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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE. INDÍCIOS VEEMENTES. CANCELAMENTO DEVIDO. TRF4. 500209...

Data da publicação: 04/07/2020, 01:55:24

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE. INDÍCIOS VEEMENTES. CANCELAMENTO DEVIDO. 1. Há e sempre houve limites para a Administração rever atos de que decorram efeitos favoráveis para o particular, em especial aqueles referentes à concessão de benefício previdenciário. 2. O cancelamento de benefício previdenciário pressupõe devido processo legal, ampla defesa e contraditório. 3. A Administração não pode cancelar um benefício previdenciário com base em simples reapreciação de provas. 4. A Lei 6.309/75 previa em seu artigo 7º que os processos de interesse de beneficiários não poderiam ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo. Assim, em se tratando de benefício deferido sob a égide da Lei 6.309/75, ou seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), caso decorrido o prazo de cinco anos, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo 5. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999. Mesmo nestas situações, todavia, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz das circunstâncias do caso concreto. 6. Com o advento da Lei 9.784/99 (art. 54), foi instituído expressamente prazo decadencial de cinco anos para desfazimento de atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, incluídos os atos de concessão de benefício previdenciário. 7. A MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos para a Previdência Social anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários. 8. Como quando a Medida Provisória 138 entrou em vigor não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99, os prazos que tiveram início sob a égide desta Lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Assim, na prática todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, passaram a observar o prazo decadencial de dez, anos aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada 9. O prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o benefício. 10. Em toda situação na qual se aprecia ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do amparo, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio constitucional da segurança jurídica. 11. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório, pois este se reveste de presunção de legitimidade. 12. No caso concreto, ficou demonstrado, por meio de processo administrativo regular, a irregularidade/ilegalidade na concessão do benefício, bem assim a má-fé do segurado, de modo que correta a redução da renda mensal inicial, devendo ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido por seus próprios fundamentos. (TRF4, AC 5002090-88.2013.4.04.7113, QUINTA TURMA, Relatora MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, juntado aos autos em 29/01/2015)


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002090-88.2013.404.7113/RS
RELATORA
:
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
APELANTE
:
OLIMPIO GHIGGI
ADVOGADO
:
IDALINO MARIO ZANETTE
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE. INDÍCIOS VEEMENTES. CANCELAMENTO DEVIDO.
1. Há e sempre houve limites para a Administração rever atos de que decorram efeitos favoráveis para o particular, em especial aqueles referentes à concessão de benefício previdenciário.
2. O cancelamento de benefício previdenciário pressupõe devido processo legal, ampla defesa e contraditório.
3. A Administração não pode cancelar um benefício previdenciário com base em simples reapreciação de provas.
4. A Lei 6.309/75 previa em seu artigo 7º que os processos de interesse de beneficiários não poderiam ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo. Assim, em se tratando de benefício deferido sob a égide da Lei 6.309/75, ou seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), caso decorrido o prazo de cinco anos, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo
5. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999. Mesmo nestas situações, todavia, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz das circunstâncias do caso concreto.
6. Com o advento da Lei 9.784/99 (art. 54), foi instituído expressamente prazo decadencial de cinco anos para desfazimento de atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, incluídos os atos de concessão de benefício previdenciário.
7. A MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos para a Previdência Social anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários.
8. Como quando a Medida Provisória 138 entrou em vigor não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99, os prazos que tiveram início sob a égide desta Lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Assim, na prática todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, passaram a observar o prazo decadencial de dez, anos aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada
9. O prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o benefício.
10. Em toda situação na qual se aprecia ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do amparo, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio constitucional da segurança jurídica.
11. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório, pois este se reveste de presunção de legitimidade.
12. No caso concreto, ficou demonstrado, por meio de processo administrativo regular, a irregularidade/ilegalidade na concessão do benefício, bem assim a má-fé do segurado, de modo que correta a redução da renda mensal inicial, devendo ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido por seus próprios fundamentos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de janeiro de 2015.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora


Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7289989v2 e, se solicitado, do código CRC 914F193A.
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Data e Hora: 29/01/2015 17:13




APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002090-88.2013.404.7113/RS
RELATORA
:
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
APELANTE
:
OLIMPIO GHIGGI
ADVOGADO
:
IDALINO MARIO ZANETTE
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
OLÍMPIO GHIGGI ajuizou ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em 11/06/2013, objetivando o restabelecimento da renda mensal inicial da sua aposentadoria por tempo de contribuição, afirmando que o INSS revisou o benefício excluindo do tempo de serviço/contribuição o período de 01/03/1995 a 31/08/1995, laborado na empresa Schulz Construções Ltda., por caracterizá-lo como vínculo fictício. Teceu considerações sobre a necessidade de observância do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, defendendo a sua boa-fé e a incidência da preclusão e da decadência do direito de a autarquia revisar o benefício. Fez referências, ainda, ao principio da segurança jurídica e, ao final, pediu a averbação do vínculo excluído como tempo de contribuição.

Sentenciando em 07/07/2014, o MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que foram fixados em R$ 4.000,00, restando suspensa a exigibilidade da condenação em face da gratuidade judiciária concedida.
Irresignada, a parte autora apelou. Em suas razões recursais, arguiu preliminarmente a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, uma vez que não lhe teria sido oportunizada a produção de prova oral. Em caso de não acolhimento da preliminar, requereu o provimento do recurso para que a sentença seja reformada, averbando-se o período de trabalho desenvolvido junto à empresa Schulz Construções Ltda. de 01/03/1995 a 31/08/1995, com o consequente restabelecimento da renda mensal inicial e o cancelamento do débito consignado. Subsidiariamente, postulou seja o período laborado na aludida empresa considerado para fins previdenciários pelo fato de ter havido recolhimentos das contribuições pertinentes, revisando-se o benefício a partir do acréscimo do tempo de serviço/contribuição excluído pela autarquia.

Foram apresentadas contrarrazões.
Oficiado, o Ministério Público Federal se pronunciou.

Subiram os autos para julgamento do recurso interposto.

É o relatório.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora


Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7289987v2 e, se solicitado, do código CRC 58214BE5.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002090-88.2013.404.7113/RS
RELATORA
:
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
APELANTE
:
OLIMPIO GHIGGI
ADVOGADO
:
IDALINO MARIO ZANETTE
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
VOTO
No presente processo discute-se sobre revisão de ato praticado pelo INSS, do qual decorreram efeitos favoráveis para o destinatário.

A questão comporta várias indagações acerca dos limites para a revisão administrativa de ato do qual resultem efeitos favoráveis para o segurado. Assim, necessária análise pontual das questões de direito relevantes envolvidas.

Não existe dúvida de que depois de deferido um benefício ou reconhecido um direito o INSS pode, em princípio, rever a situação quando restar configurada ilicitude. Essa possibilidade há muito é reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, e restou consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (art. 43 da Lei 9.784/99 e art. 103-A, da Lei 8.213/91, introduzido pela MP 138/03).

Existem, todavia, limites para a revisão, por parte do INSS, dos atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.

DA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO

Primeiramente deve ser registrado que o cancelamento de qualquer ato desta natureza pressupõe a instauração de procedimento específico, com notificação do interessado, oportunizando-se ainda que ele produza provas e exerça plenamente seu direito de defesa. Inviável, assim, o cancelamento sumário, pois deve ser observado o que dispõe o artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. SUM-160 TFR.
É ilegal a suspensão unilateral de benefício previdenciário sem a realização de regular procedimento administrativo, que oportunize ao segurado o contraditório e ampla defesa, em observância ao princípio do devido processo legal. Apelação Improvida.
(AC 9404394726. 6ª Turma do TRF4. Rel. João Surreaux chagas)

DA REAVALIAÇÃO DA PROVA - A "COISA JULGADA ADMINISTRATIVA"

Há de se registrar ainda que a Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado.

Com efeito, não havendo prova de ilegalidade, não é dado à Administração simplesmente reavaliar a situação, voltando atrás quanto à sua manifestação, porquanto caracterizada em tal situação a denominada "coisa julgada administrativa" ou preclusão das vias de impugnação interna.

A esse respeito, ensina Hely Lopes Meirelles:

"(...) a denominada coisa julgada administrativa, que, na verdade, é apenas uma preclusão de efeitos internos, não tem o alcance da coisa julgada judicial, porque o ato jurisdicional da Administração não deixa de ser um simples ato administrativo decisório, sem a força conclusiva do ato jurisdicional do Poder Judiciário.
(...)
Realmente, o que ocorre nas decisões administrativas finais é, apenas, preclusão administrativa, para a estabilidade das decisões entre as partes. Por isso, não atinge nem afeta situações ou direitos de terceiros, mas permanece imodificável entre a Administração e o administrado destinatário da decisão interna do Poder Público. Essa imodificabilidade não é efeito da coisa julgada administrativa, mas é conseqüência da preclusão das vias de impugnação interna (recursos administrativos) dos atos decisórios da própria Administração. Exauridos os meios de impugnação administrativa, torna-se irretratável, administrativa mente, a última decisão (...)."
(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 24 ed. São Paulo: Malheiros. 1999, p. 612)

Nessa linha, quando não há prova de ilegalidade que possa justificar a anulação do ato pela Administração, mas tão-somente mudança de critério interpretativo, ou mesmo reavaliação da prova, não se mostra possível o desfazimento do ato administrativo. E pouco importa, nesse caso, o tempo decorrido entre a data da concessão do benefício e a revisão administrativa promovida pela autarquia.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RESTABELECIMENTO. IRREGULARIDADES. INEXISTÊNCIA.
- O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa .
(AC 533693. Processo: 200204010468271. 5ª Turma. Rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz)

Como bem salientou o Desembargador Federal Dr. Luiz Carlos de Castro Lugon por ocasião da análise do Agravo de Instrumento nº 2000.04.01.105967-9/SC, o reconhecimento de tempo de serviço pelo INSS (e bem assim de direito ao benefício, acrescente-se) implica a constituição de situação jurídica que se incorpora patrimônio jurídico do segurado. Colhe-se do voto o seguinte excerto:

"Ora, a averbação de tempo de serviço é ato que traduz o reconhecimento pela Administração de uma situação fática, de um direito adquirido incorporado ao patrimônio jurídico do trabalhador. É a declaração de relação de direito já constituída. Desta forma, não há se pretender a submissão da eficácia do ato de averbação a novas normas, como aquela, nitidamente ilegal, contida na OS 590/97, que aliás se põe em confronto com a jurisprudência estabelecida "una voce" nesta Casa. Neste sentir, o magistério de Hely Lopes Meirelles: ´Observamos, neste ponto, que a mudança de interpretação da norma ou da orientação administrativa não autoriza a anulação dos atos anteriormente praticados, pois tal circunstância não caracteriza ilegalidade, mas simples alteração de critério da Administração incapaz de invalidar situações regularmente constituídas".

A "coisa julgada administrativa", é verdade, não se equipara à coisa julgada propriamente dita, pois despida de definitividade. De qualquer sorte, constitui óbice ao desfazimento do ato por parte da autoridade administrativa ao argumento de mera reavaliação de situação já apreciada anteriormente.

DOS EFEITOS DO TEMPO

Assim como não se admite o desfazimento de ato no qual reconhecido direito do segurado em razão de simples reavaliação, também o tempo tem influência significativa na possibilidade de atuação do INSS em casos que tais.

Devem, pois, ser apreciados os efeitos do tempo para fins de consolidação da situação.

DOS EFEITOS DO TEMPO - SITUAÇÕES CONSTITUÍDAS SOB A ÉGIDE DA LEI 6.309/75

Sob a égide da legislação anterior à atual Lei de Benefícios (Lei 8.213/91), assim estabelecia o artigo 7º da Lei 6.309, de 15.12.75 (que só foi revogada pela Lei 8.422, de 13.05.92, publicada no DOU de 14/05/92):

Art. 7º Os processos de interesse de beneficiários e demais contribuintes não poderão ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.

Pertinente referir igualmente o artigo 14 do Decreto-Lei 72, de 21.11.66 (na redação dada pela Lei 5.890, de 08.06.73) eis que tem relação com a matéria:

Art. 14. Compete às Turmas do Conselho de Recursos da Previdência Social julgar os recursos das decisões das Juntas de Recursos da Previdência Social.
§ 1º Quando o Instituto Nacional de Previdência Social, na revisão de benefícios, concluir pela sua ilegalidade, promoverá a sua suspensão e submeterá o processo ao Conselho de Recursos da Previdência Social, desde que haja decisão originária de Junta.
§ 2º Na hipótese de suspensão do benefício já concedido, e que não tenha sido objeto de recurso, o Instituto Nacional de Previdência Social abrirá ao interessado o prazo para recurso à Junta de Recursos da Previdência Social.

Como resultado do estabelecido nos artigos 7º da Lei 6.309, de 15.12.75 e 14 do Decreto-Lei 72, de 21.11.66, assim dispôs a CLPS (Decreto 89.312, de 22.01.84 (CLPS):

Art. 206. Quando o INPS, na revisão do benefício, conclui pela sua ilegalidade, deve promover sua suspensão.
§ 1º Se trata de benefício já concedido que não foi objeto de recurso, o INPS abre prazo ao interessado para recorrer à JRPS.
§ 2º Se já existe decisão da JRPS, o processo é submetido ao CRPS.

Art. 207. O processo de interesse de beneficiário ou empresa não pode ser revisto após 5 (cinco) anos contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.

Já o Decreto 83.080, de 24.01.79 (antigo Regulamento de Benefícios da Previdência Social) estabelecia em seus artigos 382 e 383:

Art. 382. Quando o INPS, ao rever a concessão do benefício, concluir pela sua ilegalidade, deve promover a sua suspensão e, se houver decisão originária de JRPS, submeter o processo ao CRPS.
Parágrafo único. No caso de revisão de benefício já concedido que não tenha sido objeto de recurso, o INPS deve abrir ao beneficiário prazo para recorrer a JRPS.

Art. 383. Ressalvada a hipótese do artigo 382, o processo de interesse de beneficiário não pode ser revisto após 5 (cinco) anos contados da sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.

Como se percebe, no caso específico do benefício previdenciário existia até 14 de maio de 1992 (data da publicação da Lei 8.422, de 13.05.92, que revogou em seu artigo 22 a Lei 6.309/75), prazo expressamente previsto para a Administração rever seus atos, ressalvados obviamente os casos de fraude, como a propósito já consignado em precedente do Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIARIO - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - REVISÃO - PRESCRIÇÃO - SUSPENSÃO - ART. 207, DEC. 89312/84 - SÚMULA 473 DO STF.
1 - NA HIPÓTESE DE SUSPENSÃO DE BENEFICIO PREVIDENCIÁRIO OBTIDO MEDIANTE FRAUDE, NÃO SE APLICA O PRAZO PRESCRICIONAL QÜINQÜENAL PREVISTO NO ART. 207 DO DEC. 89312/84, DEVENDO, INCIDIR, NA ESPÉCIE, A SÚMULA 473 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EIS QUE ATO NULO NÃO PRODUZ EFEITOS.
2 - SERIA ESDRÚXULA A HIPÓTESE DE SE CONSIDERAR OCORRIDA A PRESCRIÇÃO, IMPEDINDO A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE REVER O PROCESSO DE APOSENTADORIA NOS MOLDES EM TELA E, MESMO ASSIM, ENTENDER VIÁVEL A "PERSECUTIO CRIMINIS" DO PRETENSO FRAUDADOR.
3 - RECURSO NÃO CONHECIDO.
(STJ. 6ª Turma. REsp 78703. Rel. Min. Anselmo Santiago. .Julgado em 15/05/98)

Assim, em se tratando de ato praticado sob a égide da Lei 6.309/75, ou seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), uma vez decorrido o prazo de cinco anos, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo.

DOS EFEITOS DO TEMPO - SITUAÇÕES CONSTITUÍDAS NO PERÍODO ENTRE A REVOGAÇÃO DA LEI 6.309/75 E O ADVENTO DA LEI 9.784/99

A partir da revogação da lei 6.309/75 ocorreu um vácuo legal, que somente foi suprido com o advento da Lei 9.784, de 29/01/99 (publicada no DOU de 01/02/99), a qual dispôs em seus artigos 53 e 54:

Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.

Tenho entendimento de que o advento do artigo 54 da Lei 9.784/99 e posteriormente do artigo 103-A da Lei 8.213/91 (introduzido pela MP 138/03, depois convertida na Lei 10.839/04), prestaram-se somente para consagrar o que já estabelecia anteriormente a legislação previdenciária e, ademais, já era defendido pela doutrina administrativista.

Com efeito, a doutrina havia muito já preconizava que o desfazimento de atos administrativos, mesmos daqueles viciados, ressalvados os casos de fraude, não ficava ao alvedrio da autoridade administrativa por período indeterminado, até por aplicação analógica do disposto no Decreto 20.910 de 06/01/1932. Segundo essa corrente deve haver um limite temporal para a Administração anular atos administrativos, até em respeito ao princípio da segurança jurídica, uma vez que o direito busca acima de tudo a pacificação social.

Exemplo disso é a manifestação de Diógenes Gasparini, que, por sinal, faz menção a opiniões de outros doutrinadores:

Nada justifica a possibilidade de um ato administrativo vir a ser declarado inválido depois de um longo tempo de sua edição. A entender-se isso factível, estar-se-ia pondo em risco a necessária estabilidade das relações jurídicas após certo tempo de vigência. Destarte, decorrido um determinado prazo, o ato, mesmo que inválido, firma-se, estabiliza-se, não podendo mais ser invalidado pela Administração Pública ou anulado pelo Judiciário. Nesse sentido é a lição de Clenício da Silva Duarte, ao afirmar que as situações irregulares consolidam-se com o decurso do tempo, não sendo mais passíveis de qualquer retificação, seja para melhor, seja para pior (RDA, 116:368). Também, a esse respeito, diz Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo, cit. p. 189) que a prescrição administrativa e a judicial impedem a anulação do ato no âmbito da Administração ou do Poder Judiciário. Ademais, continua esse autor, justifica-se essa conduta porque o interesse na estabilidade das relações jurídicas existentes entre os administrados e a Administração, ou entre esta e seus servidores, é também de interesse público, tão relevante como os demais.
(GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 1995. P. 100/101)

Não se pode deixar de considerar, todavia, que o Superior Tribunal de Justiça, após alguma vacilação, firmou entendimento no sentido de que antes da Lei 9.784/99 não havia prazo para a Administração Pública desfazer atos dos quais decorressem efeitos favoráveis para os beneficiários. Seguem precedentes explicitando o entendimento daquela Corte:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ART. 54 DA LEI 9.784/99. IRRETROATIVIDADE. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. NÃO-OCORRÊNCIA. LEGALIDADE DO ATO QUE CANCELOU O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
I - A Eg. Corte Especial deste Tribunal pacificou entendimento no sentido de que, anteriormente ao advento da Lei nº 9.784/99, a Administração podia rever, a qualquer tempo, seus próprios atos quando eivados de nulidade, nos moldes como disposto nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal. Restou ainda consignado, que o prazo previsto na Lei nº 9.784/99 somente poderia ser contado a partir de janeiro de 1999, sob pena de se conceder efeito retroativo à referida Lei.
II - Agravo interno desprovido.
(AgRg no AG 774612. 5ª Turma do STJ. Rel. Min. Gilson Dipp. Data do Julgamento: 03/10/2006

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO DE ATO CONCESSÓRIO DE APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA. NÃO-OCORRÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. IMPOSSIBILIDADE DE SE CONCEDER EFEITO RETROATIVO. APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. APOSENTADORIA POR IDADE PELO INSS. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. SEGURADO ESPECIAL. CONDIÇÃO INEXISTENTE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
1. O art. 69, § 1º, da Lei 8.212/91 não impõe, como requisito para a revisão do benefício previdenciário, a existência de fraude ou simulação dolosa por parte do beneficiário, bastando, tão-somente, que haja indício de irregularidade em sua concessão e a abertura de processo administrativo, no qual o beneficiário será notificado "para apresentar defesa, provas ou documentos de que dispuser, no prazo de trinta dias".
2. A Corte Especial deste Tribunal firmou compreensão segundo a qual os atos administrativos praticados anteriormente ao advento da Lei 9.784/99 também estão sujeitos ao prazo decadencial qüinqüenal de que trata seu art. 54. Todavia, nesses casos, tem-se como termo a quo a entrada em vigor de referido diploma legal.
3.......
(REsp 521735. 5ª Turma do STJ. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. Data do Julgamento: 28/11/2006)

Como visto, segundo o Superior Tribunal de Justiça, para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 (e bem assim para os atos de reconhecimento de tempo de serviço praticados no referido período) o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999.

Considerando a posição segura do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria, e ainda que ressalvando a opinião acima externada, inviável se afirme que mesmo para os atos deferitórios praticados entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99 deva também ser considerado o prazo decadencial de cinco anos.

Não se pode ignorar, todavia, que ainda que adotada esta posição, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz do caso concreto, como se demonstrará adiante.

DOS EFEITOS DO TEMPO - A LEI 9.784/99 E A MEDIDA PROVISÓRIA 138/03 (DEPOIS CONVERTIDA NA LEI 10.839/04)

O artigo 54 da Lei 9.784/99, já mencionado anteriormente, assim estabeleceu:

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.

A disciplina da Lei 9.784/99 foi clara: ressalvados os casos de comprovada má-fé, uma vez decorridos cinco anos sem que o segurado tenha sido notificado do procedimento instaurado para revisar o ato administrativo que implicou reconhecimento de direito em seu favor, resta consumada a decadência.

Cumpre salientar que uma vez consumada a decadência, pouco importa a eventual ilegalidade do ato. A decadência existe exatamente para tornar definitivas situações antigas, pouco importando que ilegais, ressalvados, obviamente, os casos de fraude, pois estes podem ser revistos, em princípio, a qualquer tempo.

Observe-se que o prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o ato.

A despeito do que estabeleceu a Lei 9.784/99, não se pode perder de vista que em 2003 veio a lume a MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), a qual instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:

Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004)
§1ª No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.

Como a Medida Provisória 138 entrou em vigor em 20/11/03 (quando publicada no DOU), percebe-se que na ocasião ainda não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99.

Como o prazo decadencial foi ampliado de cinco para dez anos, há necessidade, assim, de se analisar questão de direito intertemporal, que diz com os efeitos da lei nova (art. 103-A da Lei 8.213/91) para os prazos de decadência que estavam em curso nos termos da norma anterior (art. 54 da Lei 9.784/99).

O Supremo Tribunal Federal, em precedentes antigos, tratando de hipótese de diminuição de prazo, firmou entendimento de que se o restante do prazo de decadência fixado na lei anterior for superior ao novo prazo estabelecido pela lei nova, despreza-se o período já transcorrido para levar-se em conta, exclusivamente, o prazo da lei nova, a partir do início de sua vigência (v. RE 97082/SC. Rel. Min. OSCAR CORRÊA, julgamento em 11/10/1983, 1ª Turma; AR 1025/PR, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE, julgamento em 18/02/1981, Tribunal Pleno; RE 92294/GO, Rel. Min. THOMPSON FLORES, julgamento em 18/03/1980, 1ª Turma; AR 9053/DF, Rel. Min. MOREIRA ALVES, julgamento em 22/02/1978, Tribunal Pleno). Assentou, pois, a Corte Suprema, o princípio de que o prazo da lei nova, se menor, incide nas situações pendentes.

O Código Civil de 2002, que alterou diversos prazos de prescrição e decadência previstos em seu antecessor (de 1916), dispôs sobre a questão de direito intertemporal, estabelecendo em seu artigo 2.028:

Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

O Código Civil de 2002, percebe-se, estabeleceu o princípio de que no caso de redução, o prazo da lei nova incide sobre as situações pendentes, salvo se já decorrido mais da metade do tempo estabelecido pela lei anterior. Os prazos maiores do Código revogado, portanto, somente prevalecem excepcionalmente.

Tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Código Civil de 2002, como verifica-se, trataram apenas de hipóteses de redução do prazo de decadência. Indicaram, todavia, que os prazos prescricionais ou decadenciais da lei nova em princípio são aplicáveis às situações apanhadas pela mudança legislativa. Possível a conclusão, assim, de que promovendo a lei nova o aumento do prazo decadencial, e desde que não tenha ele ainda se consumado sob a égide da norma revogada, aplica-se o novo prazo, com aproveitamento do tempo já decorrido.

Esta, a propósito, a opinião de Câmara Leal, ao tratar do prazo de prescrição:

Omitiu, porém, nosso legislador as regras de aplicação da nova lei às prescrições em curso, afastando-se da lei alemã, que as estabelece, e deixando, portanto, a cargo da doutrina a sua fixação.
(...)
67. Na carência de normas especiais, parece-nos que devemos adotar o critério germânico, dada a filiação de nosso Código à orientação alemã, consagrando o princípio da retroatividade da lei prescricional. E, assim, formularemos as seguintes regras, inspiradas na legislação teutônica:
1ª - Estabelecendo a nova lei um prazo mais curto de prescrição, essa começará a correr da data da nova lei, salvo se a prescrição iniciada na vigência da lei antiga viesse a completar-se em menos tempo, segundo essa lei, que, nesse caso, continuaria a regê-la, relativamente ao prazo.
2ª - Estabelecendo a nova lei um prazo mais longo de prescrição, essa obedecerá a esse novo prazo, contando-se, porém, para integrá-lo, o tempo já decorrido na vigência da lei antiga.
3ª - O início, suspensão ou interrupção da prescrição são regidos pela lei vigente ao tempo em que se verificarem.
(LEAL, Antônio Luís da Câmara. Da prescrição e decadência. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, p. 102-104).

De se concluir, portanto, que os prazos que tiveram início sob a égide da Lei 9.784/99, foram acrescidos a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Em termos mais claros: o prazo decadencial passou a ser de dez anos, aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada. Na prática, todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, portanto, passaram a observar o prazo decadencial de dez anos, pois a MP 138/03 entrou em vigor antes de decorridos cinco anos a contar do advento daquela lei.

DOS EFEITOS DO TEMPO - SITUAÇÕES CONSTITUÍDAS APÓS O ADVENTO DA MEDIDA PROVISÓRIA 138/03, DEPOIS CONVERTIDA NA LEI 10.839/04

Como já esclarecido, com o advento da Medida Provisória 138, de 19.11.03 (publicada no DOU de 20/11/03), a questão da decadência voltou a ter disciplina específica no Direito Previdenciário, tendo sido estabelecido prazo decadencial de dez anos, como se percebe da transcrição acima feita.

Está claro, assim, que para os atos praticados a partir de 20/11/03, o prazo decadencial para desfazimento passou a ser de dez anos.

DOS EFEITOS DO TEMPO - O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

Há necessidade, ainda, de se consignar a importância do princípio da segurança jurídica - pois uma das funções precípuas do Direito é a pacificação social - para a análise da ação da administração no sentido de desfazer ato de concessão de benefício previdenciário.

Esta ponderação tem importância principalmente para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99, pois, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça já referido, não existe, nestes casos, decadência estabelecida em detrimento da Administração. Deve ser considerada (esta ponderação), entrementes, para todos os casos de concessão de benefício, independentemente da data em que ocorridos, já que o princípio referido tem status constitucional e deve ser sempre observado.

E nesse particular o Supremo Tribunal Federal já assentou a existência de limites para a ação da Administração no sentido de desfazer atos administrativos, independentemente de previsão legal, como se depreende dos seguintes precedentes:

1. Mandado de Segurança. 2. Cancelamento de pensão especial pelo Tribunal de Contas da União. Ausência de comprovação da adoção por instrumento jurídico adequado. Pensão concedida há vinte anos. 3. Direito de defesa ampliado com a Constituição de 1988. Âmbito de proteção que contempla todos os processos, judiciais ou administrativos, e não se resume a um simples direito de manifestação, no processo. 4. Direito constitucional comparado. Pretensão à tutela jurídica que envolve não só o direito de manifestação e de informação, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. 5. Os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pela Constituição, aplicam-se a todos os procedimentos administrativos. 6. O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação oportuna e eficaz a respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido também em matéria jurídica. 7. Aplicação do principio da segurança jurídica, enquanto subprincípio do Estado de Direito. Possibilidade de revogação de atos administrativos que não se pode estender indefinidamente. Poder anulatório sujeito a prazo razoável. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 8. Distinção entre atuação administrativa que independe da audiência do interessado, e decisão que, unilateralmente, cancela decisão anterior. Incidência da garantia do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal ao processos administrativo. 9. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica. Aplicação nas relações jurídicas de direito público. 10. Mandado de Segurança deferido para determinar observância do princípio do contraditório e da ampla defesa (CF art. 5º LV).
(MS 24.268-0, Tribunal Pleno, Rel. p/ acórdão Ministro Gilmar Mendes, DOU 17-9-2004)

1. Mandado de segurança. 2. Acórdão do Tribunal de Contas da União. Prestação de Contas da Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária - INFRAERO. Emprego Público. Regularização de admissões. 3. Contratações realizadas em conformidade com a legislação vigente à época. Admissões realizadas por processo seletivo sem concurso público, validadas por decisão administrativa e acórdão anterior do TCU. 4. Transcurso de mais de dez anos desde a concessão da liminar no mandado de segurança. 5. Obrigatoriedade da observância do princípio da segurança jurídica enquanto subprincípio do Estado de Direito. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 6. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica e sua aplicação nas relações jurídicas de direito público. 7. Concurso de circunstâncias específicas e excepcionais que revelam: a boa fé dos impetrantes; a realização de processo seletivo rigoroso; a observância do regulamento, da INFRAERO, vigente à época da realização do processo seletivo; a existência de controvérsia, à época das contratações, quanto à exigência, nos termos do art. 37 da Constituição, de concurso público no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista. 8. Circunstâncias que, aliadas ao longo período de tempo transcorrido, afastam a alegada nulidade das contratações dos impetrantes. 9. Mandado de Segurança deferido.
(MS 22.357-0, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU 05-11-2004)

Oportuna a menção, por relacionado com a matéria, ao artigo publicado por Almiro do Couto e Silva na "Revista de Direito Administrativo" nº 237, (Renovar, p. 271-315, Jul/Set;2004) denominado "O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito público brasileiro e o direito da administração pública de anular seus próprios atos administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União [Lei nº 9.784/99". Seguem trechos do mencionado artigo:

54. A regra do art. 54 da Lei nº 9784/99, como normalmente acontece com as regras jurídicas, tem, por certo, vocação prospectiva, isto é, sua aplicação visa ao futuro e não ao passado. Quer isso dizer, portanto, que o prazo de cinco anos fixado naquele preceito, tem seu termo inicial na data em que a Lei nº 9.784/99 começou a viger, até porque a atribuição de eficácia retroativa à norma legal instituidora do prazo de decadência muito possivelmente atingiria situações protegidas pela garantia constitucional dos direitos adquiridos.

Entretanto, a vigência do princípio constitucional da segurança jurídica é bem anterior à Lei nº 9.784/99 e é ele que torna compatível com a Constituição o art. 54 daquele mesmo diploma, quando confrontado com o princípio da legalidade. Na verdade, se inexistisse, como princípio constitucional, o princípio da segurança jurídica, não haveria como justificar, em face do princípio da legalidade, a constitucionalidade do art. 54 da Lei nº 9.784/99, valendo o mesmo raciocínio para as demais regras de decadência ou de prescrição existentes em nosso ordenamento jurídica.

Bem se vê, portanto, que as situações que se constituíram anteriormente à entrada em vigor do art. 54 da Lei nº 9.784/99, devem ser solucionadas à luz do princípio da segurança jurídica, entendido como princípio da proteção à confiança, ponderado juntamente com o princípio da legalidade, exatamente como procedeu o STF no MS 223357/DF. Anteriormente à Lei nº 9.784/99, para os que não reconheciam a existência de prazo prescricional de cinco anos (que em alguns casos era decadencial, como sucedia, por exemplo, com o direito à invalidação de ato administrativo) para as pretensões ou direitos do Poder Público contra os particulares, ficava ao prudente arbítrio do julgador ou do aplicador do direito determinar, diante das peculiaridades do caso concreto, qual a extensão do prazo, após o qual, não ocorrendo má-fé dos destinatárias do ato administrativo, ficaria a Administração Pública inibida de anulá-lo, para, desse modo, assegurar a estabilidade das relações jurídicas com base no princípio da segurança jurídica. Para essas situações, o art. 54 da Lei nº 9.784/99 deu a medida do que seria "prazo razoável" para influir no juízo de precedência do princípio da segurança jurídica sobre o da legalidade, no cotejo ou no balancing test entre esses dois princípios, em face da prolongada inação da Administração Pública no que diz com a exercício do seu poder - (que para nós é um poder-dever) - de autotutela.

55. Entenda-se bem: não se está postulando a atribuição de eficácia retroativa ao prazo do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União. O que estamos afirmando é que essa lei, ao instituir prazo de decadência do direito à invalidação, em regra inspirada no Princípio da segurança jurídica, introduziu no nosso sistema jurídico parâmetro indicador do lapso de tempo que associado a outras circunstâncias, como a boa fé dos destinatários do ato administrativo, estaria a recomendar, após o seu transcurso, a manutenção de ato administrativo inválido.

Contudo, nas hipóteses anteriores ao início da vigência do art. 54 da Lei nº 9.784/99, diante do caso concreto, da situação fática objetivamente considerada e da ponderação dos princípios da legalidade e da proteção à confiança poderá o aplicador desses princípios entender que, malgrado o transcurso de cinco anos, não seria a confiança do destinatário digna de proteção, em virtude da intercorrência de outros fatores, que não se relacionam com a boa fé dos destinatários mas sim, digamos, com o interesse social ou com a relevância de valores jurídicos feridos, entendendo, em conclusão, que o princípio a ser aplicado seria o da legalidade e não o da segurança jurídica.

Cogitando-se, porém da aplicação do art. 54 da Lei nº 9.784/99, já se viu que não há essa ponderação de princípios (que já foi feita pelo legislador), incumbindo ao aplicador tão-somente subsumir a situação fática na regra jurídica - ou o suporte fático real no suporte fático legal - tirando daí a conseqüência jurídica, que será a ocorrência, ou não, da decadência do direito à invalidação.

Aliás, é assim que se procede em outros países, onde - diferentemente do que se passa na França, na Alemanha, em Portugal e, agora no Brasil - o ordenamento jurídico não tem norma que fixe prazo de decadência do direito da Administração Pública de anular seus próprios atos.

57-64. omissis

65. Das reflexões que foram desenvolvidas, tiram-se algumas conclusões principais, as quais podem ser assim arrumadas:

(A) O princípio da segurança jurídica entendido como proteção à confiança, está hoje reconhecido na legislação e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como princípio de valor constitucional, imanente ao princípio do Estado de Direito, e que serve de limite à invalidação, pela Administração Pública dos seus atos administrativos eivados de ilegalidade ou de inconstitucionalidade. Com princípio de natureza constitucional, aplica-se à União Federal, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às entidades que integram as respectivas Administrações Indiretas.

(B) No plano da União Federal, a Lei do Processo Administrativo (Lei nº 9.784/99), no seu art. 54, consigna regra, inspirada no princípio da segurança jurídica que fixa em cinco anos o prazo decadencial para a Administração Pública exercer o direito de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé dos beneficiários. Tratando-se de regra, a ponderação entre os princípios da legalidade e da segurança jurídica já foi feita pelo legislador, competindo ao aplicador apenas verificar se os pressupostos que integram o preceito estão, ou não, concretamente verificados.

(C) O prazo do art. 54 da Lei nº 9.784/99 é de natureza decadencial e não prescricional. Sendo assim, não é ele, em princípio, suscetível de interrupção ou de suspensão. Apenas quanto aos atos nulos - não na acepção que dá a esse qualificativo a doutrina do Direito Privado, mas na conceituação que lhe empresta o Direito Administrativo dos países europeus mais avançados e o Direito Administrativo da União Européia e que de algum modo, também já encontramos incipientemente esboçada na Lei da Ação Popular - apenas quanto aos atos nulos não haveria falar em decadência ou em prescrição, uma vez que incumbe ao juiz decretar-lhes de ofício a invalidade. Note-se, porém, que nulos apenas serão aqueles atos administrativos, inconstitucionais ou ilegais, marcados por vícios ou deficiências gravíssimas, desde logo reconhecíveis pelo homem comum, e que agridem em grau superlativo a ordem jurídica, tal como transparece nos exemplos da licença de funcionamento de uma casa de prostituição infantil ou da aposentadoria, como servidor público, de quem nunca foi servidor público. Não é a hierarquia da norma ferida que, por si só, implica a nulidade, como mostra o acórdão do STF no MS 22357/DF, que aplicou o princípio da segurança jurídica para manter atos administrativos contrários à Constituição. A grande maioria dos atos administrativos, inconstitucionais ou ilegais, não é, pois, composta por atos administrativos nulos, mas sim por atos administrativos simplesmente anuláveis, estando o direito a pleitear-lhe a anulação sujeito, portanto, à decadência.

(D) A boa fé que é exigida para a aplicação do princípio da segurança jurídica ou pelo art. 54 da Lei nº 9.784/99 é a dos destinatários do ato administrativo. Não está em questão a má-fé da Administração Pública ou das autoridades administrativas a menos que estas sejam também destinatárias das medidas ilegais que editaram em seu próprio proveito.

(E) omissis.

(F) Para as situações que se constituíram antes da vigência da Lei nº 9.784/99 não é possível estender-lhe o preceito do art. 54 dessa Lei. A esses casos o que se aplica é o princípio da segurança jurídica devidamente sopesado, nessas hipóteses com outros princípios constitucionais, notadamente com o princípio da legalidade. (...)

Assim, considerando o que foi exposto, é de se concluir que em toda situação na qual se analisa ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do benefício, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio da segurança jurídica.

A posição que se defende, com apoio em precedentes do Supremo Tribunal Federal, registre-se, não vai de encontro ao entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. O que se afirma é que, a despeito de não haver prazo decadencial em seu sentido estrito a considerar, e independentemente do prazo fixado em lei, nada impede que se reconheça o direito à manutenção da situação, com base em fundamento constitucional, em razão das circunstâncias do caso específico.

DA ANÁLISE DA PROVA EM PROCESSOS NOS QUAIS SE APRECIA ATO DE REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO

Há uma última circunstância a ser ponderada.

No que toca à atribuição dos ônus probatórios é sabido que nas ações judiciais nos quais se pretende a concessão de benefício previdenciário ou o reconhecimento de tempo de serviço, cabe ao segurado provar que faz jus ao bem da vida perseguido.

As ações de restabelecimento, todavia, têm como particularidade o fato de que ao segurado já foi deferido administrativamente o que postulava. Vale dizer, o INSS, após examinar a documentação apresentada, entendeu que o segurado tinha direito ao que postulou, por ter preenchido os requisitos necessários. Assim, o ato concessório se reveste de presunção de legitimidade, ou seja, presume-se que os requisitos legais para a obtenção do benefício tenham sido preenchidos.

Diante de tal quadro, caso não comprovada alguma ilegalidade no ato concessório, o cancelamento é indevido. É ao INSS, pois, que toca provar ter sido o benefício indevidamente concedido e, por conseqüência, corretamente cancelado. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE E MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. NOVA VALORAÇÃO DA PROVA. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL.
1. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário, compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório de aposentadoria, pois tal ato se reveste de presunção de legitimidade.
2. O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa .
3. Apelação do INSS e remessa oficial improvidas.
(AC: 200072070021618. 6ª Turma TRF 4. Rel. Des. Fed. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle)

Ora, se a autarquia previdenciária entende ter havido ilegalidade, é seu dever demonstrá-la quantum satis, não podendo simplesmente desconsiderar unilateralmente ato que implicou reconhecimento de direito ao segurado. Isso deve ser realçado nos casos em que alegada ocorrência de fraude, pois ela certamente não se presume.

CONCLUSÕES

Considerando o que foi exposto, podem ser extraídas as seguintes conclusões (não definitivas ou muito menos exaustivas) acerca da matéria:

- Há e sempre houve limites para a Administração rever atos de que decorram efeitos favoráveis para o particular, em especial aqueles referentes à concessão de benefício previdenciário.
- O cancelamento de benefício previdenciário pressupõe devido processo legal, ampla defesa e contraditório.
- A Administração não pode cancelar um benefício previdenciário com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado.
- A Lei 6.309/75 previa em seu artigo 7º que os processos de interesse de beneficiários não poderiam ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo. Assim, em se tratando de benefício deferido sob a égide da Lei 6.309/75, ou seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), caso decorrido o prazo de cinco anos, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo
- Segundo o Superior Tribunal de Justiça (posição em relação a qual guardo ressalvas, como acima explicitado), para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999. Mesmo nestas situações, todavia, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz das circunstâncias do caso concreto.
- Com o advento da Lei 9.784/99 (art. 54), foi instituído expressamente prazo decadencial de cinco anos para desfazimento de atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, incluídos os atos de concessão de benefício previdenciário.
- A MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos para a Previdência Social anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários.
- Como quando a Medida Provisória 138 entrou em vigor não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99, os prazos que tiveram início sob a égide desta Lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Assim, na prática todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, passaram a observar o prazo decadencial de dez anos, aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada.
- O prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o benefício.
- Em toda situação na qual se aprecia ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do amparo, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio constitucional da segurança jurídica.
- Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório, pois este se reveste de presunção de legitimidade

DO CASO CONCRETO

Não obstante os argumentos da parte apelante, a sentença da juíza federal Aline Lazzaron Tedesco apreciou corretamente a controvérsia, descortinando com propriedade a fraude da qual se utilizou o segurado para se reenquadrar em classe superior de salário-base e não ter de permanecer o tempo mínimo necessário em cada interstício, situação que ficou clara a partir dos elementos de convicção contidos na Representação Fiscal para Fins Penais juntada aos autos pela defesa.

Assim, para evitar tautologia, transcrevo o seguinte trecho da fundamentação, adotando-o como razão de decidir:

O autor busca na presente ação restabelecer a RMI e, consequentemente, a renda mensal atual do seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, afastando a decisão administrativa que desconsiderou vínculo empregatício de 01/03/1995 a 31/08/1995.
Relativamente à alegação de decadência, considerando que o presente caso envolve a discussão acerca de ocorrência ou não de má-fé, verifica-se que a prefacial se confunde com o mérito, de forma que será analisada conjuntamente com este.
O INSS excluiu o período acima especificado e procedeu à revisão do cálculo do benefício, após ter apurado em processo administrativo a irregularidade daquele vínculo.
Não verifico qualquer ilegalidade na revisão efetuada pela Autarquia Previdenciária; ao contrário, à Administração Pública é assegurado o direito de anular os seus atos quando eivados de vícios de legalidade, conforme disposto na Lei 9.784/99, em seu artigo 53, abaixo transcrito:
'Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.'
No ponto, cabe referir, como bem lembra Frederico Amado (Direito e Processo Previdenciário Sistematizado, Juspodivm, 4ª ed., 2013, p. 740), que 'em decorrência do dever-poder de autotutela, há previsão no artigo 11, da Lei 10.666/03, para que o Ministério da Previdência Social e o INSS mantenham programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da previdência social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes.'
Assim, o INSS tem o poder-dever de rever os seus atos, dentre eles os de concessão de benefícios, quando verificada qualquer ilegalidade ou irregularidade, como se deu no caso dos autos.
O direito de a Administração Pública anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais já foi inclusive sumulado pelo STF nos enunciados n. 346 e n. 473. Os artigos do Código de Processo Civil acerca do instituto da decadência, invocados pelo requerente, não se prestam a tutelar a situação em concreto. Tendo a fiscalização apurado irregularidade no vínculo integrante do tempo de contribuição do segurado, cabe à Instituição Previdenciária revisar o benefício, em respeito ao princípio da legalidade. Portanto, rejeito a alegação de decadência.
Outrossim, não se trata de nova avaliação do ato administrativo de concessão, a revisão decorreu da constatação de irregularidade em período incluído no cálculo da RMI do segurado, o que gerou o processo realizado pela Autarquia.
Também não procede a arguição de ausência da Ampla Defesa e do Contraditório. Os documentos juntados demonstram que o autor foi devidamente intimado para apresentar defesa, o que fez no processo administrativo (evento 1 - procadm13, fls. 01-02.
Quanto à má-fé do segurado, o procedimento administrativo não deixa dúvidas de que a parte autora, juntamente com a empresa Schulz Construções Ltda., burlaram a legislação previdenciária.
O art. 29 da Lei 8.212/91, antes da alteração da Lei n. 9.876 de 26/11/1999, previa uma escala de classes, com tempo mínimo de permanência em cada uma das dez classes previstas, da seguinte forma:
'Art. 29. O salário-base de que trata o inciso III do art. 28 é determinado conforme a seguinte tabela:
ESCALA DE SALÁRIOS - BASE

CLASSE
SALÁRIO-BASE NÚMERO MÍNIMO DE MESES DE PERMANÊNCIA EM CADA CLASSE (INTERSTÍCIOS) 1 R$ 120,00 12 2 R$ 206,37 12 3 R$ 309,56 24 4 R$ 412,74 24 5 R$ 515,93 36 6 R$ 619,12 48 7 R$ 722,30 48 8 R$ 825,50 60 9 R$ 928,68 60 10 R$ 1.031,87
(Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).
(...)
§ 2º O segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social como facultativo, ou em decorrência de filiação obrigatória cuja atividade seja sujeita a salário-base, será enquadrado na classe inicial da tabela.
§ 3º Os segurados empregado, inclusive o doméstico, e trabalhador avulso, que passarem a exercer, exclusivamente, atividade sujeita a salário-base, poderão enquadrar-se em qualquer classe até a equivalente ou a mais próxima da média aritmética simples dos seus seis últimos salários-de-contribuição, atualizado monetariamente, devendo observar, para acesso às classes seguintes, os interstícios respectivos.
(...)
§ 8º O segurado que deixar de exercer atividade que o incluir como segurado obrigatório do regime Geral de Previdência Social e passar a contribuir como segurado facultativo, para manter essa qualidade, deve enquadrar-se na forma estabelecida na escala de salários-base em qualquer classe, até a equivalente ou a mais próxima da média aritmética simples dos seus seis últimos salários-de-contribuição, atualizados monetariamente.
(...)
§ 10. Não é admitido o pagamento antecipado de contribuição para suprir o interstício entre as classes.
§ 11. Cumprido o interstício, o segurado pode permanecer na classe em que se encontra, mas em nenhuma hipótese isto ensejará o acesso a outra classe que não a imediatamente superior, quando ele desejar progredir na escala.'
Da análise dos documentos, constatou-se que o segurado era filiado ao RGPS (evento 12- CNIS1) e que, antes do vínculo fictício, as contribuições sempre foram feitas dentro da Classe 01 do salário-base (evento1 - Procadm10, fl. 01).
O autor se aposentou no ano de 1994, todavia, pediu e teve o cancelamento do seu benefício, a fim de computar o vínculo na empresa Schulz Construções Ltda.
No período impugnado, que são exatos seis meses (tempo necessário para se reenquadrar em nova classe de salário-base), as contribuições previdenciárias se deram sobre valores próximos ao teto da previdência (evento1 - Procadm10, fl.01).
Após o término do vínculo com a empresa Schulz Construções Ltda., o segurado retornou a categoria de contribuinte individual, e passou então a contribuir sobre o teto da previdência ou valor próximo a ele, já enquadrado na classe 10, o que fez até o pedido de aposentadoria. Tal período de contribuição foi computado no período básico de cálculo, que utilizou os trinta e seis maiores salários de contribuição para chegar ao salário de benefício, de acordo com a legislação da época, gerando assim um benefício em valor próximo ao teto da Previdência, gerando assim um benefício em valor superior ao que, de fato, a parte autora teria direito.
Ou seja, enquanto os demais segurados necessitavam respeitar a escala, contribuindo primeiramente sobre um salário, passando para dois, e assim por diante, a parte autora, por meio de um artifício, ficou vários anos contribuindo sobre o valor mínimo, para então, por meio de uma fraude, passar à escala 09, em claro prejuízo para o sistema previdenciário nacional.
Desse modo, tem-se que o segurado se utilizou do período fictício para poder se reenquadrar em classe superior de salário-base e não ter que permanecer o tempo mínimo necessário em cada interstício, como exigia a legislação da época.
Ressalte-se que a Auditoria do INSS apurou a prática da fraude na mesma empresa com outros segurados, conforme se extrai da Representação Fiscal Para Fins Penais juntada ao feito (Evento 21-PROCADM8, fl. 27), da qual transcrevo o trecho abaixo:
(...). No período de 1991 a 1999, foram feitos 116 (cento e dezesseis) registros na Schulz Construções ltda., sendo que 41 (quarenta e um) deles, ou seja 35%, teriam permanecido na empresa por exatamente seis meses, recebendo como salário, exatamente, o valor correspondente ao teto de contribuição para com o INSS.
Estudando a situação isolada de cada um desses 41 segurados observa-se que, antes deste suposto vínculo, o recolhimento era feito sobre valores mínimos - que seriam a base de cálculo para a concessão da aposentadoria.
Alguns destes contribuintes chegaram a requerer o benefício da aposentadoria que foi deferido, sendo posteriormente cancelados a pedido do titular.
Após os seis meses de suposto registro, esses mesmos segurados seguiram recolhendo como contribuinte individual, por mais 30 (trinta) meses sobre o teto da contribuição, tendo em seguida requerido a aposentadoria que foi calculada pela média dos 36 últimos salários de contribuição. (...).
Transcrevo ainda o resumo dos registros referentes ao autor, apurado no processo administrativo (Evento 21, PROCADM8, fl. 31):
'Olimpio Ghiggi
- inscrito junto ao INSS em 01/03/1979 sob o nº. 1.097.395.401-6 como empresário.
- inscrito junto ao INSS em 01/03/1979 sob o nº. 1.125.487.683-3 como empresário;
-Concedida aposentadoria em 17/10/94 como empresário, em valor equivalente a R$ 70,00 - benefício cessado em 13/12/94, a pedido do autor;
- registrado de 01/03/95 a 30/08/95, por seis meses, como mestre de obras, no LRE 2, folha 40;
- aposentou-se em 12/05/98 como autônomo, recebendo atualmente R$ 1.534,26.'
Também foi apurado no procedimento administrativo que, após a alteração dos critérios de calculo do salário de benefício (que passou a ser calculado sobre a média aritmética dos salários de contribuição correspondentes a 80% do período contributivo), não houve mais o registro de empregados recebendo no teto da contribuição, por período de seis meses na empresa Schulz Construções Ltda., conforme consta no documento do evento 21 (PROCADM8, fl. 35, letra 'c').
Conclui-se, desse modo, que o desligamento da empresa ocorreu em 6 meses, o que confirma a tese sustentada pela autarquia previdenciária.
Calha ressaltar ainda que, embora intimado para arrolar testemunhas para a produção de prova oral (evento 34), a parte autora não se manifestou, pelo que considero o seu silêncio como desistência da referida prova. Como se percebe, a parte autora não demonstrou interesse na prova oral, perdendo a oportunidade de trazer elementos que pudessem embasar a suas teses e contrapor os argumentos da parte adversa.
Por todo o exposto, tenho que a fraude apurada pela Autarquia Previdenciária efetivamente ocorreu, não havendo motivos para alterar o procedimento de revisão efetuado.
Destarte, comprovada a fraude e má-fé do segurado não subsistem as arguições de ato jurídico perfeito, coisa julgada administrativa e direito adquirido, bem como não cabe analisar o prazo decadencial, pois a ilegalidade na hipótese poderá ser pronunciada a qualquer tempo, nos termos do art. 103-A da Lei nº 8.213/91, abaixo transcrito.
'Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004)'
Diante dessas considerações, é de rigor a improcedência dos pedidos do autor.
A situação narrada nos autos pode gerar efeitos na esfera penal, razão pela qual determino a remessa de cópia do processo para o Ministério Público Federal para ciência dos fatos.

Dessa forma, tendo em vista que o processo administrativo de revisão do benefício previdenciário respeitou o contraditório e a ampla defesa e detectou irregularidade/ilegalidade, bem assim a má-fé do segurado, quando da sua concessão, correta a redução da RMI, devendo ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido por seus próprios fundamentos.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/01/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002090-88.2013.404.7113/RS
ORIGEM: RS 50020908820134047113
RELATOR
:
Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
PRESIDENTE
:
Rogerio Favreto
PROCURADOR
:
Dra. Solange Mendes de Souza
APELANTE
:
OLIMPIO GHIGGI
ADVOGADO
:
IDALINO MARIO ZANETTE
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/01/2015, na seqüência 154, disponibilizada no DE de 14/01/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
VOTANTE(S)
:
Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
:
Des. Federal ROGERIO FAVRETO
:
Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria


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