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ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATO LEGISLATIVO. PORTARIA EDITADA PELO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. CONDENAÇÕES ...

Data da publicação: 31/08/2021, 07:00:58

EMENTA: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATO LEGISLATIVO. PORTARIA EDITADA PELO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. CONDENAÇÕES DA EMPRESA NA ESFERA TRABALHISTA. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. 1. Por força de expressa norma constitucional (artigo 37, § 6º, da Constituição Federal), a responsabilidade estatal prescinde de comprovação da existência de dolo ou culpa do agente, bastando a demonstração do nexo de causalidade entre o dano (patrimonial ou extrapatrimonial) e a conduta, o qual é afastado quando há culpa exclusiva da vítima ou terceiro ou, ainda, em caso fortuito ou força maior. Não obstante, em relação à edição de ato legislativo, a responsabilidade do Estado é, de regra, afastada, pois a norma de caráter genérico e abstrato torna sua aplicação revestida de regularidade e indistinção a todas as pessoas. Com efeito, todos sofrem restrições ou recebem benefícios com essa atuação estatal (geral e abstrata). Entendimento em contrário implicaria a responsabilidade do legislador por todo e qualquer ato normativo, visto que sempre estabelece direitos, deveres ou restrições. 2. As exceções à regra geral de não responsabilização são: (1) quando o ato normativo não possui as características de generalidade e abstração, configurando lei formal de efeitos concretos (a despeito de ter origem em processo formal legislativo, é, na essência, um ato administrativo, porque tem: (1.1) um interessado ou (1.2) um ou mais destinatários específicos); (2) situações em que o legislador, na própria lei, reconhece a necessidade de indenização quanto ao prejuízo que acarretará aos destinatários, e (3) quando a lei é declarada inconstitucional em sede de controle concentrado, com eficácia erga omnes, pelo Supremo Tribunal Federal, e dela decorre diretamente um dano concreto, ressalvada eventual modulação de efeitos, uma vez que o Estado possui o dever de legislar em conformidade com a Constituição e nos limites por ela estabelecidos. Ainda que outras exceções sejam admitidas, remanesce a "excepcionalidade" da responsabilidade estatal pela edição de atos normativos, ou seja, quando o exercício da função legislativa provoca lesão excepcionalmente grave (especial e anormal) ou envolve abuso ou desvio de poder. 3. Não há se falar em responsabilidade da União pelos danos suportados pela autora, porquanto o ato normativo impugnado ostenta as características de abstração, generalidade e impessoalidade, e foi editado pela autoridade administrativa competente, com base em interpretação específica da norma legal (artigo 71, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho). 4. Os prejuízos financeiros decorrentes de condenações impostas pela Justiça Laboral são inerentes ao risco da atividade econômica desempenhada pela empresa, não gerando a decisão judicial em si o dever da União de indenizá-los. A responsabilidade objetiva do Estado por atos jurisdicionais só é admitida nos casos de erro judiciário e prisão além do tempo fixado na sentença (artigos 5º, inciso LXXV, e 37, § 6º, da Constituição Federal) e em hipóteses expressamente previstas em lei (p.ex. artigo 133 do CPC/1973 e artigo 143 do CPC/2015). (TRF4, AC 5005185-43.2015.4.04.7215, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 23/08/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005185-43.2015.4.04.7215/SC

RELATOR: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

APELANTE: ZM SA (AUTOR)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação e recurso adesivo interpostos em face de sentença proferida em ação de procedimento comum, nos seguintes termos:

3. Dispositivo

Ante o exposto, resolvo o mérito da lide (CPC/2015, art. 487, inc. I) e JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, nos termos da fundamentação, para:

I) DECLARAR a ilegalidade da Portaria MTe n. 42/07, por ter afrontado o disposto no § 3º do art. 71 da CLT e, de forma reflexa, sua inconstitucionalidade, por violar o preceito contido no inc. XXII do art. 7º da CRFB; e

II) CONDENAR a União a pagar indenização à parte autora, correspondente aos prejuízos por ela experimentados em razão das condenações judiciais que sofreu no âmbito da Justiça do Trabalho por conta da adoção do procedimento previsto na Portaria MTe n. 42/07, observada a prescrição dos valores eventualmente pagos antes de 18.12.2010, a ser apurado em sede de liquidação de sentença.

Condeno a União a ressarcir à parte autora o valor correspondente às custas processuais por ela suportadas e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, na forma do art. 85, § 3º, inc. I, do CPC/2015.

Remessa necessária dispensada (CPC/2015, art. 496, § 3º, inc. I).

Registrada eletronicamente. Publique-se e intimem-se.

Havendo interposição de recurso(s) de apelação, após apresentadas as pertinentes contrarrazões ou transcorrido o prazo para tanto (CPC/2015, art.1.010), remeta-se o processo ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região - TRF4.

Em suas razões, a União alegou, preliminarmente, (1) a incompetência da Justiça Federal para o feito; (2) a inépcia da petição inicial, e (3) a prescrição quinquenal. No mérito, sustentou que (4) não cabe a responsabilização civil do Estado pela edição de lei ou ato administrativo genérico, impessoal e abstrato; (5) a única exceção é quando uma norma é declarada inconstitucional em sede de controle concentrado pelo Supremo Tribunal Federal; (6) a pretensão da parte requerente em ser indenizada pela edição da Portaria MTE nº 42, de 2007, não encontra guarida no ordenamento pátrio, contrariando o entendimento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça sobre o tema; (7) a Portaria MTE n.º 42, de 2007, foi editada, em consonância com as normas legais e constitucionais referentes à redução do intervalo intrajornada e à saúde do trabalhador, e (8) é pacífico na jurisprudência que os atos jurisdicionais não geram responsabilidade objetiva do Estado, com fundamento no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, exceto nos casos de dolo, fraude ou culpa grave do julgador. Nesses termos, requereu o provimento do recurso, com a inversão do ônus da sucumbência.

A autora defendeu a aplicação da taxa SELIC (englobando juros e correção monetária) ou, sucessivamente, juros de um por cento mensais desde a citação e correção monetária pelo IPCA desde o efetivo pagamento (ocorrência do dano) das condenações na justiça especializada.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

I - Da competência da Justiça Federal

O artigo 109, inciso I, da Constituição Federal, dispõe que:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à justiça Eleitoral e à justiça do Trabalho;

(...)

Com efeito, o critério definidor da competência da Justiça Federal é, preponderantemente, ratione personae, o que significa dizer que depende da natureza dos envolvidos na relação processual.

Outrossim, é cediço, na jurisprudência, o entendimento no sentido de que o pedido inicial deve ser interpretado em consonância com a pretensão deduzida, esta extraída da interpretação lógico-sistemática da exordial como um todo, e não apenas do capítulo relativo ao 'pedido' (STJ, 5ª Turma, REsp 1.104.357/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, DJe de 05/03/12).

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE TRABALHISTA POR SUCESSÃO. QUESTÃO DECIDIDA NA JUSTIÇA DO TRABALHO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM PEDIDO INDENIZATÓRIO, NA JUSTIÇA FEDERAL. DISCUTE-SE A INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS, DO CONTRATO DE CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO, RELATIVAS À RESPONSABILIDADE PELO PASSIVO DE TODA E QUALQUER NATUREZA.(...) 4. O STJ possui entendimento de que a competência é definida com amparo na causa petendi e no pedido deduzido na demanda. 5. A análise da petição inicial do feito distribuído à Justiça Federal evidencia que a pretensão da suscitante é direcionada exclusivamente contra a União, e tem por origem sua suposta resistência em cumprir cláusula específica que contém a seguinte redação: 'As obrigações trabalhistas da RFFSA para com seus empregados transferidos para a CONCESSIONÁRIA, relativas ao período anterior à data da transferência de cada contrato de trabalho, sejam ou não objeto de reclamação judicial, continuarão de responsabilidade da RFFSA. Esta regra não abrange as obrigações relativas ao décimo-terceiro salário e as férias, parcial ou totalmente adquiridos até a data da transferência do contrato de trabalho, que serão de responsabilidade da CONCESSIONÁRIA, por força da sucessão trabalhista'.(...) (STJ, 1ª Seção, CC 128.982/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe de 05/12/2013)

PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AUXÍLIO-ACIDENTE. ADVENTO DA LEI N.º 9.528/1997. LIDE DE ORIGEM ACIDENTÁRIA. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA N.º 15 DO STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. O advento da Lei n.º 9.528/1997 consagrou tão-somente a extensão do reconhecimento do direito do segurado de receber benefício previdenciário decorrente da redução de sua capacidade laborativa em razão de qualquer infortúnio, antes restrito ao acidente de trabalho. 2. É imprescindível para determinar a natureza do benefício-acidente o exame do substrato fático que ampara o pedido e a causa de pedir deduzidos em juízo. 3. Envolvendo a relação processual matéria acidentária em si mesma, compete à Justiça Estadual processar e julgar a presente demanda, consoante dispõe o enunciado da Súmula n.º 15 do STJ 4. Conflito conhecido e declarado a competência do Juízo de Direito da Comarca de Criciúma/SC, ora suscitante" (STJ, 3ª Seção, CC 37.435/SC, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministra LAURITA VAZ, DJ de 25/02/2004 - grifei)

Nessa perspectiva, é de se reconhecer a competência da Justiça Federal para apreciar o pedido de ressarcimento de danos que, segunda a autora, teriam sido causados pela União, com a edição de ato normativo pelo Ministério do Trabalho e Emprego - MTe.

II - Da inépcia da inicial

A preliminar de inépcia da inicial foi rejeitada em decisão saneadora, cujos fundamentos adoto como razões de decidir (evento 22, DESPADEC1):

4. Do indeferimento da petição inicial

Como referido linhas acima, o quantum da indenização somente será conhecido em sede de liquidação, se procedente a pretensão deduzida na petição inicia, o que afasta a alegação da União de que a petição inicial seria inepta por contemplar pedido indeterminado (CPC/2015, art. 330, § 1º, inc. II).

Também não há inépcia na petição inicial por não decorrer logicamente a conclusão da narração dos fatos (CPC/2015, art. 330, § 1º, inc. III), uma vez que as causas de pedir próxima e remota - condenação em processos trabalhistas e ilegalidade/inconstitucionalidade da Portaria n. 42/2007 do MTE, respectivamente - estão relacionadas à pretensão indenizatória. Por certo, se a sentença judicial gera - ou não - responsabilidade civil do Estado é matéria afeta ao mérito da demanda, não autorizando a rejeição preliminar da petição inicial.

Ainda, o atendimento - ou não - das prescrições dos arts. 106 e 321 do CPC/2015, no que tange à juntada de todas as sentenças trabalhistas nas quais a parte autora teria sofrido condenações judiciais, por conta do desdobramento dos fatos em decorrência da edição da Portaria n. 42/2007 do MTE, não autoriza o indeferimento da petição inicial, notadamente porque tais documentos, como já referido linhas acima, podem ser apresentados em sede de liquidação de sentença, ressalvado, por óbvio, eventual improcedência da pretensão deduzida pela parte autora, quando seriam absolutamente desnecessários.

No que pertine à alegação de inexistência de interesse processual, a preliminar suscitada pela União também é impertinente. Ainda que a Portaria n. 42/2007 do MTE tenha sido revogada e substituída pela Portaria n. 1.095/2010 do mesmo órgão, os efeitos concretos do ato normativo em questão, representado pelos prejuízos financeiros sofridos pela parte autora em razão das condenações que teria sofrido na seara trabalhista, autorizam o enfrentamento do mérito da demanda.

Tampouco há impossibilidade jurídica do pedido - figura que foi excluída das condições da ação, na forma do inc. VI do art. 485 do CPC/2015 - no que tange à pretensão de ver reconhecida a nulidade, a ilegalidade ou a inconstitucionalidade da Portaria n. 42/2007 do MTE. A propósito, cumpre estabelecer a diferença entre a declaração da inconstitucionalidade abstrata do ato normativo - a ser pleiteada por meio de ação declaratória, perante o Supremo Tribunal Federal, e que exige esteja a norma impugnada em vigor - e a declaração de ilegalidade ou inconstitucionalidade no plano concreto, exercida por meio de controle difuso, o que, por óbvio, não impõe esteja a norma ainda em vigor, obrigatoriamente.

III - Da prescrição

A preliminar de prescrição também foi apreciada em decisão saneadora, em conformidade com a legislação de regência (evento 22, DESPADEC1):

5. Da prescrição

As dívidas passivas da Fazenda Pública estão sujeitas a prazo quinquenal de prescrição, nos termos do art. 1º do Decreto n. 20.910/32 (STJ: AgRg no REsp 1117531/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 19/11/2009, DJe 11/12/2009; AgRg no REsp 1073796/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 18/06/2009, DJe 01/07/2009; REsp 692.204/RJ, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 06/12/2007, DJ 13/12/2007 p. 324).

No caso concreto, considerando que a parte autora pretende a condenação da União ao pagamento de indenização "medida pela extensão dos danos, quais sejam os efetivos pagamentos, a título de despesa laboral, consistentes em condenações judiciais havidas em razão da aplicação do rito e permissivos da Portaria 42/2007", estão prescritos os valores correspondentes aos pagamentos porventura efetuados pela parte autora no período que antecede o quinquênio anterior à propositura da demanda, ocorrido em 18.12.2015, ou seja, foram atingidos pela prescrição todos os valores pagos pela parte autora antes de 18.12.2010.

IV - Do mérito

Ao apreciar o(s) pedido(s) formulado(s) na petição inicial, o juízo a quo manifestou-se nos seguintes termos:

1. Relatório

ZM S/A ajuizou ação de indenização em face da União em cuja petição inicial narrou seria detentora, até janeiro de 2007, de autorização específica do Ministério do Trabalho e Emprego - MTe para redução do intervalo intrajornada de seus empregados, deferida no âmbito do processo DRT/SC n. 46220.009328/2004-30, cuja renovação teria sido obstada em razão da edição da Portaria n. 42/07, que teria relegado à convenção ou acordo coletivo de trabalho a competência para reduzir o intervalo para repouso ou alimentação previsto no art. 71 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.

Prosseguiu dizendo que o Tribunal Superior do Trabalho - TST teria declarado a ilegalidade e a inconstitucionalidade da indigitada portaria, o que estaria lhe causando inúmeros prejuízos em razão das condenações que estaria sofrendo no âmbito de ações trabalhistas, na medida em que a disposição da matéria em acordo coletivo teria sido declarada nula pela justiça laboral.

Referiu que a Portaria n. 3.116/89 outorgava aos Delegados Regionais a competência para decidir sobre os pedidos de redução do intervalo intrajornada, ao mesmo tempo em que determinava que a Delegacia Regional do Trabalho - DRT inspecionasse a empresa requerente de forma prévia à concessão da autorização, prática que teria sido abolida pela Portaria n. 42/07, que teria estabelecido outorga automática da autorização, de modo generalista e sem necessidade de inspeção prévia in loco.

Mencionou que a Portaria n. 1.095/10, sucessora da Portaria n. 42/07, teria retomado o procedimento de outorga individualizada e não-automática da autorização de redução, restabelecendo a fiscalização efetiva e prévia ao deferimento do pedido.

Aduziu, também, que, nas referidas condenações trabalhistas, teria havido reprovação da portaria em discussão, sem exame do mérito quanto ao atendimento dos requisitos previstos no art. 71 da CLT, seguindo o previsto na Orientação Jurisprudencial - OJ n. 342, da Secretaria de Dissídios Individuais - SDI-1, do TST.

Asseverou, ainda, que a Portaria n. 42/07 do MTe teria provocado autorredução da responsabilidade administrativa, por meio de ato espontâneo, soberano e legítimo do Poder Executivo, de modo que não se poderia exigir conduta diversa daquela determinada no ato impugnado.

Sustentou, na sequência, a desnecessidade de declaração de inconstitucionalidade da norma em debate em sede concentrada, por não caracterizar hipótese de violação ao princípio da reserva legal, mas de incompatibilidade com o que preceitua o art. 71 da CLT, tratando-se de controle de legalidade e de constitucionalidade no plano difuso, notadamente porque o ato em questão não mais se encontra em vigor, visto que revogado pelo próprio MTe.

Discorreu, também, sobre a responsabilidade civil do Estado, dizendo-a objetiva no caso em apreço, na forma prevista no art. 43 do Código Civil e no art. 37, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB.

Ao final de sua longa exposição, requereu a procedência da pretensão para:

(a) DECLARAR, a título incidental, ou, sucessivamente, a título de ratificação, a inconstitucionalidade da Portaria 42/2007 do Ministério do Trabalho e Emprego, no que respeita à ofensa ao direito constitucional (art.7º, XXII, da CF/1998), conforme declarado pela Justiça Especializada;

(b) DECLARAR nula de pleno direito a Portaria 42/2007 do Ministério do Trabalho e Emprego, uma vez que incabível a regulamentação da matéria de modo inventivo e diverso daquele outorgado pela lei laboral, sobretudo sem lei certa, estrita e prévia que autorizasse a supressão ou mesmo a delegação – notadamente para ente privado (v.g, Sindicatos, via ACT) - dos deveres de gerir, inspecionar, administrar e conceder autorizações para a redução dos intervalos intrajornada;

(c) DECLARAR nula de pleno direito a Portaria 42/2007 do Ministério do Trabalho e Emprego, uma vez que incabível a regulamentação da matéria de modo a prever a outorga de autorizações de natureza genérica ou, ainda, por postergar a inspeção “a qualquer tempo”, conforme fundamentação supra;

(d) DECLARAR a nulidade do ato administrativo concreto, qual seja, a Portaria 42/2007 do Ministério do Trabalho e Emprego, por ofensa direta às regras do art. 37 da Constituição, especialmente à legalidade (agir sem amparo legal), à moralidade (abandonar o administrado à própria sorte) e à eficiência (imperícia e negligência do ente público), na medida em que a Administração Pública, por meio dela, pretendeu se desvencilhar de atividade privativa e indelegável, conforme a fundamentação adotada nesta exordial e aquela constante dos julgados da Justiça Especializada (anexo);

(e) DECLARAR presente o dever de indenizar da Ré, porquanto haja se desincumbido, espontaneamente, do dever de prestar serviço público, negando-se, mediante a edição da Portaria 42/2007 MTE, a fornecer autorização consentânea com a legislação aplicável, conforme fundamentação supra, fato condutor das posteriores e inapeláveis condenações na seara da justiça laboral;

(f) CONDENAR, confirmado o patente nexo causal, a Ré à indenização, em favor da Autora, medida pela extensão dos danos, quais sejam os efetivos pagamentos, a título de despesa laboral, consistentes em condenações judiciais havidas em razão da aplicação do rito e permissivos da Portaria 42/2007, posteriormente declarada inconstitucional, ilegal e inválida pela Justiça do Trabalho, cujo aspecto patrimonial diz respeito ao pagamento de horas extras intervalares, e seus reflexos, a todos os empregados que a acionaram judicialmente, com trânsito em julgado havido ou por haver;

(f.1) seja postergada a liquidação da sentença condenatória à fase própria, oportunizando-se nela a apresentação de todos os casos devidamente passados em julgado, quando se conhecerá dos valores devidamente corrigidos, o que pede seja feito pelo índice IPCA;

(g) requer provar o alegado por meio de toda modalidade de prova em direito admitido, inclusive testemunhal (oitiva de representantes sindicais, representante do MTE, colaboradores etc), ressalvada a pendência de juntada de mídia em vídeo, conforme prenotado; pericial, tendo por objetivo demonstrar o atendimento dos requisitos do artigo 71, § 3º da CLT, entre outras;

(h) seja concedido o prazo adicional de 60 (sessenta dias) para a apresentação de planilha atualizada contendo os números dos autos da justiça trabalhista e que dizem respeito ao objeto desta demanda;

(i) CONDENAR a Ré no consectário sucumbencial.

Anexou procuração e documentos (E1).

No que tange ao pedido de juntada de mídia digital - item "g" da petição inicial - a parte autora foi esclarecida de que a prática do ato independeria de autorização judicial. No mesmo momento, foi-lhe facultada a juntada de "planilha atualizada contendo os números dos autos da justiça trabalhista e que dizem respeito ao objeto desta demanda" - item "h" da petição inicial - na fase de liquidação, acaso procedente a pretensão versada na petição inicial (E10).

A União formulou pedido de reconsideração daquela decisão, postulando a intimação da parte autora para emendar a petição inicial, apresentando toda a documentação relacionada ao mérito da demanda, pena de extinção do processo (E15).

Em contestação, antes de adentrar o exame do mérito, a União impugnou o valor atribuído à causa pela parte autora, requereu o indeferimento da petição inicial e adjetivou de impossível o pedido de declaração de ilegalidade, inconstitucionalidade e/ou nulidade da Portaria MTE n. 42/07. Na sequência, levantou prejudicial de prescrição e, no mérito propriamente dito, requereu a improcedência da pretensão. Juntou documentos (E16).

A parte autora trouxe réplica na qual reiterou os pedidos de provas pericial e testemunhal (E20).

Na fase de saneamento e organização do processo, foi proferida decisão interlocutória indeferindo o pedido de reconsideração, rejeitando a impugnação ao valor da causa e as preliminares suscitadas pela União. Ato contínuo, foram indeferidos os pedidos de realização de prova pericial e testemunhal formulados pela parte autora. A prejudicial de prescrição da pretensão versada na petição inicial foi parcialmente acolhida, no que tange à indenização correspondente aos valores eventualmente pagos pela parte autora antes de 18.12.2010 (E22).

Intimadas, as partes não se manifestaram (E26; E28).

Registrado, o processo veio concluso para sentença.

2. Fundamentação

2.1. Da (i)legalidade e (in)constitucionalidade da Portaria n. 42/07

Segundo o que preceitua a CRFB, "são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social [...] redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança" (art. 7º, caput e inc. XXII).

A seu turno, a CLT disciplinou a questão do intervalo intrajornada nos seguintes termos:

Art. 71. Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.

§ 1º Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas.

§ 2º Os intervalos de descanso não serão computados na duração do trabalho.

§ 3º O limite mínimo de uma hora para repouso ou refeição poderá ser reduzido por ato do Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, quando ouvido o Serviço de Alimentação de Previdência Social, se verificar que o estabelecimento atende integralmente às exigências concernentes à organização dos refeitórios, e quando os respectivos empregados não estiverem sob regime de trabalho prorrogado a horas suplementares.

§ 4º Quando o intervalo para repouso e alimentação, previsto neste artigo, não for concedido pelo empregador, este ficará obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo de no mínimo 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. (Incluído pela Lei nº 8.923, de 27.7.1994)

§ 5º O intervalo expresso no caput poderá ser reduzido e/ou fracionado, e aquele estabelecido no § 1º poderá ser fracionado, quando compreendidos entre o término da primeira hora trabalhada e o início da última hora trabalhada, desde que previsto em convenção ou acordo coletivo de trabalho, ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho a que são submetidos estritamente os motoristas, cobradores, fiscalização de campo e afins nos serviços de operação de veículos rodoviários, empregados no setor de transporte coletivo de passageiros, mantida a remuneração e concedidos intervalos para descanso menores ao final de cada viagem. (Redação dada pela Lei nº 13.103, de 2015)

No plano infralegal, o Ministério do Trabalho editou a Portaria n. 3.116/89, por meio da qual disciplinou a questão de fundo, nos seguintes termos:

Art. 1º Delegar, privativamente, aos Delegados Regionais do Trabalho, competência para decidir sobre os pedidos de redução de intervalo para repouso ou refeição.

Art. 2º A empresa ao requerer a redução do intervalo de que trata o art. 1º deverá atender aos seguintes requisitos:

a) apresentar justificativa técnica para o pedido da redução;

b) acordo coletivo de trabalho ou anuência expressa de seus empregados, manifestada com a assistência da respectiva entidade sindical;

c) manter jornada de trabalho de modo que seus empregados não estejam submetidos a regime de trabalho prorrogado a horas suplementares;

d) manter o refeitório organizado de acordo com a NR-24, aprovada pela Portaria Ministerial nº 3.214, de 08 de junho de 1978, e em funcionamento adequado quanto à sua localização e capacidade de rotatividade;

e) garantir aos empregados alimentação gratuita ou a preços acessíveis, devendo as refeições ser balanceadas e confeccionadas sob a supervisão de nutricionista;

f) apresentar programa médico especial de acompanhamento dos trabalhadores sujeitos à redução do intervalo;

g) apresentar laudo de avaliação ambiental do qual constarão, também, as medidas de controle adotadas pela empresa.

Art. 3º A Delegacia Regional do Trabalho deverá inspecionar a empresa requerente, conforme as instruções expedidas pela Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho, e a autorização somente será concedida se não for constatada irregularidade quanto às normas de proteção, segurança e medicina do trabalho.

Art. 4º As autorizações serão concedidas pelo prazo de 2 (dois) anos, renováveis por igual período.

Parágrafo único. Os pedidos de renovação deverão ser formalizados 3 (três) meses antes do término da autorização, observados os requisitos das alíneas do art. 2º, além da apresentação de relatório médico resultante do programa de acompanhamento da saúde dos trabalhadores submetidos à redução do intervalo.

Art. 5º O Órgão Regional do Ministério do Trabalho deverá inspecionar regularmente as empresas que obtiveram autorização, efetuando o seu cancelamento em caso de descumprimento de exigência constante desta Portaria.

Art. 6º As portarias de autorização e as de renovação deverão ser publicadas no Diário Oficial da União.

Segundo consta dos autos, a parte autora recebeu, da Delegacia Regional do Trabalho em Santa Catarina, a autorização de que trata o § 3º do art. 71 da CLT, por meio da Portaria n. 1, de 04.01.2005, publicada no Diário Oficial da União - DOU de 14.01.2005, nos seguintes termos (E1, OUT12):

O Delegado Regional do Trabalho no Estado de Santa Catarina no uso das atribuições conferidas pela Portaria Ministerial no 3.116/89, com fundamento no artigo 71, parágrafo 3, da CLT, e considerando as conclusões do parecer exarado pelo Setor de Segurança e Saúde do Trabalhador, Resolve:

Nº 1 - Reduzir o intervalo para alimentação e repouso dos empregados da empresa ZM SA situada à RUA JOSÉ REIS E SILVA Nº. 800 BATEAS BRUSQUE, CNPJ 76812379000104, de uma hora para 00:30 minutos, ficando autorizado este intervalo nos Turnos de 05:00 às 13:30; 13:30 às 22:00 e de 22:00 às 05:00 h., para o Setor de Usinagem, Estamparia, Conformação, Montagem, Manutenção, Suprimentos, Zincagem, Termofixo, Ferramentaria, Expedição, Termoplástico, Parafuso Contatos, e Montagem Planta II por um período de 24 meses, a contar da publicação. A presente autorização poderá ser cancelada se a Fiscalização do Trabalho constatar que não estão sendo cumpridas as condições estabelecidas. (Processo DRT/SC/Nº 46220.009328/2004-30).

[...]

Posteriormente, o Sr. Ministro de Estado do Trabalho e Emprego editou a Portaria n. 42, de 28.03.2007, que revogou a Portaria n. 3.116/89 e regulamentou a questão da redução do intervalo intrajornada da seguinte maneira:

Art. 1º O intervalo para repouso ou alimentação de que trata o art. 71 da CLT poderá ser reduzido por convenção ou acordo coletivo de trabalho, devidamente aprovado em assembléia geral, desde que:

I - os empregados não estejam submetidos a regime de trabalho prorrogado; e

II - o estabelecimento empregador atenda às exigências concernentes à organização dos refeitórios e demais normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho.

Art. 2º A convenção ou acordo coletivo deverá conter cláusula que especifique as condições de repouso e alimentação que serão garantidas aos empregados, vedada a indenização ou supressão total do período.

Art. 3º A Fiscalização do Trabalho, a qualquer tempo, verificará in loco as condições em que o trabalho é exercido, principalmente sob o aspecto da segurança e saúde no trabalho e adotará as medidas legais pertinentes a cada situação encontrada.

Art. 4º O descumprimento das condições estabelecidas no art. 1º, bem como de quaisquer outras adicionais estabelecidas na convenção ou acordo coletivo, ensejará a suspensão da redução do intervalo até a devida regularização.

A norma em questão foi revogada pela Portaria n. 1.095, baixada pelo Sr. Ministro de Estado do Trabalho e Emprego em 20.05.2010, que regulamentou o tema com os seguintes dizeres:

Art. 1° A redução do intervalo intrajornada de que trata o art. 71, § 3°, da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT poderá ser deferida por ato de autoridade do Ministério do Trabalho e Emprego quando prevista em convenção ou acordo coletivo de trabalho, desde que os estabelecimentos abrangidos pelo seu âmbito de incidência atendam integralmente às exigências concernentes à organização dos refeitórios, e quando os respectivos empregados não estiverem sob regime de trabalho prorrogado a horas suplementares.

§ 1° Fica delegada, privativamente, aos Superintendentes Regionais do Trabalho e Emprego a competência para decidir sobre o pedido de redução de intervalo para repouso ou refeição.

§ 2° Os instrumentos coletivos que estabeleçam a possibilidade de redução deverão especificar o período do intervalo intrajornada.

§ 3° Não será admitida a supressão, diluição ou indenização do intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos.

Art. 2° O pedido de redução do intervalo intrajornada formulado pelas empresas com fulcro em instrumento coletivo far-se-ão acompanhar de cópia deste e serão dirigidos ao Superintendente Regional do Trabalho e Emprego, com a individualização dos estabelecimentos que atendam os requisitos indicados no caput do art. 1º desta Portaria, vedado o deferimento de pedido genérico.

§ 1° Deverá também instruir o pedido, conforme modelo previsto no anexo desta Portaria, documentação que ateste o cumprimento, por cada estabelecimento, dos requisitos previstos no caput do art. 1º desta Portaria.

§ 2° O Superintendente Regional do Trabalho e Emprego poderá deferir o pedido formulado, independentemente de inspeção prévia, após verificar a regularidade das condições de trabalho nos estabelecimentos pela análise da documentação apresentada, e pela extração de dados do Sistema Federal de Inspeção do Trabalho, da Relação Anual de Informações Sociais - RAIS e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED.

Art. 3° O ato de que trata o art. 1° desta Portaria terá a vigência máxima de dois anos e não afasta a competência dos agentes da Inspeção do Trabalho de verificar, a qualquer tempo, in loco, o cumprimento dos requisitos legais.

Parágrafo único. O descumprimento dos requisitos torna sem efeito a redução de intervalo, procedendo-se às autuações por descumprimento do previsto no caput do art. 71 da CLT, bem como das outras infrações que forem constatadas.

Da leitura dos instrumentos normativos acima transcritos conclui-se que durante o período de vigência da Portaria MTe n. 42/07 o procedimento para a redução do intervalo intrajornada dos trabalhadores foi deveras simplificado, dispensando a inspeção prévia do ambiente de trabalho e a emissão de autorização formal por parte dos Delegados Regionais do Trabalho.

Do ponto de vista formal, o ato em discussão - Portaria MTe n. 42/10 - não padece de vício, porque editado de acordo com o que prescreve o art. 87, par. único, inc. I e II, da CRFB. Já sob o aspecto material, é evidente que a disposição nele contida contraria o que determina o § 3º do art. 71 da CLT e, por via reflexa, ofende o preceito versado no art. 7º, inc. XXII, da CRFB.

A propósito do tema, segue precedente do TST, que bem se aplica ao caso em julgamento:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 - INCOMPETÊNCIA DO TRT PARA NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO DE REVISTA - CONTRADITÓRIO - AMPLA DEFESA: Nos termos do artigo 896, § 1º, da CLT, compete ao Tribunal Regional admitir ou não o Recurso de Revista, examinando os requisitos extrínsecos e intrínsecos. Não há falar em ofensa ao contraditório ou à ampla defesa. INTERVALO INTRAJORNADA - REDUÇÃO POR NORMA COLETIVA - PERÍODO DE VIGÊNCIA DA PORTARIA Nº 42/2007 DO TEM - CONCESSÃO PARCIAL - PAGAMENTO TOTAL DO PERÍODO CORRESPONDENTE - NATUREZA JURÍDICA: O acórdão regional está em harmonia com a Súmula nº 437, itens I, II e III, do TST. CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL - EMPREGADO NÃO ASSOCIADO - DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS: A contribuição assistencial somente pode ser cobrada dos filiados do sindicato. Inteligência do Precedente Normativo nº 119 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos e da Súmula nº 666 do E. Supremo Tribunal Federal. Precedentes. DOBRA DE FÉRIAS: A Reclamada não logra atender aos requisitos do artigo 896 da CLT. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (AIRR - 11125-49.2013.5.15.0039 , Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 24/08/2016, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/08/2016)

Do voto condutor do julgado, extrai-se o excerto que segue:

[...]

A par do prestígio que deve ser reconhecido às convenções e aos acordos coletivos, a jurisprudência desta Eg. Corte orienta que o direito ao intervalo intrajornada, relacionado à higiene, saúde e segurança do trabalho e assegurado por norma de ordem pública, não pode ser objeto de negociação coletiva, motivo por que é inválida sua supressão ou redução. Nesse sentido, a Súmula nº 437, II, preceitua, in litteris:

É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva.

É de se notar, ainda, que, nos termos da jurisprudência do TST, a Portaria nº 42/2007 do MTE, por seu caráter genérico, não tem o condão de autorizar a redução do intervalo intrajornada por norma coletiva, no período de sua vigência. Nesse sentido, julgados de Turmas:

RECURSO DE REVISTA - (...) - INTERVALO INTRAJORNADA - REDUÇÃO POR NORMA COLETIVA - PERÍODO DE VIGÊNCIA DA PORTARIA Nº 42/2007 DO MTE: É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada, porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (arts. 71 da CLT e 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva. Inteligência da Súmula nº 437, II, do TST. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a Portaria nº 42/2007 do MTE, por seu caráter genérico, não possui o condão de autorizar a redução do intervalo intrajornada por norma coletiva no período de sua vigência. Precedentes. (RR-1830-37.2012.5.15.0131, Relator Desembargador Convocado João Pedro Silvestrin, 8ª Turma, DEJT 6/6/2014)

RECURSO DE REVISTA. SUMARÍSSIMO. INTERVALO INTRAJORNADA. REDUÇÃO POR NORMA COLETIVA. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO ESPECÍFICA. A conclusão do Regional, ao considerar válida a redução do intervalo intrajornada com fulcro na Portaria nº 42/2007 do MTE, não se revela acertada, uma vez que tal Portaria é genérica, não podendo ser utilizada como único fundamento para a autorização da redução intervalar. Precedentes. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido. (RR-61000-28.2013.5.21.0004, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, 8ª Turma, DEJT 28/3/2014)

RECURSO DE REVISTA (...) INTERVALO INTRAJORNADA. REDUÇÃO. NORMA COLETIVA. PORTARIA 42/2007 DO MTE. A única hipótese de redução do intervalo intrajornada previsto no artigo 71 da CLT encontra-se inserida em seu § 3º e está sujeita à prévia autorização do Ministério do Trabalho, desde que observados determinados requisitos, hipótese não verificada no presente caso. Eventual Acordo Coletivo celebrado pelas partes na forma da Portaria nº 42/2007-MTE não supre tal ato de verificação da conformidade do refeitório às normas de higiene e segurança do trabalhador. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (RR-257200-67.2009.5.12.0046, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, DEJT 14/2/2014)

[...]

Ainda, merece referência o seguinte precedente:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RITO SUMARÍSSIMO. INTERVALO INTRAJORNADA. REDUÇÃO POR MEIO DE NORMA COLETIVA. Reconhecida contrariedade à Súmula nº 437, II, desta Corte Superior, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. RECURSO DE REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. INTERVALO INTRAJORNADA. REDUÇÃO POR MEIO DE NORMA COLETIVA. - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva- - Súmula nº 437, II, do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 1329-42.2012.5.12.0010 , Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 06/08/2014, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 08/08/2014)

Do respectivo voto, transcrevo o excerto abaixo:

[...]

Conforme registrado no acórdão recorrido, a empresa demandada, anteriormente à edição da Portaria nº 42/2007 do Ministério do Trabalho e Emprego, efetivamente reduzia o intervalo intrajornada de seus empregados com autorização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE). No período posterior à vigência da referida portaria ministerial, a redução do intervalo para descanso e alimentação se deu com base na previsão contida em norma coletiva. Assim, considerando que o pedido contido na exordial limita-se ao período em que a redução do intervalo encontrava regência nas convenções coletivas, cinge-se a controvérsia em verificar a possibilidade de se flexibilizar a concessão do referido intervalo por meio de instrumento normativo.

Conquanto o artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República consagre o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho, daí não se extrai autorização para a negociação de direitos indisponíveis do empregado, concernentes à proteção de sua saúde física e mental. Assim, o instrumento coletivo mediante o qual se reduz ou suprime intervalo para descanso e refeição carece de eficácia jurídica, porquanto desconsidera o disposto em norma de ordem pública, de natureza imperativa.

De outro lado, o artigo 71, cabeça, da Consolidação das Leis do Trabalho, preconiza que em qualquer trabalho contínuo cuja duração exceda de seis horas é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de uma hora e, salvo acordo ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de duas horas.

Nesse sentido, o entendimento desta Corte uniformizadora, consagrado na Súmula n.º 437, item II, desta Corte superior (resultado da conversão do item I da Orientação Jurisprudencial n.º 342 da SBDI-I), de seguinte teor:

INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT.

(...)

II - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva.

Resulta claro, daí, que o Tribunal Regional, ao absolver a reclamada da condenação ao pagamento de horas extras e reflexos decorrentes da redução do intervalo intrajornada, acabou por contrariar o inciso II da Súmula n.º 437 desta Corte superior.

Com esses fundamentos, dou provimento ao agravo de instrumento.

[...]

Cumpre registrar, ainda, que a Súmula n. 437 do TST - que, dentre outras, incorporou a OJ n. 342 da SBDI-1 - em seu item II, aponta que "é inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva."

Em suma, ao simplificar o procedimento para redução do intervalo intrajornada, dispensando a inspeção prévia do ambiente de trabalho e a emissão de autorização formal por parte dos Delegados Regionais do Trabalho, a Portaria MTe n. 42/07 incidiu no vício da ilegalidade - porque regulou a matéria de forma diversa daquela prevista no § 3º do art. 71 da CLT - e, de forma reflexa, afrontou o disposto no inc. XXII do art. 7º da CRFB.

Nesse ponto, o pedido formulado na petição inicial é procedente.

2.2. Da responsabilidade civil do Estado

Em regras gerais, "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito" (CC, art. 186). Além disso, "também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes" (CC, art. 187).

A obrigação de indenizar, a seu turno, decorre da prática do ato ilícito: "aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo." (CC, art. 927, caput). Esses, pois, são os fundamentos da teoria clássica da responsabilidade civil, que tem a culpa como pressuposto do dever de indenizar. Ausente a prova da culpa, a indenização é indevida. Assim, compete à vítima provar a existência do dano, o nexo de causalidade e a culpa do agente.

Por outro lado, em se tratando de certas pessoas e determinadas situações, o dever legal de reparar os prejuízos subsiste independentemente de culpa, bastando, para tanto, que a vítima comprove o dano e o nexo de causalidade. É a chamada responsabilidade objetiva, que tem como fundamento o preceito contido no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem."

A Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB, por sua vez, estabeleceu que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa." (art. 37, § 6º).

No mesmo sentido, o art. 43 do Código Civil prescreve que "as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo."

Segundo Yussef Said Cahali (Responsabilidade Civil do Estado. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 485), uma vez que a CF/88 teria "adotado a teoria da responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas indicadas em seu art. 37, § 6º, a que bastaria o nexo de causalidade entre o dano e a ação ou omissão do ente público ou privado prestador de serviço público, mostra-se, em princípio, despicienda qualquer averiguação do dolo ou da culpa por parte de seus agentes, por desnecessária a sua prova."

Para Alexandre de Moraes (Direito constitucional. 31 ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 391-392), os requisitos da responsabilidade objetiva são: "ocorrência do dano; ação ou omissão administrativa; existência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa e ausência de causa excludente da responsabilidade estatal."

No que tange à responsabilidade civil do Estado em razão do exercício de atividade legislativa, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito administrativo. 27 ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 731) esclarece:

[...]

Atualmente, aceita-se a responsabilidade do Estado por atos legislativos pelo menos nas seguintes hipóteses:

a) leis inconstitucionais;

b) atos normativos do Poder Executivo e de entes administrativos com função normativa, com vícios de inconstitucionalidade ou ilegalidade;

c) leis de efeitos concretos, constitucionais ou inconstitucionais;

d) omissão no poder de legislar e regulamentar.

[...]

Especificamente no que tange aos atos normativos do Poder Executivo, prossegue a doutrinadora em questão (idem, ibidem, p. 732):

[...]

O mesmo entendimento adotado em relação às leis inconstitucionais pode ser adotado, pelos mesmos fundamentos, para os regulamentos do Poder Executivo e para os atos normativos das agências reguladoras e de outros entes que exerçam competência normativa no âmbito da Administração Pública, não só quando sejam inconstitucionais, mas também quando sejam ilegais, por exorbitarem dos limites de sua competência regulamentar, contrariando normas de hierarquia superior. Só que, no caso de ilegalidade, não há necessidade de prévia apreciação judicial. A indenização pode ser pleiteada, tendo por fundamento a ilegalidade do ato normativo do Poder Executivo ou dos entes reguladores.

[...]

Já os prejuízos decorrentes de atos normativos ilegais podem ser pleiteados desde logo, na mesma ação em que se pede o reconhecimento da ilegalidade, tendo em vista que o juízo de ilegalidade não está sujeito às mesmas exigências impostas ao juízo de inconstitucionalidade.

[...]

No mesmo sentido, Yussef Said Cahali (Responsabilidade civil do Estado. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 661) esclarece que, "se o decreto regulamentar é ilegal, consequente de abuso do poder regulamentar, por ultrapassado o limite de atribuição que a lei havia delegado ao Poder Executivo, os danos que dele resultam para o particular podem ser reclamados desde logo, questionando-se incidentalmente a legalidade do decreto".

Voltando ao caso concreto, inexistem dúvidas quanto ao fato de que a atuação estatal - por meio da edição da Portaria MTe n. 42/07 - causou prejuízos à parte autora, os quais são decorrentes das condenações judiciais proferidas pela Justiça do Trabalho por conta da redução do intervalo intrajornada de seus empregados, veiculada por meio de convenção coletiva de trabalho, da forma preconizada no ato regulamentar impugnado.

Ainda, ao contrário do que sustenta a União, a declaração de inconstitucionalidade do ato normativo questionado, na via concentrada e pelo STF, não constitui requisito do pedido de indenização. A propósito, no caso em discussão, o STF sequer processaria eventual pedido nesse sentido. A uma, porque a ofensa à CRFB é reflexa, e não direta (ADI 842 MC, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, julg. 26.02.1993); e a duas, porque o ato foi revogado em 2010 (ADI 519 QO, Rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julg. 22.05.2002).

Além disso, a Portaria MTe n. 42/07, em seu art. 1º, relegou à convenção ou acordo coletivo de trabalho a competência para deliberar acerca da redução do intervalo intrajornada, disposição essa que, pela OJ n. 342, da SDI-1 do TST, incorporada pela Súmula n. 437 daquele Tribunal, reputou "inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva." Assim, a ausência de menção expressa à indigitada portaria, na redação da OJ n. 342, é irrelevante para o julgamento da causa.

Em conclusão, também é procedente o pedido de condenação da União ao pagamento de indenização, correspondente aos prejuízos experimentados pela parte autora em razão das condenações judiciais no âmbito da Justiça do Trabalho por conta da adoção do procedimento previsto na Portaria MTe n. 42/07.

Tendo em conta a impossibilidade de mensuração, neste momento, do valor da indenização, a liquidação de sentença deverá ser realizada futuramente, seguindo o que determina o art. 509 do CPC/2015.

Por fim, sendo suficiente a análise dos pontos abordados para o deslinde da controvérsia, torna-se desnecessária a apreciação dos demais argumentos trazidos pelas partes, pois, segundo o STJ, "o julgador, no exame das lides que lhe são submetidas, não está obrigado a responder questionários jurídicos elaborados pelas partes e nem a discorrer sobre todos os dispositivos legais por elas invocados. É de sua obrigação, ao examinar os contornos da lide controvertida, apresentar os fundamentos fáticos e jurídicos em que apoia suas convicções para decidir" (AgRg no AREsp 180.224/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 23/10/2012).

Para o STF, "o juiz, para atender à exigência de fundamentação do art. 93, IX, da CF, não está obrigado a responder a todas as alegações suscitadas pelas partes, mas tão-somente àquelas que julgar necessárias para fundamentar sua decisão" (AI 417161 AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 21.03.2003).

Anote-se, ainda, que esses precedentes não foram superados com a entrada em vigor do CPC/2015, conforme recente decisão do STJ, segundo a qual "o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida" (EDcl no MS 21.315/DF, Rel. Ministra Diva Malerbi, Desembargadora Convocada TRF 3ª Região, Primeira Seção, julgado em 08/06/2016, DJe 15/06/2016).

3. Dispositivo

Ante o exposto, resolvo o mérito da lide (CPC/2015, art. 487, inc. I) e JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, nos termos da fundamentação, para:

I) DECLARAR a ilegalidade da Portaria MTe n. 42/07, por ter afrontado o disposto no § 3º do art. 71 da CLT e, de forma reflexa, sua inconstitucionalidade, por violar o preceito contido no inc. XXII do art. 7º da CRFB; e

II) CONDENAR a União a pagar indenização à parte autora, correspondente aos prejuízos por ela experimentados em razão das condenações judiciais que sofreu no âmbito da Justiça do Trabalho por conta da adoção do procedimento previsto na Portaria MTe n. 42/07, observada a prescrição dos valores eventualmente pagos antes de 18.12.2010, a ser apurado em sede de liquidação de sentença.

Condeno a União a ressarcir à parte autora o valor correspondente às custas processuais por ela suportadas e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, na forma do art. 85, § 3º, inc. I, do CPC/2015.

Remessa necessária dispensada (CPC/2015, art. 496, § 3º, inc. I).

Registrada eletronicamente. Publique-se e intimem-se.

Havendo interposição de recurso(s) de apelação, após apresentadas as pertinentes contrarrazões ou transcorrido o prazo para tanto (CPC/2015, art.1.010), remeta-se o processo ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região - TRF4. (grifei)

Em sede de embargos de declaração, a sentença foi complementada:

A parte autora interpôs embargos de declaração em face da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados, aduzindo não teriam sido apreciados os pedidos constantes dos itens (f) e (f.1) da petição inicial bem assim a dinâmica de atualização monetária e juros de mora a ser observada na fase de materialização do julgado. Pediu o acolhimento dos embargos e a integração da sentença (E36). É o relato do necessário. Decido.

Na forma do art. 1.022 do CPC/2015, "cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para [I] esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; [II] suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; [III] corrigir erro material."

Por sua vez, o parágrafo único do dispositivo legal em questão aponta que "considera-se omissa a decisão que [I] deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento; [II] incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º."

No caso concreto, as alegações da recorrente não merecem trânsito. A uma, porque a sentença recorrida condenou a União "a pagar indenização à parte autora, correspondente aos prejuízos por ela experimentados em razão das condenações judiciais que sofreu no âmbito da Justiça do Trabalho por conta da adoção do procedimento previsto na Portaria MTe n. 42/07, observada a prescrição dos valores eventualmente pagos antes de 18.12.2010", compreendidos na expressão "prejuízos" todos os valores que a embargante despendeu, aí incluídos os "reflexos (em parcelas referentes a férias, décimo terceiro etc.)"; a duas, porque o decisum recorrido, em sua fundamentação, expressamente consignou que, "tendo em conta a impossibilidade de mensuração, neste momento, do valor da indenização, a liquidação de sentença deverá ser realizada futuramente, seguindo o que determina o art. 509 do CPC/2015."

Ante o exposto, REJEITO os embargos de declaração interpostos pela parte autora, nos termos da fundamentação.

Cumpra-se integralmente o dispositivo sentencial.

Registrada eletronicamente. Publique-se e intimem-se.

A Constituição Federal prevê a responsabilidade do Estado pelos danos causados por seus agentes a terceiros:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

§ 6° As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

(...)

Por força de expressa norma constitucional, a responsabilidade estatal prescinde de comprovação da existência de dolo ou culpa do agente, bastando a demonstração do nexo de causalidade entre o dano (patrimonial ou extrapatrimonial) e a conduta, o qual é afastado quando há culpa exclusiva da vítima ou terceiro ou, ainda, em caso fortuito ou força maior.

Não obstante, em relação à edição de ato legislativo, a responsabilidade do Estado é, de regra, afastada, pois a norma de caráter genérico e abstrato torna sua aplicação revestida de regularidade e indistinção a todas as pessoas. Com efeito, todos sofrem restrições ou recebem benefícios com essa atuação estatal (geral e abstrata). Entendimento em contrário implicaria a responsabilidade do legislador por todo e qualquer ato normativo, visto que sempre estabelece direitos, deveres ou restrições.

Essa orientação extrai-se do pronunciamento do eg. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgInt no AREsp 1.551.978/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, em 11/02/2020 (DJe 26/06/2020), nos seguintes termos:

(...)

A Administração pratica atos normativos, no que é acompanhada pelo Judiciário (p. ex., Regimentos Internos). Esses atos são caracterizados pela generalidade e abstração. Carregam, pois, pluralidade indeterminada de destinatários e pluralidade indeterminada de casos de incidência. Ser geral remete à impessoalidade, não visar sujeitos singulares pré-nominados e abranger todos os que, de maneira indistinta, se subsumam ao quadro de fato e de direito antecipadamente estatuído. De outra parte, generalidade não é sinônimo de incidência nacional, estadual ou municipal, preservada mesmo em atos normativos de observância em subdivisões de município, como bairros e até quadras, fenômeno usual no ordenamento do território urbano.

Outrossim, na moldura legal de regência da hipótese dos autos, para além de envolver ato normativo lícito, o próprio legislador se encarregou de preceituar que tais pronunciamentos do Estado – sem importar o Poder emissor – apresentam eficácia plena a partir de sua promulgação, efeitos transmissíveis ao conjunto inteiro do Direito e do País: "Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece" e "A Lei em vigor terá efeito imediato e geral" (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, arts. 3º e 6º, grifei).

(...)

Apartando-se de classes corriqueiras de fatos e atos geradores de responsabilidade civil – em que podem despontar situações de hiato temporal entre a causa do dano, o próprio dano e o conhecimento do dano –, Decreto, Resolução e outros documentos normativos, de caráter geral e de compleição ius cogens veiculam execução (= efeitos jurídicos) direta e in continenti.

(...)

Nesse sentido, a lição de Hely Lopes Meireles:

Responsabilidade por atos legislativos. Para os atos administrativos, já vimos que a regra constitucional é a responsabilidade objetiva da Administração, mas quanto aos atos legislativos e judiciais a Fazenda Pública só responde mediante a comprovação de culpa manifesta na sua expedição, de maneira ilegítima e lesiva. O ato legislativo típico, que é a lei, dificilmente poderá causar prejuízo indenizável ao particular, porque, como norma abstrata e geral, atua sobre toda a coletividade, em nome da soberania do Estado, que, internamente, se expressa no domínio eminente sobre todas as pessoas e bens existentes no território nacional. Como a reparação civil do Poder Público visa restabelecer o equilíbrio rompido com o dano causado individualmente a um ou alguns membros da comunidade, não há falar em indenização da coletividade. Só excepcionalmente poderá uma lei atingir o particular uti singuli, causando-lhe um dano injusto e reparável. Se tal ocorrer, necessário se torna a demonstração cabal da culpa do Estado, através da atuação de seus agentes políticos, mas isto se nos afigura indemonstrável, no regime democrático em que o próprio povo escolhe os seus representantes para o Legislativo. Onde, portanto, o fundamento para a responsabilização da Fazenda Pública, se é a própria coletividade que investe os elaboradores da lei na função legislativa, e nenhuma ação disciplinar têm os demais Poderes sobre agentes políticos? Não encontramos, assim, fundamento jurídico para a responsabilização civil da Fazenda Pública, por danos eventualmente causados por lei, ainda que declarada inconstitucional (...). (Direito Administrativo Brasileiro, 14ª. ed. pp. 556-557 - grifei)

E ainda:

ADMINISTRATIVO. CRUZADOS NOVOS BLOQUEADOS. MP N. 168/90. LEI N. 8.024/90. CORREÇÃO MONETÁRIA. BTNF. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO LEGISLATIVO. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI. NÃO-CABIMENTO.
1. Consolidado está, no âmbito do STJ, o entendimento de que a correção dos saldos bloqueados transferidos ao Bacen deve ser feita com base no BTNF. Precedentes.
2. Apenas se admite a responsabilidade civil por ato legislativo na hipótese de haver sido declarada a inconstitucionalidade de lei pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado.
3. Recurso especial provido.
(STJ, 2ª Turma, REsp 571.645/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, julgado em 21/09/2006, DJ 30/10/2006, p. 265 - grifei)

DIREITO FINANCEIRO E PROCESSUAL CIVIL. CRUZADOS NOVOS BLOQUEADOS E CONVERTIDOS EM CRUZEIROS (PLANO COLLOR), COM A RESPECTIVA TRANSFERÊNCIA PARA O BANCO CENTRAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E MARCO TEMPORAL DE SUA INCIDÊNCIA (LEIS NºS 7730/89 E 8024/90). "DIES A QUO" EM QUE SE CONFIGUROU A RESPONSABILIDADE DO BACEN PELO PAGAMENTO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E SUA LEGITIMIDADE PARA FIGURAR NO PÓLO PASSIVO DA AÇÃO. ATUALIZAÇÃO DA MOEDA E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA. DESCONSIDERAÇÃO, NO JULGAMENTO DO ESPECIAL, DE QUESTÕES CONSTITUCIONAIS E FÁTICAS CUJA APRECIAÇÃO COMPETE A SUPREMA CORTE E AOS TRIBUNAIS ORDINÁRIOS.
Consoante jurisprudência prevalecente na Corte, na esfera do especial, é defeso, ao juiz, apreciar questões (ou princípios) de natureza constitucional (tais como: o bloqueio constitui requisição, confisco, empréstimo compulsório, desapropriação; ou afronta o direito de propriedade, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito ou a irretroatividade da lei), em que se impõe a interpretação (e aplicação ao caso concreto) de normas constitucionais, atividade confinada na competência do Supremo Tribunal Federal. No sistema-jurídico-constitucional brasileiro, o juiz é essencial e substancialmente julgador, função jurisdicional estritamente vinculada à lei encastoando-se do poder do "jus dicere", descabendo-lhe recusar cumprimento à legislação em vigor (salvante se lhe couber declarar-lhe a inconstitucionalidade), sob pena de exautorar princípios fundamentais do direito público nacional. A correção monetária, em nosso direito, está sujeita ao princípio da legalidade estrita, constituindo seu primeiro pressuposto a existência de lei formal que a institua. Se o Estado democrático de direito adotou o princípio do nominalismo monetário, estabelecendo o valor legal da moeda, é juridicamente inadmissível que esta (moeda) tenha, "pari passu", um valor econômico sem autorização legal. Só a lei é o instrumento adequado para instituir a correção monetária. Na hipótese vertente (bloqueio dos cruzados novos), há lei (nº 8024, art. 6º, § 2º), estabelecendo, de forma clara e precisa, a correção monetária dos saldos em caderneta de poupança convertidos em cruzeiros, indicando expressamente o índice de atualização (BTNF), fixando o período sujeito à correção e o marco temporal em que o fator de atualização passaria a incidir (a data do primeiro crédito de rendimento). Qualquer outro índice por mais real que aquele, por mais apropriado, por mais conveniente, não pode ser pretendido (e nem concedido nesta instância), por lhe faltar um requisito inafastável - a base legal. É, pois, antijurídico, na espécie, omitir-se, o julgador, em aplicar a lei e desbordando-se na apreciação dos fatos da causa (sob divisar existência de prejuízo ou possível enriquecimento da parte adversa), enveredar na busca de outro índice que, do ponto de vista econômico, possa ser mais aconselhável do que o preconizado pelo legislador. Se a lei - para caso específico - institui o índice, de atualização, deve o legislador ter sido despertado para que este fosse o mais consentâneo com a realidade nacional e com o interesse público. Transmudar-lhe, é defeso ao Judiciário, ao qual é vedado investir-se na condição de legislador positivo. O legislador não fica obrigado, tendo-se como prevalecente o interesse nacional, em percentualizar o fator de correção (para atender a diversidade de situações e de condições que caracterizam uma dada conjuntura econômico-financeira), em igualdade absoluta com a inflação real. Por mais injusta que possa ser, a correção monetária consiste, apenas, na parcela de inflação reconhecida por lei. A transferência dos saldos em cruzeiros novos não convertidos, não se verificou, "ipso facto", logo após a promulgação da Medida Provisória nº 168/90, mas, tão-só, na data de conversão dos ativos inferiores a cinqüenta mil cruzeiros (art. 6º da Lei nº 8024/90) e que coincidiu com o dia do próximo crédito de rendimento de poupança (art. 9º). É somente a partir desse marco temporal (data do próximo crédito de rendimento) que o Banco Central se tornou responsável pela correção monetária dos saldos (porquanto, só aí, passaram à sua guarda e controle). A edição da Medida Provisória 169/90 se verificou em 16 de março de 1990 e só atuou para o futuro. E como o índice de correção (do período considerado) é calculado com base na media dos preços apurados entre o início da segunda quinzena do mês anterior e o término da primeira quinzena do mês de referência, é evidente que o índice pertinente ao mês de março (1990) foi apurado entre o dia 16 de fevereiro e 15 de março (arts. 10 e 17 da Lei nº 7730/89), e nesse interregno os saldos de poupança se encontravam, ainda, em poder das instituições financeiras depositárias - com o auferimento, por estas, dos frutos e rendimentos - sobre elas recaindo a obrigação de corrigir, não se podendo impingir ao BACEN os ônus da atualização pertinente ao mês de março de 1990. A jurisprudência que sedimentou no STF é no sentido de que, o índice de correção de poupança só não pode ser alterado durante o período de apuração em curso. "In casu", inexiste conflito com o que se assentou na Suprema Corte, dês que, a Medida Provisória de nº 168 é de 16 de março (1990) e o fator de correção deste mês foi apurado integralmente (84,32%), porquanto o instrumento legislativo citado não alcançou o passado. Ainda que se atribua a natureza jurídica do bloqueio dos cruzados como sendo mera prorrogação dos contratos de poupança, inexistiu ilegalidade na correção dos ativos financeiros (poupança) pelo BTNF, porquanto, esse fator de atualização só foi aplicado a partir do primeiro aniversário das cadernetas de poupança (data do depósito dos rendimentos), subseqüente à edição da Medida Provisória nº 168/90. O Estado só responde (em forma de indenização, ao indivíduo prejudicado) por atos legislativos quando inconstitucionais, assim declarados pelo Supremo Tribunal Federal. Recurso provido. Decisão por maioria de votos.
(STJ, 1ª Seçãom, REsp 124.864/PR, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro DEMÓCRITO REINALDO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/1998, DJ 28/09/1998, p. 3 - grifei)

As exceções à regra geral de não responsabilização são: (1) quando o ato normativo não possui as características de generalidade e abstração, configurando lei formal de efeitos concretos (a despeito de ter origem em processo formal legislativo, é, na essência, um ato administrativo, porque tem: (1.1) um interessado ou (1.2) um ou mais destinatários específicos); (2) situações em que o legislador, na própria lei, reconhece a necessidade de indenização quanto ao prejuízo que acarretará aos destinatários, e (3) quando a lei é declarada inconstitucional em sede de controle concentrado, com eficácia erga omnes, pelo Supremo Tribunal Federal, e dela decorre diretamente um dano concreto, ressalvada eventual modulação de efeitos, uma vez que o Estado possui o dever de legislar em conformidade com a Constituição e nos limites por ela estabelecidos.

Ainda que outras exceções sejam admitidas, remanesce a "excepcionalidade" da responsabilidade estatal pela edição de atos normativos, ou seja, quando o exercício da função legislativa provoca lesão excepcionalmente grave (especial e anormal) ou envolve abuso ou desvio de poder.

Pretende, a autora, a responsabilização da União pelos danos decorrentes da observância da Portaria MTE nº 42/2007, expedida pelo Ministério do Trabalho e Emprego e publicada no DOU de 30/03/2007, para regulamentar o § 3º do artigo 71 da Consolidação das Leis do Trabalho.

O ato normativo foi editada, no exercício da competência prevista no artigo 87, parágrafo único, incisos I e II, da Constituição Federal, nos seguintes termos:

Art. 1º O intervalo para repouso ou alimentação de que trata o art. 71 da CLT poderá ser reduzido por convenção ou acordo coletivo de trabalho, devidamente aprovado em assembléia geral, desde que:
I - os empregados não estejam submetidos a regime de trabalho prorrogado; e
II - o estabelecimento empregador atenda às exigências concernentes à organização dos refeitórios e demais normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho.

Art. 2º A convenção ou acordo coletivo deverá conter cláusula que especifique as condições de repouso e alimentação que serão garantidas aos empregados, vedada a indenização ou supressão total do período.

Art. 3º A Fiscalização do Trabalho, a qualquer tempo, verificará in loco as condições em que o trabalho é exercido, principalmente sob o aspecto da segurança e saúde no trabalho e adotará as medidas legais pertinentes a cada situação encontrada.

Art. 4º O descumprimento das condições estabelecidas no art. 1º , bem como de quaisquer outras adicionais estabelecidas na convenção ou acordo coletivo, ensejará a suspensão da redução do intervalo até a devida regularização.

Posteriormente, houve a edição da Portaria MTE n.º 1.095/2010 (DOU de 20/05/2010), que disciplinou a matéria, submetendo a redução do intervalo intrajornada à prévia autorização pelo Poder Público.

Em 2012, o eg. Tribunal Superior do Trabalho consolidou o entendimento no sentido da invalidade da cláusula de norma coletiva que contempla a redução do intervalo intrajornada, editando o enunciado da súmula n.º 437:

Súmula nº 437 do TST

INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 307, 342, 354, 380 e 381 da SBDI-1) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I - Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não-concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração.

II - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva.

III - Possui natureza salarial a parcela prevista no art. 71, § 4º, da CLT, com redação introduzida pela Lei nº 8.923, de 27 de julho de 1994, quando não concedido ou reduzido pelo empregador o intervalo mínimo intrajornada para repouso e alimentação, repercutindo, assim, no cálculo de outras parcelas salariais.

IV - Ultrapassada habitualmente a jornada de seis horas de trabalho, é devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, obrigando o empregador a remunerar o período para descanso e alimentação não usufruído como extra, acrescido do respectivo adicional, na forma prevista no art. 71, caput e § 4º da CLT. (grifei)

A autora alega ter sido "induzida em erro" pelo ato administrativo editado pelo órgão público, daí exsurgindo o direito ao ressarcimento pela União dos valores despendidos, em virtude de condenações impostas pela Justiça do Trabalho, por ter adotado o modus operandi previsto na Portaria n.º 42/2007 do MTE.

No que tange à legalidade da Portaria (já revogada), afigura-se despicienda qualquer deliberação específica deste Juízo acerca da questão, ante o pronunciamento da Justiça do Trabalho acerca do tema.

No tocante à responsabilização estatal pelos danos suportados pela autora, não se vislumbra hipótese que a justifique, porquanto o ato normativo impugnado ostenta as características de abstração, generalidade e impessoalidade, e foi editado pela autoridade administrativa competente, com base em interpretação específica da norma legal (artigo 71, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho).

A circunstância de a diretriz ali estabelecida não ter sido endossada pelo Poder Judiciário não gera, por si só, o dever de indenizar os danos sofridos por quem observou a norma infralegal, porque, a despeito do reconhecimento judicial de sua contrariedade ao artigo 71 da Consolidação das Leis do Trabalho e ao artigo 7º, inciso XXII, da Constituição Federal, em casos concretos (hipótese que não se confunde com inconstitucionalidade declarada em sede concentrada), ao fundamento de que ambos veiculam norma de ordem pública infenso à negociação coletiva, não resta configurado desvio ou abuso do poder regulamentar (vale dizer, exercício ilegal e abusivo de atos de execução e de regulamentos vinculados), a ensejar a pretendida responsabilização.

Os prejuízos financeiros decorrentes de condenações impostas pela Justiça Laboral são inerentes ao risco da atividade econômica desempenhada pela empresa, não gerando a decisão judicial em si o dever da União de indenizá-los. A responsabilidade objetiva do Estado por atos jurisdicionais só é admitida nos casos de erro judiciário e prisão além do tempo fixado na sentença (artigos 5º, inciso LXXV, e 37, § 6º, da Constituição Federal) e em hipóteses expressamente previstas em lei (p.ex. artigo 133 do CPC/1973 e artigo 143 do CPC/2015).

Observe-se, ainda, que a Portaria (n.º 42/2007) que teria gerado os danos materiais que a autora pretende ver ressarcidos - ato normativo de efeito imediato - foi revogada em 19/05/2010 (pela Portaria MTE n.º 1.095), tendo sido ajuizada a ação somente em 18/12/2015, mais de cinco anos após, não tendo as condenações judiciais posteriores àquela data o condão de gerar o dever de reparação do ente estatal.

Para ilustrar esse posicionamento, cite-se, por analogia:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. ALTERAÇÃO DE ALÍQUOTAS. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL.DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA. INDÚSTRIA NACIONAL. IMPACTO ECONÔMICO-FINANCEIRO. RISCO DA ATIVIDADE. DIREITO À MANUTENÇÃO DO STATUS QUO ANTE. INEXISTÊNCIA. 1. É inviável o conhecimento do recurso especial pela alínea "c" do permissivo constitucional quando a divergência não é demonstrada nos termos exigidos pela legislação de regência. 2. Não se verifica o dever do Estado de indenizar eventuais prejuízos financeiros do setor privado decorrentes da alteração de política econômico-tributária, no caso de o ente público não ter se comprometido, formal e previamente, por meio de determinado planejamento específico. 3. Com finalidade extrafiscal, a Portaria MF n. 492, de 14 de setembro de 1994, ao diminuir para 20% a alíquota do imposto de importação para os produtos nela relacionados, fê-lo em conformidade com o art. 3º da Lei n. 3.244/1957 e com o DL n. 2.162/1984, razão pela qual não há falar em quebra do princípio da confiança. 4. O impacto econômico-financeiro sobre a produção e a comercialização de mercadorias pelas sociedades empresárias causado pela alteração da alíquota de tributos decorre do risco da atividade próprio da álea econômica de cada ramo produtivo. 5. Inexistência de direito subjetivo da recorrente, quanto à manutenção da alíquota do imposto de importação (status quo ante), apto a ensejar o dever de indenizar. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido. (STJ, 1ª Turma, REsp 1.492.832/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, julgado em 04/09/2018, DJe 01/10/2018 - grifei)

Com o provimento da apelação da União, resta prejudicada a análise do recurso adesivo da autora.

Invertidos os ônus sucumbenciais, fixo os honorários advocatícios devidos à ré em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, inaplicável a majoração recursal prevista no § 11 do art. 85 do CPC (STJ, AgInt no AREsp nº 829.107).

Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da União, prejudicado o recurso adesivo da autora.



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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005185-43.2015.4.04.7215/SC

RELATOR: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

APELANTE: ZM SA (AUTOR)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

administrativo E constitucional. responsabilidade civil do estado por ato legislativo. PORTARIA editada pelo Ministério do Trabalho e emprego. CONDENAÇÕES DA EMPRESA NA ESFERA TRABALHISTA. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO.

1. Por força de expressa norma constitucional (artigo 37, § 6º, da Constituição Federal), a responsabilidade estatal prescinde de comprovação da existência de dolo ou culpa do agente, bastando a demonstração do nexo de causalidade entre o dano (patrimonial ou extrapatrimonial) e a conduta, o qual é afastado quando há culpa exclusiva da vítima ou terceiro ou, ainda, em caso fortuito ou força maior. Não obstante, em relação à edição de ato legislativo, a responsabilidade do Estado é, de regra, afastada, pois a norma de caráter genérico e abstrato torna sua aplicação revestida de regularidade e indistinção a todas as pessoas. Com efeito, todos sofrem restrições ou recebem benefícios com essa atuação estatal (geral e abstrata). Entendimento em contrário implicaria a responsabilidade do legislador por todo e qualquer ato normativo, visto que sempre estabelece direitos, deveres ou restrições.

2. As exceções à regra geral de não responsabilização são: (1) quando o ato normativo não possui as características de generalidade e abstração, configurando lei formal de efeitos concretos (a despeito de ter origem em processo formal legislativo, é, na essência, um ato administrativo, porque tem: (1.1) um interessado ou (1.2) um ou mais destinatários específicos); (2) situações em que o legislador, na própria lei, reconhece a necessidade de indenização quanto ao prejuízo que acarretará aos destinatários, e (3) quando a lei é declarada inconstitucional em sede de controle concentrado, com eficácia erga omnes, pelo Supremo Tribunal Federal, e dela decorre diretamente um dano concreto, ressalvada eventual modulação de efeitos, uma vez que o Estado possui o dever de legislar em conformidade com a Constituição e nos limites por ela estabelecidos. Ainda que outras exceções sejam admitidas, remanesce a "excepcionalidade" da responsabilidade estatal pela edição de atos normativos, ou seja, quando o exercício da função legislativa provoca lesão excepcionalmente grave (especial e anormal) ou envolve abuso ou desvio de poder.

3. Não há se falar em responsabilidade da União pelos danos suportados pela autora, porquanto o ato normativo impugnado ostenta as características de abstração, generalidade e impessoalidade, e foi editado pela autoridade administrativa competente, com base em interpretação específica da norma legal (artigo 71, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho).

4. Os prejuízos financeiros decorrentes de condenações impostas pela Justiça Laboral são inerentes ao risco da atividade econômica desempenhada pela empresa, não gerando a decisão judicial em si o dever da União de indenizá-los. A responsabilidade objetiva do Estado por atos jurisdicionais só é admitida nos casos de erro judiciário e prisão além do tempo fixado na sentença (artigos 5º, inciso LXXV, e 37, § 6º, da Constituição Federal) e em hipóteses expressamente previstas em lei (p.ex. artigo 133 do CPC/1973 e artigo 143 do CPC/2015).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da União, prejudicado o recurso adesivo da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de agosto de 2021.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002710114v6 e do código CRC 35dff178.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 04/08/2021

Apelação Cível Nº 5005185-43.2015.4.04.7215/SC

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

PRESIDENTE: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: Marcelo Henrique Schiavini Salomão por ZM SA

APELANTE: ZM SA (AUTOR)

ADVOGADO: Marcelo Henrique Schiavini Salomão (OAB PR043546)

ADVOGADO: MARIA EUGENIA PADOAN CATTA PRETA (OAB PR055251)

ADVOGADO: Marcelo Henrique Schiavini Salomão (OAB DF035876)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 04/08/2021, na sequência 649, disponibilizada no DE de 23/07/2021.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO, PREJUDICADO O RECURSO ADESIVO DA AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 31/08/2021 04:00:58.

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