Apelação Cível Nº 5000591-91.2016.4.04.7104/RS
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE: JUCELAINE MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN
APELANTE: MICHELI MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN
APELANTE: FRANCIELE MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
JUCELAINE MARTINELLI, FRANCIELE MARTINELLI e MICHELI MARTINELLI ajuizaram a presente ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) e da UNIÃO FEDERAL, postulando a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais.
Informaram que o Sr. Leonildo Martinelli era marido da primeira autora e pai das outras duas demandantes e suicidou-se em 16.04.2014. Alegaram que o suicídio do Sr. Leonildo ocorreu por culpa exclusiva dos réus, uma vez que o INSS indeferiu, em 17.10.2013, o requerimento administrativo de prorrogação de auxílio-doença formulado pelo de cujus, sendo tal fato o motivo que o levou a tirar a própria vida. Sustentaram que o segurado era portador de transtorno psicótico paranoide (F22.2) e estava incapacitado para o trabalho no momento em que o INSS indeferiu o benefício postulado. Aduziram que, "com a cassação do auxílio doença, o falecido, que possuía como única fonte os valores recebidos através do benefício previdenciário, não mais teve dinheiro para comprar os medicamentos e realizar consultas com profissionais especializados (psiquiatra, psicólogo), vindo a cometer ato que ceifou-lhe a vida". Informaram que, após o óbito do segurado, a autora Jucelaine ajuizou a ação nº50007163020144047104, em face do INSS, postulando a condenação do réu ao pagamento dos valores devidos ao de cujus, a título de auxílio-doença, no período entre a cessação do benefício e o óbito deste. Em tal ação, após a realização de perícia indireta e de o perito concluir pela incapacidade do de cujus, as partes transigiram, tendo o INSS pago os valores postulados. Discorreram sobre a responsabilidade civil do INSS e a existência do dano moral sofrido pelas autoras. Sustentaram que, quando o ato denegatório de benefício decorre de erro de qualquer natureza da autarquia previdenciária, surge o dever de indenizar, conforme artigos 187 e 927 do Código Civil. Ressaltaram que o nexo causal é evidente porque a causa do suicídio foi o indeferimento do benefício. Sustentaram que a imperícia e negligência do perito do INSS são evidentes. Discorreram sobre os critérios para fixação do quantum indenizatório, sustentando que entendem correta sua fixação em, no mínimo, quinhentos salários mínimos em favor de cada uma das autoras. Requereram a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita. Juntaram documentos (E01). Determinou-se a intimação da parte autora para que regularizasse sua representação processual e esclarecesse a pertinência da inclusão da União Federal no polo passivo desta ação (E03). A parte autora juntou procuração e requereu a exclusão da União do polo passivo (E08), o que restou acolhido (E13). Deferiu-se o benefício da assistência judiciária gratuita à parte autora (E24).
Processado o feito em seus ulteriores termos, sobreveio sentença, proferida com o seguinte dispositivo:
"Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado nesta ação, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, em favor da parte ré, fixados, com base no art. 85, §§2º, 3º e 4º, III, do CPC/2015, em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa, atualizado monetariamente pelo IPCA-E, a partir do ajuizamento desta ação, nos termos da Súmula 14 do STJ, acrescido, a contar do trânsito em julgado, de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, na forma do art. 85, §16, do CPC/2015. Cada autora deverá arcar com 1/3 dos honorários fixados. Ficará a parte autora dispensada, por ora, do pagamento da sucumbência, uma vez que beneficiária da gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015. Sem custas (art. 4º, I e II, da Lei 9.289/96).
Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se."
As autoras apelaram (evento 110). Em suma, alegam que a ação merece prosperar, eis que o falecido pai e esposo das apelantes só veio a óbito em razão de ter-lhe sido negado o benefício pelo INSS, eis que evidentemente encontrava-se em um estado depressivo grave, tanto que veio a suicidar-se. Disto surge a responsabilidade do recorrido pela reparação civil por danos morais decorrente de ato que cancela ou nega a concessão de benefício previdenciário.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Adotou-se, no Brasil, no que concerne às entidades de direito público, a responsabilidade objetiva com fulcro na teoria do risco administrativo, sem, todavia, adotar a posição extremada dos adeptos da teoria do risco integral, em que o ente público responderia sempre, mesmo presentes as excludentes da obrigação de indenizar, como a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro e o caso fortuito e a força maior.
De acordo com esta teoria, para que haja o dever de indenizar é irrelevante a culpa na conduta do agente, bastando o nexo de causalidade entre fato e dano. Veja-se a redação do referido artigo:
§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelo danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
A configuração da responsabilidade do Estado, portanto, em regra, exige apenas a comprovação do nexo causal entre a conduta praticada pelo agente e o dano sofrido pela vítima, prescindindo de demonstração da culpa da Administração.
Como bem explanado na sentença, lamentável o ocorrido com o de cujus, o que é, sem dúvidas, motivo de grande sofrimento por parte das autoras. Ocorre que o indeferimento da prorrogação do benefício, pelo INSS, mesmo equivocado, não pode gerar responsabilização civil da autarquia pela morte do segurado, decorrente de suicídio.
O indeferimento do benefício previdenciário na via administrativa por si só não implica direito à indenização, ainda que futuramente venha a ser concedido judicialmente. Isso porque a Administração age no exercício de sua função pública, dentro dos limites da lei de regência e pelo conjunto probatório apresentado pelo segurado. Assim, não se cogita de dano moral se não há procedimento flagrantemente abusivo por parte da Administração, "já que a tomada de decisões é inerente à sua atuação" (APELREEX 2006.71.02.002352-8, Desembargador Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. de 16/11/2009).
Destarte, não há configuração do nexo de causalidade necessário para a responsabilização civil, em que pese o infeliz acontecimento. Assente na jurisprudência desta Corte. In verbis:
DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DEFERIMENTO POR AÇÃO JUDICIAL. INOCORRÊNCIA DE ILÍCITO INDENIZÁVEL. 1. O indeferimento do benefício previdenciário na via administrativa por si só não implica direito à indenização, ainda que futuramente venha a ser concedido judicialmente. Isso porque a administração age no exercício de sua função pública, dentro dos limites da lei de regência e pelo conjunto probatório apresentado pelo segurado. 2. Não comprovado que o INSS cometeu erro grave, agiu de má-fé ou abusou de sua autoridade ao indeferir o auxílio-doença postulado, não há ilícito indenizável, não se podendo falar, consequentemente, em dano moral. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020992-36.2015.404.7108, 3ª Turma, Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/09/2017)
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSS. DANOS MORAIS E MATERIAIS. SUICÍDIO. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. 1. Ao cessar o benefício administrativamente, o INSS agiu em estrita conformidade com o disposto em lei, pois a incapacidade é requisito necessário à concessão do benefício pleiteado, competindo aos autores a demonstração da ilegalidade do ato administrativo. 2. De outro norte, depreende-se do aporte probatório que não houve qualquer irregularidade na perícia médica realizada na data de 18.01.2011, a qual concluiu pela inexistência de incapacidade laborativa. De igual forma, que não há indícios de que a negativa do INSS foi a causa determinante para o suicídio da segurada. 3. Diante de tal contexto, não ficou demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta imputada ao INSS pelos autores e o evento danoso, motivo pelo qual não há que falar em responsabilidade civil do ente autárquico. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001661-87.2014.404.7210, 3ª TURMA, Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 26/02/2016)
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL INSS. INDEFERIMENTO OU CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. O indeferimento ou cancelamento de benefício por parte do INSS, de acordo com os dispositivos legais de regência, não gera direito à indenização por dano moral. Precedentes. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5025865-31.2014.404.7200, 3ª TURMA, Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 14/05/2015)
Por fim, levando em conta o trabalho adicional do procurador na fase recursal, a verba honorária fica majorada em 2%, forte no §11 do art. 85 do CPC/2015.
Ressalto que fica suspensa a exigibilidade dos valores, enquanto mantida a situação de insuficiência de recursos que ensejou a concessão da gratuidade da justiça, conforme o §3º do art. 98 do novo CPC.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por MARGA INGE BARTH TESSLER, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001044813v9 e do código CRC 58eab942.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARGA INGE BARTH TESSLER
Data e Hora: 22/5/2019, às 18:40:54
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:36:34.
Apelação Cível Nº 5000591-91.2016.4.04.7104/RS
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE: JUCELAINE MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN
APELANTE: MICHELI MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN
APELANTE: FRANCIELE MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL INSS. INDEFERIMENTO OU CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INEXISTÊNCIA.
O indeferimento ou cancelamento de benefício por parte do INSS, de acordo com os dispositivos legais de regência, não gera direito à indenização por dano moral. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de maio de 2019.
Documento eletrônico assinado por MARGA INGE BARTH TESSLER, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001044814v4 e do código CRC b04e42cd.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARGA INGE BARTH TESSLER
Data e Hora: 22/5/2019, às 18:40:54
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:36:34.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/05/2019
Apelação Cível Nº 5000591-91.2016.4.04.7104/RS
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
APELANTE: JUCELAINE MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN (OAB RS047333)
APELANTE: MICHELI MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN (OAB RS047333)
APELANTE: FRANCIELE MARTINELLI (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA POTRICH GASPERIN (OAB RS047333)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído no 2º Aditamento do dia 21/05/2019, na sequência 841, disponibilizada no DE de 29/04/2019.
Certifico que a 3ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:36:34.