Apelação/Remessa Necessária Nº 5022044-53.2013.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
APELANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT (RÉU)
APELANTE: CONCESSIONÁRIA AUTOPISTA LITORAL SUL S.A (RÉU)
APELADO: ANA PAULA DE OLIVEIRA (AUTOR)
RELATÓRIO
Esta apelação ataca sentença proferida em ação ordinária que discutiu sobre indenização por danos materiais, morais e estéticos decorrentes de acidente de trânsito (queda de motocicleta) causado pela falta de adequada manutenção da rodovia (existência de buraco na faixa de rolamento).
A sentença julgou procedente a ação (evento 246), assim constando do respectivo dispositivo:
Ante o exposto: 01. Julgo procedente, em parte, o pedido e extingo o feito forte no art. 487, I, do NCPC. Em consequência, condeno os réus, solidariamente, ao pagamento de indenização (a) por danos emergentes no importe de R$ 1.473,78, (b) por lucros cessantes, atinentes ao período de 28-08-2013 a 17-03-2014, correspondente à diferença entre o salário que a autora deveria ter percebido se estivesse trabalhando normalmente e o que de fato percebeu a título de auxílio-doença, considerando-se todas as verbas remuneratórias devidas, inclusive gratificação natalina, a ser apurado em liquidação de sentença, e (c) por danos morais, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), tudo com incidência da taxa SELIC a partir da data do evento danoso, 12-08-2013. 02. Em face da sucumbência recíproca, condeno os réus solidariamente ao pagamento de honorários advocatícios à base de 10% sobre o valor da condenação, bem como condeno a autora ao pagamento de honorários advocatícios, pro rata, no valor de R$ 5.000,00, atualizado pelo IPCA-E, com exigibilidade suspensa em face da AJG deferida (Ev4). 03. Custas iniciais pela autora, isentas em razão da AJG, e custas finais pelos réus, pro rata, isento o DNIT da sua parte. 04. Sentença sujeita a reexame necessário; decorrido prazo legal sem a interposição de recurso voluntário, remetam os autos à superior instância. Interposta tempestiva e preparada apelação, a Secretaria receba-a no duplo efeito, colha contrarrazões e a remeta ao E. TRF4. 05. A Secretaria oportunamente arquive. 06. P.R.I.
Apela Autopista (evento 253 ), pedindo a reforma da sentença e o deferimento de seus pedidos. Alega que: (1) a condenação da recorrente ao pagamento de danos morais revela-se totalmente descabida, uma vez que, além da situação vivenciada não ter sido capaz de provocar danos de natureza moral à apelada, a quantia arbitrada pelo juízo, R$ 30.000,00 (trinta mil reais) demonstrou-se manifestamente exorbitante; (2) por se tratar de uma sentença indenizatória (e não remuneratória) a Taxa SELIC deve estar totalmente afastada, devendo ser aplicada a Tabela de Correção da Justiça Federal, sendo os juros de mora fixados no patamar de 1% (um por cento) ao mês, a partir do trânsito em julgado da decisão.
Apela DNIT (evento 256), pedindo a reforma da sentença e a improcedência da ação. Alega que: (1) é parte passiva ilegítima, porque a rodovia estava sob concessão; (2) quando o dano alegado decorre de uma omissão do Estado, está-se diante da responsabilidade subjetiva, a qual depende, além do fato danoso, da comprovação de culpa ou dolo, e do nexo de causalidade, bem como a inexistência de excludentes de responsabilidade estatal, o que não ocorreu no caso dos autos; (3) deve ser reduzido o valor da indenização por danos morais; (4) devem ser observados os índices de correção monetária e juros estipulados na Lei nº 11.960/09.
Houve contrarrazões.
O processo foi incluído em pauta.
É o relatório.
VOTO
Examinando os autos e as alegações das partes, fico convencido do acerto da sentença de parcial procedência quanto ao mérito, devendo apenas ser reformada no que se refere ao valor da indenização por danos morais, para reduzir, e quanto à correção monetária e juros. Portanto, transcrevo e adoto como razão de decidir, a sentença proferida pelo juiz federal Alcides Vettorazzi, a saber:
II - FUNDAMENTOS.
Trata-se de ação com a qual a autora pretende a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos materiais, morais e estéticos decorrentes de acidente de trânsito (queda de motocicleta) causado pela falta de adequada manutenção da rodovia (existência de buraco na faixa de rolamento).
Preliminares suscitadas pelo DNIT. As preliminares de ilegitimidade passiva ad causam e inépcia da inicial suscitadas pelo DNIT em sua contestação (Ev23) foram afastadas em decisão interlocutória (Ev37).
Irresignado em relação à rejeição da preliminar de ilegitimidade passiva, DNIT interpôs agravo de instrumento (AI nº 5026039-09.2014.4.04.0000), ao qual a 4ª Turma do E. TRF4 negou provimento, em Acórdão assim ementado (Ev46):
PROCESSUAL. CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO DNIT. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MÁ CONSERVAÇÃO DE RODOVIA FEDERAL. O DNIT é parte legítima para figurar no polo passivo de ação de indenização por acidente de trânsito ocorrido em via federal, ainda que objeto de concessão, em razão do dever de fiscalização permanente do serviço público previsto na Lei nº 10.233/2001. (TRF4, AG 5026039-09.2014.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 05/12/2014)
Após ter seus embargos de declaração parcialmente provido para fins exclusivos de prequestionamento, DNIT interpôs recurso especial, que foi recebido de forma retida, na forma do art. 542, § 3°, do CPC, em decisão que foi mantida após pedido de reconsideração.
Portanto, a matéria, nesta instância, se encontra exaurida.
Preliminar de impossibilidade de chamamento ao processo após a contestação. Após a primeira audiência de instrução, em decisão interlocutória (Ev86), deferi o chamamento ao processo da concessionária Autopista Litoral Sul S.A., forte no art. 130, III, do NCPC.
Autopista suscitou preliminar de impossibilidade de chamamento ao processo após a apresentação da contestação pelo DNIT (Ev101) e, paralelamente, interpôs agravo de instrumento (AI nº 5028674-89.2016.4.04.0000) ventilando a mesma matéria (Ev99), recurso ao qual o E. TRF4 negou provimento, sobrevindo trânsito em julgado em 29-09-2017.
Essa preliminar, destarte, está definitivamente superada.
Preliminar de ilegitimidade ativa ad causam. A Autopista suscitou preliminar de ilegitimidade ativa ad causam em relação ao pedido de danos materiais (danos emergentes), aos argumentos de que a autora não é proprietária da motocicleta e tampouco comprovou ter efetivamente arcado com o custo de manutenção do veículo (Ev101-CONT1).
Na réplica (Ev106), a autora disse que "apesar de a moto não ter sido transferida para seu nome, foi comprada no dia 10/10/2013 conforme comprova o DUT devidamente assinado pelo sr. João Phelipe Fortunato Rocha, restando claro ser a Autora proprietária do veículo e por conseguinte, legitima para pleitear as indenizações requeridas. Não há que se falar em ilegitimidade ativa, pois mesmo não constando como proprietária do veículo, suportou os prejuízos decorrentes do ato ilícito, além de ser a real proprietária do veículo". Juntou a autora documento de transferência do veículo, com data de 10-10-2013 (Ev106-OUT2/3).
Em juízo, a autora (Ev197AUDIO1) disse que comprou a moto, e não fez a transferência imediata por falta de dinheiro.
A preliminar não merece prosperar.
Ainda que o acidente tenha ocorrido em 12-08-2013 (Ev1-OUT3, p. 1/4) e a venda da motocicleta tenha sido formalizada apenas em 10-10-2013 (Ev106-OUT2/3), está claro que a autora é proprietária do veículo.
A presente ação foi ajuizada em 21-11-2013, quando a venda inclusive já havia sido formalizada. Portanto, ainda que pairem dúvidas sobre a propriedade à época do acidente (12-08-2013), por ocasião do ajuizamento da ação a autora já havia formalizado a compra, o que lhe concede legitimidade para a lide.
No mais, a ausência de comprovação de efetiva manutenção é matéria de mérito, de sorte que será oportunamente apreciada.
Afasto, pois, essa preliminar.
Mérito. A Constituição Federal de 1988, reafirmando a teoria do risco administrativo e estabelecendo a responsabilidade civil objetiva do Estado pelos atos dos seus agentes e das prestadoras de serviço público, assim dispôs:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
O Pleno do Supremo Tribunal Federal, à luz desse preceptivo constitucional, por ocasião do julgamento do RE 841.526, em 30-03-2016, de relatoria do Ministro Luiz Fux, sob o regime de repercussão geral, firmou posição no sentido de que mesmo na hipótese de ato omissivo o Estado deve responder de forma objetiva, conquanto que ostente o dever legal e haja efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso, conforme Acórdão que segue:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR MORTE DE DETENTO. ARTIGOS 5º, XLIX, E 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A responsabilidade civil estatal, segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, posto rejeitada a teoria do risco integral. 2. A omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso. 3. É dever do Estado e direito subjetivo do preso que a execução da pena se dê de forma humanizada, garantindo-se os direitos fundamentais do detento, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal). 4. O dever constitucional de proteção ao detento somente se considera violado quando possível a atuação estatal no sentido de garantir os seus direitos fundamentais, pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil objetiva estatal, na forma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. 5. Ad impossibilia nemo tenetur, por isso que nos casos em que não é possível ao Estado agir para evitar a morte do detento (que ocorreria mesmo que o preso estivesse em liberdade), rompe-se o nexo de causalidade, afastando-se a responsabilidade do Poder Público, sob pena de adotar-se contra legem e a opinio doctorum a teoria do risco integral, ao arrepio do texto constitucional. 6. A morte do detento pode ocorrer por várias causas, como, v. g. , homicídio, suicídio, acidente ou morte natural, sendo que nem sempre será possível ao Estado evitá-la, por mais que adote as precauções exigíveis. 7. A responsabilidade civil estatal resta conjurada nas hipóteses em que o Poder Público comprova causa impeditiva da sua atuação protetiva do detento, rompendo o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso. 8. Repercussão geral constitucional que assenta a tese de que: em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte do detento. 9. In casu, o tribunal a quo assentou que inocorreu a comprovação do suicídio do detento, nem outra causa capaz de romper o nexo de causalidade da sua omissão com o óbito ocorrido, restando escorreita a decisão impositiva de responsabilidade civil estatal. 10. Recurso extraordinário DESPROVIDO.
Destarte, a responsabilidade civil do Estado e das pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos, como regra, depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.
Ação ou omissão. O DNIT, por força das disposições da Lei n° 10.233, de 2001, tem a atribuição de administrar, diretamente ou por meio de convênios, de delegação ou cooperação, os programas de operação, manutenção, conservação, restauração e reposição de rodovias (art. 82, IV), de modo que deve responder pela falta do serviço de manutenção rodoviária, ainda que se trate de trecho de rodovia em regime de concessão, caso em que a concessionária também será responsável pela manutenção ou pela falta desta. Portanto, na hipótese há o dever legal de agir, tanto do DNIT quanto da concessionária, para que seja evitado eventual dano aos usuários da rodovia pela falta de manutenção. Cuida-se, pois, de caso de responsabilidade objetiva, consoante os parâmetros assentados pela Corte Excelsa no RE 841.526.
Na espécie, no Boletim de Acidente de Trânsito nº 8304949 (Ev1-OUT3, p. 1), que diz respeito ao acidente objeto da lide, consta, no espaço destinado à descrição da "condição da rodovia", que o estado de conservação da pista de rolamento era "ruim", e, no espaço destinado ao "texto descritivo da condição da rodovia", há a seguinte anotação: "a condutora seguia na via marginal que apresentava alguns buracos".
A Policial Rodoviária Federal Sheila Maria Neves Martins, que atendeu a ocorrência (Ev1-OUT3, p. 1/4), inquirida em juízo, disse que ainda lembrava do buraco na pista em frente ao Shopping Itaguaçu, em frente ao posto de gasolina (Ev83AUDIO3). Ademais, na inicial, há inclusive fotos do local, nas quais os buracos aparecem já cobertos por asfalto, mas perfeitamente delineados (Ev1-OUT3, p. 8/10).
A omissão, portanto, é inequívoca.
Nexo causal. O nexo causal entre a omissão (falta do serviço) e a queda da autora está sobejamente comprovado, sobretudo pelo que consta no Boletim de Acidente de Trânsito nº 8304949 (Ev1-OUT3, p. 1/4), onde restou induvidosa a causa do acidente, conforme se infere da "narrativa da ocorrência" (Ev1-OUT3, p. 2):
Conforme observações do local e declaração de testemunhas e da condutora, o veículo 01 seguia em frente na via marginal sentido decrescente quando passou em cima de um buraco na posta, perdeu o controle da direção e caiu, sofrendo lesões.
Veja-se que a conclusão acerca da causa do acidente decorreu não só das declarações da condutora (autora), mas também de testemunhas, tudo aliado à observação das condições do local.
O nexo causal, portanto, está comprovado.
Excludentes de nexo de causalidade. A Suprema Corte, no julgamento do RE 841.526, suso referido, ao fixar a responsabilidade objetiva do Estado na hipótese de condutas omissivas, ressalvou a possibilidade de oposição de causas excludentes do nexo causal, mas atribuiu ao Estado a responsabilidade de fazer prova a esse respeito, conforme se infere do voto condutor do Acórdão, exarado pelo Ministro Luiz Fux:
Diante de tais considerações, é possível extrair um denominador comum a todas as situações específicas retratadas acima: há casos em que a morte do detento simplesmente não pode ser evitada pelo Estado. Nesses casos, como já se ressaltou acima, rompe-se o nexo de causalidade entre o resultado morte e a omissão estatal no seu dever de manter a incolumidade física dos presos, o que afasta a responsabilização civil do ente público. Adota-se aqui, portanto, a teoria do risco administrativo, que permite a oposição de causas excludentes do nexo causal - as quais devem ser comprovadas pela Administração -, rejeitando-se, por consequência, a incidência da teoria do risco integral, não recepcionada pela ordem constitucional brasileira, que implicaria a imposição de responsabilidade civil ao Estado por toda e qualquer morte de detento
Na mesma linha, ponderou o Ministro Edson Fachin no mesmo julgamento, em sua antecipação de voto:
Portanto, se houver uma demonstração cujo ônus probatório é do próprio Estado, é possível, como diz Sua Excelência, a exoneração ou a demonstração de uma cláusula excludente do nexo de causalidade; mas esse ônus probatório evidentemente se atribui ao poder público. Por isso, tomei a liberdade, na formulação originária, na qual o eminente Relator reconhece a responsabilidade civil do Estado, diante da morte do detento, pela não observância de um dever específico, o seu dever de manter a incolumidade, e introduzir como sugestão apenas, dizendo que essa infração não constitui em ilícito omissivo impróprio, mas sim um ilícito omissivo próprio, que é a diferenciação, dentre outros, dois grande autores do Direito Administrativo brasileiro, o professor Juarez Freita e o professor Marçal Justen Filho adotam, exatamente para demonstrar que o dever probatório é do Estado para, se der cabo dessa demonstração, expor uma excludente da sua responsabilidade, demonstrando que não houve uma infração a um dever específico da diligência estatal. (...)
Cabe à parte ré, dessarte, comprovar eventual excludente de nexo causal, na forma do art. 373, II, do CPC.
No caso em tela, a Concessionária Autopista sustenta que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima ou, ao menos, com culpa concorrente. Diz a contestação (Ev101-CONT1):
32. Por conseguinte, o acidente deu-se em virtude da imperícia e imprudência da Autora, que trafegava em desatenção, provavelmente em velocidade incompatível com a rodovia, vindo a perder o controle da direção da motocicleta e cair sobre a marginal do Km 205 da BR-101.
O próprio prontuário de atendimento hospitalar, indica que a Autora caiu da motocicleta a uma velocidade de mais ou menos 80 km/h. A Autora, rememora-se, encontra-se em uma marginal, onde a velocidade máxima é de 60 km/h. É evidente que a Autora estava conduzia a motocicleta imperitamente.
33. A perda do controle da direção de uma motocicleta, em uma via reta, denota culpa por parte do condutor, especialmente na modalidade imperícia e imprudência. Todo condutor está obrigado a ter um mínimo de preparo e habilidade que lhe permita identificar riscos e evitar cair na rodovia, mantendo a velocidade compatível com o estado da via.
Como cediço, a velocidade e a direção que o veículo recebe constituem fatores determinantes da colisão, sendo possível ao motorista evitá-la usando de atividade e prudência.
(...)
35. Portanto, presume-se a imperícia e imprudência do condutor que, trafegando em uma via plana e reta, em condições climáticas favoráveis, perde ao controle da motocicleta e cai sobre marginal da via.35. Portanto, presume-se a imperícia e imprudência do condutor que, trafegando em uma via plana e reta, em condições climáticas favoráveis, perde ao controle da motocicleta e cai sobre marginal da via.
III.3. SUBSIDIARIAMENTE – CULPA CONCORRENTE DA VÍTIMA – APLICAÇÃO DO ART. 945 DO CÓDIGO CIVIL
37. Não bastante, releva destacar, de forma subsidiária, para efeito de exaurir a defesa, que, caso se entenda presente parcela de responsabilidade da Concessionária Autopista pelo evento danoso, impõe-se reconhecer, no mínimo, a configuração de culpa concorrente da Autora para a ocorrência do evento danoso.
Deveras, se, por um lado, cogitar-se da existência de suposto defeito na pista que tenha contribuído para o sinistro, por outro lado, é inarredável a constatação de que o acidente ocorreu também – e principalmente – porque a Autora trafegava sem observância das mínimas normas de segurança exigidas, já que não conseguiu manter o controle de seu veículo. Estivesse a Autora conduzindo sua motocicleta com cuidado e atenção, atento às particularidades da rodovia, certamente teria evitado a suposta colisão.
Na mesma esteira é a defesa do DNIT (Ev23-CONT1):
Outrossim, cabe registrar que a lei de trânsito prevê condutas obrigatórias aos condutores de veículos nas vias públicas. É que o motorista deve ter sempre o domínio pleno de seu veículo e evitar qualquer ato que possa causar danos a pessoas, animais, propriedade pública ou privada, porém, tais condutas não foram observadas. Então, agiu o motorista do veículo, nesse caso, com a mais completa imprudência e imperícia ao não conseguir corretamente evitar o acidente nos moldes como se deu, o que deve ter sido a causa única para o resultado.
A não ocorrência de outros acidentes naquele local nas horas que antecederam o acidente da parte autora, leva ao óbvio entendimento de que o problema ocorreu somente com o veículo da autora e não com outros veículos e que pudesse ter gerado uma deficiência no atendimento público e, consequentemente (e como única causa), o acidente ora noticiado.
Nas imagens acostadas, é possível detectar a presença de um buraco, porém ficou nítido que há espaço para desviar o buraco na rodovia, o que possivelmente não foi feito por falta de atenção da condutora enquanto transitava.
Então, deveria encontrar-se ela dirigindo de forma mais cautelosa e adequada a essa situação fática do trânsito no local, em velocidade compatível que pudesse aplicar a direção defensiva
As alegações dos réus, como se vê, estão estribadas em meras suposições, uma vez que não encontram apoio na prova carreada aos autos. Ressalto qe a velocidade da motocicleta anotada no prontuário médico (aproximadamente 80 Km/m - Ev1-OUT3, p. 16) é notoriamente estimativa, de modo que não pode ser tomada como referência para imputar à autora responsabilidade, exclusiva ou concorrente, pelo sinistro.
De mais a mais, também não há prova de que a velocidade na qual a autora trafegava tenha ou pudesse interferir no acidente ou nos seus resultados. Alegações nesse sentido também são meras conjecturas.
Afasto, pois, qualquer hipótese de excludente de nexo causal.
Dano material. O dano material compreende os danos emergentes (aquilo que se perdeu) e os lucros cessantes (aquilo que se deixou de lucrar), consoante dispõe o Código Civil:
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.
Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.
No caso concreto, a autora reclama o pagamento de indenização no importe de R$ 1.457,67, em razão prejuízos decorrentes das avarias sofridas pela sua motocicleta na queda (dano emergente), bem como "a condenação da Ré no pagamento dos lucros cessantes, considerando salário de R$ 946,00 (novecentos e quarenta e seis reais) mensais, em razão de a Autora estar parada sem poder exercer suas funções laborais de promotora de vendas" (Ev1-INIC1).
Danos emergentes. No Boletim de Acidente de Trânsito nº 8304949 (Ev1-OUT3, p. 1/4), consta que de fato a moto da autora sofreu diversas danos, qualificadas no "relatório de avarias" (Ev1-OUT3, p. 4) como de "pequena monta", com danos identificados no "guidão, suas fixações e comandos nele instalados", nos "pedais de apoio do condutor e passageiro" e "escapamentos e carenagens". O relatório de avarias inclui, no entanto, apenas "componentes não estruturais".
E era realmente de se esperar que a queda causasse vários danos físicos à motocicleta, como é comum nessa espécie de acidente com o veículo em movimento na faixa de rolamento da rodovia.
As peças arroladas nos orçamentos apresentados pela autora (Ev1-OUT3, p. 11/14), entre os quais o de menor valor corresponde a R$ 1.457,67, são, sim, condizentes com o acidente e com o relatório de avarias suso referido.
A Concessionária Autopista, no entanto, questiona alguns itens orçados pela autora (Ev101-CONT1):
44. Ademais, o Boletim de Acidente de Trânsito, no relatório das avariais, consignou apenas danos nos pedais e guidão da motocicleta. No menor orçamento juntado, há gastos com “apoio bagageiro”, “tampa lateral direita”. Peças, por exemplo, que não foram danificadas, segundo o documento lavrado pelos Policiais Rodoviários Federais.
A insurgência não merece acolhimento, especialmente porque não há como exigir perfeita coincidência entre a avaliação de avarias realizada pela Policia Rodoviária no ato de atendimento do acidente de trânsito e os danos efetivamente constatados em oficina especializa em momento posterior, inclusive porque a avaliação levada a termo pela autoridade de trânsito não tem essa pretensão.
Com efeito, o texto da Resolução CONTRAN nº 297/2008, que "estabelece o relatório de avarias para a classificação dos danos decorrentes de acidentes e os procedimentos para a regularização ou baixa dos veículos e dá outras providências", bem demonstra que essa avaliação tem por objetivo precípuo identificar a extensão dos danos causados ao veículo acidentado para que, assim, possa o Poder Público submeter estes a "procedimentos de controle para que possam voltar a circular nas vias públicas com segurança". Portanto, o objeto não é identificar minuciosamente todos os danos, mas, de um modo geral, identificar a sua gravidade como um todo.
Ademais, ao contrário do que argumenta a Autopista (Ev101-CONT1), é irrelevante a ausência de prova do efetivo conserto da motocicleta. O prejuízo foi infligido à autora e pode ser perfeitamente aquilatado com base apenas nos orçamentos; é o que basta para que a indenização seja fixada. Em tese, poderia ela optar por não fazer a manutenção e vender a moto com a desvalorização correspondente, mas nem por isso deixaria de ter direito à indenização do prejuízo que sofreu.
Impõe-se, pois, o dever de indenizar os danos emergentes.
Lucros cessantes. Nesse ponto, o pedido está articulado nos seguintes termos (Ev1-INIC1):
Igualmente procedente o pedido de condenação da Ré no pagamento dos valores decorrentes dos lucros cessantes suportado pela Autora, vez que à época do acidente efetivamente percebia uma renda mensal de R$ 946,00 (novecentos e quarenta e seis reais), consoante faz PROVA fotocópia de CTPS anexa (doc.03).
Como explanado anteriormente, em razão de estar parado sem poder exercer suas funções laborais, deixou de ganhar e permanece afastado de suas funções laborais, havendo diminuição da renda da família, em razão do acidente de trânsito. Assim deverá a Requerida indenizar a Autora por Lucros Cessantes até retorno efetivo de seu labor.
(...)
Destarte, como nos autos existe comprovação documental que a renda mensal da Autora; que a mesma foi lesionada; que em decorrência do acidente ficou sem poder trabalhar, é insofismável a ocorrência de lucros cessantes, estes aliás bastante verossímeis e plausíveis.
(...)
Ante o exposto, R E Q U E R - S E :
(...)
f) a condenação da Ré no pagamento dos lucros cessantes, considerando salário de R$ 946,00 (novecentos e quarenta e seis reais) mensais, em razão de a Autora estar parada sem poder exercer suas funções laborais de promotora de vendas, em liquidação de sentença;
À época do ajuizamento desta ação, em 11/2013, a autora ainda se encontrava em gozo de benefício previdenciário em razão das lesões do acidente. O auxílio-doença acidentário foi deferido com início (DIB) a partir de 28-08-2013 (16º dia após o acidente) e foi encerrado em (DCA) 17-03-2014 (Ev147-PROCADM2), com retorno da autora ao seu trabalho, a seu pedido inclusive (Ev147-PROCADM2, p. 9).
Ao apresentar réplica à contestação da Autopista, a autora acrescentou ter ficado com sequelas permanentes e ter sido demitida por consequência do acidente, conforme segue (Ev106-RÉPLICA1):
Conforme mencionado na exordial, a autora exercia a função de promotora de vendas, na qual utilizava o veículo próprio para deslocamento até as empresas conveniadas para exercer seu labor.
Em virtude do acidente, a Requerente ficou impossibilitada de exercer suas funções, pois apesar de realizar cirurgia na mão, ficou com sequelas permanentes, além de ter perdido a força, ficando impossibilita de pilotar motocicletas, restando na sua demissão após sua recuperação.
À época do acidente (08/2013), a autora era empregada da empresa DEYCON COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. e ocupava o cargo de repositora de mercadorias, percebendo o salário mensal de R$ 946,00 (conforme CTPS: Ev1-PROC2, p. 7) - embora tenha alegado receber outros benefícios, não fez prova a esse respeito. Permaneceu nessa empresa até 23-05-2014 (Ev147-PROCAM2, p. 5) mas, antes, ainda em 15-05-2014 começou a trabalhar na empresa INTELBRAS S.A. INDUSTRIA DE TELECOMUNICAÇÕES ELETRÔNICA BRASILEIRA, onde passou a perceber o salário mensal de R$ 1.053,00 (Ev147-PROCAM2, p. 5).
Não há nos prova alguma de que a autora tenha sido demitida ou que tenha sofrido algum prejuízo efetivo na sua atividade profissional em razão do acidente, com exceção do período em que esteve afastada do trabalho, em gozo de auxílio-doença. Pelo contrário, as provas revelam que autora retornou ao trabalho assim que cessado o benefício previdenciário (17-03-2014), permaneceu na mesma empresa por pouco mais de dois meses e, antes mesmo de encerrar essa relação de emprego, foi admitida numa outra empresa, onde passou a receber salário maior do que auferia anteriormente. No tocante à alteração do empregador, portanto, sequer houve prejuízo econômico comprovado.
É certo que ocorreu uma lesão na mão esquerda da autora, mais precisamente na base do dedo indicador, por ocasião do acidente. O prontuário médico da autora (Ev1-OUT3, p. 16) e as fotos que instruem a exordial não deixam dúvidas a esse respeito (Ev1-OUT3, p. 27/28), assim como é incontestável o fato de que a autora se submeteu a uma cirurgia nessa mesma mão em 14-10-2013 (Ev1-OUT3, p. 31).
O perito judicial (Ev231-LAUDO1), no entanto, concluiu que a lesão na mão esquerda da autora não resultou em qualquer sequela ou prejuízo à sua capacidade de trabalho. O experto ressaltou a existência de uma antiga lesão na mão esquerda da autora, mas decorrente de um acidente de infância. Veja-se o laudo (Ev231-LAUDO1):
ANTECEDENTES PESSOAIS:
(...)
cirurgias pregressas: teve acidente cortante na mão esquerda por queda com copo de vidro na infância, cirurgia de ouvido.
(...)
DOCUMENTOS DE RELEVÂNCIA PERICIAL: - atestado médico de 30/08/2017 assinado pelo especialista em Mão Dr.Luiz A. Chanamé. Descreve: sofreu lesão na mão esquerda em agosto de 2013 após queda de moto. Foi operada no Hospital regional por cirurgião de mão à época. Parece ter sido submetida a tenorrafia de flexor do segundo dedo da mão esquerda. Apresenta flexo extensão e sensibilidade em mão esquerda. APRESENTA CICATRIZ EM PALMA DA MÃO ESQUERDA JÁ CONSOLIDADA.
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DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
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- O exame físico segmentar sobre a mão esquerda revelou cicatriz na região tenar (palma da mão) de características antigas (provavelmente antes do acidente em tela) confirmado pelas fotos acostadas aos autos (evento 1 OUT3) que não mostram ferimento nessa região e sim na base do indicador esquerdo (região que foi operada, segundo atestado médico).
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QUESITOS DA AUTORA:
3- Há sequelas? Qual o grau das limitações? Favor descrever.
R. Atualmente sem doença ou sequela pós-traumática que levem a incapacidade laborativa ou a redução da capacidade laborativa.
O último laudo médico pericial do INSS, realizado na data da cessação do auxílio-doença, corrobora as conclusões do experto oficial quanto à inexistência de prejuízo à capacidade de trabalho da autora (Ev147-PROCADM2, p. 9):
PP em 17/03/2014 - Refere que quer retornar ao trabalho pois somente está sentindo pouco de ardência na palma da mão e tem choque sobre a cicatriz e quer acertar com empresa para fazer fisioterapia e trabalhar mesmo assim. ATM de 06/03/2014 CRM 14364 Dr Leonardo D Lanzarin (ortopedia Hosp Regional de São José)... lesão ferimento em mão ESQ, dor moderada, (ilegível) Declaração de fisioterapia de 06/03/2014
Destarte, no que se refere à atividade profissional e à capacidade laboral da autora, o único dano decorrente do acidente restringiu-se ao período em que esteve ela em gozo de auxílio-doença.
Nesse passo, considerando que o auxílio-doença consiste "numa renda mensal correspondente a 91% (noventa e um por cento) do salário-de-benefício" (art. 61 da Lei nº 8.213/91), a autora deixou de lucrar remuneração mais vantajosa no período em que recebeu o benefício (28-08-2013 a 17-03-2014). Logo, os lucros cessantes devem corresponder à diferença entre o que a autora deveria ter percebido se estive trabalhando normalmente e o que de fato percebeu a título de auxílio-doença.
Nesse sentido:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. ATROPELAMENTO.INDENIZAÇÃO. LUCROS CESSANTES. INEXISTÊNCIA DE COMPENSAÇÃO COM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PERCEBIDO. RESSARCIMENTO. EFETIVA DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. INEXISTÊNCIA.1. Não está configurada nos autos a hipótese de compensação entre o benefício previdenciário e o pensionamento a que teria direito a vítima do acidente.2. A indenização por danos materiais exige um prejuízo econômico concreto. Nesse contexto, comprovado que as despesas médicas foram suportadas pelo empregador, não há que se falar em ressarcimento.3. Embargos de declaração acolhidos para prestar esclarecimentos,sem modificação do resultado do julgado.( EDcl no REsp 296006, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, DJ 15/10/2007 p. 270).
Colho do voto do Relator o seguinte excerto:
Com efeito, o Tribunal de origem quantifica os lucros cessantes tendo como base o que o recorrente deixou de ganhar enquanto afastado do trabalho, valor correspondente à diferença entre o auxílio doença então percebido e o salário a que teria direito se estivesse trabalhando. Como se vê, não se trata de compensação entre verba indenizatória e benefício previdenciário, pois este último é utilizado simplesmente como parâmetro para se estabelecer o montante que a vítima deixou de receber em face do ato ilícito. Nesse contexto, inaplicável à espécie o entendimento desta Corte segundo o qual, nas hipóteses de pensionamento é vedada a compensação deste com o benefício previdenciário auferido pela vítima.
Não é devido à autora o valor integral de sua remuneração (R$ 946,00) como pleiteado na inicial, porque os lucros cessantes estão adstritos ao que a vítima "razoavelmente deixou de lucrar" (art. 402 do CC). O pagamento do valor integral, implicaria, ademais, em odioso enriquecimento sem causa.
Dano moral. Consoante a jurisprudência do STJ, "a verificação do dano moral não reside exatamente na simples ocorrência do ilícito, de sorte que nem todo ato desconforme o ordenamento jurídico enseja indenização por dano moral. O importante é que o ato ilícito seja capaz de irradiar-se para a esfera da dignidade da pessoa, ofendendo-a de maneira relevante" (AgRg no REsp 1269246 / RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe 27/05/2014). Isto é, "para que se configure o dano moral de natureza individual, deve o julgador ser capaz de identificar na hipótese concreta uma grave agressão ou atentado à dignidade da pessoa humana, capaz de ensejar sofrimentos e humilhações intensos, descompondo o equilíbrio psicológico do indivíduo por um período de tempo desarrazoado" (REsp 1717177, Relatora Ministra NANCY ANDRIGH, DJe 20/03/2018).
No caso sub examine, é evidente que a autora foi submetida a efetivo dano e abalo moral, pois a queda de motocicleta resultou em inúmeras escoriações, além de uma lesão na base do dedo indicador da mão esquerda (fotos: Ev1-OUT3, p. 26/28) que redundou em um cirurgia dois meses após o acidente (Ev1-OUT3, p. 31) e necessidade de tratamento fisioterápico (Ev1-OUT3, p. 32), incapacitando-a para o trabalho por mais de sete meses, período no qual esteve em gozo de benefício previdenciário (Ev147-PROCADM2). A autora, assim, induvidosamente, foi submetida a dor e sofrimento físicos e psicológicos que desbordam em muito do mero dissabor ou incômodo, pelo que faz jus à indenização por danos morais.
Valor da indenização. Como sabido, o dano moral tem caráter dúplice, pois, ao mesmo tempo em que pretende proporcionar ao ofendido um bem estar capaz de compensar o dano sofrido (efeito principal e compensador), também procura dissuadir o autor da ofensa a praticar novamente o ato danoso (efeito secundário e punitivo).
O valor da indenização deve ser fixado de acordo com as peculiaridades do caso concreto, considerada a extensão do dano (art. 944 do CC), o patrimônio e a conduta das partes. Não entrelaçar estes critérios poderia gerar uma indenização muito elevada, incompatível com a conduta, repercussão e poder econômico do ofensor, ou gerar uma indenização ínfima, que de certa forma acabaria premiando o ofensor e não contribuindo em nada para coibir a conduta do lesante.
A autora, na peça inicial, requereu "a condenação da Requerida no pagamento de Indenização por Danos Morais, no valor correspondente a 100 (cem) salários mínimos à época da Execução, em razão da dor, do sofrimento, desgaste, incomodação, perturbação e aflição suportadas" (Ev1-INIC1).
Na espécie, considerando as peculiaridades do caso, entendo suficiente para indenizar o dano moral, a importância equivalente a R$ 30.000,00 (trinta mil reais). A indenização neste patamar se apresenta suficiente para compensar todo sofrimento físico e psicológico suportado pela autora e, simultaneamente, punir e coibir a conduta omissiva dos réus.
Dano estético. A perícia judicial foi categórica ao afirmar a inexistência de danos estéticos resultantes do acidente de moto (Ev231-LAUDO1). Segundo apurou o experto, a cicatriz mais relevante, que há na palma da mão esquerda (região tenar), com discreta retração, tem "característica evolutiva antiga (anterior ao acidente)", incompatível com as lesões retratadas após a queda com a motocicleta (fotos: Ev1-OUT3, p. 26/28), provavelmente decorrente de "acidente cortante com copo de vidro na infância", referido pela autora durante o exame pericial.
Eis as considerações do perito (Ev231-LAUDO1):
- O exame físico segmentar sobre a mão esquerda revelou cicatriz na região tenar (palma da mão) de características antigas (provavelmente antes do acidente em tela) confirmado pelas fotos acostadas aos autos (evento 1 OUT3) que não mostram ferimento nessa região e sim na base do indicador esquerdo (região que foi operada, segundo atestado médico).
- Quanto ao Dano estético esse jurisperito esclarece que não apresenta mensuração. Entendemos que o tamanho da lesão, a profissão, a beleza anterior, a possibilidade de correção, se o dano se mostra de forma estática ou dinâmica, suas dimensões. Portanto suas alterações não chamam atenção, pois além de ocorrerem na palma da mão esquerda (difícil visualização), não causam vexame ou repulsa. Não existe alteração na conformação humana da autora, que caracterize um “enfeamento”. Não houve perda da beleza anterior, como em casos de acidentes com grandes deformidades. São cicatrizes pequenas, onde uma, provavelmente já existia antes do acidente em Tela.
A foto atual da mão esquerda da autora (Ev196-FOTO2), fala por si só. A cicatriz na base do dedo indicador da mão esquerda é praticamente imperceptível, de sorte que dela não se pode deduzir dano estético algum. Há, sim, uma leve retração na palma da mão, mas, como inferido pelo experto, é provavelmente decorrente de um acidente anterior, ocorrido na infância.
O pedido de indenização por danos estéticos, portanto, não merece acolhimento.
Juros de mora e correção monetária. Tratando-se de responsabilidade extracontratual o juros de mora devem incidir desde o evento danoso, nos termos do art. 398 do Código Civil (Súmula 54 do STJ) e a correção monetária desde a data do arbitramento (Súmula 362 do STJ):
Súmula 54: Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.
Súmula 362: A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.
Os juros moratórios, consoante o art. 406 do Código Civil, devem ser "fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional". Interpretando esse dispositivo, o STJ, firmou posição no sentido de que a taxa em questão é a SELIC, que não deve ser cumulada com outros índices de correção monetária:
FGTS. CONTAS VINCULADAS. CORREÇÃO MONETÁRIA. DIFERENÇAS.JUROS MORATÓRIOS. TAXA DE JUROS. ART. 406 DO CC/2002. SELIC.
1. O art. 22 da Lei 8.036/90 diz respeito a correção monetária e juros de mora a que está sujeito o empregador quando não efetua os depósitos ao FGTS. Por sua especialidade, tal dispositivo não alcança outras situações de mora nele não contempladas expressamente.
2. Relativamente aos juros moratórios a que está sujeita a CEF - por não ter efetuado, no devido tempo e pelo índice correto, os créditos de correção monetária das contas vinculadas do FGTS-, seu cálculo deve observar, à falta de norma específica, a taxa legal, prevista art. 406 do Código Civil de 2002.
3. Conforme decidiu a Corte Especial, "atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo [art. 406 do CC/2002] é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02)" (EREsp 727842, DJ de 20/11/08).
4. A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem (REsp - EDcl 853.915, 1ª Turma, Min. Denise Arruda, DJ de 24.09.08; REsp 926.140, Min. Luiz Fux, DJ de 15.05.08; REsp 1008203, 2ª Turma, Min. Castro Meira, DJ 12.08.08; REsp 875.093, 2ª Turma, Min. Eliana Calmon, DJ de 08.08.08).
5. Recurso especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08. (REsp 1.102.552/CE, Rel. MIn, Teori Albino Zavascki, DJe 06-04-09).
Dessarte, a partir da data do evento danoso, 12-08-2013, deverão incidir juros de mora à taxa SELIC, sem o acréscimo de qualquer outro índice de atualização monetária a partir da citação, porque "a referida taxa embute também a variação da moeda" (REsp 1.102.552/CE).
Honorários Advocatícios. Apesar de não alcançado o montante pretendido pela parte autora, a indenização por danos morais não implica em sucumbência recíproca, nos termos da Súmula nº 326 do STJ:
Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca.
Há sucumbência da autora, no entanto, no que se refere ao pedido de indenização por danos estéticos e, ainda, parcial sucumbência no tocante ao pedido de indenização por lucros cessantes.
A sentença deve ser mantida quanto ao mérito, mas merece reforma no que se refere ao valor da indenização por danos morais e à correção monetária e juros.
Quanto ao valor da condenação por danos morais, deve ser reduzido.
No caso dos autos, a parte autora sofreu queda de motocicleta por conta de buraco na pista. Em consequência da queda, a autora sofreu escoriações e lesionou a base do dedo indicador da mão esquerda, que redundou em um cirurgia dois meses após o acidente e necessidade de tratamento fisioterápico incapacitando-a para o trabalho por mais de sete meses.
Certamente a autora sofreu abalo moral, seja pela situação do acidente em si, como pelo fato de se submeter a cirurgia para reparação da base do dedo indicador. Contudo, o valor fixado em sentença, qual seja, R$ 30.000,00, deve ser reduzido para R$ 10.000,00, valor esse que se mostra razoável, proporcional e adequado para a reparação do dano.
Quanto aos juros e à correção monetária, restam fixados os seguintes balizamentos:
(a) os juros de mora, em se tratado de responsabilidade extracontratual, incidem a partir do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do STJ; a correção monetária, no caso de dano moral, incide desde quando arbitrado o valor da indenização (Súmula 362 do STJ);
(b) os juros moratórios e a correção monetária relativos a cada período são regulados pela lei então em vigor, conforme o princípio tempus regit actum; consequentemente, sobrevindo nova lei que altere os respectivos critérios, a nova disciplina legal tem aplicação imediata, inclusive aos processos já em curso. Ressalto, contudo, que essa aplicação não tem efeito retroativo, ou seja, não alcança o período de tempo anterior à lei nova, que permanece regido pela lei então vigente (STJ, REsp nº 1.205.946/SP, 02-02-2012);
(c) da conjugação dos julgados em recursos repetitivos acerca da matéria relativa à atualização monetária e juros de mora em condenações judiciais pelo STF (RE repetitivo 870.947, Tema 810) e pelo STJ (REsp repetitivos 1492221, 1495144 e 1495146, Tema 905), resulta a aplicação dos seguintes critérios, no caso de débitos de natureza administrativa em geral (exceto débitos relativos a servidores públicos e a desapropriações), conforme o período em exame:
c.1 - até dezembro/2002, quando entra em vigor o Código Civil de 2002: juros de mora de 0,5% ao mês (arts. 1.062 a 1.064 do CC/1916); correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001;
c.2 - no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009 (01-07-2009): juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice de atualização, visto estar a correção monetária compreendida nessa taxa;
c.3 - no período posterior à entrada em vigor da Lei 11.960/2009 (a partir de julho/2009): juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (conforme previsto no art. 12-II da Lei 8.177/91, inclusive com a modificação da Lei 12.703/2012, a partir de sua vigência); correção monetária com base na variação do IPCA-E, afastada a TR.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos recursos e à remessa necessária.
Documento eletrônico assinado por MARCOS JOSEGREI DA SILVA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001563565v21 e do código CRC f66a629d.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5022044-53.2013.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
APELANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT (RÉU)
APELANTE: CONCESSIONÁRIA AUTOPISTA LITORAL SUL S.A (RÉU)
APELADO: ANA PAULA DE OLIVEIRA (AUTOR)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. responsabilidade civil. dano moral. DANO MATERIAL. acidente de motocicleta. buraco na rodovia.
1. Cabível indenização por danos morais e materiais à parte autora em decorrência de acidente de motocicleta que ocorreu por causa de buraco na rodovia.
2. Reduzido o valor da indenização por danos morais para R$ 10.000,00.
3. Sentença também reformada no que se refere à correção monetária e juros.
4. Parcialmente provido os recursos e a remessa necessária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento aos recursos e à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de fevereiro de 2020.
Documento eletrônico assinado por MARCOS JOSEGREI DA SILVA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001563566v6 e do código CRC bba0b4e9.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 05/02/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5022044-53.2013.4.04.7200/SC
RELATOR: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PROCURADOR(A): RICARDO LUÍS LENZ TATSCH
APELANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT (RÉU)
APELANTE: CONCESSIONÁRIA AUTOPISTA LITORAL SUL S.A (RÉU)
APELADO: ANA PAULA DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: CESAR WILSON XAVIER (OAB SC012326)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 05/02/2020, na sequência 311, disponibilizada no DE de 19/12/2019.
Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS E À REMESSA NECESSÁRIA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
Votante: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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