isso porque, aquele que possui o direito de recebê-lo está afastado de sua fonte de renda justamente para poder disponibilizar melhor atenção ao infante no início de sua vida, momento tão frágil e tão importante para o desenvolvimento saudável da criança. Assim, sem poder exercer atividade remuneratória, é imprescindível que os genitores do recém-nascido recebam auxílio para poderem subsistir e garantir uma boa e saudável estrutura para o crescimento deste. Tal situação se mostra mais extrema em momentos de crise como o atual, com alta taxa de desemprego, como é o caso de um dos cidadãos que noticiaram o não recebimento do benefício de salário-maternidade durante o prazo da licença maternidade de 120 dias (evento 02, AUTO2, fl. 01, e AUTO3, fl. 20).
Verifico que o Ministério da Previdência Social e o INSS têm demonstrado maior diligência na melhoria desses serviços, seja com medidas de priorização da política de seguridade social, seja com incremento de melhor estrutura material e humana para atender a demanda, como foi relatado ao MPF (evento 02, AUTO2, fls. 27/30).
Mesmo assim, mostram-se insuficientes as medidas adotadas pela Autarquia até o momento, demonstrando encontrar limite de saneamento das debilidades funcionais, pelo menos em parte, pela demora de conclusão dos concursos públicos, prazos de nomeação e posse, greves etc. Esse fato é de conhecimento público, onde de regra não atendem os chamados de nomeação por questões de remuneração, local de residência.
Logo, esse contexto remete à adoção de providências com maior agilidade, flexibilidade e eficiência para solucionar a demanda de pedidos de benefício tão importante e, ao mesmo tempo, de fácil análise, como bem ressaltou o MPF.
A respeito do benefício de salário-maternidade, dispõe a Lei nº 8.213/91:
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
Assim, não se mostra razoável o agendamento para requisição do benefício e o pagamento após escoados o prazo de 120 dias dias, no qual a mãe ficou privada de sua remuneração. Acrescida de toda a angústia de passar sua licença sem salário. Uma verdadeira punição por ser mãe!
Ainda mais em tempos de internet, em que vários processos administrativos do Estado podem ser iniciados pelo proprio cidadão (Exemplos eproc e passaporte) com o comparecimento somente para mostrar os documentos originais, e que poupa cidadão e Estado da mora que inviabiliza direitos. Nada impede, que em prol de uma solução destes prazos cada vez mais longos, o INSS passe a pensar em uma primeira fase pela internet com o comparecimento pessoal já com dados encaminhados. Falta de pessoal não é desculpa.
Enfim, entendo que o prazo de 30 (trinta) dias para deferir ou indeferir o benefício, como requerido na inicial, mostra-se razoável considerando os bens jurídicos em conflito: direito do segurado ao benefício previdenciário e a reserva do possível diante das limitações materiais da Administração. Não é somente a falta de pessoal, mas a falta de outras alternativas que fazem ver que o INSS mais do que demorar, parece ter conforto na sua situação, que comparada a muitas mães em peurpério, é desesperadora sem seu salário. è uma situação injusta que pela sua própria injustiça deve ser revista e reajustada.
Note-se que é o mesmo prazo fixado pela Lei nº 9.784/99 para a decisão da Administração uma vez concluída a instrução do processo administrativo:
Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.
Assim, o INSS deve decidir sobre a concessão ou não dos benefícios de salário-maternidade no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do efetivo agendamento de atendimento para requisição do benefício ou meio eletrônico ou telefônico, sob pena de multa de R$ 1.000,00 diários para o caso de descumprimento.
(...)
Ante o exposto, confirmo a decisão que antecipou os efeitos da tutela e julgo parcialmente procedente o pedido inicial, nos termos do art. 487, I, do CPC.
(...)"
Dessa forma, valendo-me das razões até aqui expostas, mantenho, quanto ao mérito, a sentença ora apelada.
3. Da abrangência territorial da decisão
Quanto a esse tema, disse a sentença:
"No tocante ao alcance territorial da decisão, estabelece o art. 16 da LACP, com redação da Lei nº 9.494/97, que a sentença fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator. Trata-se de regra que vem sendo aplicada pelo Superior Tribunal de Justiça, como se vê em decisão tomada pela Corte Especial:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AUSÊNCIA DE DISSENSO ENTRE OS ARESTOS CONFRONTADOS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SENTENÇA. EFEITOS ERGA OMNES. ABRANGÊNCIA RESTRITA AOS LIMITES DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DO ÓRGÃO PROLATOR. 1. Não há falar em dissídio jurisprudencial quando os arestos em confronto, na questão em foco, decidem na mesma linha de entendimento. 2. Nos termos do art. 16 da Lei n. 7347/85, alterado pela Lei n. 9494/97, a sentença civil fará coisa julgada erga omnes nos limites da competência territorial do órgão prolator. (EDRESP 293.407/SP - Corte Especial - Rel. Min. João Otávio de Noronha - DJU 01-08-06)
Não existem razões para se entender diferentemente no caso presente.
Neste sentido também é a posição do TRF/4ª Região:
Em se tratando de ação civil pública, os efeitos do julgado atingem aqueles substituídos residentes nos limites da competência territorial do órgão prolator, na forma do art. 16, da Lei nº 7.347/85, com a redação da Lei nº 9.494/97. Entendimento já pacificado perante o STF (ADI-MC1576 - Pleno - Rel. Min. Marco Aurélio - DJ 06.06.2003, p. 0029); e STJ (EREsp 293407-SP - Corte Especial - Rel. Min. João Otávio de Noronha - DJ 01.08.2006, p. 327). 8. Apelação do Ministério Público Federal e remessa oficial parcialmente providas e não provida a apelação do INSS. (TRF4, AC 2005.72.04.004023-2, Quinta Turma, Relator Luiz Antonio Bonat, D.E. 02/06/08)
Assim, a decisão abrange os requerimentos de benefícios feitos nas agências localizadas na subseção judiciária de Curitiba.
Embora tenha sido dado provimento ao Agravo de Instrumento para definir que a decisão deve abranger todo o território nacional, observo que ainda não houve o trânsito em julgado daquela decisão. Embora tenha sido dado provimento ao Agravo de Instrumento para definir que a decisão deve abranger todo o território nacional, observo que ainda não houve o trânsito em julgado daquela decisão."
Quanto a este particular, merece reparo a sentença.
Ocorre que, conforme destacado pelo próprio Juízo singular, a questão referente à abrangência territorial da presente ação civil pública já foi objeto de apreciação por este Regional, que decidiu o Agravo de Instrumento nº 5042008-59.2017.4.04.0000/PR em acórdão assim ementado:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ABRANGÊNCIA DA DECISÃO. SALÁRIO MATERNIDADE.
1. A abrangência dos efeitos de decisão proferida em Ação Civil Pública deve observar a extensão do dano.
2. Tratando-se de ação civil pública cujo dano resultante da conduta da autarquia previdenciária no cumprimento dos prazos para agendamento de atendimento para requerimento de salário-maternidade, bem como para a concessão e início do pagamento do respectivo benefício, tem, por óbvio, amplitude nacional, a violação ou ofensa ao direito somente poderá ser evitada se a decisão produzir efeito em todo o território nacional."
Portanto, voto no sentido de adequar a sentença quanto à abrangência territorial de seus efeitos, os quais devem estender-se a todo o território nacional, em observância ao julgado desta Corte que, previamente, enfrentou esse tema, pelo que vai provido o apelo do Ministério Público Federal.
4. Da multa diária
Finalmente, quanto à multa estabelecida para o descumprimento da determinação, considerando que a decisão é reafirmada pela sentença, entendo que é de ser parcialmente reformada, merecendo provimento a apelação do INSS no ponto, para que a multa imposta seja limitada ao valor de R$ 100,00 (cem reais), por dia de atraso, para cada beneficiário em relação ao qual não for cumprida a presente decisão. Provido quanto a este ponto, portanto, o apelo do INSS.
5. Dos honorários advocatícios. Descabimento.
No que se refere aos honorários advocatícios, merece reforma a sentença, não sendo cabível a condenação a esse título, porque é vedado ao Ministério Público recebê-los, na forma do que dispõe o artigo 237, inciso I, da Lei Complementar nº 75/93. Provido, pois, também quanto a este ponto, o apelo do INSS.
Relativamente às custas processuais, o INSS é isento do seu pagamento no Foro Federal, por força do artigo 4º, inciso I, da Lei 9.289/96.
Para concluir, deve ser registrado que as razões que fundamentam o presente julgamento fazem por superar os dispositivos legais e constitucionais prequestionados pelas partes, tornando desnecessária a expressa referência a cada artigo apontado.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso do Ministério Público Federal e dar parcial provimento à apelação do INSS.
Documento eletrônico assinado por JOSÉ ANTONIO SAVARIS, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000915284v2 e do código CRC d6d5249e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Data e Hora: 12/2/2019, às 9:34:46
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Apelação Cível Nº 5027299-68.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BENEFÍCIO DE SALÁRIO-MATERNIDADE. REQUERIMENTOS. PRAZO PARA agendamento/atendimento ACERCA DOS PEDIDOS DE BENEFÍCIO. art. 49 da lei 9.784/99.
1. A razão de ser do salário maternidade envolve a proteção à materniadade e à subsistência familiar num período em que a genitora está impossibilitada de trabalhar para prover seu sustento e o do nascituro, que logo após o parto vivencia momento de fragilidade e, ao mesmo tempo, fundamental para o seu desenvolvimento saudável. Assim, é imprescindível que os requerimento desse benefício sejam decididos e, uma vez deferidos, sejam pagos com adequada brevidade, não se podendo admitir que, à revelia da norma legal que disciplina esse prazo, o agendamento para a requisição do salário maternidade, bem assim o seu pagamento, se deem somente após os 120 dias a partir do nascimento, período durante o qual a genitora esteve totalmente privada de sua remuneração.
2. Nos termos do artigo 49 da Lei 9.784/99, "concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorogação por igual período expressamente motivada."
3. Tratando-se de ação civil pública cujo dano resultante da conduta (omissiva) da autarquia previdenciária no cumprimento dos prazos para agendamento de atendimento para requerimento de salário-maternidade, bem como para a concessão e início do pagamento do respectivo benefício, soa óbvia a amplitude nacional da questão, cuidando-se de violação ou ofensa a direitos somente evitáveis se a decisão produzir efeito em todo o território nacional.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade,dar provimento ao recurso do Ministério Público Federal e dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 05 de fevereiro de 2019.
Documento eletrônico assinado por JOSÉ ANTONIO SAVARIS, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000856488v9 e do código CRC 7b81218d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Data e Hora: 8/2/2019, às 16:9:41
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/02/2019
Apelação Cível Nº 5027299-68.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/02/2019, na sequência 804, disponibilizada no DE de 21/01/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE,DAR PROVIMENTO AO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS. DETERMINADA A JUNTADA DO VÍDEO DO JULGAMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Votante: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT
SUZANA ROESSING
Secretária
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