Ação Rescisória (Seção) Nº 5046104-49.2019.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
AUTOR: LEO SARAIVA CALDAS
ADVOGADO: RENATA MILANI CALDAS (OAB SC033148)
ADVOGADO: LIANE SLAVIERO RAMOS (OAB rs082851)
ADVOGADO: MONICA MORAES GODOY (OAB SC053886)
RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
LEO SARAIVA CALDAS, com fulcro no inciso VII do art. 966 do CPC, ajuizou a presente ação rescisória contra o Ministério Público Federal, buscando a rescisão de acórdão proferido nos autos de n. 50214908420144047200 (EV 38 originário), que negou provimento à sentença que, em Ação Civil Pública visando à reparação por demolição de imóvel tombado, condenou o autor desta ação a pagar R$ 20.000,00 (vinte mil reais) de indenização a título de danos morais coletivos, à obrigação de fazer, consubstanciada em edificar ou realizar qualquer intervenção no terreno, apenas e tão somente após a integral aprovação de Estudo de Impacto de Vizinhança pelo SEPHAN/IPUF, com a assinatura de Termo de Compromisso pelo IPHAN, entes públicos que deverão vincular o uso e a ocupação da propriedade do novo imóvel aos mesmos parâmetros urbanísticos pelo imóvel demolido, bem como a averbação desta determinação de averbação dos dados identificadores desta ação e da decisão judicial de mérito desta demanda na margem de matrícula do registro de imóveis do bem demolido, nos termos do artigo 167 da Lei nº 6.015/73, em especial para dar publicidade a eventuais terceiros de boa fé.
Argumenta-se, em síntese, que a prova nova decorre do fato de que a denúncia que inaugurou o inquérito civil público e, por fim, embasou o ajuizamento da ACP originária, teria partido de servidora lotada na 6ª Vara Federal de Florianópolis, mesmo órgão jurisdicional em que teria sido instruída e processada a demanda. Relata que tal fato somente veio a conhecimento do autor depois de transitada em julgado a ação originária, o que impossibilitou sua alegação em momento anterior.
Defende que tal situação acarreta nulidade do feito, pois a denúncia formulada pela servidora perante o MPF denotaria que a mesma possuiria interesse no resultado do feito. E mais, a servidora estaria impedida de atuar no referido processo pois, segundo a lei processual, as vedações dirigidas aos Magistrados estendem-se aos auxiliares da justiça.
Requerer o deferimento de liminar para suspender os efeitos do acórdão rescindendo e, por fim, a rescisão e a improcedência da ação originária.
A antecipação de tutela foi indeferida (ev. 02).
Contestado o feito no ev. 07.
A autora apresentou réplica (ev. 09).
Razões finais pelo Ministério Público Federal no ev. 17.
É o breve relato.
VOTO
Inicialmente aponto que o feito transitou em julgado em 10/05/2019 (evento 75 originário), sendo tempestiva a propositura da ação rescisória em 01/11/2019, já que dentro do prazo decadencial de dois anos previsto no artigo 975 do CPC.
Deferido o pedido de AJG, dispensa-se a comprovação do pagamento de custas e depósito prévio.
Juízo Rescindendo;
Prova Nova - inciso VII do art. 966 do CPC/2015;
A hipótese de rescisão baseada em prova nova exige a comprovação do autor de que ignorava a sua existência, de ser pré-existente ao ajuizamento da ação originária e de que também seja capaz, por si só, assegurar pronunciamento favorável. A prova, pois, deve ser anterior à decisão rescindenda. Vejamos o seguinte precedente do STJ que explicita minuciosamente tal hipótese de rescisão:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO FUNDADA EXCLUSIVAMENTE EM PROVA TESTEMUNHAL. SÚMULA 149 DO C. STJ.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL POSTERIOR AO ACÓRDÃO. INEXISTÊNCIA DE FUNDAMENTOS LEGAIS À PROPOSITURA DA AÇÃO. IMPROCEDÊNCIA.
(...)
- Quadra ressaltar, que o documento de que trata o inciso VII, do art. 485 do CPC é o existente à época. Não se pode entender: "o constituído posteriormente. O adjetivo "novo" expressa o fato de só agora ser ele utilizado, não a ocasião em que veio formar-se. Ao contrário, para admitir-se a rescisória, é preciso que o documento já existisse ao tempo do processo em que se proferiu a sentença.
Documento cuja existência a parte ignorava é, obviamente, documento que existia; documento de que ela "não pôde fazer uso", é também, documento que, noutras circunstâncias, poderia ter sido utilizado, e portanto existia."(Moreira, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2.002, e. 10ª, p.137) - Documento não existente quando da prolação do decisum rescindendo não está apto a desconstituir o julgado.
- Ação rescisória julgada improcedente.
(AR .541/SP, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/05/2005, DJ 27/06/2005, p. 221)
No caso em tela, o autor traz prova de que servidora da Justiça Federal, lotada a 6ª Vara Federal de Florianópolis, órgão jurisdicional no qual tramitou o feito originário, seria a denunciante que "inaugurou" o inquérito civil, procedimento administrativo perante o MPF que redundou no ajuizamento da ACP. Alega que, no momento da denúncia, a depoente omitiu que seria servidora da Justiça Federal, o que só veio a descobrir após o trânsito em julgado, em consulta ao portal da transparência.
Assim, invocando as normas processuais que estendem aos auxiliares da justiça as regras de suspeição e impedimento previstas aos Magistrados, advoga a nulidade do feito.
Como antecipado no momento que analisei o pedido liminar, não denoto qualquer irregularidade na conduta da servidora da justiça em promover queixa perante o Ministério Pública Federal. O servidor público, de qualquer órgão, goza dos mesmos direitos como cidadão, carregando um dever moral de noticiar ilegalidade às autoridades competentes ainda mais evidente pois exerce função pública. Dessa forma, quando tem conhecimento de fatos que possam configurar irregularidade ou crime é esperado que dê o devido encaminhamento como assim se espera de qualquer outro cidadão.
Ademais, é preciso considerar que o órgão ministerial é independente e os fatos informados pela servidora poderiam ter sido noticiados por qualquer outra pessoa, sendo que sua atuação, na condição de fiscal da lei, certamente, redundaria no mesmo caminho até alcançar a coisa julgada formada na ação originária.
Por sua vez, registre-se que a estrutura das Varas Federais é composta por dois Magistrados, Juiz Federal e Juiz Federal Substituto, os quais atuam com total independência jurisdicional, recebendo distribuição independente de processos como forma de resguardar o Princípio do Juiz Natural. Em outras palavras, cada um desses Magistrados possui acervo distinto de processos. Outrossim, cada um dos Magistrados possui um servidor que lhes presta assessoria, que é o Oficial de Gabinete. No caso em tela, em consulta feita pela minha assessoria no cadastro de pessoal da Justiça Federal de Santa Catarina, é possível verificar que a servidora NAZARE APARECIDA DE MEDEIROS BACK, realmente, é lotada na função de Oficial de Gabinete junto à 6ª Vara Federal de Florianópolis, todavia, exercendo suas atividades perante o Juízo Federal Substituto daquele órgão. Por sua vez, segundo verifica-se da autuação do feito originário, sua tramitação se deu no Juízo Federal, com sentença proferida por este último Juízo, o que torna improvável a atuação da servidora em seu andamento.
Alás, é importante consignar que o autor não trouxe qualquer elemento que indicasse algum prejuízo à tramitação do feito ou interferência real que denotasse irregularidade praticada pela servidora.
O autor alega em sua inicial que a servidora "simulou não ser quem realmente era, passando-se por outra pessoa, para enganar a defesa do autor, que desconhecia ter a oficial de gabinete do juiz o nome de Nazaré Aparecida de Medeiros Back". Ora, tal argumentação é totalmente descabida. A denunciante declarou ser servidora pública na ocasião que noticiou os fatos. A informação acerca de sua lotação era irrelevante pois, naquele momento, sequer havia processo judicial em tramitação. Veja-se que o depoimento foi prestado em 08/2013 (ANEXO8 - ev.01) e o ajuizamento da ação civil pública originária deu-se em 06/2014, quase um ano depois, sendo que não há registro de sua participação na tramitação dos autos, até porque lotada, como acima demonstrado, em juízo distinto do qual distribuído o feito. E mais, os fatos narrados pela servidora Nazaré certamente alcançariam à análise do MPF, pois no mês anterior à sua denúncia, em 07/2013, o próprio autor proprietário registrou boletim de ocorrência perante à Polícia Civil de Santa Catarina informando que o imóvel teria ruido em razão de sua deterioração natural - p. 03 do INQ9, ev. 01.
Por fim, as alegações trazidas em réplica pelo autora (ev. 09), acerca de fatos e status jurídico do imóvel objeto da ação originária não foi apresentada na petição inicial. A causa de pedir desta rescisória escora-se em prova nova que, segundo sustentado, implicaria irregularidade na tramitação processual. Assim, o fato de se tratar de imóvel tombado ou não é irrelevante para a solução do juízo rescindendo nesta rescisória. Caso se adentrasse nesse tema por força das razões trazidas em réplica, estaríamos permitindo inovação, conhecendo de fundamento não presente na inicial, em flagrante ofensa ao contraditório.
Portanto, é flagrante a incapacidade de a prova nova apresentada ensejar a desconstituição da coisa julgada formada na ação originária, do que se conclui pela improcedência da demanda.
Não houve antecipação de custas ou depósito prévio.
Sem condenação em honorários, réu Ministério Público.
Ante o exposto, voto por julgar improcedente a ação rescisória.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001966014v16 e do código CRC e5376642.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 14/8/2020, às 18:43:12
Conferência de autenticidade emitida em 22/08/2020 04:00:57.
Ação Rescisória (Seção) Nº 5046104-49.2019.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
AUTOR: LEO SARAIVA CALDAS
ADVOGADO: RENATA MILANI CALDAS (OAB SC033148)
ADVOGADO: LIANE SLAVIERO RAMOS (OAB rs082851)
ADVOGADO: MONICA MORAES GODOY (OAB SC053886)
RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSO CIVIL. administrativo. PROVA NOVA que não garante a rescisão da demanda originária. noticia crime formulada por servidor público lotado na vara federal que tramitou a ação civil pública originária. impedimento e nulidade não configurada.
1. A hipótese de rescisão com base em prova nova (inciso VII do art. 966 do CPC/2015) necessita de prova preexistente à decisão rescindenda, cuja existência era ignorada ou que a parte não pôde fazer uso e que assegure, por si só, um pronunciamento favorável. Caso concreto em que a prova trazida, por si só, não implica nulidade dos atos praticados na ação originária.
2. O autor traz prova de que servidora da Justiça Federal lotada no órgão jurisdicional o qual tramitou o feito originário seria a denunciante que "inaugurou" o inquérito civil, procedimento administrativo perante o MPF que redundou no ajuizamento da ACP, fato que, segundo defende, implicaria seu impedimento de atuar no feito segundo as regras processuais e nulidade dos atos praticados. Contudo, trata-se de servidora lotada em juízo distinto do qual tramitou a demanda. Ademais, os fatos noticiados pela servidora, demolição de imóvel de interesse histórico, eram notórios, sendo noticiados pelo próprio proprietário por meio de boletim de ocorrência policial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001966015v4 e do código CRC 3787dfb0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 14/8/2020, às 18:43:12
Conferência de autenticidade emitida em 22/08/2020 04:00:57.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 04/08/2020 A 13/08/2020
Ação Rescisória (Seção) Nº 5046104-49.2019.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PROCURADOR(A): RICARDO LUÍS LENZ TATSCH
AUTOR: LEO SARAIVA CALDAS
ADVOGADO: RENATA MILANI CALDAS (OAB SC033148)
ADVOGADO: LIANE SLAVIERO RAMOS (OAB rs082851)
ADVOGADO: MONICA MORAES GODOY (OAB SC053886)
RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/08/2020, às 00:00, a 13/08/2020, às 16:00, na sequência 75, disponibilizada no DE de 24/07/2020.
Certifico que a 2ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 22/08/2020 04:00:57.