Apelação Cível Nº 5001455-20.2011.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: MARIA CLARICE DA ROSA (RÉU)
APELADO: HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença com dispositivo exarado nos seguintes termos:
III - Dispositivo
Ante o exposto:
a) Revogo a decisão que antecipou os efeitos da tutela e julgo improcedente a ação ordinária nº 5002261-10.2011.404.7115, extinguindo o feito com exame do mérito, com fundamento no art. 269, I, do CPC.
Condeno a parte-autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor atribuído à causa (art. 20, parágrafos 3º e 4º do CPC), atualizados pelo IPCA-e, considerando o valor atribuído à causa, a relativa simplicidade da matéria e a ausência de produção das provas pericial e testemunhal. Suspensa a exigibilidade em razão da Gratuidade Judiciária deferida
b) Julgo procedente a ação monitória nº 5001455-20.2011.404.7100, ajuizada pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre em face de Maria Clarice da Rosa, rejeitando os embargos opostos e extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I do Código de Processo Civil.
Com fundamento no § 3º do art. 1.102-C do CPC, constituo de pleno direito o título executivo judicial no valor de R$ 7.802,96 (sete mil, oitocentos e dois reais e noventa e seis centavos), em janeiro de 2011.
Condeno a parte-embargante ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor do débito (art. 20, § 3º do CPC), atualizados pelo IPCA-e. Suspensa a exigibilidade em razão da Gratuidade Judiciária, que defiro nesta oportunidade.
Em homenagem aos princípios da instrumentalidade e economia processual, desde logo registro que eventuais apelações interpostas pelas partes serão recebidas no duplo efeito (art. 520, caput, do CPC), salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, que serão oportunamente certificadas pela Secretaria.
Interposto(s) o(s) recurso(s), caberá à Secretaria, mediante ato ordinatório, abrir vista à parte contrária para contrarrazões, e, na sequência, remeter os autos ao TRF da 4ª Região.
Transcorrido sem aproveitamento, certifique-se o trânsito em julgado.
Publicação e registro pelo sistema eletrônico. Intimem-se.
O Hospital de Clínicas opôs embargos declaratórios, que restaram acolhidos, integrando a sentença nos seguintes termos (evento 27, SENT1):
Trata-se de embargos declaratórios opostos pelo HCPA contra a sentença que julgou procedente a ação monitória supramencionada. Alegou a existência de omissão do julgado, pois não foram fixados os critérios de atualização do valor da condenação.
Vieram os autos conclusos.
Com razão o embargante. Passo ao exame da matéria nesta oportunidade.
A sentença do evento nº 17 condenou a ré ao pagamento do valor de R$ 7.802,96 em jan/2011. A contar do ajuizamento da ação, deverão incidir juros de mora de 12% ao ano e correção monetária pelo IPCA-E, índice oficial do IBGE.
Ante o exposto, acolho os embargos de declaração para acrescentar ao dispositivo sentencial que o débito será atualizado, a partir do ajuizamento da ação, pelo IPCA-E e com juros de 12% ao ano.
Em suas razões de apelação, a parte embargante sustenta que se configura abusiva a cláusula inserta em contrato de seguro de saúde que consiste na imposição de 50% do valor das despesas da internação psiquiátrica, depois de ultrapassado o período de 30 (trinta) dias. Aponta a Resolução Normativa nº 338 de 21/10/2013 da ANS, que prevê que, na internação psiquiátrica, haverá incidência de fator moderador passados os primeiros 30 (trinta) dias, e que a coparticipação será de no máximo 50%, incidente sobre o valor contratado, o que deve ser entendido como o da própria mensalidade paga pelo consumidor. Alega que a disposição contida no Contrato de Hospitalização está em flagrante descompasso com a RN nº 338/2013. Afirma que não há se confundir coparticipação do segurado por utilização dos serviços com obrigação de pagamento de despesas hospitalares na forma pretendida pelo apelado.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A sentença analisou os pedidos veiculados no Processo nº 5002261-10.2011.404.7115 e no Processo nº 5001455-20.2011.404.7100 nos seguintes termos:
I - Relatório
Processo nº 5002261-10.2011.404.7115
ANDERSON MARCELO DE BARROS DA ROSA (representado pela genitora Maria Clarice da Rosa) ajuizou ação ordinária com pedido de tutela antecipada em face do HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE e INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - IPERGS, postulando a declaração de inexistência de dívida com o Hospital de Clínicas, bem como a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais.
Relatou que por ser portador de retardo mental moderado necessita de tratamentos médicos constantes e permanentes. Disse que em 12/03/2010 foi internado e submetido a cirurgias, sendo a primeira em 10/05/2010, com autorização do IPERGS, entidade conveniada ao Hospital e administradora do plano de saúde do qual é segurado. Esclareceu que após a realização dos procedimentos médico-hospitalares, o Hospital está cobrando a diferença, no valor de R$5.714,13, em nome de sua mãe, Maria Clarice da Rosa. Argumentou não ter autorizado, tampouco sua mãe, qualquer despesa de materiais a serem pagos de forma particular. Postulou a declaração de inexistência de dívida, bem como a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais. Atribuiu à causa o valor de R$16.350,00. Acostou documentos (evento 14 OUT2/9).
Inicialmente, os autos foram distribuídos, em 05/05/11, sob o nº 094/1.11.0000422-9, na Vara Judicial da Comarca de Crissiumal (evento 1), cujo juízo concedeu o benefício da AJG e deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para determinar o cancelamento do protesto levado a efeito pelo Hospital de Clínicas (evento 14 - OUT9, p. 14/15).
Citado, o Hospital de Clínicas apresentou contestação (evento 14 CONT10). Arguiu preliminares de incompetência absoluta do Juízo e litispendência. Argumentou que o IPERGS cobriu a quase totalidade dos procedimentos a que se submeteu o demandante, todavia, para os casos de internação psiquiátrica, a cobertura torna-se parcial a partir do 29º dia de internação, o que gerou a dívida que foi levada a protesto. Asseverou que a parte-autora estava plenamente ciente de que a cobertura integral do plano somente iria até o 28º dia de internação. Informou que, conforme cláusula 10 do contrato de hospitalização, os contratantes ficam responsáveis pelo pagamento das despesas não cobertas pelo convênio médico, no caso o IPERGS. Aduziu que o protesto foi regular, constituindo exercício regular do seu direito de cobrança. Ao final, postulou o acolhimento das preliminares ou o julgamento de improcedência da demanda.
O Juízo de Crissiumal acolheu a preliminar suscitada e declinou da competência para processar e julgar à Justiça Federal (evento 14, OUT14, p 17/20).
O processo foi, então, distribuído na 1ª Vara Federal de Santa Rosa, cujo juízo, reconhecendo a conexão desta demanda com a ação monitória nº 5001455-20.2011.404.7100, declinou da competência (evento 19).
Distribuído o feito neste Juízo, foram ratificados os atos processuais praticados (evento 28).
Determinada a intimação das partes para produção de provas e posterior vista ao MPF (evento 40).
Os autos foram baixados em diligência para determinar à parte-autora a emenda à inicial, dirigindo a ação também contra o IPERGS (evento 52).
Citado, o IPERGS apresentou contestação (evento 60). Primeiramente, destacou que não incide na hipótese o CDC por não se tratar de relação de consumo. Disse que não nega a internação, tampouco a cobertura, mas que exige, nos termos da Resolução nº 302, de 21/10/1998, a coparticipação da família a partir do 30º dia. Sustentou que os entes públicos podem estabelecer planos de saúde específicos aos servidores com limitação de cobertura. Asseverou que para a continuidade dos planos é imprescindível que haja correspondência entre a fonte de custeio e a amplitude de benefícios. Pontuou que a parte-autora conhecia essas limitações, pois assinou documentos apresentados pelo HCPA, contendo tais ressalvas. Defendeu a inexistência de danos morais indenizáveis. Ao final, postulou o julgamento de improcedência dos pedidos.
Apresentada réplica no evento 63.
O MPF exarou parecer no evento 66.
Vieram os autos conclusos para sentença.
Processo nº 5001455-20.2011.404.7100
O HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE ajuizou ação monitória contra MARIA CLARICE DA ROSA, atribuindo-lhe a dívida de R$7.802,96, atualizada até janeiro de 2011. Acostou documentos.
Deferida ao HCPA a Gratuidade da Justiça (evento 03).
Citada, a parte-ré apresentou embargos (evento 06). Preliminarmente, arguiu litispendência e a necessidade de denunciação da lide ao IPERGS. Relatou que seu filho efetivamente esteve internado e valeu-se dos serviços médicos prestados pelo HCPA, porém, sob a cobertura do plano de saúde de que é segurado, qual seja, IPE-PAMES, que é o real responsável pelo total cobrado pelo Hospital. Argumentou que jamais lhe foi informada a necessidade de pagamentos complementares. Sustentou a aplicabilidade do CDC ao caso em tela e pleiteou o benefício da AJG.
Apresentada impugnação aos embargos (evento 11).
Vieram os autos conclusos para sentença.
II - Fundamentação
Preliminares
Litispendência
Deve ser afastada a preliminar de litispendência, tendo em vista que as ações têm objetos diferentes, inclusive porque as partes pretendem efeitos opostos (cobrança de valores na ação monitória e inexistência da dívida na ação ordinária).
Denunciação da lide
Entendo não ser possível a denunciação à lide do IPERGS, como pretendido pela parte-embargante.
Com efeito, a discussão veiculada em monitória refere-se unicamente à eventual inexigibilidade de cobrança de débito existente junto ao HCPA, em razão da internação do paciente Anderson Marcelo de Barros da Rosa. Assim, a discordância quanto à extensão da cobertura do plano de saúde da parte-embargante ou quanto à legalidade do contrato firmado entre ela e o IPERGS escapam ao objeto da monitória, pois não se confunde com a relação estabelecida entre a embargante e o HCPA, discutida nesta ação.
Mérito
Inicialmente, esclareço que há duas relações distintas: entre a parte-autora e o Hospital, que configura relação de consumo, sujeitando-se à incidência do CDC, e entre a parte-autora e o IPERGS (participante e seu plano de saúde), sobre a qual não incide o CDC, por ser relação de direito público, regrada por lei específica, qual seja, Lei nº 12.134/04.
Ultrapassada a questão acerca da aplicabilidade do CDC, passo à análise da ação ordinária, cuja decisão refletirá diretamente na ação monitória.
Pretende a parte-autora a declaração de inexistência de dívida com o Hospital de Clínicas, bem como a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais.
Entendo que não assiste razão à parte-autora.
Com efeito, o contrato firmado entre a parte-autora e o HCPA continha cláusula expressa acerca da responsabilização do paciente (ou quem por ele se responsabilize) pelo pagamento de despesas não cobertas pelo convênio, de maneira que a parte-demandante estava ciente de sua obrigação, conforme cláusula 10 da avença (evento 14, OUT 11, p.1):
'O Paciente internado através de convênio e seu responsável, cientes da cobertura de seu plano de saúde, responsabilizam-se em ressarcir diretamente ao HCPA quaisquer despesas não pagas pela Entidade Conveniada'.
Ademais, no documento denominado 'Pacientes Conveniados IPE - Orientações Gerais' (evento 14, OUT11 p. 3), assinado pela parte-autora em 12/03/2010, consta expressamente que a cobertura integral, em caso de psiquiatria, limita-se a 28 dias, cabendo ao beneficiário, após o 29º dia, o pagamento de 50% das despesas hospitalares.
Assim, a parte-demandante concordou com as condições que lhe foram apresentadas e usufruiu dos serviços prestados pela instituição hospitalar, não podendo, agora, furtar-se do pagamento das despesas daí resultantes.
Saliente-se, ainda, que não houve qualquer impugnação quanto aos valores exigidos pelo HCPA.
Por fim, quanto à alegação de que o responsável pelo pagamento dos valores decorrentes da internação de Anderson Marcelo de Barros da Rosa seria o IPERGS, transcrevo, por oportuno, as razões apresentadas pelo MPF no parecer exarado no evento 66, adotando-as como razões de decidir:
Tendo em vista que o custeio de serviços de saúde pelo IPE é, obviamente, regulado pela legislação estadual, indispensável trazer novamente à colação o posicionamento exarado, em casos análogos, pelo egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vejamos, in litteris:
'APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. IPESAÚDE. INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA. COBERTURA. SÚMULA 302 DO STJ. CO-PARTICIPAÇÃO. POSSIBILIDADE.
Aplica-se ao Plano de Saúde do IPERGS a s. nº 302 do STJ, não se permitindo a limitação temporal da cobertura, mas é admitida a cobrança da co-participação, na forma regulamentar, após trinta dias de internação, tratando-se de plano facultativo.' (TJRS, Apel 70028124857, Rel. Des. Rejane Maria Dias de Castro Bins, Data do Julgamento 07/01/2009)
Da leitura do bem lançado voto da ilustre relatora do julgado acima colhem-se aspectos atinentes acerca da legalidade da figura da 'coparticipação' para internações como as do segurado, em virtude de problemas psiquiátricos. Seguem trechos abaixo:
'Enquanto a previdência é de caráter contributivo (art. 201 da CF) e filiação obrigatória, compreendendo a aposentadoria, entre outros benefícios, devendo ser observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e a assistência social não tem caráter contributivo, utilizando o orçamento da seguridade (art. 195 da CF) e outras fontes (art. 204), nada foi estabelecido relativamente à saúde, quanto à obrigatoriedade.
A competência para a instituição de contribuições sociais é da União, de forma exclusiva, pelo art. 149, § 1º, na redação da Emenda Constitucional nº 33, de 11.12.2001, mas os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social (§ 1º). A Constituição Estadual previra, no art. 41, a possibilidade de o Estado do Rio Grande do Sul manter órgão de previdência e assistência à saúde mediante contribuição, na forma da lei: 'O Estado manterá órgão ou entidade de previdência e assistência à saúde para seus servidores e dependentes, mediante contribuição, na forma da lei previdenciária própria'.
Aqui há que seguir a legislação administrativa.
A Lei Complementar Estadual nº 12.066/04 dispôs:
Art. 1° - Fica criado, junto ao IPERGS, o Fundo de Assistência à Saúde - FAS/RS, único e específico, destinado exclusivamente ao custeio do Sistema de Assistência à Saúde a ser disciplinado em lei.
Art. 2° - As receitas do FAS/RS serão constituídas pelos seguintes recursos:
I - contribuição mensal dos membros e servidores dos Poderes e órgãos do Estado, da Administração Direta, das Autarquias, das Fundações de direito público, e os militares estaduais, ativos, inativos e pensionistas, bem como os ocupantes de cargos em comissão e os temporários, correspondente a 3,1% (três inteiros vírgula um por cento) do salário de contribuição;
II - contribuição mensal paritária dos Poderes e dos órgãos do Estado, da Administração Direta, das Autarquias e das Fundações de direito público, correspondente a 3,1% (três inteiros vírgula um por cento);
III - contribuição mensal do optante, do licenciado e do serventuário da justiça, correspondente a 7,2 % ( sete inteiros vírgula dois por cento) do seu salário de contribuição;
IV - contribuições oriundas dos contratos de prestação de serviços a outras instituições, autorizados em lei;
V - contribuições referentes aos planos suplementares e complementares;
VI - co-participação do segurado por utilização dos serviços;
VII - rendas resultantes de aplicações financeiras;
VIII - doações, legados, subvenções e outras rendas eventuais;
IX - reversão de qualquer importância;
X- juros, multas e correção monetária de pagamento de quantias devidas ao Sistema;
XI - taxas, contribuições, percentagens e outras importâncias devidas em decorrência de prestação de serviços. [destacado aqui].
O fato concreto é que esse serviço de saúde é oferecido pelo ente público, a latere do SUS, que é gratuito. Tal direito constitui um plus em relação ao universalmente ofertado e não é possível pretendê-lo sem custo. Justamente porque não está estabelecida constitucionalmente a obrigatoriedade de adesão a tal sistema.
A legislação estadual que dispõe sobre o IPÊ-SAÚDE, junto ao qual o agravado é credenciado, Lei Complementar nº 12.134/04, determinou que os atendimentos médicos, hospitalares, os atos necessários ao diagnóstico e ao tratamento, bem como ações de prevenção da doença e à promoção da saúde integram o referido plano, reestruturado por essa lei, a qual acabou por revogar alguns dispositivos da Lei nº 7.672, que dispõe sobre o Instituto de Previdência deste Estado. Entretanto, no art. 1º, § 2º, daquela lei complementar, restou assentado que a normatização do Sistema IPESAÚDE viria a dar-se por meio da edição de leis, decretos e resoluções do Órgão Gestor, como é o caso da Resolução nº 302/1998, sobre a assistência psiquiátrica, litteris:
A Assistência Psiquiátrica é Serviço do Plano de Assistência Médica do IPERGS e compreenderá dois níveis de atendimento: ambulatorial e hospitalar.
§ 1º - assistência psiquiátrica ambulatorial se dará através de consultas com médicos psiquiatras credenciados, ou cadastrados em serviços conveniados, os quais terão autorizados até o máximo de 04 consultas/mês/beneficiário.
§ 2º - a assistência psiquiátrica hospitalar se realizará somente através de entidades credenciadas para tal, e apenas em regime de internação fechada.
A internação psiquiátrica em questão é destinada apenas ao manejo da doença mental em fase aguda, não passível de atendimento ambulatorial, como dispõe o art. 5º da Resolução, cujo prazo de duração, na forma do art. 8º, deve ser estabelecido pelo médico assistente, com cobertura integral por trinta dias e de 50% após, mediante a co-participação do paciente. É admitida a prorrogação mediante laudo denominado súmula prorrogação de tratamento hospitalar, 'a qual não terá a função de alterar o limite de cobertura expresso no caput.'
Por isso, não pode ser mantida a condenação ao ressarcimento dos quatrocentos reais pagos ao Hospital Espírita, nem cabe a condenação postulada no item b da fl. 17, 'ao pagamento de todas as despesas do tratamento psiquiátrico do autor Diego de Souza Gomes Schaussardt realizado no Hospital Espírita de Porto Alegre, incluindo despesas com assistência médica, hospitalar e com medicamentos, pelo período necessário à recuperação da saúde do autor', ou seja, direito à internação além dos trinta dias sem a contrapartida, quando o caso se enquadrar na disciplina regulamentar em pauta...'
Como visto, considerando-se o teor da legislação citada e a clareza da documentação acostada pelo IPE no evento 60, onde ressai clara a referência à 'cobertura parcial' da internação, não há falar em incidência da regra do art. 423 do Código Civil, uma vez que não cogita da existência de cláusulas ambíguas ou contraditórias na avença entre IPE e segurado a justificar interpretação mais benéfica ao usuário do serviço.
Não merece acolhida, portanto, a pretensão aqui articulada.
Assim, merece julgamento de improcedência o pedido de declaração de inexistência de dívida perante o Hospital de Clínicas, restando prejudicado o exame do pedido de condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais.
Finalmente, considerando que são devidos os valores cobrados pelo Hospital de Clínicas, merece julgamento de procedência a ação monitória nº 5001455-20.2011.404.7100.
III - Dispositivo
Ante o exposto:
a) Revogo a decisão que antecipou os efeitos da tutela e julgo improcedente a ação ordinária nº 5002261-10.2011.404.7115, extinguindo o feito com exame do mérito, com fundamento no art. 269, I, do CPC.
Condeno a parte-autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor atribuído à causa (art. 20, parágrafos 3º e 4º do CPC), atualizados pelo IPCA-e, considerando o valor atribuído à causa, a relativa simplicidade da matéria e a ausência de produção das provas pericial e testemunhal. Suspensa a exigibilidade em razão da Gratuidade Judiciária deferida.
b) Julgo procedente a ação monitória nº 5001455-20.2011.404.7100, ajuizada pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre em face de Maria Clarice da Rosa, rejeitando os embargos opostos e extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I do Código de Processo Civil.
Com fundamento no § 3º do art. 1.102-C do CPC, constituo de pleno direito o título executivo judicial no valor de R$ 7.802,96 (sete mil, oitocentos e dois reais e noventa e seis centavos), em janeiro de 2011.
Condeno a parte-embargante ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor do débito (art. 20, § 3º do CPC), atualizados pelo IPCA-e. Suspensa a exigibilidade em razão da Gratuidade Judiciária, que defiro nesta oportunidade.
Em homenagem aos princípios da instrumentalidade e economia processual, desde logo registro que eventuais apelações interpostas pelas partes serão recebidas no duplo efeito (art. 520, caput, do CPC), salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, que serão oportunamente certificadas pela Secretaria.
Interposto(s) o(s) recurso(s), caberá à Secretaria, mediante ato ordinatório, abrir vista à parte contrária para contrarrazões, e, na sequência, remeter os autos ao TRF da 4ª Região.
Transcorrido sem aproveitamento, certifique-se o trânsito em julgado.
Publicação e registro pelo sistema eletrônico. Intimem-se.
Porto Alegre, 10 de abril de 2015.
Em que pesem as razões da parte apelante, impõe-se o reconhecimento de que são irretocáveis as razões que alicerçaram a sentença monocrática, a qual mantenho por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Com efeito, o magistrado singular está próximo das partes, analisou detidamente os elementos probantes e a controvérsia inserta nos autos, tendo, de forma correta e motivada, concluído pela improcedência do pedido de declaração de inexistência de dívida com o Hospital de Clínicas, bem como de condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais.
Consoante apontado na r. sentença, a relação que está sob exame nesta ação e na ação monitória nº 5001455-20.2011.404.7100 é travada entre a parte autora e o Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Trata-se, sem dúvida, de uma relação de consumo, onde a parte autora figura como consumidora e o Hospital como fornecedor de serviço, estando, por isso, ao abrigo da proteção legal prevista no Código de Defesa do Consumidor.
O contrato firmado entre a parte-autora e o HCPA continha cláusula expressa acerca da responsabilização do paciente (ou quem por ele se responsabilize) pelo pagamento de despesas não cobertas pelo convênio, de maneira que a parte-demandante estava ciente de sua obrigação, conforme cláusula 10 da avença (evento 14, OUT 11, p.1):
“10. O paciente internado através de Convênio e seu responsável, cientes da cobertura de seu Plano de Saúde, responsabilizam-se em ressarcir diretamente ao HCPA quaisquer despesas não pagas pela Entidade Conveniada.”
Aponta o ilustre magistrado a quo, ainda, que "no documento denominado 'Pacientes Conveniados IPE - Orientações Gerais' (evento 14, OUT11 p. 3), assinado pela parte-autora em 12/03/2010, consta expressamente que a cobertura integral, em caso de psiquiatria, limita-se a 28 dias, cabendo ao beneficiário, após o 29º dia, o pagamento de 50% das despesas hospitalares".
Quanto à mencionada Resolução Normativa nº 338/2013 da ANS, dispõe seu artigo 21:
“Art. 21. O Plano Hospitalar compreende os atendimentos realizados em todas as modalidades de internação hospitalar e os atendimentos caracterizados como de urgência e emergência, conforme Resolução específica vigente, não incluindo atendimentos ambulatoriais para fins de diagnóstico, terapia ou recuperação, ressalvado o disposto no inciso X deste artigo, observadas as seguintes exigências:
I - cobertura, em número ilimitado de dias, de todas as modalidades de internação hospitalar;
II quando houver previsão de mecanismos financeiros de regulação disposto em contrato para internação hospitalar, o referido aplica-se a todas as especialidades médicas, contudo a coparticipação nas hipóteses de internações psiquiátricas somente poderá ser exigida considerando os seguintes termos, que deverão ser previstos em contrato:
a) somente haverá fator moderador quando ultrapassados 30 dias de internação contínuos ou não, nos 12 meses de vigência; e
b) a coparticipação poderá ser crescente ou não, estando limitada ao máximo de 50% do valor contratado.
(...)”
A interpretação feita pela parte autora de que a expressão "valor contratado" deve ser entendida como o valor da própria mensalidade paga pelo consumidor não possui embasamento legal, englobando aquele as despesas hospitalares referenciadas no contrato.
Com efeito, tendo a parte autora concordado com as condições que lhe foram apresentadas e utilizado os serviços prestados pela instituição hospitalar, não pode agora furtar-se ao pagamento das despesas resultantes.
Nesse sentido, nenhum reparo merece a sentença apelada.
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5001455-20.2011.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: MARIA CLARICE DA ROSA (RÉU)
APELADO: HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE (AUTOR)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. CIVIL. ação monitória. INTERNAÇÃO HOSPITALAR. RELAÇÃO DE CONSUMO. COPARTICIPAÇÃO DO SEGURADO.
A relação entre a parte autora e o hospital réu configura-se como uma relação de consumo, onde a parte autora figura como consumidora e o hospital como fornecedor de serviço, estando, por isso, ao abrigo da proteção legal prevista no código de defesa do consumidor.
O contrato firmado entre a parte-autora e o HCPA continha cláusula expressa acerca da responsabilização do paciente (ou quem por ele se responsabilize) pelo pagamento de despesas não cobertas pelo convênio, de maneira que a parte-demandante estava ciente de sua obrigação, conforme cláusula 10 da avença.
Tendo a parte autora concordado com as condições que lhe foram apresentadas e utilizado os serviços prestados pela instituição hospitalar, não pode agora furtar-se ao pagamento das despesas resultantes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de dezembro de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/12/2018
Apelação Cível Nº 5001455-20.2011.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES
APELANTE: MARIA CLARICE DA ROSA (RÉU)
ADVOGADO: JAIME DARLAN MARTINS
APELADO: HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE (AUTOR)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/12/2018, na sequência 415, disponibilizada no DE de 19/11/2018.
Certifico que a 4ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
LUIZ FELIPE OLIVEIRA DOS SANTOS
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:44:46.