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ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO COM FUNDAMENTO NA APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EC 103/2019. APOSENTADORIA CONCEDIDA ...

Data da publicação: 04/09/2024, 11:00:56

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO COM FUNDAMENTO NA APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EC 103/2019. APOSENTADORIA CONCEDIDA APÓS VIGÊNCIA EC. TEMA 606, STF. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. O benefício de aposentadoria concedido após a promulgação da EC 103/2019, ainda que mantivesse o direito à concessão da aposentadoria segundo as regras anteriores, passou a submeter-se ao novo regramento quanto às demais disposições - tais como a previsão de rompimento do vínculo de trabalho, consoante previsto no art. 37, § 14, da Constituição Federal, acrescido pela referida Emenda. 2. Apelação desprovida. (TRF4, AC 5060847-65.2023.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 27/08/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5060847-65.2023.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

APELANTE: SIMONE DA SILVA PINTO (AUTOR)

APELADO: HOSPITAL NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO S/A (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação em face de sentença proferida em ação do procedimento comum, na qual se discutiu sobre rescisão de contrato de trabalho com fundamento na aposentadoria espontânea, na vigência da Emenda Constitucional 103/2019.

A sentença julgou improcedente a ação, nos seguintes termos (evento 33, DOC1):

(....)

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art 487, I, do CPC.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atribuído à causa, nos termos do art. 85, do CPC. A condenação resta suspensa em razão de a parte autora ser benficiária da assistência judiciária gratuita.

Intimem-se.

Registre-se. Publique-se.

Havendo recurso tempestivo, intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões, no prazo legal. Juntados os recursos e as respectivas respostas, apresentadas no prazo legal, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Transitada em julgado esta sentença, e nada sendo requerido, dê-se baixa nos autos.

Apela a parte autora (evento 37, DOC1), alegando que:

(a) Aposentou-se por tempo de contribuição em 29/09/2021, mas obteve o direito anteriormente;

(b) Considerando que há de se observar o princípio da irretroatividade da norma nova, e por exigência de isonomia de tratamento entre trabalhadores segurados em situações indistintas, o dispositivo constitucional deve ser interpretado de modo a acolher também aqueles que já tinham direito a obter a aposentadoria antes da entrada em vigor da EC 103/19;

(c) Não se trata de aposentadoria por regime especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91), portanto, inexiste qualquer impeditivo para a obreira seguir laborando no réu (art. 57, § 6º da Lei 8.213/91). Também não se trata de demissão compulsória pela idade, haja vista a idade da reclamante (56 anos). A demandante não fez comum acordo ou qualquer tipo de aceite em face a sua demissão. Frisa-se que o contrato de trabalho se iniciou antes da entrada em vigor da lei 13.764/17 e EC 109/19;

(d) Nesse contexto, considerando que há de se observar o princípio da irretroatividade da norma nova (art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), e por exigência de isonomia de tratamento entre trabalhadores segurados, o dispositivo constitucional antes citado deve ser interpretado de modo a acolher também aqueles que já tinham direito a obter a aposentadoria antes da entrada em vigor da EC 103/19.

Pede, assim, o provimento da apelação para reformar a sentença.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 43, DOC1).

O processo foi incluído em pauta.

É o relatório.

VOTO

Examinando os autos e as alegações das partes, fico convencido do acerto da sentença proferida pela juíza federal Daniela Tocchetto Cavalheiro, que transcrevo e adoto como razão de decidir, a saber:

(...)

II - FUNDAMENTAÇÃO

A questão objeto da lide diz respeito ao direito da parte autora relativamente à aposentadoria e à manutenção do contrato de trabalho com a parte ré em face do novo regramento constituicional instituído pela Emenca Constitucional nº 103/2019.

1. Aposentaodoria

O direito à Previdência Social, embora não previsto expressamente na Declaração dos Direitos Humanos, é por ela tutelado como direito fundamental da pessoa humana.

Brandão1 leciona a respeito do direito à Previdência Social como um direito humano fundamental:

As principais normativas internacionais que orientam o sistema das Nações Unidas, sistema ONU (Organização das Nações Unidas) ou sistema global de proteção dos direitos humanos estão reunidas na chamada “Carta Internacional de Direitos Humanos” (RAMOS, 2020), composta pela Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948,2 pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP) de 1966 e pelo Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) de 1966. Há, ainda, outros diplomas internacionais que contemplam de forma mais pormenorizada a defesa e a proteção a direitos naquelas normas referidos.

No que concerne à DUDH, proclamada pela Resolução nº 217 da 3ª Assembleia Geral da ONU, de 10 de dezembro de 1948, é inegável que seja dotada de efeitos jurídicos, não obstante haja algumas discussões acerca de seu caráter vinculante. Nesse ponto, tal instrumento inspirou a elaboração de diversas constituições, como a brasileira (MAZZUOLI, 2018). Ademais, a própria adoção dos tratados PIDESC e PIDCP representa também um claro esforço de conferir-lhe força vinculante, como instrumento hard law.

(...)

Referência expressa ao direito à previdência social não há. Todavia, ele é extraído do comando de assegurar-se proteção na doença, na invalidez, na viuvez e na velhice, que nada mais são do que os riscos sociais tutelados pela previdência.

Em evolução na tratativa dos DESCA, demonstrando o maior relevo que eles adquiriram, o Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais vem em complemento à DUDH e para especificar melhor a matéria. Inicialmente, já reconhece que a efetivação dos DESCA é marcada pela progressividade, por meio da qual os Estados aplicam o máximo de recursos disponíveis, não obstante seja essa concretização de direitos também obrigatória e com vedação de retrocesso social (RAMOS, 2020).

Outrossim, ao discriminar os DESCA, o PIDESC disciplina em seu artigo 9º que “os Estados- partes do presente pacto reconhecem o direito de toda pessoa à previdência social, inclusive ao seguro social”. Percebe-se, ainda, por meio das disposições dos artigos 7º e 12 do mesmo tratado, que o direito à previdência está intrinsecamente ligado ao direito ao trabalho e à saúde. Isso na medida em que os Estados-partes devem zelar pela salubridade e pela segurança no ambiente de trabalho, bem como pela prevenção e pelo tratamento de doenças, em especial as de cunho profissional. Ora, a fragilização ou perda da saúde institui a necessidade de afastamento do trabalho e, por conseguinte, implica necessidade de amparo previdenciário.

Evidencia-se que se no plano do direito internacional está estabelecida a proteção do trabalhador através da Previdência Social, o legislador constituinte, assim como o legislador infraconstitucional, não destoaram de tal abordagem.

A previdência social e a aposentadoria do trabalhador têm previsão na Constituição da República Federativa do Brasil, no capítulo dos direitos sociais, consoante segue:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)

Parágrafo único. Todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária (Incluído pela Emenda Constitucional nº 114, de 2021)

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

XXIV - aposentadoria;

Sobre a Administração Pública, o texto constitucional estabelece:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

§ 14. A aposentadoria concedida com a utilização de tempo de contribuição decorrente de cargo, emprego ou função pública, inclusive do Regime Geral de Previdência Social, acarretará o rompimento do vínculo que gerou o referido tempo de contribuição. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

No capítulo atinente à Previdência Social, a Constituição da República Federativa do Brasil prevê:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional103, de 2019)

(...)

§ 1º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios, ressalvada, nos termos de lei complementar, a possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria exclusivamente em favor dos segurados: (Redação dada pela Emenda Constitucional103, de 2019)

I - com deficiência, previamente submetidos a avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar; (Incluído pela Emenda Constitucional103, de 2019)

II - cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação. (Incluído pela Emenda Constitucional103, de 2019)

(...)

§ 14. É vedada a contagem de tempo de contribuição fictício para efeito de concessão dos benefícios previdenciários e de contagem recíproca. (Incluído pela Emenda Constitucional103, de 2019)

§ 16. Os empregados dos consórcios públicos, das empresas públicas, das sociedades de economia mista e das suas subsidiárias serão aposentados compulsoriamente, observado o cumprimento do tempo mínimo de contribuição, ao atingir a idade máxima de que trata o inciso II do § 1º do art. 40, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

Ainda, em se tratando de empresa pública, cujos funcionários estão regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho e Regime Geral de Previdência Social, necessário o exame das disposições constantes nessa legislação de regência.

Em âmbito infraconstitucional, a Lei nº 8.213/91 estabelece o regramento para a aposentadoria dos trabalhadores vinculados ao Regime Geral de Previdência Social.

Dispõe a Lei nº 8.213/91:

Art. 9º A Previdência Social compreende:

I - o Regime Geral de Previdência Social;

II - o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social.

§ 1o O Regime Geral de Previdência Social - RGPS garante a cobertura de todas as situações expressas no art. 1o desta Lei, exceto as de desemprego involuntário, objeto de lei específica, e de aposentadoria por tempo de contribuição para o trabalhador de que trata o § 2o do art. 21 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991. (Redação dada pela Lei Complementar nº 123, de 2006)

§ 2º O Regime Facultativo Complementar de Previdência Social será objeto de lei especifica.

Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:

I - quanto ao segurado:

a) aposentadoria por invalidez;

b) aposentadoria por idade;

c) aposentadoria por tempo de contribuição; (Redação dada pela Lei Complementar nº 123, de 2006)

d) aposentadoria especial;

e) auxílio-doença;

f) salário-família;

g) salário-maternidade;

h) auxílio-acidente;

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)

O Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão sob debate no julgamento do RE 655.283 submetido ao regime de repercussão geral, Tema 606, fixando a seguinte tese:

A natureza do ato de demissão de empregado público é constitucional-administrativa e não trabalhista, o que atrai a competência da Justiça comum para julgar a questão. A concessão de aposentadoria aos empregados públicos inviabiliza a permanência no emprego, nos termos do art. 37, § 14, da CRFB, salvo para as aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional103/19, nos termos do que dispõe seu art. 6º.

Estabelecidas essas premissas, passo a enfrentar as questões objeto da lide.

A parte autora afirma que é nula a dispensa por ela sofrida em razão da aposentadoria concedida em 18/12/2019, uma vez que possui direito adquirido ao benefício em data anterior à promulgação da Emenda Constitucionalnº 103/2019 e que não utilizou tempo de serviço posterior à alteração constitucional para a obtenção do benefício previdenciário.

A decisão que examinou o pedido de tutela de urgência analisou a questão, consoante segue (evento 23, DESPADEC1):

Tutela de urgência.

Para o deferimento da tutela de urgência, exige-se a presença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 300).

O fundamento para a autora ser desligada é o disposto no artigo 37, §14, da Constituição, norma que foi incluída pela EC 103/2019 e que dispõe o seguinte:

§ 14. A aposentadoria concedida com a utilização de tempo de contribuição decorrente de cargo, emprego ou função pública, inclusive do Regime Geral de Previdência Social, acarretará o rompimento do vínculo que gerou o referido tempo de contribuição. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019).

De acordo com o que restou decidido pelo STF no julgamento do Tema 606, antes transcrito, "a concessão de aposentadoria aos empregados públicos inviabiliza a permanência no emprego, nos termos do art. 37, § 14, da CRFB, salvo para as aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/19, nos termos do que dispõe seu art. 6º".

Esse entendimento baseou-se no disposto no artigo 6º da referida Emenda Constitucional:

Art. 6º O disposto no § 14 do art. 37 da Constituição Federal não se aplica a aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional.

No caso concreto, quando da entrada em vigor da EC 103/19, em 13/11/2019, a parte autora ainda não era aposentada, tendo formulado pedido de aposentadoria por tempo de contribuição apenas em 18/06/2020, o qual foi concedido em 29/09/2021, retroativo à data do requerimento (evento 12, DOC4).

Ainda que a parte autora alegue que "irrelevante o fato da comunicação da concessão da aposentadoria ter ocorrido em data posterior à entrada em vigor da EC nº 103/2019, na medida em que a autora preencheu os requisitos para obtenção do benefício em data anterior e emenda" (INIC1, p. 09), tal fato não a enquadra na exceção supracitada, para fins de não rompimento do vínculo empregatício junto ao réu.

Fosse a intenção do legislador excepcionar da regra do art. 37, §14, da CF também aqueles que, embora não tivessem requerido, já tivessem adquirido o direito a se aposentar pelas regras anteriores, teria se manifestado neste sentido de forma expressa, mas, ao contrário, optou por ressalvar apenas os casos em que a aposentadoria já tivesse sido concedida pelo RGPS até a data da entrada em vigor da EC 103/19.

Ademais, não se confunde o direito adquirido à concessão de aposentadoria àqueles que atendiam aos requisitos para obtenção do benefício na data da entrada em vigor da EC 103/19, pelos critérios vigentes à época da implementação dos requisitos, com o pretenso direito adquirido ao regime jurídico anterior no que tange às demais regras.

Logo, a implementação da aposentadoria com termo inicial após a vigência da referida emenda constitucional, por si só, afasta a regra de transição e faz incidir o novo regime jurídico quanto às demais disposições, tais como a previsão de rompimento do vínculo de trabalho, consoante previsto no art. 37, § 14, da CF.

Sobre o tema, observe o entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. DIREITO ADQUIRIDO À APOSENTADORIA. PRESERVAÇÃO. REGIME JURÍDICO ANTERIOR. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. PREVISÃO DO ART. 37, § 4º. ROMPIMENTO DO VÍNCULO DE TRABALHO QUE GEROU QUE GEROU O TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA A APOSENTADORIA. INCIDÊNCIA. 1. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos suficientes que atestem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do disposto no art. 300 do CPC. 2. A preservação do direito já adquirido, à aposentadoria, antes da Emenda Constitucional nº 103/2019, não garante o direito ao regime jurídico anterior, no que diz respeito às demais regras. Isso porque, como já firmado pela jurisprudência pátria, não há direito adquirido a determinado regime jurídico. 3. Na hipótese, não há dúvida que a impetrante possuía direito adquirido à aposentadoria segundo os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão - anteriores à EC nº 103/2019 - já que inclusive tinha postulado, obtido a concessão do benefício e dele desistido. No entanto, ao postular novo benefício após a promulgação da EC nº 103/2019, ainda que mantivesse o direito à concessão da aposentadoria segundo as regras anteriores, em princípio passou a submeter-se ao novo regramento quanto às demais disposições - tais como a previsão de rompimento do vínculo de trabalho, consoante previsto no art. 37, § 14 da Constituição Federal, acrescido pela referida Emenda. 4. Não restando demonstrada de plano a probabilidade do direito invocado, recomendável que seja mantida a decisão agravada. (TRF4, AG 5038359-47.2021.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 08/12/2021) [grifou-se]

ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TEMA 606/STF. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. VÍNCULO DE EMPREGO PÚBLICO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Restou decidido no julgamento do Tema 606/STF, a aposentadoria espontânea gera o cessar do vínculo de emprego público, inclusive quando feita sob o Regime Geral de Previdência Social, excetuando-se apenas as aposentadorias concedidas pelo RGPS até a data da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/19. 2. O entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal apenas afasta a incidência da regra prevista no artigo 37, § 14°, da Constituição Federal, diante das aposentadorias concedidas pelo RGPS antes da entrada em vigor da reforma da previdência. A hipótese trazida aos autos não está acobertada pela tese fixada. 3. Agravo de instrumento desprovido. (TRF4, AG 5008140-17.2022.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 25/05/2022) [grifou-se]

Assim, verificado que o requerimento de concessão de aposentadoria somente ocorreu em 18/06/2020, após a entrada em vigor da EC 103/19, e que o benefício foi concedido com a utilização de tempo de contribuição do emprego público mantido junto ao HNSC, afigura-se correta a dispensa da autora.


1. Ante o exposto, indefiro o pedido de tutela provisória de urgência.

Nessa toada e diante da prova dos autos, não vislumbro qualquer conduta ilegal da parte ré na extinção do contrato de trabalho, a qual decorreu da concessão da aposentadoria à parte autora.

Restou claro que a parte ré agiu em cumprimento à nova ordem constitucional estabelecida, especialmente porque a aposentadoria NB 201.807.989-6 foi concedida posteriormente à promulgação da Emenda Constitucional nº 103/2019, com o pagamento iniciado em 18/06/2020, como demonstra o documento do evento 12, OUT4.

Em que pese não terem sido considerados períodos de contribuição posteriores à promulgação da Emenda Constitucional nº 103/2019, a data de implantação do benefício é posterior à EC 103/2019 e, por isso, ainda incidente o novel regramento.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, ao examinar a questão no julgamento do RE 655283, Tema 606, julgado em 16/06/2021, publicado em 02/12/2021, fixou a seguinte tese:

A natureza do ato de demissão de empregado público é constitucional-administrativa e não trabalhista, o que atrai a competência da Justiça comum para julgar a questão. A concessão de aposentadoria aos empregados públicos inviabiliza a permanência no emprego, nos termos do art. 37, § 14, da CRFB, salvo para as aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional103/19, nos termos do que dispõe seu art. 6º.

Nesse contexto, não há mácula na rescisão do contrato de trabalho a que procedeu a parte ré, não havendo nulidade. Quanto ao pedido de reintegração ao trabalho, por consequência, também é improcedente, uma vez que adequado o procedimento adotado pela parte ré em cumprimento às normas constitucionais vigentes.

(...)

O que foi trazido nas razões de recurso não me parece suficiente para alterar o que foi decidido, mantendo o resultado do processo e não vendo motivo para reforma da sentença, pois:

(a) O artigo 37, § 14º, da CF, incluído pela EC 103/2019, é claro ao estabelecer a cessação do vínculo de cargo, emprego ou função pública, pela aposentadoria concedida com a utilização de tempo de contribuição. Ainda, o artigo 6º da Emenda esclarece que não se aplica a regra às aposentadorias concedidas até aquela data.

(b) Assim, não se trata de direito adquirido para quem tivesse direito à aposentadoria antes da vigência da EC 103/2019, mas o direito adquirido é de quem tivesse a aposentadoria concedida até aquela data.

(c) Ademais, foi decidido no julgamento do Tema 606/STF, que a aposentadoria espontânea gera o cessamento do vínculo de emprego público, inclusive quando feita sob o Regime Geral de Previdência Social, à exceção apenas das aposentadorias concedidas pelo RGPS até a data da entrada em vigor da EC 103/19.

(d) No caso, a autora requereu a aposentadoria em 18/06/2020, tendo sido concedida em 29/09/2021, portanto, após a vigência da EC 103/2019. Assim, se aplica o disposto no artigo artigo 37, § 14º, da CF.

A propósito, precedentes desta Corte:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TEMA 606/STF. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. VÍNCULO DE EMPREGO PÚBLICO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Restou decidido no julgamento do Tema 606/STF, a aposentadoria espontânea gera o cessar do vínculo de emprego público, inclusive quando feita sob o Regime Geral de Previdência Social, excetuando-se apenas as aposentadorias concedidas pelo RGPS até a data da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/19. 2. O entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal apenas afasta a incidência da regra prevista no artigo 37, § 14°, da Constituição Federal, diante das aposentadorias concedidas pelo RGPS antes da entrada em vigor da reforma da previdência. A hipótese trazida aos autos não está acobertada pela tese fixada. 3. Agravo de instrumento desprovido. (TRF4, AG 5008140-17.2022.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 25/05/2022)

ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. DIREITO ADQUIRIDO À APOSENTADORIA. PRESERVAÇÃO. REGIME JURÍDICO ANTERIOR. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. PREVISÃO DO ART. 37, § 4º. ROMPIMENTO DO VÍNCULO DE TRABALHO QUE GEROU O TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA A APOSENTADORIA. INCIDÊNCIA. 1. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos suficientes que atestem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do disposto no art. 300 do CPC. 2. A preservação do direito já adquirido, à aposentadoria, antes da Emenda Constitucional nº 103/2019, não garante o direito ao regime jurídico anterior, no que diz respeito às demais regras. Isso porque, como já firmado pela jurisprudência pátria, não há direito adquirido a determinado regime jurídico. 3. Na hipótese, não há dúvida que a impetrante possuía direito adquirido à aposentadoria segundo os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão - anteriores à EC nº 103/2019 - já que inclusive tinha postulado, obtido a concessão do benefício e dele desistido. No entanto, ao postular novo benefício após a promulgação da EC nº 103/2019, ainda que mantivesse o direito à concessão da aposentadoria segundo as regras anteriores, em princípio passou a submeter-se ao novo regramento quanto às demais disposições - tais como a previsão de rompimento do vínculo de trabalho, consoante previsto no art. 37, § 14 da Constituição Federal, acrescido pela referida Emenda. 4. Não restando demonstrada de plano a probabilidade do direito invocado, recomendável que seja mantida a decisão agravada. (TRF4, AG 5038359-47.2021.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 08/12/2021).

Assim, voto por negar provimento à apelação da parte autora.

Honorários advocatícios relativos à sucumbência recursal

A majoração dos honorários em decorrência da sucumbência recursal, conforme preconizado pelo STJ, depende da presença dos seguintes requisitos: (a) que o recurso seja regulado pelo CPC de 2015; (b) que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido; (c) que a parte recorrente tenha sido condenada em honorários no primeiro grau, de forma a poder a verba honorária ser majorada pelo Tribunal. Atendidos esses requisitos, a majoração dos honorários é cabível, independentemente da apresentação de contrarrazões pela parte recorrida.

No caso dos autos, estão presentes os requisitos exigidos pela jurisprudência, impondo-se a majoração em desfavor do apelante. Com base no art. 85, §11, do CPC de 2015, majoro os honorários advocatícios em 10%, percentual incidente sobre a verba honorária fixada na sentença.

Prequestionamento

Para evitar futuros embargos, dou expressamente por prequestionados todos os dispositivos constitucionais e infraconstitucionais indicados pelas partes no processo. A repetição de todos os dispositivos é desnecessária, para evitar tautologia.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.



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1. Brandão, Karem. O novo requisito etário da aposentadoria especial:análise da inconstitucionalidade e da inconvencionalidade naperspectiva dos direitos humanos. Publicado em https://www.trf4.jus.br/trf4/upload/editor/uli72_12-karembrandao.pdf

5060847-65.2023.4.04.7100
40004584906.V5


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5060847-65.2023.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

APELANTE: SIMONE DA SILVA PINTO (AUTOR)

APELADO: HOSPITAL NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO S/A (RÉU)

EMENTA

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO COM FUNDAMENTO NA APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EC 103/2019. APOSENTADORIA CONCEDIDA APÓS VIGÊNCIA EC. TEMA 606, STF. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

1. O benefício de aposentadoria concedido após a promulgação da EC 103/2019, ainda que mantivesse o direito à concessão da aposentadoria segundo as regras anteriores, passou a submeter-se ao novo regramento quanto às demais disposições - tais como a previsão de rompimento do vínculo de trabalho, consoante previsto no art. 37, § 14, da Constituição Federal, acrescido pela referida Emenda.

2. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de agosto de 2024.



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5060847-65.2023.4.04.7100
40004584907 .V3


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/08/2024 A 27/08/2024

Apelação Cível Nº 5060847-65.2023.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS

APELANTE: SIMONE DA SILVA PINTO (AUTOR)

ADVOGADO(A): THIAGO ROCHA MOYSES (OAB RS069821)

ADVOGADO(A): JORGE RENAN KOJOROSCHI DE MENEZES (OAB RS121330)

ADVOGADO(A): ROGERIO CALAFATI MOYSES (OAB RS031295)

APELADO: HOSPITAL NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO S/A (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/08/2024, às 00:00, a 27/08/2024, às 16:00, na sequência 395, disponibilizada no DE de 08/08/2024.

Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO

Secretário



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