Apelação Cível Nº 5007697-39.2018.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC (RÉU)
APELADO: SERGIO CASTELLO BRANCO NAPPI (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
APELADO: ROBERTO MACIEL CASCAES (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
APELADO: ROGERIO CID BASTOS (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta por ROGERIO CID BASTOS e outros em face da UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC, postulando seja reconhecida a ilegalidade do ato administrativo que determinou a reposição ao erário dos valores pagos a título da rubrica URP no período de 07/2001 a 12/2007, em decorrência de decisão judicial que posteriormente foi revogada, bem como que a ré se abstenha de proceder a quaisquer atos de cobrança
Sentenciando, o juízo a quo assim decidiu:
Ante o exposto, rejeito as preliminares, confirmo a tutela de urgência anteriormente concedida e julgo procedente o pedido para: (1) declarar a ilegalidade dos descontos dos proventos dos autores relativos à rubrica "URP", paga a eles no período de junho de 2001 a dezembro de 2007; (2) condenar a UFSC a restituir aos autores os valores por ela eventualmente descontados a título da rubrica "URP", paga aos demandantes no período de junho de 2001 a dezembro de 2007, acrescidas de correção monetária e juros, nos termos da fundamentação.
Condeno a ré a pagar aos autores honorários advocatícios em 10% do valor da causa, corrigido.
Isenção de custas à UFSC (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).
Considerando que o valor da causa, respaldado por cálculos que eximem a pretensão econômica da ação, alcança a cifra de R$ 186.712,32, valor este muito inferior a 1.000 (um mil) salários mínimos, inexiste reexame necessário, a teor do disposto no art. 496, § 3º, I, do atual Código de Processo Civil.
Irresignada, a UFSC interpôs apelação sustentando a possibilidade de restituição dos valores, tendo em vista que se trata de restituição ao erário de valores recebidos em sede de antecipação de tutela/liminar posteriormente revogada, referentes ao período de julho de 2001 a dezembro de 2007, por força da decisão judicial proferida nos autos do MS 2001.34.00.0020574-8. Alega que, em caso de pagamento por força de decisões judiciais liminares precárias, não se pode admitir a alegação de boa-fé para afastar a obrigação de dever os valores recebidos. Defende que a natureza alimentar da verba não dispensa o ressarcimento de quantia recebida indevidamente e pertencente aos cofres público. Alternativamente, requer seja reformada em parte a decisão apelada, com a modificação do julgado para reconhecer a improcedência dos pedidos quanto às verbas correspondentes ao intervalo de julho/2001 a agosto/2002, tendo em vista que pagas enquanto válida a tutela antecipada deferida nos autos 2001.34.00.020574-8. Pede, por fim, a aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, para fins de correção monetária.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Preliminar
Na hipótese dos autos, cabe analisar inicialmente a ocorrência de litispendência ou coisa julgada em relação ao mandado de segurança coletivo nº 2001.34.00.020574-8 (0020541-40.2001.4.01.3400), impetrado pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior perante a Seção Judiciária do Distrito Federal em 17/07/2001.
Com efeito, é de ser observado o disposto no art. 22, da Lei 12.016/2009 c/c art. 104 da Lei n. 8.078/90, que assim dispõem:
Art. 22. No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.
§ 1o O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.
§ 2o No mandado de segurança coletivo, a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas.
Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.
Não prospera a alegação de que, ajuizado o mandado de segurança coletivo, restaria vedado o ajuizamento de ações individuais sobre a mesma matéria, independentemente do resultado da decisão, ou seja, ainda que julgado improcedente o mandamus. Entendimento contrário, implica em negar a aplicação da expressa disposição legal no sentido de que "O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais (...)".
Portanto, ainda que o pedido seja julgado improcedente em sede de mandado de segurança coletivo, e independente do motivo pelo qual o pedido foi negado, não há qualquer vedação ao ajuizamento de nova demanda individual pelos lesados. Entendimento contrário acabaria por violar o princípio constitucional do contraditório e ampla defesa, já que impediria à parte a devida tutela jurisdicional de seu direito em decorrência de decisão judicial originária em processo do qual não fez parte.
Atente-se que somente haveria impeditivo de ajuizamento de nova ação individual caso o titular do direito discutido atuasse como assistente na ação coletiva, o que não ocorreu na hipótese em tela.
Não se pode olvidar, igualmente, que na proposição de mandado de segurança coletivo não se está diante de substituição processual propriamente dita, uma vez que o legitimado coletivo também atua em nome próprio e na defesa dos direitos coletivos. Na verdade, há legitimação processual coletiva que justamente engloba "a possibilidade de almejar a proteção dos direitos coletivos lato sensu (difusos, coletivos e individuais homogêneos), ainda que haja coincidência entre os interesses próprios de quem atua com os daqueles que serão, em tese beneficiados com a decisão a ser prolatada" (Comentários a Lei do Mandado de Segurança: Lei 12.016/2009 - RT, 4ªd. atualizada, p. 212).
Nesses termos, conforme entendimento consolidado da jurisprudência pátria, inexiste litispendência entre ação coletiva e ação individual, não havendo que se falar em ocorrência de coisa julgada no caso concreto. Confiram-se os seguintes precedentes:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INTEGRAÇÃO DO JULGADO. PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSIDADE. 1. (...) 2. Conforme entendimento consolidado da jurisprudência pátria, inexiste litispendência entre ação coletiva e ação individual. À parte é dado o direito de se beneficiar do resultado da ação coletiva, não havendo, entretanto, obrigatoriedade de aguardar o deslinde daquela para poder ingressar em juízo, sob pena de se afrontar o direito constitucional de ação, art. 5º, XXXV. 3. Quanto ao pedido de pré-questionamento, cabe ressaltar que, a teor do artigo 1025 do Novo Código de Processo Civil, é suficiente a mera suscitação da matéria para se obter tal desiderato, com o que rejeito os embargos declaratórios no ponto. 4. Embargos parcialmente providos para correção de omissão. (TRF4, EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002271-51.2015.404.7103, 3ª TURMA, Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 15/09/2016)
ADMINISTRATIVO. PRELIMINARES. SERVIDOR PÚBLICO INATIVO. DNER. NOVO PLANO DE CARGOS E SALÁRIOS DO DNIT. LEI 11.171/2005. PARIDADE DE VALORES REMUNERATÓRIOS. APOSENTADORIAS E PENSÕES ANTERIORES À EMENDA CONSTITUCIONAL 41/2003. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA Nº 1.244.632/CE. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. REPERCUSSÃO GERAL Nº 810. 1. A existência de ação coletiva anterior não induz litispendência ou coisa julgada, não obstando, assim, o ajuizamento de ação individual, por constituir direito subjetivo dos autores. 2. (...) (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5067876-21.2013.4.04.7100, 3ª Turma , Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE JUNTADO AOS AUTOS EM 13/12/2017)
Portanto, o ajuizamento de ação coletiva anterior não induz litispendência ou coisa julgada, não sendo obstado o ajuizamento de ação individual, por constituir direito subjetivo dos autores. Há de se ressaltar que o objetivo das ações coletivas é proporcionar maiores meios de defesa da coletividade, não podendo restringir direitos individuais.
Do mérito
O juízo singular assim apreciou a controvérsia dos autos (Evento 24, SENT1):
"No mérito, superadas as preliminares, mantenho o entendimento esposado na liminar e nos embargos de declaração contra ela interpostos, no sentido de que as verbas pagas, tanto em decorrência de decisão liminar em processo judicial ulteriormente revogada, como em virtude de erro da administração não são passíveis de repetição pelo erário.
Reafirmo tal entendimento nos termos a seguir delineados.
A lide em foco abarca tanto valores pagos pela Administração em decorrência de liminar concedida em mandado de segurança coletivo, ulteriormente revogada quando da extinção sem resolução de mérito do referido writ (verbas pagas no período de julho de 2001 a 09/08/2002), bem como valores pagos em decorrência de erro da administração (10/08/2002 a dezembro de 2007), os quais os autores alegam terem percebido de boa-fé; e, por fim, a decadência do direito da Administração de reaver tais valores, ao argumento de que a restituição somente lhes foi exigida no ano de 2016.
Consoante a Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal "a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial".
A revisão administrativa, contudo, não pode ser feita a qualquer tempo no que toca a atos capazes de beneficiar o administrado - categoria na qual se enquadra a aposentadoria -, consoante expressa previsão legal:
Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
"Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
(...)".
Como a Lei acima mencionada é anterior aos atos que mantiveram o pagamento da URP aos autores no período de 2001 a dezembro de 2006, o prazo decadencial deve ser computado a partir de janeiro de 2007.
Entre o início do prazo decadencial acima estabelecido (janeiro de 2007) e a decisão administrativa que determinou a restituição dos valores pagos a título de UPR aos autores (2016), decorreu bem mais de 5 (cinco) anos, de modo que já tinha sido completamente fulminada pela decadência a faculdade de revisão do ato praticado, conferida à Administração.
Outrossim, confirmando o entendimento da tutela de urgência, tenho que os valores em foco foram recebidos de boa-fé pelos autores, de modo que são irrepetíveis.
Em relação ao período de julho de 2001 a 09/08/2002, as verbas foram pagas em virtude de liminar concedida no Mandado de Segurança Coletivo (MSC) nº. 2001.34.00.020574-8, ulteriormente revogada.
Ou seja, quanto a tal interregno a lide não abarca o pagamento de valores pagos em razão de erro da administração, mas sim de verba paga em face de decisão liminar concedida em juízo posteriormente revogada.
E, acerca do tema, que apesar de o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Repetitivo, no julgamento do REsp 1401560/MT, Relator para acórdão Ministro Ari Pargendler, em 12/02/2014, haja firmado o entendimento de que tais valores são sujeitos à repetição pela Administração Pública, o Supremo Tribunal Federal, em recentes decisões esposou entendimento diametralmente oposto, no sentido de que os valores recebidos em decorrência de liminar concedida pelo Poder Judiciário, configuram verba auferida de boa-fé, de modo a serem irrepetíveis.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes da Egrégia Suprema Corte:
Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR SERVIDORES PÚBLICOS. VALORES REFERENTES À PARCELA DE 10,87% (IPCR) E AO PAGAMENTO PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES GRATIFICADAS E CARGOS EM COMISSÃO. A NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM O DEVER DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DESPROVIDOS. 1. O acórdão recorrido foi publicado em período anterior à vigência do Novo Código de Processo Civil, razão pela qual os presentes embargos seguirão a disciplina jurídica da Lei nº 5.869/1973, por força do princípio tempus regit actum. 2. A omissão, contradição ou obscuridade, quando inocorrentes, tornam inviável a revisão da decisão em sede de embargos de declaração, em face dos estreitos limites do artigo 535 do CPC/1973. 3. A revisão do julgado, com manifesto caráter infringente, revela-se inadmissível, em sede de embargos (Precedentes: AI 799.509-AgR-ED, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJe 8/9/2011, e RE 591.260-AgR-ED, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJe 9/9/2011). 4. In casu, o acórdão embargado restou assim ementado: 'AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATOS DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR SERVIDORES PÚBLICOS. VALORES REFERENTES À PARCELA DE 10,87% (IPCR) E RELATIVOS A PAGAMENTO PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES COMISSIONADAS E CARGOS EM COMISSÃO. A NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO'. 5. Embargos de declaração DESPROVIDOS. (STF, MS 31259 AgR-ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 16/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-184 DIVULG 30/08/2016 PUBLIC 31/08/2016)
Ementa: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVOS REGIMENTAIS EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APOSENTADORIA. EXAME. DECADÊNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DIREITO AO PAGAMENTO DA UNIDADE DE REFERÊNCIA E PADRÃO - URP DE 26,05%, INCLUSIVE PARA O FUTURO, RECONHECIDO POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. PERDA DA EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO JUDICIAL, EM RAZÃO DA SUPERVENIENTE ALTERAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS FÁTICOS E JURÍDICOS QUE LHE DERAM SUPORTE. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À GARANTIA DA COISA JULGADA, DA SEGURANÇA JURÍDICA, DA BOA-FÉ E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. DEVOLUÇÃO DAS VERBAS PERCEBIDAS. IMPOSSIBILIDADE. 1. Nos termos da jurisprudência do STF, o ato de concessão de aposentadoria é complexo, aperfeiçoando-se somente após a sua apreciação pelo Tribunal de Contas da União, sendo, desta forma, inaplicável o art. 54, da Lei nº 9.784/1999, para os casos em que o TCU examina a legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. 2. Inexiste afronta ao princípio da separação de poderes quando o TCU não desconstitui decisão advinda do Poder Judiciário, mas apenas emite interpretação quanto à modificação das condições fáticas que justificaram a prolação da sentença, exercendo o seu poder-dever de fiscalizar a legalidade das concessões. 3. A eficácia temporal da sentença, cuidando-se de relação jurídica de trato continuado, circunscreve-se aos pressupostos fáticos e jurídicos que lhe serviram de fundamento, não se verificando ofensa ao princípio da coisa julgada quando o TCU verifica mudanças no conjunto fático que deu suporte à decisão. 4. Não se constata ofensa aos princípios da segurança jurídica e da boa-fé quando a alteração do contexto fático implica alteração dos fundamentos pelos quais o próprio direito se constituiu. 5. Esta Corte decidiu, quando do julgamento do MS 25.430, que as verbas recebidas a título de URP, que havia sido incorporado à remuneração dos servidores e teve sua ilegalidade declarada pelo Tribunal de Contas da União, até o momento do julgamento, não terão que ser devolvidas, em função dos princípios da boa-fé e da segurança jurídica, tendo em conta expressiva mudança de jurisprudência relativamente à eventual ofensa à coisa julgada de parcela vencimental incorporada à remuneração por força de decisão judicial. 6. Agravos regimentais a que se nega provimento. (STF, MS 27965 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 15/03/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-066 DIVULG 08/04/2016 PUBLIC 11/04/2016)
Diante do posicionamento do Supremo Tribunal Federal, posterior à decisão em recurso repetitivo pelo Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região também acatou o entendimento de que os valores recebidos em decorrência de decisão judicial posteriormente revogada são irrepetíveis em razão da boa-fé no seu recebimento. A título ilustrativo, cito os seguintes precedentes:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. AUXÍLIO-INVALIDEZ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RECEBIMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. precedentes do STF. Em relação às verbas remuneratórias recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração, é cediço que sua devolução é inexigível. Todavia, se o recebimento de tais valores decorre de decisão judicial precária, posteriormente revogada, a divergência jurisprudencial impera. De um lado, há o posicionamento do e. Superior Tribunal de Justiça, inclusive em sede de recurso repetitivo, no sentido de que são passíveis de devolução; de outro, existem precedentes do e. Supremo Tribunal Federal, reconhecendo o caráter irrepetível das parcelas de natureza alimentar percebidas de boa-fé.Considerando que a tese sustentada pela agravante não vem sendo acolhida pelo Supremo Tribunal Federal em casos análogos, há de prevalecer a orientação consubstanciada na decisão agravada, em observância ao decidido pela Suprema Corte, última instância do Judiciário nacional. (TRF4, AG 5000272-61.2017.404.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 16/03/2017)
EMENTA: PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESES DE CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO EMBARGADO. NATUREZA ALIMENTAR E PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM DEVER DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. ERRO MATERIAL. INEXISTÊNCIA.1. Os embargos de declaração são cabíveis para o suprimento de omissão, saneamento de contradição ou esclarecimento de obscuridade no julgamento embargado. A jurisprudência também os admite para a correção de erro material e para fins de prequestionamento.2. Os valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, com base em decisão judicial precária, não são passíveis de restituição. Precedentes do STF.3. Os embargos declaratórios não se prestam à reforma do julgado proferido, nem substituem os recursos previstos na legislação processual para que a parte inconformada com o julgamento possa buscar sua revisão ou reforma.4. Embargos declaratórios parcialmente providos apenas para fins de prequestionamento. (TRF4, APELREEX 2001.71.00.021937-7, QUARTA TURMA, Relator CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, D.E. 14/03/2017)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. RECEBIMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES.Os valores recebidos pelo segurado em razão de antecipação de tutela que posteriormente veio a ser revogada não são sujeitos à restituição, diante do seu caráter alimentar e da inexistência de má-fé. Precedentes do STF.Não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115, da Lei 8.213/91, o reconhecimento da impossibilidade de devolução ou desconto dos valores indevidamente percebidos. A hipótese é de não incidência do dispositivo legal, porque não concretizado o seu suporte fático. (TRF4, AC 0008366-93.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 17/03/2017)
Diante do atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, tenho que são irrepetíveis as verbas recebidas em virtude de decisão judicial posteriormente revogada, porquanto caracterizada a boa-fé daquele que as percebeu por decisão do próprio Poder Judiciário.
Igualmente, em relação aos valores pagos por erro da Administração (período de 10/08/2002 a dezembro de 2007), a sua repetição é indevida, eis que percebidos de boa-fé, conforme entendimento jurisprudencial remansoso (STJ., AgRg no REsp 788.822/MA, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 02/05/2013, DJe 14/05/2013; TRF4 5022736-86.2012.404.7200, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 31/05/2013; TRF4, AC 5056048-96.2011.404.7100, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Vânia Hack de Almeida, D.E. 04/06/2013; TRF4, AC 5054289-63.2012.404.7100, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, D.E. 31/05/2013; TRF4, AC 5008524-70.2011.404.7208, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, D.E. 22/05/2013).
No caso em apreço, o erro da Administração pode ser claramente identificado na Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa nº. 5006680-41.2013.4.04.7200, movida pela UFSC contra então Procurador Federal que havia emitido parecer no sentido de que o pagamento das aludidas verbas seriam devidas; bem como na Ação de Procedimento Comum nº. 2008.72.00.014271-7 (TRF) / 0014271-18.2008.4.04.7200; das quais se infere a atribuição de responsabilidade ao citado Procurador pelo pagamento e não dos servidores da UFSC.
Note-se que a ressalva contida em decisão de segundo grau nas citadas ações de que os valores indevidamente pagos deveriam ser cobrados dos servidores claramente não implica na responsabilização deste pelo recebimento em decorrência de erro da Administração.
Uma vez comprovado que os valores cuja restituição a UFSC requer decorrem de liminar concedida em processo judicial e de erro da Administração; bem como levando-se em consideração a prescrição do direito desta de postular a restituição dos valores percebidos pelos demandantes (gize-se, de boa-fé), procede a pretensão autoral."
Com efeito, no que toca à reposição de valores ao erário, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, "(...) a partir do julgamento do REsp 1.401.560/MT, Rel. p/acórdão Min. Ari Pargendler, submetido ao rito do art. 543-C, firmou-se orientação de que o servidor deve devolver os valores recebidos em virtude de decisão judicial precária, que venha a ser posteriormente revogada.' (AgRg no REsp 1.365.066/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, Segunda Turma, julgado em 18/08/2015, DJe 26/08/2015).
No mesmo sentido a orientação das Turmas da 2ª Seção desta Corte, do que é exemplo o seguinte julgado:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL PRECÁRIA E NÃO DEFINITIVA. BOA-FÉ. CARACTERIZAÇÃO.
É cediça na jurisprudência a orientação no sentido de que é obrigatória a devolução de vantagem patrimonial paga pelo erário, em face de cumprimento de decisão judicial precária ou não definitiva, desde que observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, nos termos do art. 46 da Lei n.º 8.112/90. A boa-fé tem como pressuposto a legítima crença de que os valores recebidos integram em definitivo o patrimônio do beneficiário. Se o pagamento ocorre por força de decisão judicial de natureza precária e não definitiva, posteriormente revogada, inexiste presunção de definitividade, o que impõe a restituição do numerário, sob pena de enriquecimento sem causa.
(TRF4, AC 5013692-43.2012.404.7200, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 14/07/2015).
Contudo, conquanto o STJ e esta Corte tenha firmado a tese de que, sendo a tutela antecipada provimento de caráter provisório e precário, a sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos, o presente caso apresenta peculiaridades que devem ser levadas em consideração.
Os autores foram beneficiados pela Ação Trabalhista nº 561/1989, ajuizada pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior - ANDES, tendo sido reconhecido na ocasião o direito ao reajuste remuneratório específico (URP de fevereiro/1989- 26/06% - Plano Verão). Com a incorporação do reajuste, referida verba passou a ser paga em rubrica específica, até que em 2002 a Administração, reapreciando a questão, reputou que o percentual deveria ser deduzido em datas-bases posteriores, o que acarretaria a cessação ainda em dezembro de 1989.
Determinada a cessação, o sindicato ajuizou nova ação coletiva, sob o nº 2001.34.00.020574-8 perante a 17ª Vara Federal de Brasília, com o intuito de reverter a supressão do pagamento da URP. Em referida ação, foi deferida antecipação de tutela em 07/2001, garantindo a manutenção dos pagamentos em favor dos servidores substituídos, a qual foi confirmada por sentença. Tal decisão foi reformada em outubro de 2007 no julgamento do recurso de apelação pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, tendo transitada em julgado em 26/08/2015
Com isso, pretende agora a UFSC cobrar do servidor tudo o que foi pago a título de URP desde a data em que obstado o desconto por força do deferimento da decisão provisória no processo 2001.34.00.020574-8. Ressalte-se que em março/2016 os autores foram notificados acerca da necessidade de reposição ao erário.
No caso, o longo tempo decorrido, a natureza alimentar da verba e as particularidades do caso em apreço conferem-lhe características peculiares, as quais devem ser ponderadas para se solucionar o litígio.
Por outro lado, trata-se o percentual referente à URP de parcela remuneratória que foi incorporada à folha de pagamentos entre as décadas de 1980 e 1990, incorporação que decorreu, tenha ou não havido interpretação equivocada do título, em tese, de decisão judicial (ação trabalhista). Os servidores, saliente-se, figuraram como substituídos, pelo que a iniciativa, de rigor, sequer foi pessoal. Ainda assim, beneficiados pelo título, tiveram reconhecido o direito à incorporação.
Não soa desarrazoada a afirmação de que, em tese, os valores, até que afirmado em definitivo que deveria ocorrer a cessação, estavam sendo recebidos (e a própria Administração, como já afirmado, entendia assim) por força de decisão judicial (ação trabalhista). Sendo este o quadro, defensável, em princípio, a aplicação da mesma ratio que inspirou os precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que descabida a restituição de valores recebidos por conta de decisão judicial transitada em julgado:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. VALORES RECEBIDOS POR SERVIDOR PÚBLICO EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA POR MEIO DE AÇÃO RESCISÓRIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Nº 1.401.560/MT. INAPLICABILIDADE.
1. 'A jurisprudência do STJ firmou o entendimento no sentido de que, em virtude da natureza alimentar, não é devida a restituição dos valores que, por força de decisão transitada em julgado, foram recebidos de boa-fé, ainda que posteriormente tal decisão tenha sido desconstituída em ação rescisória'. (AgRg no AREsp 2.447/RJ, Rel.Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/04/2012, DJe 04/05/2012)
2. O entendimento consolidado pela Primeira Seção do STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.410.560/MT, segundo o qual é legítimo o desconto de valores pagos em razão do cumprimento de decisão judicial precária, posteriormente revogada, não tem aplicação no caso dos autos, pois na hipótese o pagamento decorreu de sentença judicial definitiva, desconstituída em ação rescisória.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp 463.279/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 08/09/2014)
Em sentido similar o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal:
SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE 1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010)
2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua restituição.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.(MS 25921 AgR-segundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/09/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 25-09-2015 PUBLIC 28-09-2015)
Deve ser registrado, ainda, que na ação 2001.34.00.020574-8 a sentença, proferida no dia 19/03/2002, foi de procedência, determinando a manutenção do pagamento da rubrica até o julgamento final dos recursos interpostos pela impetrante sobre o alcance temporal da incorporação referida nos autos da Reclamatória Trabalhista nº 561/89. Referida decisão posteriormente foi reformada em sede de apelação. Portanto, mesmo que posteriormente a decisão judicial tenha sido reformada por meio de julgamento do recurso, não há que se falar em devolução dos valores recebidos de boa-fé pelos ora demandantes.
A ordem concedida no Mandado de Segurança 2001.34.00.020574-8 teria perdido seu objeto em 09/08/2002, data do trânsito em julgado do último recurso na Reclamatória Trabalhista nº 561/89. Contudo, somente em março de 2016 a UFSC deu início ao processo de reposição ao erário.
Pode-se afirmar, assim, sob outra ótica, que plausível a alegação de que os pagamentos não se deram por força de decisão provisória, mas, sim, por erro da administração, que continuou a pagar a URP, a despeito da inexistência, a partir de então, de manifestação judicial definitiva afirmando que a cessação estava incorreta.
Com efeito, o STJ e esta Corte vêm decidindo de forma reiterada que verbas de caráter alimentar pagas a maior em face de conduta errônea da Administração ou da má interpretação legal não devem ser devolvidas quando recebidas de boa-fé pelo beneficiário. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ART. 46, CAPUT DA LEI Nº 8.112/90. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DA LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. BOA-FÉ DO ADMINISTRADO. RECURSO SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC.
1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de interpretação equivocada de lei.
2. O art. 46, caput, da Lei nº 8.112/90 deve ser interpretado com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé.
3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público.
4. Recurso afetado a Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido a regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.
5. Recurso Especial não provido. (REsp 1244182/PB, 1ª Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJ-e 19/10/2012)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. URP DE FEVEREIRO/1989. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. IMPOSSIBILIDADE. PRESENÇA DA BOA-FÉ. Em conformidade com jurisprudência pacífica no Superior Tribunal de Justiça, presente a boa-fé, os erros de interpretação ou má aplicação da lei constituem hipóteses de dispensa de reposição ao erário de valores recebidos indevidamente. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005769-24.2016.404.7200, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 07/04/2017)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR INATIVO. VALORES RECEBIDOS POR DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. CARACTERIZADA A BOA-FÉ. INDEVIDA A DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO. - Em virtude do princípio da legítima confiança, o servidor público, em regra, tem a justa expectativa de que são legais os valores pagos pela Administração Pública, porquanto jungida à legalidade estrita. Desse modo, após o trânsito em julgado da decisão que reconheceu ser indevido o pagamento da parcela atinente à URP, poderia a ré ter imediatamente notificado o demandante para promover a suspensão dos pagamentos, entretanto, somente procedeu de tal maneira em março de 2015, não podendo a inércia da Administração servir de fundamento para justificar o afastamento da boa-fé objetiva do autor no recebimento dos valores guerreados. - Diante da ausência da comprovação da má-fé no recebimento dos valores pagos pela Administração, não se pode efetuar qualquer desconto na remuneração do servidor público a título de reposição ao erário. Incide no caso vertente o denominado princípio da irrepetibilidade dos alimentos, visto que os valores discutidos nos autos foram auferidos com arrimo em decisão judicial que se pautou na convicção do Magistrado, de onde se extrai a presunção de boa-fé do jurisdicionado que se beneficiou da medida. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001603-86.2015.404.7101, 4ª TURMA, Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/09/2016
Inclusive, sobre o tema objeto desta ação, assevero que recente julgado da 3ª Turma ampliada deste TRF4 reconheceu ser descabida a restituição de valores recebidos a título de URP, in verbis:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. DESCONTOS DE REMUNERAÇÃO. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. SITUAÇÃO PECULIAR, NA QUAL EVIDENCIADA, ADEMAIS, A BOA-FÉ DO BENEFICIÁRIO. ACOLHIMENTO DO PEDIDO PARA RECONHECER A ILICITUDE DOS DESCONTOS. 1. Trata-se o percentual referente à URP de parcela remuneratória que foi incorporada à folha de pagamentos entre as décadas de 1980 e 1990, incorporação que decorreu, tenha ou não havido interpretação equivocada do título, em tese, de decisão judicial (ação trabalhista). Os servidores, saliente-se, figuraram como substituídos, pelo que a iniciativa, de rigor, sequer foi pessoal. 2. Razoável o entendimento de que, em tese, os valores, até que afirmado em definitivo que deveria ocorrer a cessação, estavam sendo recebidos (e a própria Administração entendia assim) por força de decisão judicial (ação trabalhista). Sendo este o quadro, aplicável a mesma ratio que inspirou os precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que descabida a restituição de valores recebidos por conta de decisão judicial transitada em julgado. 3. Acolhimento do pedido para declarar indevidos os descontos questionados. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007453-13.2018.4.04.7200, 3ª Turma , Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, DECIDIU, POR MAIORIA JUNTADO AOS AUTOS EM 20/03/2019)
Nestes termos, mantém-se a sentença que determinou à Universidade Federal de Santa Catarina que se abstenha de exigir dos autores a reposição ao erário dos valores recebidos a título de URP.
Juros de mora e correção monetária
Com relação aos juros moratórios e correção monetária de débitos não tributários incidentes sobre as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, segundo critérios previstos no art. 1º- F da Lei nº 9.497/97, com redação conferida pela Lei nº 11.960/09, o STF, apreciando o tema 810 da Repercussão Geral (RE 870.947), fixou as seguintes teses:
a) ... quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09;
b) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.
A partir desse julgamento, passei a determinar a incidência do IPCA-E, ao invés da TR, por ser o índice que melhor reflete a inflação acumulada no período. Ademais, a aplicação de tal índice de atualização monetária passou a contar com o respaldo da tese fixada pelo Superior Tribunal de Justiça, quando apreciou o Tema 905.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, por meio de decisão monocrática do Ministro Luiz Fux, em razão do pedido de modulação dos efeitos do acórdão proferido no julgamento do RE nº 870.947, deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pelos entes federativos estaduais.
Da referida decisão, datada de 24/09/2018, ressalta-se o seguinte fundamento:
Desse modo, a imediata aplicação do decisum embargado pelas Instâncias a quo, antes da apreciação por esta Suprema Corte do pleito de modulação dos efeitos da orientação estabelecida, pode realmente dar ensejo à realização de pagamentos de consideráveis valores, em tese, a maior pela Fazenda Pública, ocasionando grave prejuízo às já combalidas finanças públicas.
Assim, considerando a possibilidade de modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade da aplicação da TR como índice de correção monetária das condenações impostas à Fazenda Pública, impõe-se aguardar o desfecho do julgamento dos embargos de declaração opostos no RE nº 870.947.
Com efeito, enquanto pendente o efeito suspensivo atribuído pelo Ministro Relator do Recurso Extraordinário em questão, mostra-se adequado diferir para a fase de execução a forma de cálculo da atualização monetária.
Dos honorários advocatícios
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
A partir dessas considerações, tenho que os honorários advocatícios devidos pela parte ré devem ser fixados à taxa de 10% sobre o valor da causa, pois conforme previsto no art. 85 do novo CPC.
De qualquer maneira, levando em conta o improvimento do recurso do réu, associado ao trabalho adicional realizado nesta Instância, no sentido de manter a sentença de procedência, a verba honorária deve ser majorada em favor do patrono da parte vencedora.
Assim sendo, em atenção ao disposto no art. 85, § 2º c/c §§ 3º e 11, do novo CPC, majoro os honorários de 10% para 12% (doze por cento) incidentes sobre o valor da causa.
Conclusão
Mantém-se integralmente a sentença.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da UFSC e, de ofício, diferir para a fase de cumprimento de sentença a definição dos índices de correção monetária e juros de mora, restando prejudicada a apelação da UFSC no tocante.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001009187v2 e do código CRC dae140e4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 25/4/2019, às 10:53:13
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Apelação Cível Nº 5007697-39.2018.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC (RÉU)
APELADO: SERGIO CASTELLO BRANCO NAPPI (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
APELADO: ROBERTO MACIEL CASCAES (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
APELADO: ROGERIO CID BASTOS (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
EMENTA
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. DESCONTOS DE REMUNERAÇÃO. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. SITUAÇÃO PECULIAR, NA QUAL EVIDENCIADA, ADEMAIS, A BOA-FÉ DO BENEFICIÁRIO. ACOLHIMENTO DO PEDIDO PARA RECONHECER A ILICITUDE DOS DESCONTOS.
1. Trata-se o percentual referente à URP de parcela remuneratória que foi incorporada à folha de pagamentos entre as décadas de 1980 e 1990, incorporação que decorreu, tenha ou não havido interpretação equivocada do título, em tese, de decisão judicial (ação trabalhista). Os servidores, saliente-se, figuraram como substituídos, pelo que a iniciativa, de rigor, sequer foi pessoal.
2. Razoável o entendimento de que, em tese, os valores, até que afirmado em definitivo que deveria ocorrer a cessação, estavam sendo recebidos (e a própria Administração entendia assim) por força de decisão judicial (ação trabalhista). Sendo este o quadro, aplicável a mesma ratio que inspirou os precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que descabida a restituição de valores recebidos por conta de decisão judicial transitada em julgado.
3. Acolhimento do pedido para declarar indevidos os descontos questionados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da UFSC e, de ofício, diferir para a fase de cumprimento de sentença a definição dos índices de correção monetária e juros de mora, restando prejudicada a apelação da UFSC no tocante, com ressalva da Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA e da Des. Federal MARGA BARTH TESSLER, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de abril de 2019.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001009188v3 e do código CRC 3a0711b7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 25/4/2019, às 10:53:13
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/04/2019
Apelação Cível Nº 5007697-39.2018.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
SUSTENTAÇÃO ORAL: PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO por ROBERTO MACIEL CASCAES
APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC (RÉU)
APELADO: ROGERIO CID BASTOS (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
ADVOGADO: PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO
APELADO: SERGIO CASTELLO BRANCO NAPPI (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
ADVOGADO: PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO
APELADO: ROBERTO MACIEL CASCAES (AUTOR)
ADVOGADO: BRENDALI TABILE FURLAN
ADVOGADO: PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/04/2019, na sequência 211, disponibilizada no DE de 29/03/2019.
Certifico que a 3ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UFSC E, DE OFÍCIO, DIFERIR PARA A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA A DEFINIÇÃO DOS ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA, RESTANDO PREJUDICADA A APELAÇÃO DA UFSC NO TOCANTE, COM RESSALVA DA DES. FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA E DA DES. FEDERAL MARGA BARTH TESSLER.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Ressalva em 22/04/2019 18:16:02 - GAB. 33 (Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA) - Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA.
Considerando a posição firmada quando do julgamento das apelações nºs 50076904720184047200 e 50070911120184047200, iniciado nesta 3ª Turma e finalizado na forma preconizada pelo artigo 942 do CPC, passo a acompanhar o entendimento majoritário no sentido de que não é devida a restituição dos valores pagos a título de URP aos servidores da UFSC que foram beneficiados com ações ajuizadas pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES (Ação Trabalhista nº 561/1989 e Mandado de Segurança 2001.34.00.020574-8).
Com a presente ressalva, acompanho o eminente Relator.
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:45:57.