Apelação Cível Nº 5030169-73.2023.4.04.7001/PR
RELATOR: Juiz Federal RONY FERREIRA
APELANTE: MARILENA FERNANDES LUZ (IMPETRANTE)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Marilena Fernandes Luz em face do Comandante da 5ª Região Militar do Exército Brasileiro por meio do qual pretende a manutenção do pagamento cumulativo do benefício de pensão especial de ex-combatente do Ministério da Defesa com o pagamento dos benefícios previdenciários de pensão por morte do Regime Próprio de Previdência Social (Ministério da Saúde) e de pensão por morte do Regime Geral de Previdência Social (Instituto Nacional do Seguro Social).
Processado o feito, sobreveio sentença cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, ratifico os termos da decisão interlocutória do evento 08 para, no mérito, denegar a segurança.
Condeno a parte impetrante ao pagamento das custas processuais.
Deixo de condenar as partes ao pagamento de honorários advocatícios, com base no artigo 25 da Lei nº 12.016/2009.
Dou esta sentença por publicada com a sua liberação no sistema. Registrada eletronicamente. Intimem-se.
Apela a impetrante requerendo a reforma da sentença sustentando, em síntese, que os proventos recebidos pelo médico-militar falecido (Leandro Lobão Luz) de aposentadoria por tempo de contribuição no Regime Próprio de Previdência Social e de aposentadoria por idade no Regime Geral de Previdência Social possuía cumulação com o pagamento da pensão especial de ex-combatente por serem provenientes de fatos geradores diversos, por observarem o caráter contributivo para diferentes regimes previdenciários e por serem provenientes do exercício do cargo de médico acumulável na atividade.
Com contrarrazões, vieram os autos.
Em parecer, manifestou-se o Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
A controvérsia dos autos cinge-se à possibilidade da tríplice cumulação de proventos pela impetrante.
A Lei nº 3.765/60 somente permite a cumulação de 2 (dois) benefícios, sendo a cumulação tríplice totalmente inviável.
O E. STF já reafirmou ser indevida a tríplice cumulação:
Recurso extraordinário com agravo. 2. Percepção de provento de aposentadoria cumulado com duas remunerações decorrentes de aprovação em concursos públicos. Anterioridade à EC 20/98. Acumulação tríplice de remunerações e/ou proventos públicos. Impossibilidade. Precedentes. 3. Repercussão geral reconhecida com reafirmação da jurisprudência desta Corte. 4. Recurso extraordinário provido. (ARE 848993 RG, Relator Ministro Gilmar Mendes, Processo Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-056 DIVULG 22-03-2017 PUBLIC 23-03-2017).
Referido recurso fora complementado quando do julgamento dos embargos declaratórios:
Embargos de declaração no recurso extraordinário com agravo. 2. Percepção de provento de aposentadoria cumulado com duas remunerações decorrentes de aprovação em concurso público, antes da EC 20/98. 3. Vedação constitucional à acumulação tríplice de remunerações pela ocupação de cargos públicos mediante concurso. Precedentes. 4. Prazo quinquenal para que a Administração reveja seus próprios atos. Omissão caracterizada. 5. Necessidade de análise da legislação infraconstitucional e do contexto fático probatório dos autos. Impossibilidade. 6. Fundamento autônomo e suficiente para a manutenção do acórdão recorrido. 7. Embargos acolhidos, com efeitos infringentes, para sanar omissão, de modo que seja dado provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão recorrido, apenas na parte em que reconheceu o direito da servidora à acumulação tríplice de vencimentos e proventos, mantendo-se hígido quanto aos demais fundamentos. (ARE 848993 ED, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 24/08/2020, Processo Eletrônico DJe-229 DIVULG 19-09-2020 PUBLIC 17-09-2020)
A respeito da possibilidade de a administração rever seus próprios atos, dispõe o caput do art. 54, da Lei 9.784/99:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
Especificamente no que se refere à concessão inicial de aposentadoria, o Supremo Tribunal Federal, ao examinar o Tema de Repercussão Geral n.º 445, assim decidiu:
Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas. ( RE 636.553 , Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno julgado em 19.2.2020, DJe 26.5.2020).
No julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário do Tema 445, assim dispôs o Ministro Gilmar Mendes:
"(...)
Com essa fundamentação, o Supremo Tribunal Federal definiu que a fixação do prazo de cinco anos se afigura razoável para que as cortes de contas procedam à analise da legalidade dos atos de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, após o qual estes serão considerados definitivamente registrados.
Trata-se de prazo ininterrupto, a ser computado a partir da chegada do processo à respectiva corte de contas – ou, como definido pelo Ministro Roberto Barroso durante o julgamento, um verdadeiro período de “cinco anos tout court”.
Passado esse prazo sem finalização do processo, o ato restará automaticamente estabilizado. Abre-se, a partir daí, a possibilidade de sua revisão, nos termos do art. 54 da Lei 9.873/1999.
(...)"
Infere-se, portanto, que o entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que, decorrido o prazo de cinco anos da chegada do processo na Corte de Contas sem que este tenha sido examinado, considera-se "estabilizado" o ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão e, a partir desse marco, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 54 da Lei 9.784/99.
Importa registrar, contudo, que, quando do julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 839, decidiu a Suprema Corte que "[a]s situações flagrantemente inconstitucionais não devem ser consolidadas pelo transcurso do prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei nº 9.784/99, sob pena de subversão dos princípios, das regras e dos preceitos previstos na Constituição Federal de 1988" (STF, RE 817.338, Rel. Ministro Dias Toffoli).
Ainda, ao julgar o Tema de Repercussão Geral n.º 921, dentre os fundamentos invocados no voto condutor do acórdão, assentou o STF que "é vedada, em qualquer hipótese, a acumulação tríplice de remunerações sejam proventos, sejam vencimentos" (STF, ARE 848.993, Rel. Ministro Gilmar Mendes).
Logo, não se aplica o prazo decadencial do Tema de Repercussão Geral n.º 445 quando verificada a acumulação tríplice de benefício previdenciário, sendo vedada, em qualquer hipótese, a sua percepção.
Nesse sentido os seguintes precedentes:
JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. TEMA 839/STF. INAPLICÁVEL. TEMA 921 DO STF. APLICÁVEL. ACÚMULO TRÍPLICE DE REMUNERAÇÕES. INVIABILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, apenas se permite a acumulação de proventos e vencimentos quando se tratar de cargos, funções, ou empregos acumuláveis na atividade, conforme permitido pela Constituição. 2. Não se admite acúmulo tríplice de proventos, vencimentos ou remunerações, em qualquer hipótese, mesmo que decorrentes de aprovações em concursos públicos anteriores à vigência da EC 20/98. 3. A jurisprudência tem-se posicionado no sentido de que não se opera a decadência do direito da administração pública de rever a acumulação inconstitucional de cargos públicos, principalmente porque os atos inconstitucionais não se convalidam pelo decurso do tempo. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012216-83.2020.4.04.7201, 4ª Turma, Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 02/08/2023)
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESES DE CABIMENTO. ARGUIÇÃO DE DECADÊNCIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA SUSCITADA APENAS EM SEDE DE ACLARATÓRIOS. INOVAÇÃO RECURSAL. INOCORRÊNCIA. ARTIGO 54 DA LEI Nº 9.784/1999. TEMA 839 DO STF (RE 817.338). SITUAÇÃO FLAGRANTEMENTE INCONSTITUCIONAL. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA AFASTADA. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA DECIDIDA. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. (...) 5. Considerando que a aposentadoria da servidora foi concedida em desconformidade com as regras da Constituição Federal, configurando situação flagrantemente inconstitucional, resta afastada a decadência administrativa (art. 54 da Lei nº 9.784/99) para revisar seus proventos, na esteira de decisão vinculante do STF (Tema 839) e de precedentes do STJ. (...) (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5084660-63.2019.4.04.7100, 3ª Turma, Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 08/02/2023)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PENSÃO MILITAR. TRÍPLICE ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS. VEDADA. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. NÃO CONFIGURADA. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. TEMAS 445, 839 E 921 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADEQUAÇÃO. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA PROVIDAS. 1. O STF concluiu o julgamento dos Temas 445 e 921 de Repercussão Geral, firmando as seguintes teses: Tema 445: Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 (cinco) anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas; e Tema 921: É vedada a cumulação tríplice de vencimentos e/ou proventos, ainda que a investidura nos cargos públicos tenha ocorrido anteriormente à EC 20/1998. 2. Ademais, o Pretório Excelso pronunciou-se na ementa de seu Tema 839 especificamente sobre a possibilidade de tríplice acumulação e o afastamento do prazo decadencial sobre situações flagrantemente inconstitucionais. 3. Adequação à jurisprudência vinculante da Corte Constitucional. 4. Apelação e remessa necessária providas. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5013535-98.2020.4.04.7100, 4ª Turma, Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 11/11/2022)
No caso em exame, verifica-se que inexistem informações nos autos sobre o momento em que o processo foi remetido ao TCU. Entretanto, conforme se expôs, não se aplica o prazo decadencial do Tema de Repercussão Geral n.º 445 quando verificada a acumulação tríplice de benefícios previdenciários.
Nesse contexto, sendo vedada a tríplice cumulação de benefícios, deve ser mantida a sentença que denegou a segurança.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5030169-73.2023.4.04.7001/PR
RELATOR: Juiz Federal RONY FERREIRA
APELANTE: MARILENA FERNANDES LUZ (IMPETRANTE)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (INTERESSADO)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PENSÃO MILITAR. TRÍPLICE ACUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. DECADÊNCIA PARA REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. TEMA 445 DO STF. INAPLICABILIDADE.
1. Não se aplica o prazo decadencial do Tema de Repercussão Geral n.º 445 quando verificada a acumulação tríplice de benefício previdenciário, sendo vedada, em qualquer hipótese, a sua percepção.
2. Vedada a tríplice cumulação de benefícios, mantida a sentença que denegou a segurança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 03 de julho de 2024.
Documento eletrônico assinado por RONY FERREIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004500820v6 e do código CRC 20b2274f.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 26/06/2024 A 03/07/2024
Apelação Cível Nº 5030169-73.2023.4.04.7001/PR
RELATOR: Juiz Federal RONY FERREIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS
APELANTE: MARILENA FERNANDES LUZ (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A): ERNANI JOSE PERA JUNIOR (OAB PR036423)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 26/06/2024, às 00:00, a 03/07/2024, às 16:00, na sequência 314, disponibilizada no DE de 17/06/2024.
Certifico que a 12ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 12ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal RONY FERREIRA
Votante: Juiz Federal RONY FERREIRA
Votante: Desembargadora Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
SUZANA ROESSING
Secretária
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