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ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA PELO INSS CONTRA EMPREGADOR CULPADO. CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE. INOCORRÊCIA DE BIS IN IDEM COM A CONTRIBUIÇ...

Data da publicação: 02/07/2020, 07:10:19

EMENTA: ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA PELO INSS CONTRA EMPREGADOR CULPADO. CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE. INOCORRÊCIA DE BIS IN IDEM COM A CONTRIBUIÇÃO ACIDENTÁRIA PAGA PELO EMPREGADOR. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. CONFIRAÇÃO DA CULPA EXCLUSIVA OU PREPONDERANTE DO EMPREGADOR. FALTA DE FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL E DE TREINAMENTO ADEQUADO. CULPA DO EMPREGADOR CARACTERIZADA E COMPROVADA. Sentença de parcial procedência mantida. Apelação improvida. (TRF4, AC 5006569-11.2014.4.04.7204, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 23/05/2016)


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006569-11.2014.4.04.7204/SC
RELATOR
:
CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
APELANTE
:
CECRISA REVESTIMENTOS CERAMICOS S/A
ADVOGADO
:
Paulo Camargo Tedesco
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
CECRISA REVESTIMENTOS CERAMICOS S.A
EMENTA
ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA PELO INSS CONTRA EMPREGADOR CULPADO. CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE. INOCORRÊCIA DE BIS IN IDEM COM A CONTRIBUIÇÃO ACIDENTÁRIA PAGA PELO EMPREGADOR. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. CONFIRAÇÃO DA CULPA EXCLUSIVA OU PREPONDERANTE DO EMPREGADOR. FALTA DE FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL E DE TREINAMENTO ADEQUADO. CULPA DO EMPREGADOR CARACTERIZADA E COMPROVADA.
Sentença de parcial procedência mantida.
Apelação improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de maio de 2016.
Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8262600v3 e, se solicitado, do código CRC E57AADE7.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Cândido Alfredo Silva Leal Junior
Data e Hora: 20/05/2016 19:30




APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006569-11.2014.4.04.7204/SC
RELATOR
:
CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
APELANTE
:
CECRISA REVESTIMENTOS CERAMICOS S/A
ADVOGADO
:
Paulo Camargo Tedesco
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
CECRISA REVESTIMENTOS CERAMICOS S.A
RELATÓRIO
Esta apelação ataca sentença proferida em ação ordinária que discutiu sobre direito de regresso do INSS quanto a acidente do trabalho.
Os fatos estão relatados na sentença:
Trata-se de ação regressiva movida pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS visando a condenação da CECRISA REVESTIMENTOS CERÂMICOS S/A ao ressarcimento dos valores despendidos com o pagamento do benefício de aposentadoria por invalidez - acidente de trabalho NB 92/542.730.833-0, instituído em decorrência de acidente ocorrido na sede da empresa ré no dia 23/07/2010 (evento 1 - INIC1).
Citada, a ré apresentou contestação, defendendo, como preliminares, a natureza civil da presente ação e a prescrição da pretensão autoral. No mérito, aduziu a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/9 e rechaçou na íntegra os pedidos veiculados na inicial (evento 8).
A autarquia previdenciária apresentou réplica no evento 12.
Foi realizada audiência, com a colheita de prova oral (eventos 40/48).
As partes apresentaram suas alegações finais (evento 49 e 50).
Os autos vieram conclusos para sentença.
A sentença julgou parcialmente procedente a ação (evento 53), assim constando do respectivo dispositivo:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, extinguindo o processo na forma do art. 269, I, do CPC, a fim de condenar a ré a:
(a) ressarcir ao INSS todos os valores pagos em razão da concessão dos benefícios NB 92/542.730.833-0 (aposentadoria por invalidez - acidente de trabalho) até a data da sua cessação;
(b) efetuar o pagamento ao INSS, até o dia 20 de cada mês, do valor correspondente às prestações dos referidos benefícios que se vencerem após a liquidação, por meio de Guia da Previdência Social - GPS, pela própria ré preenchida e devidamente identificada com o número do processo judicial e o código específico de pagamento (9636).
Na atualização dos valores da condenação deve-se observar a incidência de: a) correção monetária pelo IPCA-E desde o desembolso de cada parcela dos benefícios (STJ, Súmula nº 43) até o efetivo pagamento; b) juros de mora de 1% ao mês para as parcelas que vencerem até a liquidação (CC, artigo 406; CTN, artigo 161, § 1º) desde a citação (Código Civil, artigo 405); c) com relação às prestações que vencerem após a liquidação, correção monetária pelo IPCA-E e juros de mora de mora de 1% ao mês desde a data em que o INSS efetuar o pagamento.
Por ausência de previsão legal, rejeito a pretensão de cominação de multa diária de 1% (um por cento) no caso de atraso.
Considerando que o INSS decaiu minimamente de sua pretensão, deve ser aplicada a regra estampada no art. 21, § único, do CPC, razão pela qual condeno a ré ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios que, com base no art. 20, §§ 3º e 4º, também do CPC, fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais), atualizáveis a partir da presente data pelo IPCA-E, considerando a relativamente rápida tramitação e a relativa importância da causa, o elevado grau de diligência e zelo dos patronos do autor, a necessidade de dilação probatória, com a inquirição de testemunhas, e a ausência de recursos incidentais.
Apela a parte ré (evento 60), pedindo a reforma da sentença e a improcedência da ação. Alega que: (a) a presente ação tem natureza cível e, portanto, está sujeita a prazo prescricional de três anos (artigo 206-par. 3o-V do Código Civil), contado a partir de agosto de 2010, quando houve a concessão do benefício; (b) não acbe ação regressiva porque o empregador recolhia habitualmente as contribuições para o SAT, e não haveria motivo para ser responsabilizado civilmente; (c) a cobrança da indenização pelo INSS, além de constituir bis in idem, resulta em inconstitucional por afronta ao artigo 7o-XXVIII da CF; (d) a indenização é indevida porque não houve negligência do empregador e porque o ônus da prova é do INSS, que não comprovou a culpa; (e) o acidente ocorreu por culpa da vítima, que agiu de modo imprudente e se colocou em risco que devia ter evitado, ainda que devidamente instruído pelo empregador; (f) o empregador forneceu à vítima todos os equipamentos de proteção individual indicados para a função que exercia; (g) o acidente ocorreu às 9 horas, quando o trabalhador adentrava à erceira hora trabalhada naquele dia e já havia concluído o serviço de limpeza da plataforma, não havendo se falar em excesso de jornada, nem ausência de EPIs, nem desconhecimento ou falta de instrução quanto às suas atividades, sendo que "o acidentado postou-se de forma completamente irregular quando colocou todo seu peso sobre a estrutura do guarda-corpo, o qual não é projetado para suportar a carga vertical de um ser humano, mas deve funcionar como instrumento de contenção, que serve tão-somente a esmorecer os corpos em risco de queda" (p. 28 da apelação); (h) houve culpa exclusiva da vítima ou, ao menos, deve ser reconhecida a culpa concorrente; (i) deve ser corretamente apurado o valor real devido a título de indenização, levando em conta os valores que já foram pagos a título de contribuição ao longo de toda a vida profissional do acidentado; (j) os juros moratórios são abusivos, devendo ser utilizado o critério do artigo 406 do Código Civil.
Houve contrarrazões.
O processo foi incluído em pauta.
É o relatório.
VOTO
ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA PELO INSS CONTRA EMPREGADOR CULPADO. CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE. INOCORRÊCIA DE BIS IN IDEM COM A CONTRIBUIÇÃO ACIDENTÁRIA PAGA PELO EMPREGADOR. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. CONFIRAÇÃO DA CULPA EXCLUSIVA OU PREPONDERANTE DO EMPREGADOR. FALTA DE FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL E DE TREINAMENTO ADEQUADO. CULPA DO EMPREGADOR CARACTERIZADA E COMPROVADA. Sentença de parcial procedência mantida. Apelação improvida.
Examinando os autos e as alegações das partes, fico convencido do acerto da sentença de parcial procedência, proferida pelo juiz federal Paulo Vieira Aveline, que transcrevo e adoto como razão de decidir, a saber:
PRESCRIÇÃO
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por sua Segunda Seção, firmou o entendimento de que o prazo prescricional em demandas regressivas como a presente é quinquenal, por força do disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32.
É o que se observa da seguinte ementa:
"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO REGRESSIVA DE INDENIZAÇÃO. RESSARCIMENTO DE VALORES PAGOS PELO INSS A TÍTULO DE AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. 1. Tratando-se de pedido de ressarcimento de valores pagos pelo INSS a título de auxílio-doença acidentário concedido a empregado, quanto à prescrição, é aplicável ao caso, pelo princípio da simetria, o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32 (prescrição quinquenal). Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 2. Nulidade da sentença, afastando-se a prescrição, e determinado o retorno dos autos à origem para regular processamento do feito, com produção probatória, para que seja aferido se a hipótese dos autos (doença ocupacional) está albergada na previsão legal de direito de regresso, nos termos dos arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213/91" (TRF4, EINF 5006331-06.2011.404.7201, Segunda Seção, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, D.E. 15/10/2012).
O evento que resultou no acidente de trabalho ocorreu em 23/07/2010.
É preciso, contudo, considerar a distinção necessária entre a prescrição do fundo de direito (situação jurídica fundamental) e a perda da pretensão (exigibilidade) das vantagens pecuniárias a partir dele decorrentes.
É que, como demonstra o caso concreto, as conseqüências do acidente ainda perduram (dano), a significar que a exigibilidade do fundo de direito (pretensão à tutela ressarcitória) mostra-se atual, existindo a prescrição extintiva tão-somente em relação aos benefícios pagos (parcelas) pela autarquia que suplantam o prazo quinquenal.
Dessa forma, verificado que o ajuizamento da demanda ocorreu em 28/04/2014 e como o benefício NB 92/542.730.833-0 teve início (DIB) em 09/08/2010, não há prescrição de parcelas a ser reconhecida.
MÉRITO
O núcleo da lide reside em aferir se a ré foi negligente quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, de modo a atrair a responsabilização pelo acidente ocorrido, tal como preconiza o art. 120 da LBPS.
CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LBPS
O INSS postula a condenação da ré a lhe ressarcir os valores que vem despendendo a título de pensão por morte decorrentes da alegada culpa da empregadora quando do narrado na petição inicial, em que teria sido negligente no que diz com a proteção do seu trabalhador.
Na presente demanda não se veicula pedido de índole exclusivamente patrimonial, sujeito aos estreitos cânones da legislação civilista. Uma leitura mais consentânea com a atual quadra jurídico-constitucional compreende o pedido num âmbito mais abrangente, também sob a perspectiva da proteção constitucional do meio ambiente do trabalho.
De fato, o meio ambiente do trabalho, como bem jurídico de primeira grandeza, compreende diversos valores que conformam o seu conteúdo plurívoco, como a dignidade da pessoa humana, a valorização social do trabalho e a função social da empresa. O seu caráter ambiental assume especial relevo, pois, conforme ensina José Afonso da Silva "É um meio ambiente que se insere no artificial, mas digno de tratamento especial, tanto que a Constituição o menciona explicitamente no art. 200, VIII, ao estabelecer que uma das atribuições do Sistema Único de Saúde consiste em colaborar na proteção do ambiente, nele compreendido o do trabalho." (SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 23). É o que se depreende inclusive do que dispõe o art. 3º, I, da Lei nº 6.938/81, que versa sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, segundo o qual entende-se por "meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.".
Tal a razão para a precisa advertência de Édis Milaré:
"Para o Direito brasileiro, portanto, são elementos do meio ambiente, além daqueles tradicionais, como o ar, a água e o solo, também a biosfera, esta com claro conteúdo relacional (e, por isso mesmo, flexível). Temos, em todos eles, a representação do meio ambiente natural. Além disso, vamos encontrar uma série de bens culturais e históricos, que também se inserem entre os recursos ambientais, como meio ambiente artificial ou humano, integrado ou associado ao patrimônio ambiental. O Direito Ambiental se preocupa com todos esses bens, sejam eles naturais ou não. Abarca ele não só o meio ambiente natural, a saber as condições físicas da terra, da água e do ar, mas também o meio ambiente humano, isto é, as condições produzidas pelo homem e que afetam sua existência no Planeta.". (MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. 4ª ed. São Paulo: RT, 2005. p. 105).
Constata-se assim que a causa envolve matéria de inegável relevo constitucional. A partir disso, o papel imposto ao intérprete e aplicador do Direito deve levar em conta alguns aspectos para uma decisão calcada em ampla legitimidade não só jurídica, mas também político-social.
Nesse sentido, a solução judicial a ser adotada deve também ter como escopo e critério de legitimação a dimensão social e política da jurisdição, ou seja, a busca da consagração de uma democracia material, a fim de que se conciliem os valores em jogo. Essa tarefa não pode ser neutra ou descompromissada nem poderá apresentar resultados que nulifiquem valores constitucionais. Ao contrário, deve buscar assegurar a máxima eficácia de cada qual, em relação de precedência condicionada de acordo com o caso concreto.
No atual momento jurídico, inequivocamente se passa por um processo de reconhecimento de que a proteção e a promoção do ambiente é tarefa a todos dirigida, órgãos estatais e sociedade civil, decorrente do comando constitucional insculpido no art. 225 da CF, que impõe inclusive um compromisso de solidariedade para com as gerações futuras (intergeracional).
Insere-se nesse contexto a dignidade da pessoa humana como valor-fonte, que compendia a unidade material da Constituição Federal. Essa dignidade, todavia, não pode ser vista, modernamente, senão também em sua dimensão ecológica, como defendem Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer. A partir dessa análise, esses autores também defendem o reconhecimento de um "Estado Socioambiental de Direito", a confluir para um marco jurídico-constitucional que resulte "na convergência necessária da tutela dos direitos sociais e dos direitos ambientais num mesmo projeto jurídico-político para o desenvolvimento humano em padrões sustentáveis, inclusive pela perspectiva da noção ampliada e integrada dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais." (SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito Constitucional Ambiental: Constituição, Direitos Fundamentais e Proteção do Ambiente. 2ª edição revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p. 93-5). É a partir da centralidade da pessoa humana - e mais modernamente de sua dimensão ecológica -, inclusive, que o Código Civil vigente não desconsidera a existência de uma despatrimonialização ou mesmo publicização do Direito Civil em prol de uma ordem normativa que tenha na pessoa, individuada, de origem kantiana, a centralidade das atenções do intérprete/aplicador.
Esse quadro importa numa mudança de paradigma do Direito com desdobramentos na hermenêutica. Paradigma este que também decorre de novos princípios materializados na socialidade, eticidade, operabilidade e na boa-fé objetiva. Buscam os referidos princípios a assegurar a normatividade da Constituição, o prestígio dos direitos fundamentais e a necessária adoção de uma (nova) hermenêutica que não se coaduna mais com um sistema positivado hermético e fechado (axiomático-dedutivo), mas que parta do caso concreto, amparado a um pluralismo metodológico de interpretação/aplicação, ciente do processo dialógico que consubstancia essa nova concepção.
Fenômeno análogo não poderia deixar de ocorrer no seio da ordem econômica. É que, igualmente, o exercício da empresa se dá no esteio de uma ordem jurídica que, como explicita o art. 170, caput, da CF, tem dentre os seus fundamentos a valorização do trabalho humano, buscando assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Esta mesma ordem econômica tem como um dos seus princípios gerais a "defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação" (art. 170, VI, CF).
É bem verdade que a autonomia de vontade mostra-se como espaço que deve ser preservado, pois integra a própria noção de liberdade jurídica, isto é, a possibilidade do sujeito de direito atuar com eficácia jurídica. Disso não se conclua, entretanto, tratar-se de espaço imune aos valores jurídicos vigentes, corolário, aqui, da dimensão objetiva dos direitos fundamentais (eficácia horizontal). A concepção de que aos particulares tudo lhes é permitido desde que inexistente norma em sentido contrário, deve ser lida com o cuidado necessário. Essa interpretação evidencia um campo jurídico-social que não se mostra inteiramente adequado aos tempos atuais. Imaginar-se um sujeito de direito que no exercício da liberdade contratual, da liberdade associativa ou mesmo na empresa possa derruir uma ordem jurídica calcada em valores, própria do pós-positivismo, é permitir espaço ao arbítrio. Tal postura desconsideraria a realidade social, econômica e política desta quadra a história, ou seja, uma sociedade de massa, uma sociedade de risco, tal como enuncia Ulrich Beck. Deve-se ter presente a importância da funcionalização dos institutos jurídicos para a efetivação da justiça social inserta no já mencionado art. 170, caput, da Constituição Federal.
Em casos como o dos autos, a imputação de responsabilidade naturalmente poderá repercutir na vida das empresas, especialmente daquelas que operam em atividade de maior risco. Desde logo, adianta-se que a repercussão da imputação de responsabilidade - fato que não se ignora - por fatos graves ocorridos por negligência e que ceifam a vida e a saúde de trabalhadores e exigem aporte substancial de recursos da sociedade para cobrir prestações previdenciárias, não justifica a negativa do ressarcimento apenas por argumentos de ordem econômica.
Registro, por fim, que as premissas aqui lançadas não se revestem de caráter apenas teórico. Estabelecem, na verdade, valores que devem nortear a interpretação da legislação infraconstitucional a partir do que dispõe a Constituição. Nesse contexto, afirma-se inequívoca, em meu singelo juízo, a constitucionalidade do art. 120 da LBPS.
PRETENSÃO REGRESSIVA
A pretensão regressiva encontra amparo no artigo 120 da Lei de Benefícios da Previdência Social:
"Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis".
Tal direito se fundamenta no fato de que, nos termos do art. 19, § 1º, da Lei de Benefícios, a "empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador".
Assim, caso não adote as precauções recomendadas e o empregado venha a se acidentar no exercício de suas funções em razão disso, a sociedade empresária ou o empresário individual poderão ser compelidos a indenizar o INSS pelas despesas que esta tiver com o segurado acidentado ou com os seus dependentes.
Não se trata de incongruência sistêmica. É que, além da responsabilidade civil comum, os empregadores estão sujeitos à responsabilização para com a Previdência Social na hipótese de culpa ou dolo (art. 7º, XXVIII, da CF), pois para as empresas a prevenção deve representar um custo menor do que a reparação do sinistro, a fim de que sejam tomadas todas as medidas para a redução dos acidentes.
Registre-se, ainda, que é inconsistente juridicamente o argumento de que, por ser contribuinte da exação vertida ao SAT, a empregadora estaria sujeita a um verdadeiro bis in idem. Não é disso que se trata, evidentemente. A relação jurídico-tributária apresenta contornos e fundamentação próprios. Sem embargo, a prestação pecuniária compulsória exigida do contribuinte é expressão do poder fiscal estatal, no exercício de sua soberania.
A contribuição em análise é espécie tributária destinada a propiciar que a receita derivada arrecadada permita ao Estado dar concretude aos inúmeros compromissos que a Ordem Social (Título VIII) e, mais especificamente, a Seguridade Social, estabelecem, dentre os quais: assegurar os meios indispensáveis de manutenção do trabalhador em virtude de infortúnio decorrente de acidente laboral. Para tanto, o constituinte previu a figura de um seguro contra acidentes de trabalho (art. 7º, XXVIII, CF), cuja conformação dada pelo legislador atribuiu-lhe feição pública, gerindo-o o INSS. Disso não se conclua que a contribuição recolhida exclua qualquer responsabilização futura nesse campo. É que a contribuição ao SAT possui a finalidade - nota distintiva da espécie tributária em comento - de carrear ao seguro público numerário suficiente a fazer frente às demandas havidas dos benefícios acidentários pagos aos segurados da Previdência Social. Vale dizer, a contribuição ao SAT pode ser considerada similar a prêmio vertido ao seguro público destinado a amparar os segurados que, no exercício da atividade laboral, venham a sofrer acidente que os afastem, temporariamente ou definitivamente, do mercado de trabalho. Isso, entretanto, não alberga a hipótese em que o responsável age com "negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva".
A relação jurídico-tributária e a relação civil decorrente da negligência prevista no artigo 120 da LBPS possuem campos de atuação distintos, pois os suportes fáticos abstratos previstos, embora com origem comum (acidente de trabalho), possuem fatos imponíveis diversos (acidente sem e com negligência por parte do empregador).
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. DEPENDENTES. ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA. INDENIZAÇÃO. RESSARCIMENTO DE VALORES. O instituidor da pensão era empregado na primeira empresa e estava trabalhando para a segunda empresa, o que implementa a legitimidade passiva em ação para discussão sobre relação jurídica concernente à responsabilidade civil estabelecida entre o INSS e as pessoas jurídicas demandadas. (...). O fato de o empregador pagar aos cofres públicos contribuição destinada ao seguro de acidente do trabalho SAT, não o exime da responsabilidade nos casos em que o sinistro decorra de inobservância de normas de higiene e segurança do trabalho. (TRF4, AC 5002833-24.2010.404.7204, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, D.E. 13/05/2011).
PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. MOLÉSTIA DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. DEVER DO EMPREGADOR DE RESSARCIR OS VALORES DESPENDIDOS PELO INSS EM VIRTUDE DA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ALEGAÇÕES DE ILEGITIMIDADE ATIVA DO INSS E DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR AFASTADAS. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CULPA CONCORRENTE DO SEGURADO NÃO DEMONSTRADA. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA QUANTO À ADOÇÃO E OBSERVÂNCIA DAS MEDIDAS DE PROTEÇÃO À SEGURANÇA DO TRABALHADOR. PEDIDO DE ABATIMENTO DOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE SEGURO - SAT. IMPROCEDÊNCIA. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELOS DESPROVIDOS. (...). 8. Improcede o pedido do apelante/réu de que as parcelas pagas a título de seguro de acidente do trabalho - SAT sejam abatidas do montante a que foi condenado, uma vez que é pacífico em nossos Tribunais o entendimento no sentido de que o fato das empresas contribuírem para o custeio da Previdência Social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui sua responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. (...). 11. Apelos desprovidos. (TRF4, AC 5005583-26.2010.404.7001, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 08/07/2011).
Até mesmo o STF, já fixou entendimento consolidado no enunciado da Súmula nº 229, no sentido de que: "A indenização acidentária não exclui a do direito comum em caso de dolo ou culpa grave do empregador."
A responsabilização com fulcro no art. 120 da LBPS, exigindo a presença da culpa do empregador, busca afastar condutas omissivas ou desidiosas no âmbito empresarial que venham a solapar a integridade do trabalhador no âmbito da sua saúde ocupacional. Insere-se, portanto, no dever de proteção do Estado, calcado na dimensão objetiva dos direitos fundamentais, de sorte a impor a adoção de medidas administrativas ou legislativas, o estabelecimento de políticas públicas. Enfim, ações necessárias para a concreção no mundo dos fatos de condições mínimas que, no meio ambiente do trabalho, possibilitem a quem quer que seja o livre desenvolvimento de suas aptidões, capacidade, de modo a assegurar a sua autodeterminação, presente a pluralidade de concepções de modo de vida.
O acidente de trabalho, nesta perspectiva, sem dúvida, é fator a ser combatido, mitigado com o permanente controle, com enfoque na prevenção e precaução, pelos inegáveis efeitos deletérios que acarreta no seio familiar e social, e, mais que isso, na vítima em si mesma considerada.
DO CASO CONCRETO
Com a petição inicial, o INSS juntou aos autos o laudo pericial do processo trabalhista nº 0004108-63.2011.512.0055, que tramitou na Justiça do Trabalho deste cidade (PROCJUDIC5, evento 01), em que o perito assim se manifestou:
"4. Parecer Técnico
Com base neste laudo técnico, é de nosso parecer que o acidente de tabalho sofrido na reclamada: gerou incapacidade omniprofissional; o incapacita para a vida independente, e não há recurso na medicina contemporânea para uma recuperação significativa.
5. Respostas aos quesitos do reclamante (página 132)
a) Descreva o perito a situação atual da parte autora, ou seja, qual a situação física/saúde do reclamente?
R: Mentalmente encontra-se bem e com memória diminuída. Fisicamente apresenta-se com tetraplegia (paralisia dos membros superiores e inferiores), acamado e dependente de terceiros paras as atividades básicas da vida".
Também juntou a Comunicação de Acidente de Trabalho - CAT, emitida pela empresa ré em 27/07/2010 (evento 1 - PROCADM4, pag. 5), com a seguinte descrição: "Queda de pessoa em passarela ou plataforma permanentes, corte na cabeça, laceração, ferida contusa, com edema cerebral traumático".
A testemunha Sidnei Bernardino Cardoso, ex-empregado da empresa ré, disse que trabalhou com José no setor, presenciando o acidente; o local em que o acidente ocorreu tinha, aproximadamente, 4,00 metros de altura; José não estava usando cinto de segurança ou trava-queda; o local do acidente era uma plataforma onde se transitava para fazer os serviço do setor; não recorda se José teve treinamento; não havia necessidade de uso de cinto de segurança; o trabalho era rotineiro e José tinha experiência no serviço; no local tinha piso antiderrapante, guarda-corpo e iluminação; viu quando José projetou o corpo entre as barras, quando o correto era ficar de pé e soltar a espátula que usava; o guarda-corpo é feito para contenção e não para suportar peso para baixo, mas sim para o lado.
A testemunha Édio dos Santos, empregado da empresa ré, disse que trabalhou com José, mas não presenciou o acidente; soube que José, ao tentar descer as ferramentas, para que estas não atingissem as pessoas que passavam embaixo da plataforma, ajoelhou-se e posicionou seu peito no primeiro corrimão da plataforma para entregar essas ferramentas a outro funcionário e, ao se abaixar, a solda rompeu e ele caiu; o corrimão é seguro para suportar peso lateralmente, não horizontalmente; o local onde o autor estava desenvolvendo seu trabalho tinha 3,87 metros de altura; não tinha necessidade de usar cinto de segurança para trabalhar no local do acidente, pois a plataforma tinha piso antiderrapante e escada com proteção lateral; a empresa sempre fazia treinamento quando necessário; a empresa fazia treinamento na integração do funcionário ao ser contratado.
Pois bem, o item 1.7 da NR-01 da ABNT tem o seguinte teor (grifei):
"1.7. Cabe ao empregador:
a) cumprir e fazer cumprir as disposições legais e regulamentares sobre segurança e medicina do trabalho;
b) elaborar ordens de serviço sobre segurança e medicina do trabalho, dando ciência aos empregados, com os seguintes objetivos:
I - prevenir atos inseguros no desempenho do trabalho;
II - divulgar as obrigações e proibições que os empregados devam conhecer e cumprir;
III - dar conhecimento aos empregados de que serão passíveis de punição, pelo descumprimento das ordens de serviço expedidas;
IV - determinar os procedimentos que deverão ser adotados em caso de acidente do trabalho e doenças profissionais ou do trabalho;
V - adotar medidas determinadas pelo MTb;
VI - adotar medidas para eliminar ou neutralizar a insalubridade e as condições inseguras de trabalho.
c) informar aos trabalhadores:
I - os riscos profissionais que possam originar-se nos locais de trabalho;
II - os meios para prevenir e limitar tais riscos e as medidas adotadas pela empresa;
III - os resultados dos exames médicos e de exames complementares de diagnóstico aos quais os próprios trabalhadores forem submetidos;
IV - os resultados das avaliações ambientais realizadas nos locais de trabalho.
d) permitir que representantes dos trabalhadores acompanhem a fiscalização dos preceitos legais e regulamentares sobre segurança e medicina do trabalho".
A propósito, ainda, o que dispõe a Norma Regulamentadora nº 35, que estabelece os requisitos mínimos para a realização das atividades executadas em altura e a prevenção de acidentes (os grifos são meus):
"35.3. Capacitação e Treinamento
35. 3.1 - O empregador deve promover programa para capacitação dos trabalhadores à realização de trabalho em altura.
35. 3.2 - Considera-se trabalhador capacitado para trabalho em altura aquele que foi submetido e aprovado em treinamento, teórico e prático, com carga horária mínima de oito horas, cujo conteúdo programático deve, no mínimo, incluir:
a) normas e regulamentos aplicáveis ao trabalho em altura;
b) análise de Risco e condições impeditivas;
c) riscos potenciais inerentes ao trabalho em altura e medidas de prevenção e controle;
d) sistemas, equipamentos e procedimentos de proteção coletiva;
e) equipamentos de Proteção Individual para trabalho em altura: seleção, inspeção, conservação e limitação de uso;
f) acidentes típicos em trabalhos em altura;
g) condutas em situações de emergência, incluindo noções de técnicas de resgate e de primeiros socorros.
35.3.3 - O empregador deve realizar treinamento periódico bienal e sempre que ocorrer quaisquer das seguintes situações:
a) mudança nos procedimentos, condições ou operações de trabalho;
b) evento que indique a necessidade de novo treinamento;
c) retorno de afastamento ao trabalho por período superior a noventa dias;
d) mudança de empresa.
35. 3.3.1 - O treinamento periódico bienal deve ter carga horária mínima de oito horas, conforme conteúdo programático definido pelo empregador.
35. 3.3.2 - Nos casos previstos nas alíneas "a", "b", "c" e "d", a carga horária e o conteúdo programático devem atender a situação que o motivou.
35. 3.4 - Os treinamentos inicial, periódico e eventual para trabalho em altura podem ser ministrados em conjunto com outros treinamentos da empresa.
35.3.5 - A capacitação deve ser realizada preferencialmente durante o horário normal de trabalho.
35.3.5.1 - O tempo despendido na capacitação deve ser computado como tempo de trabalho efetivo.
35. 3.6 - O treinamento deve ser ministrado por instrutores com comprovada proficiência no assunto, sob a responsabilidade de profissional qualificado em segurança no trabalho.
35.3.7 - Ao término do treinamento deve ser emitido certificado contendo o nome do trabalhador, conteúdo programático, carga horária, data, local de realização do treinamento, nome e qualificação dos instrutores e assinatura do responsável.
35. 3.7.1 - O certificado deve ser entregue ao trabalhador e uma cópia arquivada na empresa.
35.3.8 - A capacitação deve ser consignada no registro do empregado".
Cumpre destacar que, conforme a legislação de regência, afora a comprovação da realização de curso específico na área, cabe ao empregador realizar capacitação compatível com as funções do trabalhador, que aborde os riscos a que estão expostos e as medidas de proteção existentes e necessárias.
Depreende-se daí, até mesmo à falta de prova em sentido contrário, a cargo da ré (CPC, art. 333, II), que, de fato, não se proporcionou à vítima treinamento específico e suficiente, a despeito de se tratar de trabalho realizado em altura, portanto. Reforça esse entendimento o fato de não ter a empresa ré juntado aos autos o certificado do curso de treinamento para trabalho em altura, conforme estabelece a Norma citada.
Aliás, o "treinamento" na empresa se resume, como visto, a ensinar apenas "na prática" como o funcionário deverá realizar a tarefa, sem qualquer preocupação metodológica ou teórico-formal, muito menos com o fornecimento da indispensável ordem de serviço exigida pelo art. 157, II, da CLT e o cumprimento do que determina o item 1.7 da NR-01 da ABNT.
Também restou claro, da prova produzida nos autos, que o segurado acidentado não fazia uso, na ocasião, de cinto de segurança e que este equipamento de proteção individual seria mesmo desnecessário, "pois a plataforma tinha piso antiderrapante e escada com proteção lateral", segundo afirmaram as testemunhas ouvidas em juízo.
Todavia, a NR-01, em seu item 35, exige mais do que isso. Veja-se:
"35.5. Equipamentos de Proteção Individual, Acessórios e Sistemas de Ancoragem
35.5.1 - Os Equipamentos de Proteção Individual - EPI, acessórios e sistemas de ancoragem devem ser especificados e selecionados considerando-se a sua eficiência, o conforto, a carga aplicada aos mesmos e o respectivo fator de segurança, em caso de eventual queda.
35.5.1.1 - Na seleção dos EPI devem ser considerados, além dos riscos a que o trabalhador está exposto, os riscos adicionais.
35.5.2 - Na aquisição e periodicamente devem ser efetuadas inspeções dos EPI, acessórios e sistemas de ancoragem, destinados à proteção de queda de altura, recusando-se os que apresentem defeitos ou deformações.
35. 5.2.1 - Antes do início dos trabalhos deve ser efetuada inspeção rotineira de todos os EPI, acessórios e sistemas de ancoragem.
35.5.2.2 - Deve ser registrado o resultado das inspeções:
a) na aquisição;
b) periódicas e rotineiras quando os EPI, acessórios e sistemas de ancoragem forem recusados.
35. 5.2.3 - Os EPI, acessórios e sistemas de ancoragem que apresentarem defeitos, degradação, deformações ou sofrerem impactos de queda devem ser inutilizados e descartados, exceto quando sua restauração for prevista em normas técnicas nacionais ou, na sua ausência, normas internacionais.
35. 5.3 - O cinto de segurança deve ser do tipo paraquedista e dotado de dispositivo para conexão em sistema de ancoragem.
35. 5.3.1 - O sistema de ancoragem deve ser estabelecido pela Análise de Risco.
35. 5.3.2 - O trabalhador deve permanecer conectado ao sistema de ancoragem durante todo o período de exposição ao risco de queda.
35.5.3.3 - O talabarte e o dispositivo trava-quedas devem estar fixados acima do nível da cintura do trabalhador, ajustados de modo a restringir a altura de queda e assegurar que, em caso de ocorrência, minimize as chances do trabalhador colidir com estrutura inferior.
A Norma Regulamentadora nº 06, dos Equipamentos de Proteção Individual, em seu Anexo, item I, estabelece a listagem dos equipamentos de segurança para trabalhos em altura (grifos meus):
"I - EPI PARA PROTEÇÃO CONTRA QUEDAS COM DIFERENÇA DE NÍVEL
I.1 - CINTURÃO DE SEGURANÇA COM DISPOSITIVO TRAVA-QUEDA
a) cinturão de segurança com dispositivo trava-queda para proteção do usuário contra quedas em operações com movimentação vertical ou horizontal.
I.2 - CINTURÃO DE SEGURANÇA COM TALABARTE
a) cinturão de segurança COM TALABARTE para proteção do usuário contra riscos de queda em trabalhos em altura;
b) cinturão de segurança COM TALABARTE para proteção do usuário contra riscos de queda no posicionamento em trabalhos em altura".
Os equipamentos de proteção individual fornecidos pela empresa ré, porém, eram, tão só, calça/camisa/macacão, botas, luvas, máscara e protetor auricular (evento 8 - COMP5), não obstante possuísse em seu quadro empregados especializados em segurança do trabalho (evento 22 - OUT2 e OUT3), que deveriam conhecer as normas de segurança e proteção do trabalhador.
Cumpre ressaltar, a propósito, que a análise feita por ocasião da elaboração do PPRA em nenhum momento apontou como agente de risco, para qualquer das atividades desenvolvidas na empresa ré, o trabalho em altura (evento 22 - OUT4 a OUT6). Não obstante, consigna o PPRA, em seu item 7 - MEDIDAS DE CONTROLE, a obrigatoriedade do uso de cinto de segurança para trabalhos em altura (evento 22 - OUT6, p. 16).
Ora, se em seu item 35.1.2, a Norma Regulamentadora nº 35 considera trabalho em altura toda atividade executada acima de 2,00 metros e a plataforma onde o autor realizava as tarefas de limpeza estava a uma altura de 4,00 metros, aproximadamente, o uso de cinto de segurança era obrigatório.
Assim, não obstante a alegação de que teria havido culpa concorrente, a principal causa do acidente e de suas graves conseqüências foi a negligência da ré, tendo apresentado relevantes deficiências em relação à atividade preventiva, pois além de não fornecer treinamento adequado, também não forneceu o principal equipamento de segurança para trabalho em altura, que é o cinto de segurança.
Portanto, ainda que restasse comprovada a culpa do empregado - o que não ocorreu neste caso - remanesceria a culpa preponderante da ré, decorrente da ineficiência das medidas anteriormente adotadas para a proteção do trabalhador na realização de atividade envolvendo sérios riscos de acidente.
Tudo considerado, há inegavelmente ilícito perpetrado, uma vez que a conduta omissiva da ré na adoção das medidas de proteção ao meio ambiente de trabalho dos seus empregados, consubstanciou infração a dever legal que lhe incumbia (art. 19, § 1º, LBPS).
(...)
O que foi trazido nas razões de recurso não me parece suficiente para alterar o que foi decidido, mantendo o resultado do processo e não vendo motivo para reforma da sentença.
Acrescento apenas que a indenização é devida, porque existem elementos suficientes para concluir pela responsabilidade e pela culpa do empregador, não havendo como se imputar ao empregado culpa pelo acidente que sofreu, nem exclusiva nem concorrente.
Além disso, especificamente quanto ao valor da indenização, o critério que deve ser adotado é aquele da sentença, reparando-se regressivamente ao INSS quanto ao que ele tiver pago a título de prestações vencidas, vincendas e futuras, nos termos da sentença. O critério pretendido pelo empregador não merece acolhida, porque os valores que foram pagos a título de contribuição acidentária ao longo da vida profissional não servem para constituir um fundo para compensação com eventuais indenizações que venham a ser pagas, mas destina-se ao custeio do sistema de seguridade social, sem possibilidade de compensação nem redução do valor indenizatório total devido.
Por fim, quanto ao critério de correção monetária e juros moratórios, considerando que ambas as parcelas têm distinta natureza, deve prevalecer o critério da sentença, não havendo se falar em juros moratórios abusivos, já que os valores contam com a necessária previsão normativa, nos termos da sentença:
Na atualização dos valores da condenação deve-se observar a incidência de: a) correção monetária pelo IPCA-E desde o desembolso de cada parcela dos benefícios (STJ, Súmula nº 43) até o efetivo pagamento; b) juros de mora de 1% ao mês para as parcelas que vencerem até a liquidação (CC, artigo 406; CTN, artigo 161, § 1º) desde a citação (Código Civil, artigo 405); c) com relação às prestações que vencerem após a liquidação, correção monetária pelo IPCA-E e juros de mora de mora de 1% ao mês desde a data em que o INSS efetuar o pagamento.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8262599v16 e, se solicitado, do código CRC E50F7D0C.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Cândido Alfredo Silva Leal Junior
Data e Hora: 20/05/2016 19:30




EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/05/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006569-11.2014.4.04.7204/SC
ORIGEM: SC 50065691120144047204
RELATOR
:
Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR
PRESIDENTE
:
VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PROCURADOR
:
Dr. Cláudio Dutra Fontella
APELANTE
:
CECRISA REVESTIMENTOS CERAMICOS S/A
ADVOGADO
:
Paulo Camargo Tedesco
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
CECRISA REVESTIMENTOS CERAMICOS S.A
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/05/2016, na seqüência 448, disponibilizada no DE de 25/04/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR
VOTANTE(S)
:
Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR
:
Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
:
Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Luiz Felipe Oliveira dos Santos, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8333781v1 e, se solicitado, do código CRC 32921FB9.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Data e Hora: 19/05/2016 19:00




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