APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005538-41.2014.404.7111/RS
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LONI MARIA SCHAEFER |
ADVOGADO | : | JUÇARA FERREIRA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REVISÃO. LIMITES AO DESFAZIMENTO DE ATO CONCESSÓRIO POR PARTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Há e sempre houve limites para a Administração rever atos de que decorram efeitos favoráveis para o particular, em especial aqueles referentes à concessão de benefício previdenciário.
2. O cancelamento de benefício previdenciário pressupõe devido processo legal, ampla defesa e contraditório.
3. A Administração não pode cancelar um benefício previdenciário com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado.
4. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, consagrado inclusive em recurso especial repetitivo (RESP Nº 1.114.938 - AL (2009/0000240-5). Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. 3ª Seção do STJ. Unânime. Julgado em 14/04/2010), para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência para a revisão do ato de concessão deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999, pois anteriormente não havia norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa.
5. Ressalva de entendimento pessoal do relator no sentido de que como a Lei 6.309/75 previa em seu artigo 7º que os processos de interesse de beneficiários não poderiam ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo, em se tratando de benefício deferido sob a égide do referido Diploma, ou seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), caso decorrido o prazo de cinco anos, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo.
6. Com o advento da Lei 9.784/99 (art. 54), foi instituído expressamente prazo decadencial de cinco anos para desfazimento de atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, incluídos os atos de concessão de benefício previdenciário.
7. A MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos para a Previdência Social anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários.
8. Como quando a Medida Provisória 138 entrou em vigor não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99, os prazos que tiveram início sob a égide desta Lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Assim, na prática todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, passaram a observar o prazo decadencial de dez, anos aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada
9. O prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o benefício.
10. Em toda situação na qual se aprecia ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos anteriormente à Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do amparo, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio constitucional da segurança jurídica.
11. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório, pois este se reveste de presunção de legitimidade.
12 . Até 29/06/2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
13. A partir de 30/06/2009, por força da Lei n.º 11.960, de 29/06/2009 (publicada em 30/06/2009), que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança. Registre-se que a Lei 11.960/09, segundo o entendimento do STJ, tem natureza instrumental, devendo ser aplicada aos processos em tramitação (EREsp 1207197/RS. Relator Min. Castro Meira. Julgado em 18/05/2011).
14. A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam: ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64); OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86); BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89); INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91); IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92); URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94); IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94); INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95); IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94); INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, e REsp n.º 1.103.122/PR).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de janeiro de 2015.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7279158v2 e, se solicitado, do código CRC F266AA25. | |
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RELATÓRIO
Trata-se de Ação Ordinária ajuizada contra o INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando, inclusive em sede de liminar, '(i) a suspensão dos descontos efetuados no seu benefício previdenciário NB 42/121.637.300-8 (ii) o reconhecimento da decadência do direito da autarquia anular o ato administrativo de concessão do benefício de aposentadoria, NB 42/116.559.233-6, declarando nulo o ato que determinou a cessação do benefício, (iii) o imediato restabelecimento do referido benefício e a condenação do réu a restituir os valores já descontados da autora, acrescidos correção monetária e juros'.
Sentenciando, o MM. Juiz monocrático proferiu a seguinte decisão: confirmo a liminar anteriormente deferida e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão veiculada pela autora em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, extinguindo o feito com resolução de mérito, com fulcro no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para os fins de:
a) determinar ao INSS o cancelamento dos descontos efetuados no benefício de Aposentadoria nº 121.637.300-8 percebido pela autora;
b) determinar ao INSS a desconstituição do débito administrativo apurado (R$ 67.288,50); e
c) determinar ao INSS que restitua ao autor os valores já efetivamente descontados, até a efetiva implantação da decisão antecipatória concedida nestes autos, devidamente corrigidos, nos termos da fundamentação.
Considerando a sucumbência recíproca, condeno cada parte a pagar os honorários da parte adversa, que vão arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa devidamente atualizado, consoante o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, ficando reciprocamente compensada entre as partes, nos termos do artigo 21, também do Código de Processo Civil. Não é óbice à compensação o fato de a parte autora ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, porquanto não haverá desembolso de valores.
O INSS é isento do pagamento das custas, nos termos do art. 4º, da Lei nº 9.289/96.
Irresignada, a Autarquia interpôs recurso de apelação pretendendo: (a) a manutenção da cobrança do débito da apelada decorrente de valores recebidos indevidamente. (b) determinando-se a aplicação do artigo 1º-F, Lei nº 9.494/97 com as alterações trazidas pela Lei nº 11.960/09 até que o STF decida sobre a modulação temporal dos efeitos da ADI 4.357.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora
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VOTO
DA REMESSA OFICIAL
Conforme entendimento firmado pela Corte Especial do STJ, a sentença ilíquida deve se sujeitar ao duplo grau de jurisdição, não incidindo a regra contida no §2º do art. 475 do CPC. Vejamos:
PROCESSO CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA.
A sentença ilíquida proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; a exceção contemplada no § 2º do art. 475 do Código de Processo Civil supõe, primeiro, que a condenação ou o direito controvertido tenham valor certo e, segundo, que o respectivo montante não exceda de 60 (sessenta) salários mínimos. Embargos de divergência conhecidos e providos.
(Embargos de Divergência no Resp nº 934.642/PR, STJ, Corte Especial, Rel. Min. Pargendler, DJe de 26/11/2009)
Assim, nas hipóteses em que a sentença condenatória proferida contra a Fazenda Pública for de valor incerto, impõe-se o reexame do julgado, conforme determinado na sentença.
MÉRITO
No presente processo discute-se sobre revisão de ato praticado pelo INSS, do qual decorreram efeitos favoráveis para o destinatário.
A questão comporta várias indagações acerca dos limites para a revisão administrativa de ato do qual resultem efeitos favoráveis para o segurado. Assim, necessária análise pontual das questões de direito relevantes envolvidas.
Não existe dúvida de que depois de deferido um benefício ou reconhecido um direito o INSS pode, em princípio, rever a situação quando restar configurada ilicitude. Essa possibilidade há muito é reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, e restou consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (art. 43 da Lei 9.784/99 e art. 103-A, da Lei 8.213/91, introduzido pela MP 138/03).
Existem, todavia, limites para a revisão, por parte do INSS, dos atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.
Da necessidade de observância do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório
Primeiramente deve ser registrado que o cancelamento de qualquer ato desta natureza pressupõe a instauração de procedimento específico, com notificação do interessado, oportunizando-se ainda que ele produza provas e exerça plenamente seu direito de defesa. Inviável, assim, o cancelamento sumário, pois deve ser observado o que dispõe o artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. SUM-160 TFR.
É ilegal a suspensão unilateral de benefício previdenciário sem a realização de regular procedimento administrativo, que oportunize ao segurado o contraditório e ampla defesa, em observância ao princípio do devido processo legal. Apelação Improvida.
(AC 9404394726. 6ª Turma do TRF4. Rel. João Surreaux chagas)
Da reavaliação da prova - a "coisa julgada administrativa"
Há de se registrar ainda que a Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado.
Com efeito, não havendo prova de ilegalidade, não é dado à Administração simplesmente reavaliar a situação, voltando atrás quanto à sua manifestação, porquanto caracterizada em tal situação a denominada "coisa julgada administrativa" ou preclusão das vias de impugnação interna.
A esse respeito, ensina Hely Lopes Meirelles:
"(...) a denominada coisa julgada administrativa, que, na verdade, é apenas uma preclusão de efeitos internos, não tem o alcance da coisa julgada judicial, porque o ato jurisdicional da Administração não deixa de ser um simples ato administrativo decisório, sem a força conclusiva do ato jurisdicional do Poder Judiciário.
(...)
Realmente, o que ocorre nas decisões administrativas finais é, apenas, preclusão administrativa, para a estabilidade das decisões entre as partes. Por isso, não atinge nem afeta situações ou direitos de terceiros, mas permanece imodificável entre a Administração e o administrado destinatário da decisão interna do Poder Público. Essa imodificabilidade não é efeito da coisa julgada administrativa, mas é conseqüência da preclusão das vias de impugnação interna (recursos administrativos) dos atos decisórios da própria Administração. Exauridos os meios de impugnação administrativa, torna-se irretratável, administrativa mente, a última decisão (...)."
(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 24 ed. São Paulo: Malheiros. 1999, p. 612)
Nessa linha, quando não há prova de ilegalidade que possa justificar a anulação do ato pela Administração, mas tão-somente mudança de critério interpretativo, ou mesmo reavaliação da prova, não se mostra possível o desfazimento do ato administrativo. E pouco importa, nesse caso, o tempo decorrido entre a data da concessão do benefício e a revisão administrativa promovida pela autarquia.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RESTABELECIMENTO. IRREGULARIDADES. INEXISTÊNCIA.
- O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa .
(AC 533693. Processo: 200204010468271. 5ª Turma. Rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz)
Como bem salientou o Desembargador Federal Dr. Luiz Carlos de Castro Lugon por ocasião da análise do Agravo de Instrumento nº 2000.04.01.105967-9/SC, o reconhecimento de tempo de serviço pelo INSS (e bem assim de direito ao benefício, acrescente-se) implica a constituição de situação jurídica que se incorpora patrimônio jurídico do segurado. Colhe-se do voto o seguinte excerto:
"Ora, a averbação de tempo de serviço é ato que traduz o reconhecimento pela Administração de uma situação fática, de um direito adquirido incorporado ao patrimônio jurídico do trabalhador. É a declaração de relação de direito já constituída. Desta forma, não há se pretender a submissão da eficácia do ato de averbação a novas normas, como aquela, nitidamente ilegal, contida na OS 590/97, que aliás se põe em confronto com a jurisprudência estabelecida "una voce" nesta Casa. Neste sentir, o magistério de Hely Lopes Meirelles: ´Observamos, neste ponto, que a mudança de interpretação da norma ou da orientação administrativa não autoriza a anulação dos atos anteriormente praticados, pois tal circunstância não caracteriza ilegalidade, mas simples alteração de critério da Administração incapaz de invalidar situações regularmente constituídas".
A "coisa julgada administrativa", é verdade, não se equipara à coisa julgada propriamente dita, pois despida de definitividade. De qualquer sorte, constitui óbice ao desfazimento do ato por parte da autoridade administrativa ao argumento de mera reavaliação de situação já apreciada anteriormente.
Dos efeitos do tempo
Assim como não se admite o desfazimento de ato no qual reconhecido direito do segurado em razão de simples reavaliação, também o tempo tem influência significativa na possibilidade de atuação do INSS em casos que tais.
Devem, pois, ser apreciados os efeitos do tempo para fins de consolidação da situação.
Dos efeitos do tempo - Lei 6.309/75 - Lei 8.422//92 - Lei 9.784/99
Sob a égide da legislação anterior à atual Lei de Benefícios (Lei 8.213/91), assim estabelecia o artigo 7º da Lei 6.309, de 15.12.75 (que só foi revogada pela Lei 8.422, de 13.05.92, publicada no DOU de 14/05/92):
Art. 7º Os processos de interesse de beneficiários e demais contribuintes não poderão ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.
Pertinente referir igualmente o artigo 14 do Decreto-Lei 72, de 21.11.66 (na redação dada pela Lei 5.890, de 08.06.73) eis que tem relação com a matéria:
Art. 14. Compete às Turmas do Conselho de Recursos da Previdência Social julgar os recursos das decisões das Juntas de Recursos da Previdência Social.
§ 1º Quando o Instituto Nacional de Previdência Social, na revisão de benefícios, concluir pela sua ilegalidade, promoverá a sua suspensão e submeterá o processo ao Conselho de Recursos da Previdência Social, desde que haja decisão originária de Junta.
§ 2º Na hipótese de suspensão do benefício já concedido, e que não tenha sido objeto de recurso, o Instituto Nacional de Previdência Social abrirá ao interessado o prazo para recurso à Junta de Recursos da Previdência Social.
Como resultado do estabelecido nos artigos 7º da Lei 6.309, de 15.12.75 e 14 do Decreto-Lei 72, de 21.11.66, assim dispôs a CLPS (Decreto 89.312, de 22.01.84 (CLPS):
Art. 206. Quando o INPS, na revisão do benefício, conclui pela sua ilegalidade, deve promover sua suspensão.
§ 1º Se trata de benefício já concedido que não foi objeto de recurso, o INPS abre prazo ao interessado para recorrer à JRPS.
§ 2º Se já existe decisão da JRPS, o processo é submetido ao CRPS.
Art. 207. O processo de interesse de beneficiário ou empresa não pode ser revisto após 5 (cinco) anos contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.
Já o Decreto 83.080, de 24.01.79 (antigo Regulamento de Benefícios da Previdência Social) estabelecia em seus artigos 382 e 383:
Art. 382. Quando o INPS, ao rever a concessão do benefício, concluir pela sua ilegalidade, deve promover a sua suspensão e, se houver decisão originária de JRPS, submeter o processo ao CRPS.
Parágrafo único. No caso de revisão de benefício já concedido que não tenha sido objeto de recurso, o INPS deve abrir ao beneficiário prazo para recorrer a JRPS.
Art. 383. Ressalvada a hipótese do artigo 382, o processo de interesse de beneficiário não pode ser revisto após 5 (cinco) anos contados da sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.
Como se percebe, no caso específico do benefício previdenciário existia até 14 de maio de 1992 (data da publicação da Lei 8.422, de 13.05.92, que revogou em seu artigo 22 a Lei 6.309/75), prazo expressamente previsto para a Administração rever seus atos, ressalvados obviamente os casos de fraude.
Assim, entendo que em se tratando de ato praticado sob a égide da Lei 6.309/75, ou seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), uma vez decorrido o prazo de cinco anos, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo.
A partir da revogação da lei 6.309/75 ocorreu um vácuo legal, que somente foi suprido com o advento da Lei 9.784, de 29/01/99 (publicada no DOU de 01/02/99), a qual dispôs em seus artigos 53 e 54:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Tenho entendimento de que o advento do artigo 54 da Lei 9.784/99 e posteriormente do artigo 103-A da Lei 8.213/91 (introduzido pela MP 138/03, depois convertida na Lei 10.839/04), prestaram-se somente para consagrar o que já estabeleciam a revogada Lei 6.309/75 e os diplomas a ela relacionados e, ademais, já era defendido pela doutrina administrativista.
Com efeito, a doutrina havia muito já preconizava que o desfazimento de atos administrativos, mesmos daqueles viciados, ressalvados os casos de fraude, não ficava ao alvedrio da autoridade administrativa por período indeterminado, até por aplicação analógica do disposto no Decreto 20.910 de 06/01/1932. Segundo essa corrente deve haver um limite temporal para a Administração anular atos administrativos, até em respeito ao princípio da segurança jurídica, uma vez que o direito busca acima de tudo a pacificação social.
Exemplo disso é a manifestação de Diógenes Gasparini, que, por sinal, faz menção a opiniões de outros doutrinadores:
Nada justifica a possibilidade de um ato administrativo vir a ser declarado inválido depois de um longo tempo de sua edição. A entender-se isso factível, estar-se-ia pondo em risco a necessária estabilidade das relações jurídicas após certo tempo de vigência. Destarte, decorrido um determinado prazo, o ato, mesmo que inválido, firma-se, estabiliza-se, não podendo mais ser invalidado pela Administração Pública ou anulado pelo Judiciário. Nesse sentido é a lição de Clenício da Silva Duarte, ao afirmar que as situações irregulares consolidam-se com o decurso do tempo, não sendo mais passíveis de qualquer retificação, seja para melhor, seja para pior (RDA, 116:368). Também, a esse respeito, diz Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo, cit. p. 189) que a prescrição administrativa e a judicial impedem a anulação do ato no âmbito da Administração ou do Poder Judiciário. Ademais, continua esse autor, justifica-se essa conduta porque o interesse na estabilidade das relações jurídicas existentes entre os administrados e a Administração, ou entre esta e seus servidores, é também de interesse público, tão relevante como os demais.
(GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 1995. P. 100/101)
Não se pode deixar de considerar, todavia, que o Superior Tribunal de Justiça veio a firmar entendimento no sentido de que antes da Lei 9.784/99 não havia prazo para a Administração Pública desfazer atos dos quais decorressem efeitos favoráveis para os beneficiários. Seguem precedentes explicitando o entendimento daquela Corte:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ART. 54 DA LEI 9.784/99. IRRETROATIVIDADE. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. NÃO-OCORRÊNCIA. LEGALIDADE DO ATO QUE CANCELOU O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
I - A Eg. Corte Especial deste Tribunal pacificou entendimento no sentido de que, anteriormente ao advento da Lei nº 9.784/99, a Administração podia rever, a qualquer tempo, seus próprios atos quando eivados de nulidade, nos moldes como disposto nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal. Restou ainda consignado, que o prazo previsto na Lei nº 9.784/99 somente poderia ser contado a partir de janeiro de 1999, sob pena de se conceder efeito
retroativo à referida Lei.
II - Agravo interno desprovido.
(AgRg no AG 774612. 5ª Turma do STJ. Rel. Min. Gilson Dipp. Data do Julgamento: 03/10/2006
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO DE ATO CONCESSÓRIO DE APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA. NÃO-OCORRÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. IMPOSSIBILIDADE DE SE CONCEDER EFEITO RETROATIVO. APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. APOSENTADORIA POR IDADE PELO INSS. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. SEGURADO ESPECIAL. CONDIÇÃO INEXISTENTE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
1. O art. 69, § 1º, da Lei 8.212/91 não impõe, como requisito para a revisão do benefício previdenciário, a existência de fraude ou simulação dolosa por parte do beneficiário, bastando, tão-somente, que haja indício de irregularidade em sua concessão e a abertura de processo administrativo, no qual o beneficiário será notificado "para apresentar defesa, provas ou documentos de que dispuser, no prazo de trinta dias".
2. A Corte Especial deste Tribunal firmou compreensão segundo a qual os atos administrativos praticados anteriormente ao advento da Lei 9.784/99 também estão sujeitos ao prazo decadencial qüinqüenal de que trata seu art. 54. Todavia, nesses casos, tem-se como termo a quo a entrada em vigor de referido diploma legal.
3.......
(REsp 521735. 5ª Turma do STJ. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. Data do Julgamento: 28/11/2006)
Há inclusive julgado da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial repetitivo, ratificando este entendimento:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.787/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei 9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99 incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência (01.02.99). Ressalva do ponto de vista do Relator.
2. Antes de decorridos 5 anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários.
3. Tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato.
4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5a. Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor.
(RESP Nº 1.114.938 - AL (2009/0000240-5). Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. 3ª Seção do STJ. Unânime. Julgado em 14/04/2010)
Como visto, segundo o Superior Tribunal de Justiça, para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 (e bem assim para os atos de reconhecimento de tempo de serviço praticados no referido período) o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999.
Considerando a posição segura do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria, e ainda que ressalvando a opinião acima externada, inviável se afirme que mesmo para os atos deferitórios praticados antes da Lei 9.784/99 deva também ser considerado o prazo decadencial.
Não se pode ignorar, todavia, que ainda que adotada esta posição, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz do caso concreto, como se demonstrará adiante.
Dos efeitos do tempo - a Lei 9.784/99 e a Medida Provisória 138/03 (depois convertida na Lei 10.839/04)
O artigo 54 da Lei 9.784/99, já mencionado anteriormente, assim estabeleceu:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
A disciplina da Lei 9.784/99 foi clara: ressalvados os casos de comprovada má-fé, uma vez decorridos cinco anos sem que o segurado tenha sido notificado do procedimento instaurado para revisar o ato administrativo que implicou reconhecimento de direito em seu favor, resta consumada a decadência.
Cumpre salientar que uma vez consumada a decadência, pouco importa a eventual ilegalidade do ato. A decadência existe exatamente para tornar definitivas situações antigas, pouco importando que ilegais, ressalvados, obviamente, os casos de fraude, pois estes podem ser revistos, em princípio, a qualquer tempo.
Observe-se que o prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o ato.
A despeito do que estabeleceu a Lei 9.784/99, não se pode perder de vista que em 2003 veio a lume a MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), a qual instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:
Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004)
§1ª No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Como a Medida Provisória 138 entrou em vigor em 20/11/03 (quando publicada no DOU), percebe-se que na ocasião ainda não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99.
Como o prazo decadencial foi ampliado de cinco para dez anos, há necessidade, assim, de se analisar questão de direito intertemporal, que diz com os efeitos da lei nova (art. 103-A da Lei 8.213/91) para os prazos de decadência que estavam em curso nos termos da norma anterior (art. 54 da Lei 9.784/99).
O Supremo Tribunal Federal, em precedentes antigos, tratando de hipótese de diminuição de prazo, firmou entendimento de que se o restante do prazo de decadência fixado na lei anterior for superior ao novo prazo estabelecido pela lei nova, despreza-se o período já transcorrido para levar-se em conta, exclusivamente, o prazo da lei nova, a partir do início de sua vigência (v. RE 97082/SC. Rel. Min. OSCAR CORRÊA, julgamento em 11/10/1983, 1ª Turma; AR 1025/PR, Rel. Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE, julgamento em 18/02/1981, Tribunal Pleno; RE 92294/GO, Rel. Min. THOMPSON FLORES, julgamento em 18/03/1980, 1ª Turma; AR 9053/DF, Rel. Min. MOREIRA ALVES, julgamento em 22/02/1978, Tribunal Pleno). Assentou, pois, a Corte Suprema, o princípio de que o prazo da lei nova, se menor, incide nas situações pendentes.
O Código Civil de 2002, que alterou diversos prazos de prescrição e decadência previstos em seu antecessor (de 1916), dispôs sobre a questão de direito intertemporal, estabelecendo em seu artigo 2.028:
Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.
O Código Civil de 2002, percebe-se, estabeleceu o princípio de que no caso de redução, o prazo da lei nova incide sobre as situações pendentes, salvo se já decorrido mais da metade do tempo estabelecido pela lei anterior. Os prazos maiores do Código revogado, portanto, somente prevalecem excepcionalmente.
Tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Código Civil de 2002, como se verifica, trataram apenas de hipóteses de redução do prazo de decadência. Indicaram, todavia, que os prazos prescricionais ou decadenciais da lei nova em princípio são aplicáveis às situações apanhadas pela mudança legislativa. Possível a conclusão, assim, de que promovendo a lei nova o aumento do prazo decadencial, e desde que não tenha ele ainda se consumado sob a égide da norma revogada, aplica-se o novo prazo, com aproveitamento do tempo já decorrido.
Esta, a propósito, a opinião de Câmara Leal, ao tratar do prazo de prescrição:
Omitiu, porém, nosso legislador as regras de aplicação da nova lei às prescrições em curso, afastando-se da lei alemã, que as estabelece, e deixando, portanto, a cargo da doutrina a sua fixação.
(...)
67. Na carência de normas especiais, parece-nos que devemos adotar o critério germânico, dada a filiação de nosso Código à orientação alemã, consagrando o princípio da retroatividade da lei prescricional. E, assim, formularemos as seguintes regras, inspiradas na legislação teutônica:
1ª - Estabelecendo a nova lei um prazo mais curto de prescrição, essa começará a correr da data da nova lei, salvo se a prescrição iniciada na vigência da lei antiga viesse a completar-se em menos tempo, segundo essa lei, que, nesse caso, continuaria a regê-la, relativamente ao prazo.
2ª - Estabelecendo a nova lei um prazo mais longo de prescrição, essa obedecerá a esse novo prazo, contando-se, porém, para integrá-lo, o tempo já decorrido na vigência da lei antiga.
3ª - O início, suspensão ou interrupção da prescrição são regidos pela lei vigente ao tempo em que se verificarem.
(LEAL, Antônio Luís da Câmara. Da prescrição e decadência. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, p. 102-104).
De se concluir, portanto, que os prazos que tiveram início sob a égide da Lei 9.784/99, foram acrescidos a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Em termos mais claros: o prazo decadencial passou a ser de dez anos, aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada. Na prática, todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, portanto, passaram a observar o prazo decadencial de dez anos, pois a MP 138/03 entrou em vigor antes de decorridos cinco anos a contar do advento daquela lei.
Esta, a propósito, foi a conclusão a que chegou a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça ao apreciar em 14/04/2010 o recurso especial repetitivo 1.114.938, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, cuja ementa está acima transcrita.
Dos efeitos do tempo - situações constituídas após o advento da Medida Provisória 138/03, depois convertida na Lei 10.839/04
Como já esclarecido, com o advento da Medida Provisória 138, de 19.11.03 (publicada no DOU de 20/11/03), a questão da decadência voltou a ter disciplina específica no Direito Previdenciário, tendo sido estabelecido prazo decadencial de dez anos, como se percebe da transcrição acima feita.
Está claro, assim, que para os atos praticados a partir de 20/11/03, o prazo decadencial para desfazimento passou a ser de dez anos.
Dos efeitos do tempo - o princípio da segurança jurídica
Há necessidade, ainda, de se consignar a importância do princípio da segurança jurídica - pois uma das funções precípuas do Direito é a pacificação social - para a análise da ação da administração no sentido de desfazer ato de concessão de benefício previdenciário.
Esta ponderação tem importância principalmente para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99, pois, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça já referido, não existe, nestes casos, decadência estabelecida em detrimento da Administração. Deve ser considerada (esta ponderação), entrementes, para todos os casos de concessão de benefício, independentemente da data em que ocorridos, já que o princípio referido tem status constitucional e deve ser sempre observado.
E nesse particular o Supremo Tribunal Federal já assentou a existência de limites para a ação da Administração no sentido de desfazer atos administrativos, independentemente de previsão legal, como se depreende dos seguintes precedentes:
1. Mandado de Segurança. 2. Cancelamento de pensão especial pelo Tribunal de Contas da União. Ausência de comprovação da adoção por instrumento jurídico adequado. Pensão concedida há vinte anos. 3. Direito de defesa ampliado com a Constituição de 1988. Âmbito de proteção que contempla todos os processos, judiciais ou administrativos, e não se resume a um simples direito de manifestação, no processo. 4. Direito constitucional comparado. Pretensão à tutela jurídica que envolve não só o direito de manifestação e de informação, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. 5. Os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pela Constituição, aplicam-se a todos os procedimentos administrativos. 6. O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação oportuna e eficaz a respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido também em matéria jurídica. 7. Aplicação do principio da segurança jurídica, enquanto subprincípio do Estado de Direito. Possibilidade de revogação de atos administrativos que não se pode estender indefinidamente. Poder anulatório sujeito a prazo razoável. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 8. Distinção entre atuação administrativa que independe da audiência do interessado, e decisão que, unilateralmente, cancela decisão anterior. Incidência da garantia do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal ao processos administrativo. 9. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica. Aplicação nas relações jurídicas de direito público. 10. Mandado de Segurança deferido para determinar observância do princípio do contraditório e da ampla defesa (CF art. 5º LV).
(MS 24.268-0, Tribunal Pleno, Rel. p/ acórdão Ministro Gilmar Mendes, DOU 17-9-2004)
1. Mandado de segurança. 2. Acórdão do Tribunal de Contas da União. Prestação de Contas da Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária - INFRAERO. Emprego Público. Regularização de admissões. 3. Contratações realizadas em conformidade com a legislação vigente à época. Admissões realizadas por processo seletivo sem concurso público, validadas por decisão administrativa e acórdão anterior do TCU. 4. Transcurso de mais de dez anos desde a concessão da liminar no mandado de segurança. 5. Obrigatoriedade da observância do princípio da segurança jurídica enquanto subprincípio do Estado de Direito. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 6. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica e sua aplicação nas relações jurídicas de direito público. 7. Concurso de circunstâncias específicas e excepcionais que revelam: a boa fé dos impetrantes; a realização de processo seletivo rigoroso; a observância do regulamento, da INFRAERO, vigente à época da realização do processo seletivo; a existência de controvérsia, à época das contratações, quanto à exigência, nos termos do art. 37 da Constituição, de concurso público no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista. 8. Circunstâncias que, aliadas ao longo período de tempo transcorrido, afastam a alegada nulidade das contratações dos impetrantes. 9. Mandado de Segurança deferido.
(MS 22.357-0, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU 05-11-2004)
Oportuna a menção, por relacionado com a matéria, ao artigo publicado por Almiro do Couto e Silva na "Revista de Direito Administrativo" nº 237, (Renovar, p. 271-315, Jul/Set;2004) denominado "O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito público brasileiro e o direito da administração pública de anular seus próprios atos administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União [Lei nº 9.784/99". Seguem trechos do mencionado artigo:
54. A regra do art. 54 da Lei nº 9784/99, como normalmente acontece com as regras jurídicas, tem, por certo, vocação prospectiva, isto é, sua aplicação visa ao futuro e não ao passado. Quer isso dizer, portanto, que o prazo de cinco anos fixado naquele preceito, tem seu termo inicial na data em que a Lei nº 9.784/99 começou a viger, até porque a atribuição de eficácia retroativa à norma legal instituidora do prazo de decadência muito possivelmente atingiria situações protegidas pela garantia constitucional dos direitos adquiridos.
Entretanto, a vigência do princípio constitucional da segurança jurídica é bem anterior à Lei nº 9.784/99 e é ele que torna compatível com a Constituição o art. 54 daquele mesmo diploma, quando confrontado com o princípio da legalidade. Na verdade, se inexistisse, como princípio constitucional, o princípio da segurança jurídica, não haveria como justificar, em face do princípio da legalidade, a constitucionalidade do art. 54 da Lei nº 9.784/99, valendo o mesmo raciocínio para as demais regras de decadência ou de prescrição existentes em nosso ordenamento jurídica.
Bem se vê, portanto, que as situações que se constituíram anteriormente à entrada em vigor do art. 54 da Lei nº 9.784/99, devem ser solucionadas à luz do princípio da segurança jurídica, entendido como princípio da proteção à confiança, ponderado juntamente com o princípio da legalidade, exatamente como procedeu o STF no MS 223357/DF. Anteriormente à Lei nº 9.784/99, para os que não reconheciam a existência de prazo prescricional de cinco anos (que em alguns casos era decadencial, como sucedia, por exemplo, com o direito à invalidação de ato administrativo) para as pretensões ou direitos do Poder Público contra os particulares, ficava ao prudente arbítrio do julgador ou do aplicador do direito determinar, diante das peculiaridades do caso concreto, qual a extensão do prazo, após o qual, não ocorrendo má-fé dos destinatárias do ato administrativo, ficaria a Administração Pública inibida de anulá-lo, para, desse modo, assegurar a estabilidade das relações jurídicas com base no princípio da segurança jurídica. Para essas situações, o art. 54 da Lei nº 9.784/99 deu a medida do que seria "prazo razoável" para influir no juízo de precedência do princípio da segurança jurídica sobre o da legalidade, no cotejo ou no balancing test entre esses dois princípios, em face da prolongada inação da Administração Pública no que diz com a exercício do seu poder - (que para nós é um poder-dever) - de autotutela.
55. Entenda-se bem: não se está postulando a atribuição de eficácia retroativa ao prazo do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União. O que estamos afirmando é que essa lei, ao instituir prazo de decadência do direito à invalidação, em regra inspirada no Princípio da segurança jurídica, introduziu no nosso sistema jurídico parâmetro indicador do lapso de tempo que associado a outras circunstâncias, como a boa fé dos destinatários do ato administrativo, estaria a recomendar, após o seu transcurso, a manutenção de ato administrativo inválido.
Contudo, nas hipóteses anteriores ao início da vigência do art. 54 da Lei nº 9.784/99, diante do caso concreto, da situação fática objetivamente considerada e da ponderação dos princípios da legalidade e da proteção à confiança poderá o aplicador desses princípios entender que, malgrado o transcurso de cinco anos, não seria a confiança do destinatário digna de proteção, em virtude da intercorrência de outros fatores, que não se relacionam com a boa fé dos destinatários mas sim, digamos, com o interesse social ou com a relevância de valores jurídicos feridos, entendendo, em conclusão, que o princípio a ser aplicado seria o da legalidade e não o da segurança jurídica.
Cogitando-se, porém da aplicação do art. 54 da Lei nº 9.784/99, já se viu que não há essa ponderação de princípios (que já foi feita pelo legislador), incumbindo ao aplicador tão-somente subsumir a situação fática na regra jurídica - ou o suporte fático real no suporte fático legal - tirando daí a conseqüência jurídica, que será a ocorrência, ou não, da decadência do direito à invalidação.
Aliás, é assim que se procede em outros países, onde - diferentemente do que se passa na França, na Alemanha, em Portugal e, agora no Brasil - o ordenamento jurídico não tem norma que fixe prazo de decadência do direito da Administração Pública de anular seus próprios atos.
57-64. omissis
65. Das reflexões que foram desenvolvidas, tiram-se algumas conclusões principais, as quais podem ser assim arrumadas:
(A) O princípio da segurança jurídica entendido como proteção à confiança, está hoje reconhecido na legislação e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como princípio de valor constitucional, imanente ao princípio do Estado de Direito, e que serve de limite à invalidação, pela Administração Pública dos seus atos administrativos eivados de ilegalidade ou de inconstitucionalidade. Com princípio de natureza constitucional, aplica-se à União Federal, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às entidades que integram as respectivas Administrações Indiretas.
(B) No plano da União Federal, a Lei do Processo Administrativo (Lei nº 9.784/99), no seu art. 54, consigna regra, inspirada no princípio da segurança jurídica que fixa em cinco anos o prazo decadencial para a Administração Pública exercer o direito de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé dos beneficiários. Tratando-se de regra, a ponderação entre os princípios da legalidade e da segurança jurídica já foi feita pelo legislador, competindo ao aplicador apenas verificar se os pressupostos que integram o preceito estão, ou não, concretamente verificados.
(C) O prazo do art. 54 da Lei nº 9.784/99 é de natureza decadencial e não prescricional. Sendo assim, não é ele, em princípio, suscetível de interrupção ou de suspensão. Apenas quanto aos atos nulos - não na acepção que dá a esse qualificativo a doutrina do Direito Privado, mas na conceituação que lhe empresta o Direito Administrativo dos países europeus mais avançados e o Direito Administrativo da União Européia e que de algum modo, também já encontramos incipientemente esboçada na Lei da Ação Popular - apenas quanto aos atos nulos não haveria falar em decadência ou em prescrição, uma vez que incumbe ao juiz decretar-lhes de ofício a invalidade. Note-se, porém, que nulos apenas serão aqueles atos administrativos, inconstitucionais ou ilegais, marcados por vícios ou deficiências gravíssimas, desde logo reconhecíveis pelo homem comum, e que agridem em grau superlativo a ordem jurídica, tal como transparece nos exemplos da licença de funcionamento de uma casa de prostituição infantil ou da aposentadoria, como servidor público, de quem nunca foi servidor público. Não é a hierarquia da norma ferida que, por si só, implica a nulidade, como mostra o acórdão do STF no MS 22357/DF, que aplicou o princípio da segurança jurídica para manter atos administrativos contrários à Constituição. A grande maioria dos atos administrativos, inconstitucionais ou ilegais, não é, pois, composta por atos administrativos nulos, mas sim por atos administrativos simplesmente anuláveis, estando o direito a pleitear-lhe a anulação sujeito, portanto, à decadência.
(D) A boa fé que é exigida para a aplicação do princípio da segurança jurídica ou pelo art. 54 da Lei nº 9.784/99 é a dos destinatários do ato administrativo. Não está em questão a má-fé da Administração Pública ou das autoridades administrativas a menos que estas sejam também destinatárias das medidas ilegais que editaram em seu próprio proveito.
(E) omissis.
(F) Para as situações que se constituíram antes da vigência da Lei nº 9.784/99 não é possível estender-lhe o preceito do art. 54 dessa Lei. A esses casos o que se aplica é o princípio da segurança jurídica devidamente sopesado, nessas hipóteses com outros princípios constitucionais, notadamente com o princípio da legalidade. (...)
Assim, considerando o que foi exposto, é de se concluir que em toda situação na qual se analisa ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do benefício, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio da segurança jurídica.
A posição que se defende, com apoio em precedentes do Supremo Tribunal Federal, registre-se, não vai de encontro ao entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. O que se afirma é que, a despeito de não haver prazo decadencial em seu sentido estrito a considerar, e independentemente do prazo fixado em lei, nada impede que se reconheça o direito à manutenção da situação, com base em fundamento constitucional, em razão das circunstâncias do caso específico.
Da análise da prova em processos nos quais se aprecia ato de revisão de benefício previdenciário
Há uma última circunstância a ser ponderada.
No que toca à atribuição dos ônus probatórios é sabido que nas ações judiciais nos quais se pretende a concessão de benefício previdenciário ou o reconhecimento de tempo de serviço, cabe ao segurado provar que faz jus ao bem da vida perseguido.
As ações de restabelecimento, todavia, têm como particularidade o fato de que ao segurado já foi deferido administrativamente o que postulava. Vale dizer, o INSS, após examinar a documentação apresentada, entendeu que o segurado tinha direito ao que postulou, por ter preenchido os requisitos necessários. Assim, o ato concessório se reveste de presunção de legitimidade, ou seja, presume-se que os requisitos legais para a obtenção do benefício tenham sido preenchidos.
Diante de tal quadro, caso não comprovada alguma ilegalidade no ato concessório, o cancelamento é indevido. É ao INSS, pois, que toca provar ter sido o benefício indevidamente concedido e, por conseqüência, corretamente cancelado. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE E MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. NOVA VALORAÇÃO DA PROVA. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL.
1. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário, compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório de aposentadoria, pois tal ato se reveste de presunção de legitimidade.
2. O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa .
3. Apelação do INSS e remessa oficial improvidas.
(AC: 200072070021618. 6ª Turma TRF 4. Rel. Des. Fed. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle)
Ora, se a autarquia previdenciária entende ter havido ilegalidade, é seu dever demonstrá-la quantum satis, não podendo simplesmente desconsiderar unilateralmente ato que implicou reconhecimento de direito ao segurado. Isso deve ser realçado nos casos em que alegada ocorrência de fraude, pois ela certamente não se presume.
Conclusões
Considerando o que foi exposto, podem ser extraídas as seguintes conclusões (não definitivas ou muito menos exaustivas) acerca da matéria:
- Há e sempre houve limites para a Administração rever atos de que decorram efeitos favoráveis para o particular, em especial aqueles referentes à concessão de benefício previdenciário.
- O cancelamento de benefício previdenciário pressupõe devido processo legal, ampla defesa e contraditório.
- A Administração não pode cancelar um benefício previdenciário com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado.
- Segundo o Superior Tribunal de Justiça (posição em relação a qual guardo ressalvas, como acima explicitado), para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999. Mesmo nestas situações, todavia, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz das circunstâncias do caso concreto.
- Com o advento da Lei 9.784/99 (art. 54), foi instituído expressamente prazo decadencial de cinco anos para desfazimento de atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, incluídos os atos de concessão de benefício previdenciário.
- A MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos para a Previdência Social anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários.
- Como quando a Medida Provisória 138 entrou em vigor não haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99, os prazos que tiveram início sob a égide desta Lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, quando entrou em vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez anos. Assim, na prática todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei 9.784/99, passaram a observar o prazo decadencial de dez, anos aproveitando-se, todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada.
- O prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o benefício.
- Em toda situação na qual se aprecia ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do amparo, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio constitucional da segurança jurídica.
- Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório, pois este se reveste de presunção de legitimidade.
DO CASO CONCRETO
A fim de evitar tautologia, transcrevo a r. sentença monocrática:
Do cancelamento do benefício e da decadência.
Inicialmente, importa esclarecer que não há dúvidas sobre a legalidade do ato praticado pelo INSS, qual seja: o de cancelamento do segundo benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido à autora, pois é expressamente vedada na legislação de regência, a cumulação de dois benefícios de aposentadoria como se observa da leitura do artigo 124, II da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 124. Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da Previdência Social:
(...)
II - mais de uma aposentadoria; (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).
Frise-se, de início, que o simples fato da autora não ter agido de má-fé no recebimento do benefício de forma indevida, não autoriza a perpetuação do erro, ensejando o enriquecimento ilícito do segurado. Além disso, defender a manutenção de benefícios recebidos cumulativamente afrontaria a legislação de regência.
No caso concreto, ainda, não há se falar em decadência para a Administração rever o ato de concessão do benefício como quer o autor na sua inicial.
Embora não conste nos autos a data da instauração do procedimento interno (auditoria) que culminou na cessação do benefício em 31/10/2011, conforme documentos juntados com a inicial, o benefício cessado (NB nº 116.559.233-6) teve o 1º pagamento em 13/05/2002 (evento 01 -PROCADM21 - fl. 68 e 69) e, portanto, dentro do prazo decadencial previsto no Art. 103-A, § 1º da Lei 8.213/91.
De qualquer forma, não se trata de erro ou fraude no ato de concessão do benefício, o que justificaria a aplicação do prazo decadencial, impedindo a revisão após o decurso do prazo estabelecido na legislação de regência. No caso concreto não se está a discutir o ato de concessão e, sim, a vedação legal do percebimento de dois benefícios de aposentadoria. Desta forma, a ilegalidade se renova a cada percebimento indevido não havendo se falar em aplicação da decadência como quer o autor.
Por fim cumpre esclarecer que a cessação do benefício é ato conforme a Lei, sendo inclusive desnecessária a abertura de processo administrativo onde se assegure ampla defesa e contraditório, pois cuida-se efetivamente de mera verificação de fato superveniente à concessão do benefício de aposentadoria e que torna legalmente inviável a continuidade da manutenção deste benefício, eis que o autor já recebia benefício inacumulável anteriormente (conduta vedada expressamente pelo art. 124 da Lei nº 8.213/91).
Diante de tais circunstâncias, não é devido o restabelecimento da aposentadoria pretendida.
Da devolução dos valores recebidos.
Primeiro é importante esclarecer que, apesar de estar autorizado pela Lei nº 8.213/91, a consignação de valores pagos indevidamente (art. 115, II), no caso de recebimento de boa-fé pelo segurado, não há como se exigir a repetição dos valores percebidos em razão de erro atribuído à Administração.
A boa fé subjetiva, necessária para afastar a condenação do segurado na repetição dos valores, consiste numa situação psicológica, estado de espírito ou ânimo do sujeito que realiza algo ou vivencia um momento, sem ter a noção do vício que a inquina. Geralmente este estado subjetivo, deriva da ignorância do sujeito a respeito de determinada situação.
Podemos concluir então que a boa fé subjetiva se refere ao estado psicológico da pessoa, consistente na justiça ou na licitude de seus atos, ou na ignorância de sua antijuridicidade.
É o caso dos autos, como veremos a seguir.
Embora o INSS, em sua contestação, aduza que o segurado, quando da concessão do benefício de aposentadoria estivesse assistido por advogado, evidenciando assim a sua má-fé pela sua conduta omissiva, tenho que não assiste razão à Autarquia.
Consta nos autos que a parte autora é pessoa de baixa escolaridade, que trabalhou a maior parte da sua vida na atividade rural, em regime de economia familiar.
Ademais, não há como presumir que a autora após a implantação de ambos os benefícios (o que ocorreu em datas muito próximas) relatou ao procurador que a representava perante a Autarquia acerca do valor que estava recebendo mensalmente, e mais, que este a esclareceu devidamente acerca da vedação legal de cumular dois benefícios de aposentadoria.
Há que ser considerado, ainda, nesse contexto, a idade da autora: 75 anos (63 anos, na data da concessão dos benefícios).
Não é demais lembrar que a boa-fé se presume e a má-fé tem que ser provada, ônus do qual o INSS não se desincumbiu.
Além disso, a revisão administrativa efetuada pela Autarquia Previdenciária depõe a favor da autora, reforçando a tese de agiu de boa-fé, porquanto, após ter sido devidamente notificada acerca da ilegalidade da cumulação dos benefícios em 30/04/2013, requereu imediatamente à agência do INSS o cancelamento de uma das aposentadorias em 13/05/2013, conforme documentos juntados ao processo administrativo (evento 01 - PROCADM2 - fls. 74 a 78).
Assim, no caso dos autos, em que pese a possibilidade de ser cancelada a aposentadoria ilegalmente concedida à autora, tenho que ela não obrou com má-fé, nem contribuiu para a ocorrência do erro administrativo.
Ressalto, também que não se trata propriamente de declarar a inconstitucionalidade da norma (art. 115, II, da Lei 8.213/91), pois ela é plenamente aplicável aos casos em que o valor é recebido pelo segurado que agiu comprovadamente de má-fé. Ou seja, o estado de inconstitucionalidade não está na previsão genérica de devolução dos valores recebidos indevidamente, mas em sua aplicação àqueles segurados que os receberam de boa-fé.
A aplicação da norma indistintamente viola os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da razoabilidade, pois prejudicaria as condições mínimas de vida do segurado.
Portanto, não se trata de inconstitucionalidade do art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, mas de interpretação conforme a Constituição.
Nesse ponto, destaca-se que a interpretação conforme a constituição se resume ao julgamento da causa com base na interpretação que se mostre mais congruente com a Constituição e não se confunde com a declaração de inconstitucionalidade da norma a que se refere o art. 97 da Constituição.
Ou seja, o fato de se entender pela irrepetibilidade de valores recebidos de boa-fé não implica, por si só, negativa de vigência ao art. 115 da Lei nº 8.213/91.
No caso dos autos a repetição dos valores através do desconto de 30% (por cento) do valor do benefício no valor de um salário mínimo, afrontaria a garantia constitucional de renda mínima que permita a manutenção de necessidades vitais básicas, tais como moradia, alimentação, vestuário, higiene, etc.
Conforme documento juntado aos autos (evento 01 - EXTR4) com o desconto pretendido pelo réu, o valor do benefício de R$ 724,00, o que, vale dizer, já é insuficiente para o custeio das necessidades acima apontadas, se reduziria a R$ 506,80, reduzindo a segurada à condição de miserabilidade, o que no meu entender, não pode ser o escopo da legislação invocada pelo INSS.
Ainda, vale transcrever o que o Desembargador Federal Luiz Carlos de Castro Lugon oportunamente observou no julgamento da AC nº 1999.04.01.005654-0, DJ de 18-07-01, verbis:
(...)
Perdurando o desconto dos valores indevidamente pagos à impetrante, estará sendo vilipendiado o princípio do valor mínimo e reduzida a supremacia da norma constitucional. Não se cuida de inconstitucionalidade da norma prevista no art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, mas de aparente antinomia, que deve ser solucionada pela prevalência das regras e princípios constitucionais sobre as normas inferiores. Ante o conflito entre dois valores consagrados pela ordem jurídica, prevalece aquele mais caro aos fundamentos do Estado: a dignidade da pessoa humana. É certo que repugna à consciência jurídica de qualquer cidadão o enriquecimento sem causa, porém não se pode negar a esse mesmo cidadão as condições mínimas para a sua sobrevivência, diminuídas por um erro que a ele não pode ser atribuído, cometido unicamente pela administração. Destarte, deve ser restabelecido o pagamento do benefício da autora no valor de um salário mínimo, ficando vedada a realização de qualquer desconto que o reduza à importância inferior ao piso mínimo constitucional.
Assim, em se tratando de benefício no valor de um salário mínimo, está vedada a incidência de qualquer desconto.
(...)
Sendo assim, tenho que deve ser acolhido parcialmente o pleito do autor, para declarar inexigível o valor do débito apurado e para determinar que o INSS se abstenha de descontar os valores indevidamente recebidos por ocasião da aposentadoria NB 42/116.559.233-6 do benefício de aposentadoria que atualmente percebe (NB 42/121.637.300-8). Deverá também o INSS restituir à parte os valores que porventura já tenham sido descontados.
Prequestionamento
A jurisprudência sedimentou-se que para efeitos de prequestionamento, é dispensável que a decisão se refira expressamente a todos os dispositivos legais invocados, bastando, para tal propósito, o exame da matéria pertinente, o que supre a necessidade de prequestionamento e viabiliza o acesso às instâncias superiores.
Dessa forma, tenho por prequestionados todos os dispositivos aventados pela autarquia previdenciária (art. 588 do CPC, art. 876 do CC, arts. 103-A e 124, II da Lei 8.213/91 e art. 97 da Constituição Federal).
Assim, correta a r. sentença.
DOS CONSECTÁRIOS
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
a) CORREÇÃO MONETÁRIA:
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, e REsp n.º 1.103.122/PR).
Entendia a 3ª Seção deste Tribunal que a contar de 30/06/2009, data em que passou a viger a Lei nº 11.960/09, de 29/06/2009, publicada em 30/06/2009 (a qual alterou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97), deveria haver, para fins de atualização monetária, a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica aplicados à caderneta de poupança.
Não são aplicáveis, todavia, no que toca à correção monetária, os critérios previstos na Lei nº 11.960/2009, que modificou a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, por conta de decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, que apreciou a constitucionalidade do artigo 100 da CF, com a redação que lhe foi dada pela EC 62/2006. Essa decisão proferida pela Corte Constitucional, além de declarar a inconstitucionalidade da expressão "na data de expedição do precatório", do §2º; dos §§ 9º e 10º; e das expressões "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança" e "independente de sua natureza", do §12, todos do art. 100 da Constituição Federal de 1988, com a redação da Emenda Constitucional nº 62/2009, por arrastamento, também declarou inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960, de 29.07.2009 (atualização monetária pelo índice de remuneração da poupança).
Impõe-se, pois, a observância do que decidido com efeito erga omnes e eficácia vinculante pelo STF nas ADIs 4.357 e 4.425, restabelecendo-se, no que a sistemática anterior à Lei nº 11.960/09, ou seja, apuração de correção monetária pelo INPC.
A sentença deve ser adequada, quanto à correção monetária, aos critérios acima definidos. De fato, em razão do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, as disposições do art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/09, foram expungidas do ordenamento jurídico no que toca à correção monetária, a qual, como sabido, constitui acessório, sobre o qual pode e deve o órgão julgador deliberar. Eliminada do mundo jurídico uma norma legal em razão de manifestação do Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade, não pode subsistir decisão que a aplique, pois está em confronto com a Constituição Federal. Deve, portanto, haja vista os fundamentos constitucionais expostos, ser feita a adequação da correção monetária.
b) JUROS DE MORA
Até 20/06/2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de 30/06/2006, por força da Lei n.º 11.960, de 29/06/2009(publicada em 30/06/2009), que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança. Registre-se que a Lei 11.960/09, segundo o entendimento do STJ, tem natureza instrumental, devendo ser aplicada aos processos em tramitação (EREsp 1207197/RS. Relator Min. Castro Meira. Julgado em 18/05/2011).
Observo que as decisões tomadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não interferiram com a taxa de juros aplicável às condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça a partir do julgamento do RESP 1.270.439. Com efeito, como consignado pela Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, "No julgamento do Resp 1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da Lei 9.494/99 no que concerne à correção monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança".
DA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO:
Assim decidiu a 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal ao julgar em 09/08/07 a questão de ordem na apelação cível 2002.71.00.050349-7 (Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper):
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE.
1. Atento à necessidade de aparelhar o processo de mecanismos preordenados à obtenção do resultado prático equivalente à situação jurídica que se verificaria caso o direito material tivesse sido observado espontaneamente pelo "devedor" através da realização da conduta imposta pelo direito material, o legislador, que já havia, na época da edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) instituído a tutela específica do direito do "credor" de exigir o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes de relação de consumo, inseriu no ordenamento processual positivo, por meio da alteração no art. 461 do Código de Processo Civil operada pela Lei 8.952/94, a tutela específica para o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes das relações do direito material que não as de consumo.
2. A adoção da tutela específica pela reforma processual de 1994 do CPC veio para suprir, em parte, a morosidade judicial, na proporção em que busca dar ao cidadão aquilo e somente aquilo que lhe é devido, tirando o direito do plano genérico-abstrato da norma, conferindo-lhe efeitos concretos, com o fito de lhe garantir a mesma conseqüência do que aquela que seria obtida pelo adimplemento voluntário.
3. A sentença que concede um benefício previdenciário (ou assistencial), em regra, compõe-se de uma condenação a implantar o referido benefício e de outra ao pagamento das parcelas atrasadas. No tocante à determinação de implantação do benefício (para o futuro, portanto), a sentença é condenatória mandamental e será efetiva mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença.
5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal.
6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação.
7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora.
No caso dos autos, reconhecido o direito ao benefício, impõe-se a implantação.
A bem da celeridade processual, já que o INSS vem opondo embargos de declaração em todos os feitos nos quais determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos 128 e 475-O, I, do CPC e 37 da Constituição Federal de 1988, abordo desde logo a matéria.
Não se cogita de ofensa aos artigos 128 e 475-O, I, do CPC, porque a hipótese, nos termos do precedente da 3ª Seção, não é de antecipação, de ofício, de atos executórios. A implantação do benefício decorre da natureza da tutela judicial deferida, como a propósito, está expresso na ementa da Questão de Ordem acima transcrita.
A invocação do artigo 37 da Constituição Federal, por outro lado, é despropositada. Sequer remotamente pode-se falar em ofensa ao princípio da moralidade na concessão de benefício previdenciário por autoridade judicial competente.
Desta forma, em vista da procedência do pedido e do que estabelecem os artigos 461 e 475-I, caput, bem como dos fundamentos expostos na questão de ordem cuja ementa foi acima transcrita, e inexistindo embargos infringentes, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado deste acórdão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
DISPOSITIVO
Diante de todo o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7279157v2 e, se solicitado, do código CRC B3E4DB58. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/01/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005538-41.2014.404.7111/RS
ORIGEM: RS 50055384120144047111
RELATOR | : | Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dra. Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LONI MARIA SCHAEFER |
ADVOGADO | : | JUÇARA FERREIRA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/01/2015, na seqüência 105, disponibilizada no DE de 14/01/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7323002v1 e, se solicitado, do código CRC 61B504C2. | |
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