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ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8. 213/1991. CONSTITUCIONALIDADE. CONTRIBUIÇÃO AO SAT. CULPA CONCORRENTE DO EMPRE...

Data da publicação: 13/05/2022, 07:33:56

EMENTA: ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/1991. CONSTITUCIONALIDADE. CONTRIBUIÇÃO AO SAT. CULPA CONCORRENTE DO EMPREGADO. A Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de arguição de inconstitucionalidade, declarou constitucional o artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991, em face das disposições dos artigos 7º, inciso XXVIII, 154, inciso I, e 195, § 4º, todos da Constituição Federal. É firme, na jurisprudência, a orientação no sentido de que o recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho - que se destina ao custeio geral dos benefícios de aposentadoria especial e decorrentes de acidente de trabalho relativos aos riscos ordinários do empreendimento ou, nos termos do inciso II do artigo 22, aos "riscos ambientais do trabalho" - não impede o Instituto Nacional do Seguro Social de pleitear, via regressiva, o ressarcimento dos valores pagos ao segurado ou seus dependentes, a título de benefício previdenciário, nos casos em que o acidente do trabalho decorre de negligência do empregador, por inobservância das normas padrão de segurança e higiene do trabalho (art. 120 da Lei n.º 8.213/1991). A intenção do legislado não é onerá-lo duplamente, mas, sim, assegurar o reembolso do que fora despendido, mediante sua responsabilização pelo evento lesivo (natureza indenizatória). Para caracterização da responsabilidade do empregador em face da Previdência Social, é necessária a configuração de (i) conduta (comissiva ou omissiva) culposa do empregador, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, (ii) dano e (iii) nexo causal entre ambos os elementos (artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991). Comprovada a culpa concorrente do empregado e da empresa empregadora para a ocorrência do evento danoso, o ressarcimento devido ao Instituto Nacional do Seguro Social corresponderá a uma parcela (proporcional) dos valores pagos ao segurado ou seus dependentes, a título de benefício previdenciário. (TRF4, AC 5000435-13.2020.4.04.7121, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 05/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000435-13.2020.4.04.7121/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELANTE: ZONA NOVA CENTER CONSTRUÇÃO E DECORAÇÃO LTDA (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas em face de sentença que julgou parcialmente procedente ação de procedimento comum, nos seguintes termos:

Dispositivo

Ante o exposto, rejeito a preliminar de inépcia da inicial e julgo parcialmente procedente o pedido, extinguindo o processo com a resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do CPC, para condenar a parte-ré a ressarcir ao INSS 50% (cinquenta por cento) dos valores pagos pela autarquia aos dependentes Lidiane Euzebio Oliveira e Lucas Oliveira Menger em razão da concessão da pensão por morte NB 1900739183, bem como os valores vincendos, tudo nos termos da fundamentação.

Condeno a parte-ré ao pagamento de metade das custas, sendo o INSS isento das restantes. Condeno ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios à outra parte, calculados de acordo com o patamar mínimo estabelecido nos inciso I do § 3º do art. 85 do CPC, quando da execução, cabendo 50% a cada uma, em conformidade com o art. 85, § 4º, II, do CPC, considerando, para tanto, apenas as prestações vencidas até a data da presente sentença (Súmula n° 111 do STJ - aplicada à espécie por analogia, por se tratar de prestações de trato sucessivo).

Publicação e registro pelo sistema eletrônico. Intimem-se.

Havendo interposição de recurso, deverá a Secretaria intimar a parte- contrária para contrarrazões e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Sentença dispensada de reexame necessário (art. 496, § 3°, inc. I, do CPC).

Em sede de embargos de declaração, a r. sentença foi complementada (evento 53, SENT1, autos originários).

O Instituto Nacional do Seguro Social pugnou pelo conhecimento e provimento do apelo, para o fim de: (1) reformar a sentença e reconhecer a culpa exclusiva da empresa apelada pelo acidente, afastando a culpa concorrente; 1.2 sucessivamente, caso mantida a culpa concorrente, pugna pela reforma do percentual de 50% atribuído à responsabilidade da vítima, fixando-o em 20%, ou outro patamar inferior, conforme prudente análise do conjunto probatório; (2) reformar a sentença e fixar a base de cálculo dos honorários sobre as prestações vencidas, acrescidas de 12 vincendas, afastando a aplicação (indevida) da súmula nº 111 do STJ.

Em suas razões, a ré ZONA NOVA CENTER CONSTRUÇÃO E DECORAÇÃO LTDA., preliminarmente, requereu a juntada de documento novo, consistente em laudo pericial produzido na Justiça do Trabalho. Quanto ao mérito, sustentou que: (1) a única prova elencada pelo apelado se mostra frágil, não só porque contém informações contraditórias a realidade – situações que conflitam com a prova documental e testemunhal, mas como também por ser o relatório técnico elaborado pelo Ministério do Trabalho preliminarmente, com viés arrecadatório; (2) as provas acostadas aos autos demonstram que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que agiu de forma negligente, imprudente e imperita; (3) não se verifica o nexo causal entrea conduta da apelante e o dano descrito na inicial. Nesses termos, requereu o provimento do recurso.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Da juntada de documento novo

Acerca do laudo juntado pela ré com sua apelação, diz o art. 435 do CPC:

Art. 435. É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos.

Parágrafo único. Admite-se também a juntada posterior de documentos formados após a petição inicial ou a contestação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a condutada parte de acordo com o art. 5°.

O laudo pericial acostado pela ré foi produzido em 28 de agosto de 2021, após a prolação da sentença, elaborado por perito nomeado na Justiça do Trabalho, sendo plausível a alegação da apelante de que só tomou conhecimento do documento após o fim da instrução do feito.

O Superior Tribunal de Justiça admite a juntada a posteriori de documentos com a apelação, desde que tais documentos sejam acerca de fatos já alegados ou para contrapor-se a outros fatos que foram produzidos nos autos.

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONVÊNIO. DOCUMENTOS JUNTADOS EM SEDE DE APELAÇÃO. OBSERVÂNCIA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. MODIFICAÇÃO DAS CONCLUSÕES DO JULGADO A QUO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. ÓBICE DA SÚMULA 7 DO STJ.
1. Este Sodalício possui entendimento no sentido de que "a apresentação de documentos novos em apelação é admitida, desde que não sejam indispensáveis à apreciação da demanda, observe o contraditório e que não haja má-fé" (AgInt no AgInt no AREsp 1.653.794/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/8/2020, DJe 31/8/2020).
2. Nesse contexto, a alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem, tal como colocada a questão nas razões recursais, no sentido de asseverar a impossibilidade de juntada dos documentos realizada em sede de apelação, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ.
3. Para se afirmar que a anulação do ato administrativo se deu com observância ao contraditório e à ampla defesa, seria imprescindível o reexame dos elementos contidos no caderno processual, providência incabível na via do especial, a teor do óbice da Súmula 7/STJ.
4. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1776407/AM, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/02/2022, DJe 24/02/2022)

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. JUNTADA DE DOCUMENTO COM A APELAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 435 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/2015. VALOR DO DÉBITO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULAS 5 E 7/STJ. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO. ARTIGOS 932, III, E 1.021, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/2015. SÚMULA 182/STJ. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. NÃO PROVIMENTO.
1. É possível a juntada a posteriori de documentos com a apelação, desde que tais documentos sejam acerca de fatos já alegados ou para contrapor-se a outros fatos que foram produzidos nos autos, nos termos do art. 435 do CPC/2015 (art. 397 do CPC/1973).
2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória e a interpretação de cláusulas contratuais (Súmulas 5 e 7/STJ).
3. Nos termos do art. 1021, § 1º, do CPC/2015 e da Súmula 182/STJ, é inviável o agravo interno que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada.
4. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1471855/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 17/03/2020)

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. PROVA. ART. 435 DO CPC/2015 (ART.
397 DO CPC/1973). DOCUMENTO NOVO. FATO ANTIGO. INDISPENSABILIDADE. EFEITO SURPRESA. APRECIAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. É admissível a juntada de documentos novos, inclusive na fase recursal, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da ação, inexista má-fé na sua ocultação e seja observado o princípio do contraditório (art. 435 do CPC/2015).
2. O conteúdo da alegada prova nova, tardiamente comunicada ao Poder Judiciário, foi objeto de ampla discussão, qual seja, a condição de bem de família de imóvel penhorado e, por isso, não corresponde a um fato superveniente sobre o qual esteja pendente apreciação judicial.
3. A utilização de prova surpresa é vedada no sistema pátrio (arts.
10 e 933 do Código de Processo Civil de 2015) por permitir burla ou incentivar a fraude processual. 4. Há preclusão consumativa quando à parte é conferida oportunidade para instruir o feito com provas indispensáveis acerca de fatos já conhecidos do autor e ocorridos anteriormente à propositura da ação e esta se queda silente.
5. A penhorabilidade do bem litigioso foi aferida com base no conjunto fático-probatório dos autos, que é insindicável ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1721700/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/05/2018, DJe 11/05/2018)

Não se tratando, no caso concreto, de documento indispensável à propositura da ação e tendo sido respeitado o contraditório e ampla defesa, uma vez que a parte autora teve oportunidade de sobre ele se manifestar em contrarrazões (evento 66, autos originários), admissível a juntada aos autos.

DIREITO ADMINISTRATIVO. CIVIL. COBRANÇA DE COTAS CONDOMINIAIS. PARCELAS VENCIDAS E VINCENDAS. JUNTADA DE DOCUMENTOS EM FASE RECURSAL. INOCORRÊNCIA DAS HIPÓTESES PERMITIDAS NO CPC. NECESSIDADE DE VISTA À PARTE CONTRÁRIA PARA MANIFESTAÇÃO. OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A jurisprudência de nossos tribunais é uníssona no sentido de que as dívidas condominiais são espécies de obrigações propter rem, as quais acompanham o imóvel, sendo devidas pelo proprietário, ainda que referentes a períodos anteriores à transferência do domínio a este. 2. No tocante à juntada de documentos, o art. 435 do CPC, dispõe ser lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos. No parágrafo único, do mesmo dispositivo, também admite-se a juntada posterior de documentos formados após a petição inicial ou a contestação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a conduta da parte de acordo com o art. 5º. 3. Não obstante o Superior Tribunal de Justiça admita a possibilidade de juntada de novos documentos após o encerramento da fase de instrução, inclusive em âmbito recursal, tal entendimento não prescinde da necessidade de que seja respeitado o contraditório. 4. Na admissão de juntada de documentos novos em fase recursal, há de se ter muita cautela, porquanto essa deveria ser admitida em casos cuja utilização tenha sido antes impossível, não podendo tal permissão ser feita com o intuito de sanar a produção de prova documental que já poderia ter sido realizada. 5. Apelação improvida. (TRF4, AC 5004707-41.2019.4.04.7200, QUARTA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 23/10/2021)

Da constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/1991

A Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de arguição de inconstitucionalidade, declarou constitucional o artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991, em face das disposições dos artigos 7º, inciso XXVIII, 154, inciso I, e 195, § 4º, todos da Constituição Federal:

CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF. Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos. Interpretação conforme a Constituição. Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato. Argüição rejeitada, por maioria. (TRF 4ª Região, Corte Especial, INAC 1998.04.01.023654-8, Rel. p/ Acórdão Manoel Lauro Volkmer de Castilho, DJU 13/11/2002)

Eis um trecho do voto proferido pelo eminente Relator:

Salvo engano, não há incompatibilidade entre o art. 7º, inciso 28, da Constituição, e o art. 120 da Lei 8.213/91. Assim porque estou lendo o inc. 28 de modo diverso ao que faz a eminente Relatora. Penso que, quando a Constituição garante aos trabalhadores esse direito de seguro contra acidente de trabalho a cargo do empregador, é o custeio que ele faz perante a Previdência. Diz a Constituição em seguida: ... 'sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa'. A Constituição não diz que essa indenização é ao empregado. A Constituição diz que o empregador fica responsável por uma indenização se ele der causa ao acidente por culpa ou dolo. O direito dos trabalhadores urbanos e rurais é o seguro contra acidente de trabalho; foi isso que se garantiu na Constituição. Se essa leitura é compatível do jeito que estou a propor, não há divergência entre o art. 120 da Lei nº 8.213 e este inciso, porque, quando o art. 120 diz que a Previdência vai propor ação de regresso, é justamente para se ressarcir daquilo que pagou por responsabilidade objetiva ao empregado, tendo o empregador tido culpa ou dolo. (...)

De modo que, se isso é verdadeiro, o ressarcimento ou a indenização, conforme o termo da Constituição, se é devido, é devido à Previdência Social, que atendeu o direito, garantido pela Constituição, ao empregado. Não estou vendo a incompatibilidade que se quer extrair, e mais, a inconstitucionalidade que se quer ler no dispositivo mencionado. De qualquer modo, se a regra tivesse a leitura afirmada pela Relatora, também não seria incompatível com a da Constituição, pois que, tendo títulos diversos, tanto o empregador tem de contribuir, quanto, sendo culpado, haverá de indenizar quem pagou o seguro, isto é, o INSS e a quem causar dano, e nessa perspectiva, não acontece inconstitucionalidade.

Acresça-se a tais fundamentos que (i) o artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991 não contraria os princípios da contrapartida e da equidade na forma de participação no custeio da Seguridade Social (art. 195, § 5º, da Constituição Federal), porquanto a norma legal prevê a responsabilização do empregador por culpa em acidente de trabalho (natureza indenizatória), e (ii) a pretensão ressarcitória não implica bitributação ou bis in idem, uma vez que envolve responsabilização por ato ilícito (violação de dever legal), e não cobrança de tributo ou similar.

Do Seguro de Acidente do Trabalho - SAT

É firme, na jurisprudência, a orientação no sentido de que o recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho - que se destina ao custeio geral dos benefícios de aposentadoria especial e decorrentes de acidente de trabalho relativos aos riscos ordinários do empreendimento ou, nos termos do inciso II do artigo 22, aos "riscos ambientais do trabalho" - não impede o Instituto Nacional do Seguro Social de pleitear, via regressiva, o ressarcimento dos valores pagos ao segurado ou seus dependentes, a título de benefício previdenciário, nos casos em que o acidente do trabalho decorre de negligência do empregador, por inobservância das normas padrão de segurança e higiene do trabalho (art. 120 da Lei n.º 8.213/1991). A intenção do legislado não é onerá-lo duplamente, mas, sim, assegurar o reembolso do que fora despendido, mediante sua responsabilização pelo evento lesivo (natureza indenizatória).

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REGRESSIVA MOVIDA PELO INSS EM FACE DE EMPRESA RESPONSÁVEL POR ACIDENTE DE TRABALHO. INTERPRETAÇÃO CONJUNTA DOS ARTS. 22 DA LEI 8.212/91 E 120 DA LEI 8.213/91. A CONTRIBUIÇÃO AO SAT NÃO ELIDE A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA. AGRAVO INTERNO DA OI S/A A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. É firme a orientação desta Corte de que o recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho - SAT não impede a cobrança pelo INSS, por intermédio de ação regressiva, dos benefícios pagos ao segurado nos casos de acidente do trabalho decorrentes de culpa da empresa por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.
2. Precedentes: AgRg no REsp. 1.543.883/SC, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 13.11.2015; AgRg no REsp. 1.458.315/SC, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 1.9.2014; AgRg no AREsp. 294.560/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 22.4.2014 e EDcl no AgRg nos EDcl no REsp. 973.379/RS, Rel. Min. ALDERITA RAMOS DE OLIVEIRA, DJe 14.6.2013.
3. Agravo Interno da OI S/A a que se nega provimento.
(STJ, 1ª Turma, AgInt no REsp 1.353.087/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 17/10/2017, DJe 31/10/2017)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA. ACIDENTE DE TRABALHO. RESSARCIMENTO DE VALORES AO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS PELO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE DE OPOR A CULPA CONCORRENTE À AUTARQUIA. OMISSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ARGUMENTO DE INDEVIDA DIMINUIÇÃO DO VALOR A SER RESSARCIDO. IMPROCEDÊNCIA. VALORAÇÃO DAS PROVAS E DIMENSIONAMENTO DA CULPA DA VÍTIMA. REAVALIAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. INTEGRAÇÃO DO POLO PASSIVO E CITAÇÃO POSTERIOR AO SANEAMENTO DOS AUTOS. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. ART. 47 DO CPC/1973. NORMA DE ORDEM PÚBLICA. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE PREJUÍZO NA PRODUÇÃO DE PROVAS (SÚMULA 7/STJ) E DE INEXISTÊNCIA DO LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. IMPROCEDÊNCIA ANTE A NECESSIDADE DE IMPUTAÇÃO SIMULTÂNEA DAS PARCELAS DE RESPONSABILIDADE NO ACIDENTE. ILEGITIMIDADE DA EMPRESA PÚBLICA SUSCITADA. APLICAÇÃO DO ART. 71, § 2º, DA LEI N. 8.666/1993. RESSARCIMENTO DE VALORES EM BIS IN IDEM COM O PAGAMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES SAT/RAT. IMPROCEDÊNCIA. ALEGAÇÃO DE DIVERGÊNCIA PROCESSUAL NÃO DEMONSTRADA.
1. A alegada omissão quanto à impossibilidade de opor a culpa concorrente à autarquia não procede, pois o acórdão recorrido reconheceu a culpa concorrente entre as empresas e a vítima.
2. Não houve redução dos valores devidos à autarquia. O caso não foi de imposição ao INSS de redução de valor, mas de dimensionamento do montante devido por cada empresa em virtude da sua parcela de culpa no acidente.
3. Reavaliar a escolha das provas pelo julgador (livre convencimento motivado) e o dimensionamento da culpa da vítima demandaria o revolvimento dos elementos de convicção colacionados aos autos, o que é obstado pelo teor da Súmula 7/STJ. Precedente.
4. A integração do polo passivo e a citação em momento posterior ao saneamento do feito, bem como em razão de litisconsórcio necessário, são possíveis devido à norma de ordem pública representada pelo art. 47 do CPC/1973. Precedentes.
5. A alegação de prejuízo por não se ter acompanhado a produção de provas não prospera, porquanto, para infirmar o acórdão recorrido nesse ponto, necessário seria o revolvimento do material fático-probatório, o que é obstado pela Súmula 7/STJ. Precedente.
6. O argumento de que não haveria litisconsórcio passivo necessário não prospera, visto que, apontada a responsabilidade concorrente da Transpetro no acidente, se faz necessário imputar, simultaneamente, a parcela de responsabilidade cabível a cada litisconsórcio.
7. Quanto à alegada ilegitimidade, por força do disposto no art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/1993, como bem salientado pelo Ministério Público em seu parecer, o § 2º daquele artigo de lei prevê a solidariedade com o contratado pelos encargos previdenciários.
8. "É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual a Contribuição para o SAT não exime o empregador da sua responsabilização por culpa em acidente de trabalho, conforme art. 120 da Lei 8.213/1991" (AgInt no REsp 1.571.912/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 23/8/2016, DJe 31/8/2016).
9. Embora indicada a alínea "c" do inciso III do art. 105 da Constituição, não houve demonstração da divergência jurisprudencial, nem mesmo se apontando qualquer acórdão paradigma, o que obsta o conhecimento do recurso nesse ponto.
10. Recurso especial de Escohre Estruturas Tubulares e Equipamentos Ltda. (EPP) não conhecido; recurso especial de Petrobrás Transporte S.A. - Transpetro parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido; e recurso especial do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a que se nega provimento.
(STJ, 2ª Turma, REsp 1.512.721/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, julgado em 05/10/2017, DJe 11/10/2017 - grifei)

Ressalte-se, ainda, que a instituição do Fator Acidentário de Prevenção, pelo Decreto n.º 6.042 - índice variável que traduz o grau de risco de ocorrência de acidente de trabalho em cada empresa, de acordo com a gravidade e frequência (concreta) de tais eventos, influenciando na definição da alíquota do SAT - não altera esse entendimento, nem torna juridicamente impossível a pretensão ressarcitória do Instituto Nacional do Seguro Social, na medida em que (i) não constitui um novo indexador, nem majora, necessariamente, o seguro devido, e (ii) na ação ressarcitória o que se busca é a responsabilização do empregador, por ter contribuido para o infortúnio que vitimou um de seus empregados, ao descumprir o dever de adotar efetivamente as medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador (art. 19, § 1º, da Lei n.º 8.213/1991). Com efeito, não está em discussão o custeio geral da Seguridade Social, fundado no princípio da solidariedade (art. 195, caput, da CRFB).

Nessa perspectiva, o fato de a empresa contribuir para o Seguro de Acidente do Trabalho não exclui eventual responsabilização por acidente de trabalho.

Do dever do empregador de ressarcir valores ao erário

Para caracterização da responsabilidade do empregador em face da Previdência Social, é necessária a configuração de (i) conduta (comissiva ou omissiva) culposa do empregador, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, (ii) dano e (iii) nexo causal entre ambos os elementos.

Ao apreciar o(s) pedido(s) deduzido(s) na petição inicial, o juízo a quo manifestou-se nos seguintes termos:

Trata-se de ação proposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social, contra a empresa Zona Nova Center Construção e Decoração Ltda. (Redemac Materiais de Construção), objetivando a condenação da ré ao pagamento de indenização correspondente aos valores gastos pela Previdência Social com o adimplemento da pensão por morte concedida à dependente de segurado vítima fatal de acidente de trabalho.

O INSS fundamentou o pedido no art. 120, I, da Lei nº 8.213/91, bem como nos artigos 186 e 927 do Código Civil. Enfatizou como objetivos da demanda o dever de zelo pela integridade do patrimônio da Previdência Social e o intuito de incentivar as empresas a cumprirem as normas de segurança e de higiene do trabalho, compatibilizando os primados da livre iniciativa com a valorização do trabalho e a dignidade da pessoa humana. Afirmou que, no dia 24/05/2019, às 09h15min, nas dependências da empresa-ré, ocorreu um grave acidente, que ocasionou a morte do funcionário Huendel Martins Menger, empregado da ré desde 07/05/2012. Afirmou que no dia dos fatos, juntamente com outros dois empregados, [Huendel] executava medidas de manutenção no elevador de carga da empresa que havia apresentado defeito durante o uso, sem qualquer qualificação para tal tarefa, quando a cabine movimentou-se bruscamente para baixo, atingindo-o e causando-lhe a morte. Transcreveu as conclusões da análise do acidente feita pela Superintendência Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, que apontou as causas do acidente e constatou irregularidades que resultaram na lavratura de oito autos de infração. Além disso, os fatos também geraram a instauração do Inquérito nº 003232.2019.04.000/0, no qual a ré admitiu que o elevador em questão foi inutilizado, pois a adequação do mesmo aos padrões normativos e técnicos atuais não era viável economicamente. Argumentou que eventuais falhas dos trabalhadores no contexto do acidente são resultado direto de uma gestão de riscos deficiente. Asseverou que em razão do acidente concedeu aos dependentes do segurado falecido um benefício de pensão por morte, com DIB em 02/06/2019 e ainda ativo. Tratou das estatísticas dos custos dos acidentes de trabalho à Previdência Social. Discorreu sobre os fundamentos constitucionais e infraconstitucionais da ação regressiva e sobre o valor da indenização pleiteada. Manifestou a possibilidade de realização de audiência de conciliação. Asseverou ser caso de inversão do ônus da prova, cabendo à empregadora demonstrar que agiu com diligência e precaução necessárias a diminuir os riscos de lesões. Por fim, pugna pela correção monetária do valor da condenação pela SELIC, nos termos do art. 406 do CC.

Citada, a parte-ré contestou (evento 11, DOC1). Preliminarmente, alega a inépcia da petição inicial, já que não foi formulado pedido certo e determinado. No mérito, defendeu que o art. 120 da Lei nº 8.213/91 é inconstitucional, diante das previsões dos artigos 7º, XXVIII, 195, caput, inciso I, “a”, e, § 4º, e 201 da CF/88; que já financiou o pagamento da pensão por morte aos dependentes do segurado falecido, através do recolhimento da contribuição do SAR/RAT (Risco Ambiental do Trabalho), cuja cobrança é individualizada através do Fator Acidentário de Prevenção (FAP), calculado segundo variáveis como o histórico de acidentes de trabalho ocorridos na empresa e a adoção de boas práticas de gestão de risco. Sustentou não estarem presentes os requisitos ensejadores da responsabilidade civil, pois não cometeu ato ilícito, já que o acidente ocorreu porque a vítima descumpriu o protocolo de segurança da empresa. Mencionou que no Inquérito Policial nº 2378/2019/152507/A, instaurado para a apuração dos fatos, foi reconhecido que o infortúnio foi um acidente de trabalho, ocorrido devido à negligência, imprudência e imperícia da vítima. Asseverou que após o acidente a vítima ficou apenas um dia na emergência e foi encaminhada para o quatro, aguardando de 8 a 9 dias para a realização de uma cirurgia. O hospital informou à empresa que a vítima não apresentava risco de vida. Mencionou um vídeo que a vítima fez do hospital para encaminhar para a empregadora, no qual se verifica o cuidado que a empresa tem com os empregados. Impugnou o laudo sobre ocidente elaborado pela Superintendência Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, que não está assinado e é totalmente contrário aos depoimentos sobre o acidente, colhidos no inquérito policial. Impugnou, também, as informações lançadas nos oito autos de infração, os quais foram devidamente contestados e se encontram em andamento. Asseverou que, ao contrário do que afirmou o INSS, não confessou a culpa do acidente ao dizer, nos autos do Inquérito Civil nº 003232.2019.04.000/0, que também está em andamento, que o elevador foi inativado devido ao fato de que o custo do conserto não compensava, pois apenas estava prestando as informações verídicas quando à destinação do elevador no qual ocorreu o acidente. Reiterou que a culpa do acidente foi exclusivamente da vítima, que ocupava cargo de gerente e deveria apenas ter solicitado a manutenção do elevador e não tentado consertá-lo inadvertidamente, como ocorreu. Afirmou possuir 175 empregados no Estado do RS, considerando a matriz e três filiais, e nos últimos três anos emitiu apenas quatro Comunicações de Acidente de Trabalho (CAT), incluindo as duas referentes ao acidente citado nos autos. Requereu a improcedência do pedido, pois o infortúnio ocorreu por culpa exclusiva, ou no mínimo concorrente da vítima, a demora na realização da cirurgia apresenta-se como uma concausa, não há provas de que a empresa descumpriu as condicionantes de segurança do trabalho, ou, ainda que tenha havido eventual descumprimento, não há prova de que foi relevante para o resultado danoso. Sucessivamente, requereu a redução da verba indenizatória em 50% do pedido determinado. Pugnou pena não aplicação da SELIC. Impugnou os cálculos apresentados com a petição inicial. Por fim, argumentou o descabimento da inversão do ônus da prova, pois compete ao autor provar o fato constitutivo de seu direito. Juntou documentos.

Houve réplica (evento 18, DOC1).

Intimadas as partes para dizerem as provas que pretendiam produzir (evento 20, DOC1), a parte-ré requereu o uso dos elementos de prova produzidos no inquérito policial como prova emprestada, com o que não concordou a parte-autora, já que as testemunhas no inquérito são ouvidas sem prestar compromisso (evento 34, DOC1), e a expedição de ofício ao Hospital Cristo Redentor para que seja enviado aos autos o prontuário médico (evento 25, DOC1), o que foi indeferido pelo juízo (evento 36, DOC1). A parte-autora requereu a oitiva do auditor que elaborou o Relatório de Análise de Acidente de Trabalho (evento 26, DOC1), tendo desistido posteriormente da oitiva (evento 41, DOC1).

É o relatório.

Preliminar de inépcia da inicial

O INSS formulou os seguintes pedidos:

3) A procedência total dos pedidos para condenar a ré ao ressarcimento da pensão por morte (e eventuais desdobramentos), vale dizer, de todas as despesas com prestações e benefícios acidentários que o INSS tiver pago até a data da liquidação ou ainda vier a pagar após a liquidação decorrentes do infortúnio laboral ocorrido;

4) A determinação de utilização da taxa SELIC como índice de atualização dos valores a serem ressarcidos ao INSS, a partir da data de início do benefício;

5) No caso de benefício ativo, a condenação da demandada a pagar ao INSS cada prestação mensal que despender (parcelas vincendas), referente ao (s) benefício (s) decorrentes dos fatos mencionados, até a respectiva cessação por uma das causas legais. Para tanto, pugna-se pela determinação de que a ré repasse à Previdência Social, até o dia 20 (vinte) de cada mês, o valor da parcela do benefício paga no mesmo mês, através de Guia da Previdência Social (GPS), código 9636, se pessoa jurídica (CNPJ), ou 9652, se pessoa física (CPF);

Trata-se de pedido certo e determinado, pois o autor pretende ser ressarcido de todos os custos previdenciários decorrentes da morte do segurado Huendel Martins Menger.

Dessa forma, rejeito a preliminar de inépcia da inicial por ausência de pedido certo e determinado.

Mérito

O INSS pretende a obtenção de provimento jurisdicional que condene a empresa-ré ao ressarcimento de todos os gastos relativos à concessão do benefício de pensão por morte em razão da morte do segurado Huendel Martins Menger, decorrente das lesões sofridas no acidente do trabalho referido na petição inicial.

Segundo consta na prova dos autos, foi deferido o seguinte benefício previdenciário:

Pensão por Morte Previdenciária nº NB 1900739183 (evento 1, DOC5)

DIB (data do início do benefício): 02/06/2019

DER (data de entrada do requerimento): 05/06/2019

RMI (Renda mensal inicial): R$ 2.796,98 (evento 1 PLAN4)

Pensionista: Lidiane Euzebio Oliveira e Lucas Oliveira Menger

A autarquia previdenciária fundamentou seu pedido no artigo 120 da Lei nº 8.213/91, que dispõe:

Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.

Referido dispositivo (que já teve a constitucionalidade reconhecida pelo TRF4 ao apreciar a Arguição de Inconstitucionalidade da Apelação Cível nº 1998.04.01.023654-8, Rel. Des. Federal Volkmer de Castilho. Data julgamento 23/10/2002) legitima o INSS a buscar o ressarcimento dos valores que despendeu em razão de atitude culposa da empresa, no que tange às normas padrão de segurança e higiene do trabalho.

O fato da empresa contribuir para o Seguro de Acidente do Trabalho - SAT (atualmente denominado RAT - Risco de Acidente do Trabalho) não exclui sua responsabilidade nos casos de acidente do trabalho decorrentes de culpa, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. Referida contribuição, de natureza tributária, destina-se ao custeio da aposentadoria especial e dos benefícios decorrentes de acidente de trabalho relativos aos riscos ordinários do empreendimento ou, nos termos do inciso II do artigo 22 da Lei 8.213/91, dos "riscos ambientais do trabalho", não se tratando de seguro privado e não afastando a responsabilidade da empresa pela adoção das medidas individuais e coletivas de prevenção de acidentes. Assim, o recolhimento do tributo não exclui a obrigação do empregador de ressarcir o INSS pelos gastos decorrentes de acidente de trabalho nas situações previstas no artigo 120 da Lei nº 8.213/1991, de "negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho", não configurando bis in idem.

Desse modo, considerando que a concessão de um benefício depende de uma prévia fonte de custeio, consoante o disposto no artigo 195, § 5º, da CF, constata-se que para os riscos ordinários do trabalho há a expressa previsão do SAT/RAT. Como os riscos extraordinários decorrentes de negligência da empresa não são abrangidos pelo referido seguro ou por outras fontes de custeio do sistema previdenciário, impõe-se o ressarcimento do INSS, inclusive com o objetivo de propiciar o equilíbrio atuarial do regime, além de representar mais um fator de inibição do desrespeito de normas trabalhistas, em inegável benefício do trabalhador.

A ação regressiva busca, portanto, um ressarcimento excepcional ao INSS que, de ordinário, deve arcar com o pagamento de benefícios devidos pelo Regime Geral de Previdência Social. Neste contexto, tem-se que, para a caracterização da responsabilidade do empregador em face do INSS, são necessários os seguintes elementos: a) conduta omissiva culposa, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho; b) dano; c) nexo causal entre a conduta culposa e o dano.

Em decorrência do que estabelece o art. 7º, XXII, da Constituição Federal, cabe asseverar que é de responsabilidade do empregador promover a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. E para este desiderato não basta a existência de normas de segurança no trabalho, fazendo-se necessário seu efetivo cumprimento, o que doravante deverá ser analisado a partir do caso concreto descrito nos autos.

É fato incontroverso na causa a ocorrência do acidente de trabalho que causou a morte do trabalhador/segurado. Também é incontroverso que foi concedida pensão por morte aos dependentes do segurado, conforme acima descrito.

O relatório técnico sobre as causas do acidente ora em análise, elaborado pelo Ministério do Trabalho, chegou às seguintes conclusões (evento 1, DOC2):

Descrição do local

Trata-se de estabelecimento comercial de grande porte, que opera sob nome fantasia Redemac Materiais de Construção e que realiza venda varejista de materiais de construção e outros produtos afins.

O estabelecimento, em seu piso inferior e superior, possui áreas de estoque interligados por um elevador de materiais, que foi diretamente envolvido no acidente fatal. A circulação de pessoal entre pisos se dá por meio da escada permanente em concreto e/ou alvenaria.

O elevador seria fabricado pela empresa PORTISUL ANDAIMES E ELEVADORES LTDA, empresa já extinta, de acordo com informação prestada pelo empregador em relatório sobre o caso acidentário assinado pela empresa em pela engenheira Luíza Tânia Elesbão Rodrigues. Consulta telefônica ao setor de a ART do CREA/RS revelou que tal empresa nunca foi registrada perante tal órgão, tratando-se assim de praticante de exercício ilegal profissional de atividade de engenharia caso verídica a informação de que era sua fabricante e fornecedora.

O elevador não possui projeto técnico, manual de instruções, livro ou fichas de registro de manutenção e engenheiro responsável técnico por seu dimensionamento e instalação, o que é coerente com a falta de registro da empresa Portisul e com a má-qualidade do equipamento descrita mais adiante.

Há, por parte da dita engenheira, alegação de que o elevador, à época de sua aquisição, estaria “atendendo as normas vigentes" e ao “estado da técnica“. Tal alegação, com a devida vênia, é teratológica e desprovida de mínimo fundamento, tendo em vista que o projeto, construção em instalação de elevador são óbvios serviços de engenharia regidos pelas leis 5194/66 e 6496/77, que já estavam em pleno vigor há décadas na época da fabricação instalação do elevador. É evidente que é um elevador fabricado e instalado por empresa sem registro no CREA, sem projetos sem ARTs de fabricação, montagem e manutenção não atende preceitos mais elementares de normas de engenharia vigentes e a fabricação e montagem de um sobre tais condições consiste em exercício ilegal profissional de atividades de engenharia. Impossível considerar regular, estável e seguro um elevador que não foi projetado tecnicamente e cujas exatas características são verdadeiro mistério, como por exemplo cálculo de sua capacidade e seu diagrama elétrico. Sua "manutenção" era também inidônea e feita sem qualquer registro, responsável técnico formal, programa de manutenção ou manual de instruções, sendo comentada mais adiante.

O elevador possuía papel apregoado na porta que indicava limite de peso de 400kgs. O número 4 consistia em rasura sobre número 5 originalmente constante na folha de papel. Não há qualquer explicação técnica sobre os motivos de tal limite de 400kgs e de sua anotação anterior de 500kgs.

O elevador se trata de elevador tracionado por um único cabo, dotado de cabine com portas e montado em poço de elevador fechado por cancelas de porta do tipo dupla, com abertura central. Dada a já comentada ausência de documentação técnica básica e de manutenção idônea, o elevador obviamente, funcionava de forma precária. As principais irregularidades visíveis dizem respeito a suas instalações elétricas de má qualidade, com fiação exposta e instalada de forma desordenada; cabos de sustentação mal amarrados, presença de vazamento de óleo muito provavelmente advindo de seu sistema de motorização o frenagem; quadro de comando desprovido de identificação de funções e, principalmente, defeito no seu sistema de travamento de portas. Este consiste portas internas nas duas extremidades da cabine e portas externas junto as aberturas do poço do elevador nos pavimentos. O defeito será comentado em tópico seguinte.

(...)

Descrição da organização do trabalho:

(...)

Para serviços de manutenção do elevador a empresa se valia de serviços prestados pelo empresário individual “Júlio Conceição de Oliveira Júnior“, (…), e que opera sobre nome fantasia Champion Elevadores. Júlio possui registro no CREA/RS como pessoa jurídica desde 2008 de acordo com consulta telefônica ao setor de registro do CREA/RS e tem como engenheiro responsável técnico engenheiro Nerci da Silva Cardoso, CREA/RS 64016-D. Júlio possui inscrição CNPJ desde 18/12/1990, o que significa que provavelmente operou de forma irregular e clandestina perante o CREA/RS, em exercício ilegal profissional, por aproximadamente 18 anos.

Em relação aos serviços prestados por Júlio no local do acidente, não houve qualquer ART conhecida emitida por parte do engenheiro Nerci, contrariando frontalmente a Lei 6496/77. Isso, em tese, constitui em infração administrativa perante o CREA/RS. O empregador, em relatório apresentado, alegou que o serviços de manutenção estava sob responsabilidade de engenheiro mas falhou em apresentar qualquer documentação correspondente. O CREA/RS, mediante consulta telefônica, não identificou nenhuma RT emitida pela empresa de julho correspondente a empresa Zona Nova Center ou ao endereço desta. Conclui-se que a informação prestada pelo empregador, em relatório da engenheira Luíza Tânia Elesbão Rodrigues, mais uma vez é inconsistente e não corresponde à realidade. Isto é, não havia nenhum engenheiro formalmente responsável pela manutenção do elevador.

Nesse sentido, não foi identificado nenhum indício de qualquer efetiva participação de Nerci na direção e supervisão técnica das atividades exercidas por Júlio no local do acidente, ainda que informalmente. Não há nenhum documento assinado por Nerci e, no momento da inspeção, o sócio-gerente da empresa Zona Nova Center, Sr. Nivaldo Dalla Valle dos Santos, informou desconhecer qualquer atuação de engenheiro na manutenção do elevador, limitando-se a indicar que apenas Júlio trabalhava neste. Estranhamente, quem assinou documento após o acidente declarando falsamente elevador apresentava boas condições de uso fora, aparentemente, Júlio e não Nerci. Isso, associado a falta de ART, indica que Júlio atuava por sozinho e conta própria, sem efetiva participação do engenheiro que figura como responsável pelas atividades da empresa.

Júlio Conceição de Oliveira Júnior, que opera sobre nome fantasia Champion Elevadores, é um fornecedor de serviços de péssima qualidade de manutenção de elevadores, notabilizando-se por ter sido flagrado anteriormente pela Superintendência Regional do Trabalho no fornecimento e “manutenção“ elevadores sucateados e desprovidos de mínimas condições de uso em obras de construção civil na região de Capão da Canoa. Foram identificados registros de pelo dois elevadores interditados na região do Litoral Norte pelo AFT ora signatário envolvendo Júlio. O primeiro deles, termo de embargo 356689/010-2013 lavrado contra empresa Nazale Teixeira Imóveis Ltda referente a obra situada na Av Moema 3033 em Capão da Canoa/RS, expressamente descreve elevador da marca “Champion Elevadores“ em péssimo estado de conservação, literalmente caindo aos pedaços em razão de avançadíssimo estado de corrosão das peças, que se soltavam do elevador após simples puxões. O sistema de fechaduras das portas e cancelas do elevador era inoperante.

Uma segunda interdição associada a mesma empresa “Champion Elevadores“ e a de número 352896/006-2012, lavrada contra empresa Jacobus e Zucati Incorporações Ltda referente a obra na rua Tiaraju 163, também em Capão da Canoa/RS. Este descreve falta de projeto, corrosão, fiação elétrica precária, sistema de fechamento de portas inoperante, dentre outras irregularidades. O termo de interdição não informa a identificação da “Champion Elevadores". Contudo, esta constei manifestação datada de 19/4/2013 feita no processo 46218.005203/2013-71, relacionado a auto de infração derivado da dita interdição, onde a descrição do elevador interditado possuía marcação “Champion Elevadores", novamente associando outro elevador em péssimas condições a Júlio.
Desconfia-se fortemente que existiu múltiplas outras interdições de elevadores mantidos por Júlio na região, sobretudo feita por outros AFTs de atuação na região de Capão da Canoa. Contudo, a identificação de tais registros resta prejudicada em razão do fato que interdições, embargos e autos de infração cabíveis são lavrados e cadastrados em nome da empresa cliente e tomadora do serviço de Júlio, e não este próprio, e estão arquivados na SRT/RS em meio físico impresso. Fortuitamente, nos dois casos acima mencionados, excepcionalmente os arquivos eletrônicos correspondentes aos processos físicos ainda se encontravam arquivado no computador do AFT ora signatário e havia expressa menção ao termo “Champion" em seus textos, permitindo assim localização destes por busca textual no respectivo diretório e identificação dos processos administrativos.

O padrão de regularidade encontrados em 2012 e 2013 é o mesmo encontrado no presente caso. Ou seja, a situação encontrada no caso do acidente não fugia do mau padrão praticado por Júlio e Nivaldo. Estes sabiam ou deveriam saber perfeitamente dos embargos e interdições anteriores feitos contra outros clientes seus e, consequentemente, sabiam perfeitamente dos riscos de validar o uso do elevador sem projeto, conversas de má qualidade e funcionando de forma precária, vindo a efetivamente provocar uma morte. Há aí conduta predatória, onde presta um serviço abaixo dos padrões legais de qualidade exigíveis obtendo assim redução artificial de preço e vantagem concorrencial indevida perante concorrentes que atendem a padrões normativos e que possuem custos extras em razão disso. Isso prejudica também a clientela incauta que confia nas certificações de "regularidade" emitidas e que acaba sendo vítima de devidas sanções administrativas(pois legalmente é o responsável pelo elevador) e, principalmente, de risco de acidentes, efetivamente ocorridos no caso

Descrição da atividade:

Atividade envolvida no acidente diz respeito ao uso e manutenção de elevador tracionado a cabo destinada a movimentação de materiais. Elevadores possuem regulamentação geral na Norma Regulamentadora 11, que exige múltiplas cautelas como devido projeto e dimensionamento técnico, proteção as cabines e inspeções permanentes de itens de segurança. Nada disso havia. Na Norma Regulamentadora 18, específica a construção civil, há regras mais detalhada sobre o tipo de elevador utilizado que, ao que tudo indica, é oriundo de alguma obra finda. De qualquer sorte, A NR 18 não é aplicável ao caso em razão da natureza do estabelecimento comercial, atraindo assim as normas gerais da NR 11. Aplica-se de forma subsidiária NR 12, referente a máquinas e equipamentos.

Um dos principais riscos na operação de elevador, sobretudo na manutenção, é o de ingresso de pessoas ou segmentos corporais no poço do elevador com a cabine fora de nível e em movimento. Tratando-se a cabine de uma parte móvel do elevador, esta pode atingir prensar trabalhadores que se posicionem acima ou embaixo desta. Pode ainda provocar amputação de braços e pernas inseridos em seu caminho mediante chamado “efeito guilhotina“. Para evitar isso, exigi-se que as portas do elevador possuam chaves de segurança que impeçam que a cabine se movimente com as portas em posição aberta e também evitem que a porta do pavimento possa ser aberta com a cabine posicionada fora do nível tudo isso falhou no caso, conforme próximo tópico.

As atividades de manutenção de elevadores são atividades técnicas complexas, do ramo da engenharia, cuja execução depende de qualificação do responsável pela manutenção e execução do serviço sob supervisão responsabilidade técnica de engenheiro. Pressupõe ainda que sejam devidamente registradas em livro, ficha ou sistema informatizado na forma do item 12.112 da NR 12. A manutenção do elevador, por sua vez, na forma registrada pela NR já referida 12 pelo item 12.111 e seguintes, deve ser feita sob direção de profissional legalmente habilitado. Nos termos do item 12.113, devem ser feitas por equipe qualificada com equipamento devidamente paralisado. Também não foi o caso conforme visto a seguir.

(...)

Descrição do acidente/doença:

Antes de descrever o acidente, necessário mencionar seu histórico de supostas manutenções. A despeito da falta de registros formais de serviços de manutenção exigida pela NR 12, a reconstituição (ao menos parcial) do histórico de manutenção do elevador foi possível mediante notas fiscais e recibos emitidos pelo já mencionado Júlio. O registro mais antigo de serviços prestados por Julio é datado de 28/04/2017, referente a nota fiscal 97, que indica troca de contatora. A nota fiscal 114 indica nova manutenção corretiva no valor de R$ 1460,00.

Na nota fiscal 121, paga em 26/10/17, há registro bastante relevante ao presente caso, que indica pagamento de conserto de R$150,00 referente a "elevador andando com a porta aberta". A mesma nota indica que a origem do problema de tratava de "curto na fiação" e que esta foi substituída. A partir de tal data Julio cessou a emissão de notas fiscais, havendo apenas apresentação de recibos de pagamento. Isso traz indício de irregularidade fiscal (prestar serviços sem emissão de nota fiscal correspondente) e consequente sonegação tributária. Há dois recibos de R$450,00 referentes a "manutenção de elevador", datados de 24/05/18 05/10/2018.

O próximo recibo relevante, e elemento probatório chave, diz respeito a recibo no valor de R$ 1800,00 referente a troca de quatro fechaduras de ruptura positiva. É datado de 05/12/2018. No termo de interdição, é descrito que apenas uma destas (que fora trocada após o acidente) estava em perfeito estado de conservação. Todas as demais apresentam corrosão e desgaste, aparentemente de anos de uso e, até a apresentação do recibo que indicava troca relativamente recente, acreditava-se que estavam instaladas no elevador há anos. Isso significa que em 05/12/2018 Júlio instalou chaves de segurança usadas, com visíveis sinais de desgaste e muito provavelmente oriundas de reaproveitamento de peças de um segundo elevador desativado, conforme descrito mais adiante. Isso é coerente com o padrão encontrado nas interdições e embargos de 2012 e 2013, onde o péssimo estado de conservação dos elevadores instalados por Júlio não correspondia a data de sua suposta instalação, indicando que Júlio rotineiramente fornece peças e materiais usados, fora de garantia do fabricante e em mau estado de conservação.

Em 02/02/2019 há nova e último registro de serviços genéricos de manutenção prestados por Júlio, no valor de R$250,00. Há um recibo datado de 01 de fevereiro, emitido pela "Rebobinagem do Alemão", que apontava serviço de R$400,00 de rebobinagem de motor trifásico do elevador.

De tais notas fiscais, extraem-se ainda duas conclusões: não havia periodicidade regular nas intervenções de Júlio e estas, salvo duas notas fiscais que não especificam serviços, são sempre de manutenções corretivas, e não de inspeções preventivas que seriam esperadas. A quantidade de panes graves no elevador em um período de aproximadamente 18 meses chama também a atenção.

Na data do acidente, os trabalhadores Patrick Justin de Oliveira e Matheus Cardoso Lummertz, respectivamente auxiliar de depósito e recepcionista de mercadorias, acionaram o elevador a partir do pavimento térreo a fim de carregá-lo com carrinho de mercadorias que deveria ser levado até o pavimento superior. A cabine estava originalmente parada no piso superior e, durante a descida, uma das portas internas do elevador se abriu, aparentemente repetindo o mesmo defeito já "consertado" por Júlio em 26/10/2017. Tais portas, conforme relatório, não possuíam monitoramento de interface de segurança e redundância. Sua abertura não fez o motor do elevador parar, conforme deveria ocorrer caso houvesse tal sistema de segurança. O movimento da cabine somente "cessou" após a porta interna aberta ficar mecanicamente presa junto a estrutura do poço do elevador, emperrando e obstruindo a trajetória da cabine. Houve narrativa de que após o travamento e forte barulho gerado do atrito da porta foi acionado comando de parada do elevador. O próprio empregador diz que nenhum dos dois sobreviventes soube dizer que fez o acionamento.

Os dois trabalhadores acionaram então a vítima, que era gerente do local. O trio resolveu então consertar o elevador, a despeito de não possuir mínima qualificação para tanto. Uma questão não esclarecidas pelo empregador é a seguinte: por que é exatamente a equipe decidiu se aventurar na operação de manutenção, sem ter qualquer qualificação e correndo sério risco de danificar o elevador, sobretudo quando Júlio prestava serviços de manutenção corretiva do elevador? Pode-se especular que ou a equipe estava agindo sob sugestão e instruções de Júlio após possivelmente ser acionada para prestar o serviço de manutenção e alegar indisponibilidade, ou por determinação do empregador após desacerto financeiro com o Júlio ou ainda por conta própria para "mostrar serviço" e agradar o empregador, sobretudo em razão de desconfiança (plenamente justificada e ilegítima) quanto a péssima qualidade do serviços de Júlio. Inicialmente, a equipe adentrar no interior do poço do elevador abrindo a porta térrea. Esta, a despeito da cabine estar fora do nível o pavimento, permitiu a abertura. O empregador, em seu relatório da engenheira Luiza Tânia, se limitou a dizer que houve "burla" no sistema de chaves de segurança instalados nas portas, sem explicar como isso ocorreu exatamente. Partindo do pressuposto que a informação é verdadeira, isso significa, no mínimo, que havia chaves de segurança de má qualidade, suscetíveis a burla. A informação de burla é, o entanto, de baixa credibilidade: documento datado de 29/05/19 feito por Júlio indica que houve troca de uma das chaves que "não estava a trancando", não havendo qualquer informação de que a chave tivesse sido depredada pela equipe. Isso leva a crer que simplesmente tivesse deixado de funcionar por defeito, repetindo algo que já havia ocorrido em 2017, e não por ação deliberada do trio envolvido diretamente no acidente. Outros dois elementos que indicam que não houve burla alguma pela equipe são os fatos de que nenhum dos trabalhadores tinha familiaridade com manutenção de elevadores e, consequentemente, conhecimento técnico para burlar uma chave que é fabricada para resistir a tentativas de abertura com uso de força bruta que seriam esperada de um leigo. Caso a equipe tivesse mínima noção de como operar o elevador e burlar a chave, não teria se posicionado embaixo da cabine suspensa, um erro grosseiro e condição sine qua non ao desfecho fatal do caso. (...)

Após a falha do sistema de tranca da porta externa do pavimento inferior (seja por defeito, seja por burla), a vítima e Matheus ingressaram o interior do poço do elevador e ficaram embaixo da cabine suspensa, posicionados diretamente na zona de perigo do elevador. Patrick estava fora do poço, observando seus colegas. O elevador não foi previamente desligado junto ao quadro de disjuntores e estava energizado operante durante a "manutenção", não havendo registros de que bloqueado ou sinalizado como sob manutenção. Após a equipe identificar que a causa do travamento do movimento da cabine era sua porta interna aberta e presa na estrutura do poço, a vítima e Matheus tentara fechá-la utilizando um guarda-sol como ferramenta improvisada. Desnecessário comentar o grau de amadorismo e inadequação disso. Não houve êxito em tal tentativa inicial. Houve então troca da "ferramenta", passando a ser usado um pé de cabra. A porta foi destravada e colocada no lugar com o pé de cabra e, ato contínuo, a cabine se movimentou violentamente em sentido descendente atingindo a vítima e Matheus. A cabine, contudo, não desceu em queda livre até o final de seu curso, restando ainda suspensa. Caso isso tivesse ocorrido, a equipe teria sido esmagada no local.

A engenheira contratada pelo empregador para apurar o caso, Sra. Luiza Tânia, não esclareceu o motivo de tal movimentação vertical descendente, que é anormal e atípica. Estivesse o elevador realmente parado após obstrução, o esperado seria que a cabine se mantivesse no local após essa altura da porta interna. Vejamos algumas hipóteses sobre tal evento:

a) no cenário em que considera que ambos os sobreviventes prestaram informações fidedignas, houve aí defeito no sistema de motor, sustentação e/ou freio do elevador, de maneira exata desconhecida. Uma das possibilidades (e que não deveria ocorrer em elevador de boa qualidade) seria que a interrupção da movimentação de destino ocasionada pela apreensão da porta aberta na estrutura do poço tem levado a perda de tensionamento do cabo de sustentação do elevador. Isto é, o cabo estava se desenrolando para descer mas a cabine não descia face a obstrução, gerando folga no cabo. Quando obstrução causada pela porta aberta empresa foi eliminada, o cabo não apresentava mais tensão suficiente para segurar a cabine no lugar onde havia parado e esta desceu em queda livre até o ponto onde o cabo voltou a restar tensionado, parando-a. A inexistência de projetos do elevador, como o diagrama elétrico e desenho e especificações do seu sistema de sustentação e frenagem, impede uma melhor análise identificação exata dos efeito.

b) em um segundo cenário alternativo, após a desobstrução feita com uso do pé de cabra, o cabo se manteve tencionado e a cabine do elevador permaneceu parada. O elevador foi acionado para descer, seja por Patrick a partir do térreo em razão de algum "teste" para verificar se o elevador fora "consertado", seja por algum quarto trabalhador ainda não identificado a partir do pavimento superior possivelmente alheio a tarefa ou ciente desta mais ignorante do fato de que havia colegas no interior do poço no momento do acionamento. O sistema de segurança que deveria impedir o funcionamento do elevador com as portas abertas não funcionou e o movimento desse surpreendeu a equipe no interior do poço, atingindo-a. O elevador, obviamente, não fora bloqueado ou desligado durante a "manutenção". Após perceber que houve atingimento aos colegas, o botão de parada foi acionado pelo responsável pelo acionamento. Neste cenário, seria necessário reconhecer prestação de informações falsas sobre o não acionamento do elevador após a desobstrução a fim de proteger Patrick ou algum terceiro trabalhador.

c) Em um terceiro cenário hipotético, os sobreviventes não acionado o botão de parada ao perceberem que este travou durante a descida, antes de acionarem a vítima para lhe ajudar. Assim, a manutenção fora feita com o comando de descida ainda acionado e com a cabine imobilizada tão somente pelo impedimento mecânico causado pela apreensão da porta interna aberta na estrutura do poço. Com essa altura da porta presa e a desobstrução do trajeto da cabine, esta automaticamente retomou seu curso de descida e atingiu a equipe em seu interior. O sistema de segurança que deveria impedir descida do elevador com as portas abertas obviamente falhou. O botão de parada foi imediatamente acionado por Patrick após o acidente para parar o prosseguimento da descida. Neste cenário, igualmente necessário reconhecer que houve prestação de informações incorretas sobre a dinâmica dos fatos afim de escudar os dois sobreviventes.

Ao perceberem a descida brusca da cabine, Matheus muito provavelmente estava próximo à porta de saída e se esquivou do interior do poço, sofrendo em decorrência disso ferimento leve no ombro durante a esquiva, sem sofrer afastamento laboral. Já a vítima muito provavelmente tentou se abaixar e foi atingido em sua coluna vertebral, sofrendo lesões graves. Foi levado ao hospital convide faleceu em 2/6/1919 2019 na verdade durante internação, enquanto aguardava cirurgia.

Júlio foi acionado para realizar manutenção corretiva na data de 29/05/2019 trocou chave defeituosa do lado esquerdo da porta externa inferior do elevador conforme declaração. Não foi identificada a nota fiscal do serviço nem recibo de pagamento. A troca declarado de fato ocorreu pois inspeção no elevador identificou que havia uma chave nova em perfeito estado instalada. Não houve registro de qualquer reparo em relação a parte interna que teria se aberto durante a movimentação do elevador e que foi o estopim do acidente. Igualmente, não houve qualquer registro de reparo no sistema de sustentação do elevador.

Imagens da chave de segurança seguem abaixo. Observa-se nas chaves do pavimento superior sinais visíveis de ferrugem e seus parafusos e também desgaste nas respectivas etiquetas, especialmente na da chave direita, que apresenta possuir anos de uso. Observação fiação exposta. Tais chaves foram instalados nove meses antes de tudo da tomada das fotos o que significa que eram chaves usadas pois impossível haver de teorização tão rápida e não uniforme entre as chaves.

(...)

Informações adicionais relacionadas ao acidente/doença:

Trata-se de acidente de plena responsabilidade do empregador. Houve ai uma enorme sequência de erros.

Em primeiro lugar, louve culpa in vigilando e in eligendo do empregador na escolha da empresa fornecedora do elevador, que não era registrada no CREA/RS e forneceu elevador de má-qualidade, sem projetos, manual, responsável técnico e programa de manutenção.

Em segundo lugar, o empregador não dava manutenção regular ao elevador, que não tinha programa de manutenção e não era submetido a manutenção periódica regular. Sua manutenção era corretiva e em decorrência de frequentes quebras e defeitos do elevador. No momento do acidente, apresentou simultaneamente pelo menos três defeitos distintos: abertura indevida e involuntária da porta interna da cabine durante descida, abertura indevida voluntária da porta externa do pavimento inferior com a cabine fora do nível e falta de paralisação do movimento da cabine com a abertura tanto da porta interna quanto da externa. Possivelmente houve um quarto defeito de exata natureza desconhecida na movimentação descendente abrupta da cabine sobre a vítima.

Em terceiro lugar, houve mais uma vez culpa in vigilando e in elegendo do empregador em relação ao escolhido por prestar manutenção, que o fazia de forma em total desconformidade com normas de segurança e engenharia em vigor, deixando de cumprir itens básicos como emitir ARTs e manter programa e registros de manutenção. No curso dos trabalhos parou até mesmo de emitir notas fiscais do serviço.

E, por último, houve também falha grosseira de toda a equipe envolvida, que se aventurou em uma tentativa amadora e improvisada de consertar o elevador, sem possuir qualificação e se posicionando em zona de perigo. Houve ainda falhas em deixar de desligar ou bloquear previamente o elevador. É possível que a descida da cabine sobre a vítima tenha também sido resultante de acionamento voluntário do elevador. No caso da equipe acidentada, contudo, impossível exigir comportamento perito e seguro destes por serem totalmente desqualificados à tarefa. Seu comportamento amador é perfeitamente condizente com sua total falta de qualificação. O problema, neste ponto específico, reside na total falta de supervisão técnica e descontrole da atividade pelo empregador.

Em decorrência dos fatos, a empresa-ré foi autuada pelas seguintes infrações pelo Mistério Público do Trabalho (evento 1, DOC3), em relação às quais ainda não houve decisão administrativa definitiva (evento 11, DOC12 a DOC19). Porém, analisadas as provas apresentadas nos autos, há demonstração do descumprimento de padrões de segurança pela empresa-ré nas seguintes condições:

- dotar máquinas e/ou equipamentos de proteções móveis associadas a dispositivos de intertravamento que não paralisem suas funções perigosas quando as proteções forem abertas durante a operação;

- utilizar equipamento na movimentação de materiais que não seja calculado e construído de maneira que ofereça as garantias de resistência e segurança ou que não esteja em perfeitas condições de trabalho;

- deixar de executar manutenção e/ou inspeção e/ou reparo e/ou ajuste e/ou outras intervenções em máquina e/ou equipamento por profissionais capacitados ou qualificados ou legalmente habilitados e/ou autorizados formalmente pelo empregador e/ou com as máquinas e/ou equipamentos parados;

- executar manutenção e/ou inspeção e/ou reparo e/ou limpeza e/ou ajuste e/ou outras intervenções em máquina e/ou equipamento sem bloqueio mecânico e elétrico na posição "desligado" ou "fechado" de todos os dispositivos de corte de fontes de energia, e/ou sem sinalizar o local do bloqueio mecânico com cartão ou etiqueta de bloqueio com horário e data, motivo da manutenção e nome do responsável;

- deixar de submeter máquinas e/ou equipamentos à manutenção preventiva ou corretiva e/ou na forma e periodicidade determinada pelo fabricante e/ou conforme as normas técnicas oficiais nacionais e/ou normas técnicas internacionais;

- fabricar e/ou importar e/ou utilizar máquina e/ou equipamento que não possuam manual de instruções com informações relativas à segurança em todas as fases de utilização;

- deixar de registrar as manutenções preventivas ou corretivas em livro próprio, ou ficha ou sistema informatizado;

- deixar de inspecionar cabos de aço e/ou cordas e/ou correntes e/ou roldanas e/ou ganchos dos equipamentos utilizados na movimentação de materiais ou deixar de substituir as partes defeituosas de cabos de aço e/ou cordas e/ou correntes e/ou roldanas e/ou ganchos dos equipamentos utilizados na movimentação de materiais.

No laudo de necropsia da vítima (evento 11, DOC6) consta como causa da morte embolia pulmonar consecutiva a politraumatismo.

O sócio-gerente da parte-ré, Nivaldo, em seu depoimento no inquérito policial afirmou que a manutenção do elevador era feita pela empresa Champion Elevadores, de propriedade de Júlio Conceição de Oliveira Júnior (evento 11, DOC7).

No próprio laudo de análise do acidente elaborado pela empresa-ré consta que A empregadora ignorava o fato de que o equipamento (elevador de materiais) já não mais atendia às normas vigentes e ao atual "ESTADO DA TÉCNICA", conforme termos da NR12 vigente (evento 11, DOC8, p. 5).

Em seu depoimento, Matheus Cardoso Lummertz, a outra vítima do acidente, afirmou que o elevador já tinha apresentado problemas anteriormente, porém, sempre chamavam um técnico para resolver o problema. não sabe porque dessa vez Huendel quis consertar o elevador, acredita que tenha sido pra ganhar velocidade já que estavam com bastante trabalho no dia, hoje percebe que tanto o depoente como Huendel forma totalmente negligentes. Que tanto Huendel como o depoente não ganharam ordem superior para consertar o elevador, tendo tudo sido uma atitude do próprio Huendel e tudo muito rápido (evento 11, DOC8, p. 7).

A testemunha Patrick Justin de Oliveira, também funcionária da parte-ré que presenciou os fatos, sustentou recordar que o elevador já teve este mesmo tipo de travamento anteriormente e SR. Huendel sempre chamava o técnico e este vinha no local e resolvia. Foi somente neste dia que Huendel resolveu solucional o problema. O depoente acredita que Huendel quis consertar o elevador por tinham bastante serviço (evento 11, DOC8, p. 11).

Esse conjunto probatório demonstra que a empresa-ré não atendeu as normas de segurança do trabalho, instalando e desenvolvendo as suas atividades com um elevador de carga que não atendia as normas regulamentares padrão de segurança e com isso contribuiu de forma decisiva para a ocorrência do acidente cujas consequências acabaram culminando na morte do funcionário. A instalação e manutenção regular do equipamento, segundo a regulamentação técnica padrão, muito provavelmente teria evitado o desfecho trágico ocorrido.

Reconhecida a culpa da parte-ré, o dano e o nexo causal, há dever de indenizar.

Por outro lado, ficou comprovada a culpa concorrente do trabalhador, pois, segundo a prova produzida nos autos, ele não recebeu ordens diretas para realizar o conserto e o fez sem mensurar adequadamente os riscos, o que se pressupõe que tinha condições de fazer, já que ocupava uma função de gerência. Todavia, isso não exclui a culpa concorrente da empresa, seja por ter incrementado grandemente o risco de acidentes, instalando e mantendo em funcionamento um equipamento fora dos padrões de segurança, mas também por não ter advertido e capacitado suficientemente seu funcionário sobre o zelo pela integridade física de todos os colaboradores. É dever do empregador implantar uma cultura organizacional de prevenção, especialmente no caso da vítima que ocupava uma função de liderança (gerência), instituindo valores claros de absoluta priorização da segurança. A vítima trabalhava na empresa desde 2012 e ocupava cargo de chefia, do que se pode concluir que sua postura frente ao serviço (que o levou a colocar-se em risco e ao seu colega em prol da realização do serviço) era coerente com a visão transmitida aos funcionários pela empresa. A construção de um ambiente de trabalho preventivo e mais seguro demanda ações intencionais do empregador nesse sentido, o que a parte-ré não demonstrou fazer.

Assim, deverá a ré ressarcir ao INSS 50% dos gastos inerentes à concessão do benefício previdenciário NB 1641936697, envolvendo os já adimplidos e os vincendos. Nesse sentido:

DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA REGRESSIVA. INSS. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR E DO TRABALHADOR. CULPA CONCORRENTE. 1. É irrefutável a conclusão de que tanto a empregadora quanto o obreiro contribuíram para o evento danoso, o que configura culpa concorrente, a ensejar a divisão da responsabilidade pelo infortúnio. 2. Configurada a culpa concorrente do trabalhador vítima do acidente do trabalho e da empresa empregadora, a distribuição da parcela de responsabilidade (gradação de culpa) a modo equivalente (50% para a empresa e 50% para o empregado) é adequada no caso concreto. (TRF4 5000420-67.2017.4.04.7115, TERCEIRA TURMA, Relatora para Acórdão VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 12/07/2021)

Os valores já adimplidos serão corrigidos pela taxa SELIC, a partir do desembolso de cada parcela, abrangendo correção monetária e juros, sem capitalização, como requereu a parte-autora.

Dispositivo

Ante o exposto, rejeito a preliminar de inépcia da inicial e julgo parcialmente procedente o pedido, extinguindo o processo com a resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do CPC, para condenar a parte-ré a ressarcir ao INSS 50% (cinquenta por cento) dos valores pagos pela autarquia aos dependentes Lidiane Euzebio Oliveira e Lucas Oliveira Menger em razão da concessão da pensão por morte NB 1900739183, bem como os valores vincendos, tudo nos termos da fundamentação.

Condeno a parte-ré ao pagamento de metade das custas, sendo o INSS isento das restantes. Condeno ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios à outra parte, calculados de acordo com o patamar mínimo estabelecido nos inciso I do § 3º do art. 85 do CPC, quando da execução, cabendo 50% a cada uma, em conformidade com o art. 85, § 4º, II, do CPC, considerando, para tanto, apenas as prestações vencidas até a data da presente sentença (Súmula n° 111 do STJ - aplicada à espécie por analogia, por se tratar de prestações de trato sucessivo).

Publicação e registro pelo sistema eletrônico. Intimem-se.

Havendo interposição de recurso, deverá a Secretaria intimar a parte- contrária para contrarrazões e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Sentença dispensada de reexame necessário (art. 496, § 3°, inc. I, do CPC).

Em sede de embargos de declaração, a r. sentença restou complementada (evento 53, autos originários):

Trata-se de embargos de declaração opostos pela parte-ré contra a sentença que julgou procedente em parte o pedido (evento 43, SENT1). Alegou haver omissão e contradição na decisão embargada, pois a conclusão do juízo pela atuação culposa da embargante no acidente é contraditória em relação ao teor do depoimento da vítima, registrado em ata notarial, em relação ao qual também houve omissão na análise, e ao depoimento das testemunhas. Além disso, afirmou que o o relatório técnico elaborado pelo Ministério do Trabalho não pode ser utilizado como meio de prova, pois os auditores fiscais do trabalho possuem bônus de produtividade, calculado a partir da arredação produzida. Requereu o o acolhimento dos embargos.

Vieram os autos conclusos.

Inexiste omissão, contradição ou obscuridade na decisão ora embargada, conforme prevê o art. 1.022 do CPC. A irresignação da parte-recorrente cinge-se ao entendimento exposto na sentença, o que resultaria em atribuição de efeitos infringentes aos presentes embargos de declaração.

Por sua vez, as alegações da parte-embargante, em verdade, denotam a sua discordância com a interpretação dada pelo Juízo à prova constante nos autos, pretendendo fazer valer o seu entendimento no caso em exame, com o acolhimento de tese diversa da exposta na sentença.

Os embargos declaratórios, todavia, constituem recurso com finalidade precípua de aperfeiçoamento da sentença, não se prestando para atacar seus fundamentos com objetivo de reforma, tampouco para possibilitar o reexame de questões já decididas. A inconformidade com o resultado do julgamento deve ser discutida através do recurso próprio.

Por fim, os relatórios produzidos pelos auditores fiscais do trabalho são atos administrativos e como tais são presumidamente legítimos, não tendo a embargante apresentado qualquer elemento concreto que pusesse em dúvida o higidez do trabalho.

Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração, mantendo a sentença nos moldes em que foi lançada.

Intimem-se.

O empregador é responsável tanto pelo treinamento e conscientização de seus empregados para o estrito cumprimento das normas de segurança e higiene do trabalho, como pelo controle das atividades por eles executadas e medidas de proteção eficazes na prevenção de acidentes.

Depreende-se da análise dos autos que, efetivamente, houve negligência por parte da ré quanto à adoção de medidas de segurança do trabalhador (efetivas e idôneas) e respectiva fiscalização, bem como culpa concorrente do empregado para a ocorrência do evento danoso.

Como já salientado na sentença, com lastro no acervo probatório:

(1) acerca do elevador onde ocorreu o acidente que vitimou o trabalhador Huendel Martins Menger, consta no relatório técnico elaborado pelo Ministério do Trabalho:

Trata-se de estabelecimento comercial de grande porte, que opera sob nome fantasia Redemac Materiais de Construção e que realiza venda varejista de materiais de construção e outros produtos afins.

O estabelecimento, em seu piso inferior e superior, possui áreas de estoque interligados por um elevador de materiais, que foi diretamente envolvido no acidente fatal. A circulação de pessoal entre pisos se dá por meio da escada permanente em concreto e/ou alvenaria.

O elevador seria fabricado pela empresa PORTISUL ANDAIMES E ELEVADORES LTDA, empresa já extinta, de acordo com informação prestada pelo empregador em relatório sobre o caso acidentário assinado pela empresa em pela engenheira Luíza Tânia Elesbão Rodrigues. Consulta telefônica ao setor de a ART do CREA/RS revelou que tal empresa nunca foi registrada perante tal órgão, tratando-se assim de praticante de exercício ilegal profissional de atividade de engenharia caso verídica a informação de que era sua fabricante e fornecedora.

O elevador não possui projeto técnico, manual de instruções, livro ou fichas de registro de manutenção e engenheiro responsável técnico por seu dimensionamento e instalação, o que é coerente com a falta de registro da empresa Portisul e com a má-qualidade do equipamento descrita mais adiante.

Há, por parte da dita engenheira, alegação de que o elevador, à época de sua aquisição, estaria “atendendo as normas vigentes" e ao “estado da técnica“. Tal alegação, com a devida vênia, é teratológica e desprovida de mínimo fundamento, tendo em vista que o projeto, construção em instalação de elevador são óbvios serviços de engenharia regidos pelas leis 5194/66 e 6496/77, que já estavam em pleno vigor há décadas na época da fabricação instalação do elevador. É evidente que é um elevador fabricado e instalado por empresa sem registro no CREA, sem projetos sem ARTs de fabricação, montagem e manutenção não atende preceitos mais elementares de normas de engenharia vigentes e a fabricação e montagem de um sobre tais condições consiste em exercício ilegal profissional de atividades de engenharia. Impossível considerar regular, estável e seguro um elevador que não foi projetado tecnicamente e cujas exatas características são verdadeiro mistério, como por exemplo cálculo de sua capacidade e seu diagrama elétrico. Sua "manutenção" era também inidônea e feita sem qualquer registro, responsável técnico formal, programa de manutenção ou manual de instruções, sendo comentada mais adiante.

O elevador possuía papel apregoado na porta que indicava limite de peso de 400kgs. O número 4 consistia em rasura sobre número 5 originalmente constante na folha de papel. Não há qualquer explicação técnica sobre os motivos de tal limite de 400kgs e de sua anotação anterior de 500kgs.

O elevador se trata de elevador tracionado por um único cabo, dotado de cabine com portas e montado em poço de elevador fechado por cancelas de porta do tipo dupla, com abertura central. Dada a já comentada ausência de documentação técnica básica e de manutenção idônea, o elevador obviamente, funcionava de forma precária. As principais irregularidades visíveis dizem respeito a suas instalações elétricas de má qualidade, com fiação exposta e instalada de forma desordenada; cabos de sustentação mal amarrados, presença de vazamento de óleo muito provavelmente advindo de seu sistema de motorização o frenagem; quadro de comando desprovido de identificação de funções e, principalmente, defeito no seu sistema de travamento de portas. Este consiste portas internas nas duas extremidades da cabine e portas externas junto as aberturas do poço do elevador nos pavimentos. O defeito será comentado em tópico seguinte.

(...)

(2) sobre a manutenção do referido elevador, consta no relatório:

(...)

Para serviços de manutenção do elevador a empresa se valia de serviços prestados pelo empresário individual “Júlio Conceição de Oliveira Júnior“, (…), e que opera sobre nome fantasia Champion Elevadores. Júlio possui registro no CREA/RS como pessoa jurídica desde 2008 de acordo com consulta telefônica ao setor de registro do CREA/RS e tem como engenheiro responsável técnico engenheiro Nerci da Silva Cardoso, CREA/RS 64016-D. Júlio possui inscrição CNPJ desde 18/12/1990, o que significa que provavelmente operou de forma irregular e clandestina perante o CREA/RS, em exercício ilegal profissional, por aproximadamente 18 anos.

Em relação aos serviços prestados por Júlio no local do acidente, não houve qualquer ART conhecida emitida por parte do engenheiro Nerci, contrariando frontalmente a Lei 6496/77. Isso, em tese, constitui em infração administrativa perante o CREA/RS. O empregador, em relatório apresentado, alegou que o serviços de manutenção estava sob responsabilidade de engenheiro mas falhou em apresentar qualquer documentação correspondente. O CREA/RS, mediante consulta telefônica, não identificou nenhuma RT emitida pela empresa de julho correspondente a empresa Zona Nova Center ou ao endereço desta. Conclui-se que a informação prestada pelo empregador, em relatório da engenheira Luíza Tânia Elesbão Rodrigues, mais uma vez é inconsistente e não corresponde à realidade. Isto é, não havia nenhum engenheiro formalmente responsável pela manutenção do elevador.

Nesse sentido, não foi identificado nenhum indício de qualquer efetiva participação de Nerci na direção e supervisão técnica das atividades exercidas por Júlio no local do acidente, ainda que informalmente. Não há nenhum documento assinado por Nerci e, no momento da inspeção, o sócio-gerente da empresa Zona Nova Center, Sr. Nivaldo Dalla Valle dos Santos, informou desconhecer qualquer atuação de engenheiro na manutenção do elevador, limitando-se a indicar que apenas Júlio trabalhava neste. Estranhamente, quem assinou documento após o acidente declarando falsamente elevador apresentava boas condições de uso fora, aparentemente, Júlio e não Nerci. Isso, associado a falta de ART, indica que Júlio atuava por sozinho e conta própria, sem efetiva participação do engenheiro que figura como responsável pelas atividades da empresa.

Júlio Conceição de Oliveira Júnior, que opera sobre nome fantasia Champion Elevadores, é um fornecedor de serviços de péssima qualidade de manutenção de elevadores, notabilizando-se por ter sido flagrado anteriormente pela Superintendência Regional do Trabalho no fornecimento e “manutenção“ elevadores sucateados e desprovidos de mínimas condições de uso em obras de construção civil na região de Capão da Canoa. Foram identificados registros de pelo dois elevadores interditados na região do Litoral Norte pelo AFT ora signatário envolvendo Júlio. O primeiro deles, termo de embargo 356689/010-2013 lavrado contra empresa Nazale Teixeira Imóveis Ltda referente a obra situada na Av Moema 3033 em Capão da Canoa/RS, expressamente descreve elevador da marca “Champion Elevadores“ em péssimo estado de conservação, literalmente caindo aos pedaços em razão de avançadíssimo estado de corrosão das peças, que se soltavam do elevador após simples puxões. O sistema de fechaduras das portas e cancelas do elevador era inoperante.

Uma segunda interdição associada a mesma empresa “Champion Elevadores“ e a de número 352896/006-2012, lavrada contra empresa Jacobus e Zucati Incorporações Ltda referente a obra na rua Tiaraju 163, também em Capão da Canoa/RS. Este descreve falta de projeto, corrosão, fiação elétrica precária, sistema de fechamento de portas inoperante, dentre outras irregularidades. O termo de interdição não informa a identificação da “Champion Elevadores". Contudo, esta constei manifestação datada de 19/4/2013 feita no processo 46218.005203/2013-71, relacionado a auto de infração derivado da dita interdição, onde a descrição do elevador interditado possuía marcação “Champion Elevadores", novamente associando outro elevador em péssimas condições a Júlio.
Desconfia-se fortemente que existiu múltiplas outras interdições de elevadores mantidos por Júlio na região, sobretudo feita por outros AFTs de atuação na região de Capão da Canoa. Contudo, a identificação de tais registros resta prejudicada em razão do fato que interdições, embargos e autos de infração cabíveis são lavrados e cadastrados em nome da empresa cliente e tomadora do serviço de Júlio, e não este próprio, e estão arquivados na SRT/RS em meio físico impresso. Fortuitamente, nos dois casos acima mencionados, excepcionalmente os arquivos eletrônicos correspondentes aos processos físicos ainda se encontravam arquivado no computador do AFT ora signatário e havia expressa menção ao termo “Champion" em seus textos, permitindo assim localização destes por busca textual no respectivo diretório e identificação dos processos administrativos.

O padrão de regularidade encontrados em 2012 e 2013 é o mesmo encontrado no presente caso. Ou seja, a situação encontrada no caso do acidente não fugia do mau padrão praticado por Júlio e Nivaldo. Estes sabiam ou deveriam saber perfeitamente dos embargos e interdições anteriores feitos contra outros clientes seus e, consequentemente, sabiam perfeitamente dos riscos de validar o uso do elevador sem projeto, conversas de má qualidade e funcionando de forma precária, vindo a efetivamente provocar uma morte. Há aí conduta predatória, onde presta um serviço abaixo dos padrões legais de qualidade exigíveis obtendo assim redução artificial de preço e vantagem concorrencial indevida perante concorrentes que atendem a padrões normativos e que possuem custos extras em razão disso. Isso prejudica também a clientela incauta que confia nas certificações de "regularidade" emitidas e que acaba sendo vítima de devidas sanções administrativas(pois legalmente é o responsável pelo elevador) e, principalmente, de risco de acidentes, efetivamente ocorridos no caso

(3) no histórico de serviços de manutenção do elevador, além de irregularidades fiscais, foi constatada a utilização de peças e materiais, como chaves de segurança, usadas e com visíveis sinais de desgaste, muito provavelmente oriundas de reaproveitamento de peças de um segundo elevador desativado, o que foi considerado pelo Auditor-Fiscal do Ministério do Trabalho como coerente com o padrão encontrado nas interdições e embargos de 2012 e 2013, onde o péssimo estado de conservação dos elevadores instalados por Júlio não correspondia a data de sua suposta instalação, indicando que Júlio rotineiramente fornece peças e materiais usados, fora de garantia do fabricante e em mau estado de conservação. Do exame das notas fiscais relativas a reparos no elevador, extraem-se ainda duas conclusões: não havia periodicidade regular nas intervenções de Júlio e estas, salvo duas notas fiscais que não especificam serviços, são sempre de manutenções corretivas, e não de inspeções preventivas que seriam esperadas. A quantidade de panes graves no elevador em um período de aproximadamente 18 meses chama também a atenção;

(4) sobre o acidente propriamente dito, consta no relatório:

Na data do acidente, os trabalhadores Patrick Justin de Oliveira e Matheus Cardoso Lummertz, respectivamente auxiliar de depósito e recepcionista de mercadorias, acionaram o elevador a partir do pavimento térreo a fim de carregá-lo com carrinho de mercadorias que deveria ser levado até o pavimento superior. A cabine estava originalmente parada no piso superior e, durante a descida, uma das portas internas do elevador se abriu, aparentemente repetindo o mesmo defeito já "consertado" por Júlio em 26/10/2017. Tais portas, conforme relatório, não possuíam monitoramento de interface de segurança e redundância. Sua abertura não fez o motor do elevador parar, conforme deveria ocorrer caso houvesse tal sistema de segurança. O movimento da cabine somente "cessou" após a porta interna aberta ficar mecanicamente presa junto a estrutura do poço do elevador, emperrando e obstruindo a trajetória da cabine. Houve narrativa de que após o travamento e forte barulho gerado do atrito da porta foi acionado comando de parada do elevador. O próprio empregador diz que nenhum dos dois sobreviventes soube dizer que fez o acionamento.

Os dois trabalhadores acionaram então a vítima, que era gerente do local. O trio resolveu então consertar o elevador, a despeito de não possuir mínima qualificação para tanto. Uma questão não esclarecidas pelo empregador é a seguinte: por que é exatamente a equipe decidiu se aventurar na operação de manutenção, sem ter qualquer qualificação e correndo sério risco de danificar o elevador, sobretudo quando Júlio prestava serviços de manutenção corretiva do elevador? Pode-se especular que ou a equipe estava agindo sob sugestão e instruções de Júlio após possivelmente ser acionada para prestar o serviço de manutenção e alegar indisponibilidade, ou por determinação do empregador após desacerto financeiro com o Júlio ou ainda por conta própria para "mostrar serviço" e agradar o empregador, sobretudo em razão de desconfiança (plenamente justificada e ilegítima) quanto a péssima qualidade do serviços de Júlio. Inicialmente, a equipe adentrar no interior do poço do elevador abrindo a porta térrea. Esta, a despeito da cabine estar fora do nível o pavimento, permitiu a abertura. O empregador, em seu relatório da engenheira Luiza Tânia, se limitou a dizer que houve "burla" no sistema de chaves de segurança instalados nas portas, sem explicar como isso ocorreu exatamente. Partindo do pressuposto que a informação é verdadeira, isso significa, no mínimo, que havia chaves de segurança de má qualidade, suscetíveis a burla. A informação de burla é, o entanto, de baixa credibilidade: documento datado de 29/05/19 feito por Júlio indica que houve troca de uma das chaves que "não estava a trancando", não havendo qualquer informação de que a chave tivesse sido depredada pela equipe. Isso leva a crer que simplesmente tivesse deixado de funcionar por defeito, repetindo algo que já havia ocorrido em 2017, e não por ação deliberada do trio envolvido diretamente no acidente. Outros dois elementos que indicam que não houve burla alguma pela equipe são os fatos de que nenhum dos trabalhadores tinha familiaridade com manutenção de elevadores e, consequentemente, conhecimento técnico para burlar uma chave que é fabricada para resistir a tentativas de abertura com uso de força bruta que seriam esperada de um leigo. Caso a equipe tivesse mínima noção de como operar o elevador e burlar a chave, não teria se posicionado embaixo da cabine suspensa, um erro grosseiro e condição sine qua non ao desfecho fatal do caso. (...)

Após a falha do sistema de tranca da porta externa do pavimento inferior (seja por defeito, seja por burla), a vítima e Matheus ingressaram o interior do poço do elevador e ficaram embaixo da cabine suspensa, posicionados diretamente na zona de perigo do elevador. Patrick estava fora do poço, observando seus colegas. O elevador não foi previamente desligado junto ao quadro de disjuntores e estava energizado operante durante a "manutenção", não havendo registros de que bloqueado ou sinalizado como sob manutenção. Após a equipe identificar que a causa do travamento do movimento da cabine era sua porta interna aberta e presa na estrutura do poço, a vítima e Matheus tentara fechá-la utilizando um guarda-sol como ferramenta improvisada. Desnecessário comentar o grau de amadorismo e inadequação disso. Não houve êxito em tal tentativa inicial. Houve então troca da "ferramenta", passando a ser usado um pé de cabra. A porta foi destravada e colocada no lugar com o pé de cabra e, ato contínuo, a cabine se movimentou violentamente em sentido descendente atingindo a vítima e Matheus. A cabine, contudo, não desceu em queda livre até o final de seu curso, restando ainda suspensa. Caso isso tivesse ocorrido, a equipe teria sido esmagada no local.

(5) a conclusão lógica sobre as causas do sinistro foi:

Trata-se de acidente de plena responsabilidade do empregador. Houve ai uma enorme sequência de erros.

Em primeiro lugar, louve culpa in vigilando e in eligendo do empregador na escolha da empresa fornecedora do elevador, que não era registrada no CREA/RS e forneceu elevador de má-qualidade, sem projetos, manual, responsável técnico e programa de manutenção.

Em segundo lugar, o empregador não dava manutenção regular ao elevador, que não tinha programa de manutenção e não era submetido a manutenção periódica regular. Sua manutenção era corretiva e em decorrência de frequentes quebras e defeitos do elevador. No momento do acidente, apresentou simultaneamente pelo menos três defeitos distintos: abertura indevida e involuntária da porta interna da cabine durante descida, abertura indevida voluntária da porta externa do pavimento inferior com a cabine fora do nível e falta de paralisação do movimento da cabine com a abertura tanto da porta interna quanto da externa. Possivelmente houve um quarto defeito de exata natureza desconhecida na movimentação descendente abrupta da cabine sobre a vítima.

Em terceiro lugar, houve mais uma vez culpa in vigilando e in elegendo do empregador em relação ao escolhido por prestar manutenção, que o fazia de forma em total desconformidade com normas de segurança e engenharia em vigor, deixando de cumprir itens básicos como emitir ARTs e manter programa e registros de manutenção. No curso dos trabalhos parou até mesmo de emitir notas fiscais do serviço.

E, por último, houve também falha grosseira de toda a equipe envolvida, que se aventurou em uma tentativa amadora e improvisada de consertar o elevador, sem possuir qualificação e se posicionando em zona de perigo. Houve ainda falhas em deixar de desligar ou bloquear previamente o elevador. É possível que a descida da cabine sobre a vítima tenha também sido resultante de acionamento voluntário do elevador. No caso da equipe acidentada, contudo, impossível exigir comportamento perito e seguro destes por serem totalmente desqualificados à tarefa. Seu comportamento amador é perfeitamente condizente com sua total falta de qualificação. O problema, neste ponto específico, reside na total falta de supervisão técnica e descontrole da atividade pelo empregador.

(6) a prova oral produzida corrobora os dados constatados pelo Ministério do Trabalho, tendo o sócio-gerente da empresa ré, Nivaldo, em seu depoimento no inquérito policial confirmado que a manutenção do elevador era feita pela empresa Champion Elevadores, de propriedade de Júlio Conceição de Oliveira Júnior (evento 11, DOC7). Outros depoentes afirmaram:

Em seu depoimento, Matheus Cardoso Lummertz, a outra vítima do acidente, afirmou que o elevador já tinha apresentado problemas anteriormente, porém, sempre chamavam um técnico para resolver o problema. não sabe porque dessa vez Huendel quis consertar o elevador, acredita que tenha sido pra ganhar velocidade já que estavam com bastante trabalho no dia, hoje percebe que tanto o depoente como Huendel forma totalmente negligentes. Que tanto Huendel como o depoente não ganharam ordem superior para consertar o elevador, tendo tudo sido uma atitude do próprio Huendel e tudo muito rápido (evento 11, DOC8, p. 7).

A testemunha Patrick Justin de Oliveira, também funcionária da parte-ré que presenciou os fatos, sustentou recordar que o elevador já teve este mesmo tipo de travamento anteriormente e SR. Huendel sempre chamava o técnico e este vinha no local e resolvia. Foi somente neste dia que Huendel resolveu solucional o problema. O depoente acredita que Huendel quis consertar o elevador por tinham bastante serviço (evento 11, DOC8, p. 11).

(7) Ademais, no próprio laudo de análise do acidente elaborado pela empresa-ré consta que A empregadora ignorava o fato de que o equipamento (elevador de materiais) já não mais atendia às normas vigentes e ao atual "ESTADO DA TÉCNICA", conforme termos da NR12 vigente (evento 11, DOC8, p. 5).

(8) Esse conjunto probatório demonstra que a empresa-ré não atendeu as normas de segurança do trabalho, instalando e desenvolvendo as suas atividades com um elevador de carga que não atendia as normas regulamentares padrão de segurança e com isso contribuiu de forma decisiva para a ocorrência do acidente cujas consequências acabaram culminando na morte do funcionário. A instalação e manutenção regular do equipamento, segundo a regulamentação técnica padrão, muito provavelmente teria evitado o desfecho trágico ocorrido.

(9) as conclusões do laudo apresentado pela ré com a apelação (evento 62, OUT4), que atribuem à vítima culpa exclusiva pelo acidente, a meu sentir, não infirmam os dados apontados pelo Ministério do Trabalho na inspeção realizada, de forma ampla, detalhada e rigorosa, no local onde ocorrido o sinistro. O perito que assina o laudo apresentado pela ré afirma, inclusive, que o equipamento não foi periciado por ele, que tomou suas decisões com base em documentos apresentados, relatando que o equipamento foi fabricado pela empresa PORTSUL ANDAIMES E ELEVADORES LTDA, em 2006;

(10) não resta dúvida, outrossim, sobre a culpa concorrente da vítima, como apontado pelo MM. Juiz a quo:

Por outro lado, ficou comprovada a culpa concorrente do trabalhador, pois, segundo a prova produzida nos autos, ele não recebeu ordens diretas para realizar o conserto e o fez sem mensurar adequadamente os riscos, o que se pressupõe que tinha condições de fazer, já que ocupava uma função de gerência. Todavia, isso não exclui a culpa concorrente da empresa, seja por ter incrementado grandemente o risco de acidentes, instalando e mantendo em funcionamento um equipamento fora dos padrões de segurança, mas também por não ter advertido e capacitado suficientemente seu funcionário sobre o zelo pela integridade física de todos os colaboradores. É dever do empregador implantar uma cultura organizacional de prevenção, especialmente no caso da vítima que ocupava uma função de liderança (gerência), instituindo valores claros de absoluta priorização da segurança. A vítima trabalhava na empresa desde 2012 e ocupava cargo de chefia, do que se pode concluir que sua postura frente ao serviço (que o levou a colocar-se em risco e ao seu colega em prol da realização do serviço) era coerente com a visão transmitida aos funcionários pela empresa. A construção de um ambiente de trabalho preventivo e mais seguro demanda ações intencionais do empregador nesse sentido, o que a parte-ré não demonstrou fazer.

Resta mantida a sentença, portanto, inclusive quanto à distribuição da parcela de responsabilidade da ré, fixada em 50% dos valores despendidos com o pagamento do benefício de Pensão por Morte NB 1641936697.

Quanto aos ônus sucumbenciais, é cediço, na jurisprudência, que, em ações de ressarcimento fundada no artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991, os honorários advocatícios devem ser fixados sobre o valor da condenação, cuja base de cálculo é a soma das parcelas vencidas com 12 (doze) parcelas vincendas, dada a natureza continuada da relação jurídica (art. 85, § 9º, do CPC).

ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. INSS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. PARCELAS VENCIDAS E DOZE VINCENDAS. Em ações de ressarcimento promovidas pelo INSS com base no art. 120 da Lei nº 8213/91, as quais versam sobre relação continuada, os honorários devem ser fixados em 10% sobre a condenação, considerando esta como a soma das parcelas vencidas mais as 12 vincendas, na linha do entendimento desta Corte. (TRF4, 4ª Turma, AC 5005900-35.2017.4.04.7209, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 16/08/2018 - grifei)

ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. NEGLIGÊNCIA. VALORES PAGOS A TÍTULO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. HONORÁRIOS. VENCIDAS E VINCENDAS. (...). 5. Os honorários devem ser fixados em 10% sobre a condenação, considerando essa como a soma das parcelas vencidas mais as 12 vincendas, na linha do entendimento desta Corte. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002736-34.2013.404.7005, Relator Juiz Federal EDUARDO VANDRÉ O L GARCIA, juntado aos autos em 20/12/2016 - grifei)

DIREITO CIVIL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS. ARTIGO 120 DA LEI Nº 8.213/91. CULPA DO EMPREGADOR. COMPROVAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS MORATÓRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRECEDENTES. . No que se refere à correção monetária das parcelas vencidas, deve ser aplicado índice do Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor, que é o mesmo índice utilizado para o pagamento administrativo dos benefícios, a contar do efetivo pagamento de cada uma dessas parcelas. Afastada a aplicação da Taxa SELIC, pois o crédito não possui natureza tributária; . Sobre o quantum indenizatório, os juros moratórios são devidos à taxa de 1% ao mês, contados da citação, conforme mais recente posicionamento do STJ que enfatiza o caráter alimentar do benefício previdenciário. Em relação às parcelas vincendas, no caso de inadimplemento, deverá incidir juros de mora fixados em 1% ao mês, contados da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ e artigo 398 do Código Civil. O evento danoso coincide com a data em que o INSS efetuou o pagamento de cada parcela do benefício previdenciário para o beneficiário. Na esteira do entendimento dessa Corte, em ações de ressarcimento promovidas pelo INSS com base no art. 120 da Lei nº 8213/91, as quais versam sobre relação continuada, os honorários advocatícios devem ser fixados sobre o valor da condenação, cuja base de cálculo será a soma das parcelas vencidas com as 12 (doze) parcelas vincendas.. No caso, diante das peculiaridades do caso, afigura-se razoável a fixação dos honorários advocatícios em 10% do valor da condenação. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL nº 5005686-35.2012.404.7107, Relator Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, juntado aos autos em 18/11/2016 - grifei)

ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA DE INDENIZAÇÃO. CONTUTUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI 8.213/91. SAT. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL DOS JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (...). 3. A correção monetária aplicada às condenações em ação regressiva promovida pelo INSS deve ser a mesma utilizada por essa autarquia para corrigir os pagamentos administrativos dos benefícios previdenciários, qual seja, o INPC. 4. Os juros de mora são devidos desde o evento danoso, de conformidade com a Súmula nº 54 do STJ. 5. Os honorários devem ser fixados em 10% sobre a condenação, considerando esta como a soma das parcelas vencidas mais as 12 vincendas, na linha do entendimento desta Corte. (TRF4, 3ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL nº 5011863-44.2014.404.7107, Relator Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 29/06/2016 - grifei)

Improvida a apelação da ré, impõe-se a majoração em 1% (um por cento) dos honorários advocatícios fixados na sentença em favor do INSS, tendo em vista o trabalho adicional realizado em grau recursal (art. 85, § 11, do CPC).

Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da ré e dar parcial provimento à apelação do INSS.



Documento eletrônico assinado por SERGIO RENATO TEJADA GARCIA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003149629v18 e do código CRC b20981c1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SERGIO RENATO TEJADA GARCIA
Data e Hora: 5/5/2022, às 12:7:40


5000435-13.2020.4.04.7121
40003149629.V18


Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:33:54.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000435-13.2020.4.04.7121/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELANTE: ZONA NOVA CENTER CONSTRUÇÃO E DECORAÇÃO LTDA (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/1991. constitucionalidade. CONTRIBUIÇÃO AO SAT. culpa concorrente do empregado.

A Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de arguição de inconstitucionalidade, declarou constitucional o artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991, em face das disposições dos artigos 7º, inciso XXVIII, 154, inciso I, e 195, § 4º, todos da Constituição Federal.

É firme, na jurisprudência, a orientação no sentido de que o recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho - que se destina ao custeio geral dos benefícios de aposentadoria especial e decorrentes de acidente de trabalho relativos aos riscos ordinários do empreendimento ou, nos termos do inciso II do artigo 22, aos "riscos ambientais do trabalho" - não impede o Instituto Nacional do Seguro Social de pleitear, via regressiva, o ressarcimento dos valores pagos ao segurado ou seus dependentes, a título de benefício previdenciário, nos casos em que o acidente do trabalho decorre de negligência do empregador, por inobservância das normas padrão de segurança e higiene do trabalho (art. 120 da Lei n.º 8.213/1991). A intenção do legislado não é onerá-lo duplamente, mas, sim, assegurar o reembolso do que fora despendido, mediante sua responsabilização pelo evento lesivo (natureza indenizatória).

Para caracterização da responsabilidade do empregador em face da Previdência Social, é necessária a configuração de (i) conduta (comissiva ou omissiva) culposa do empregador, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, (ii) dano e (iii) nexo causal entre ambos os elementos (artigo 120 da Lei n.º 8.213/1991).

Comprovada a culpa concorrente do empregado e da empresa empregadora para a ocorrência do evento danoso, o ressarcimento devido ao Instituto Nacional do Seguro Social corresponderá a uma parcela (proporcional) dos valores pagos ao segurado ou seus dependentes, a título de benefício previdenciário.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da ré e dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por SERGIO RENATO TEJADA GARCIA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003149630v4 e do código CRC bed89ae6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SERGIO RENATO TEJADA GARCIA
Data e Hora: 5/5/2022, às 12:7:40


5000435-13.2020.4.04.7121
40003149630 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:33:54.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 04/05/2022

Apelação Cível Nº 5000435-13.2020.4.04.7121/RS

RELATOR: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

PRESIDENTE: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: KELLY COMIN por ZONA NOVA CENTER CONSTRUÇÃO E DECORAÇÃO LTDA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELANTE: ZONA NOVA CENTER CONSTRUÇÃO E DECORAÇÃO LTDA (RÉU)

ADVOGADO: KELLY COMIN (OAB RS095456)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 04/05/2022, na sequência 703, disponibilizada no DE de 22/04/2022.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA RÉ E DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN

GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:33:54.

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