Apelação/Remessa Necessária Nº 5070902-51.2018.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS (RÉU)
APELADO: IRACEMA GARCIA GONCALVES (AUTOR)
ADVOGADO: THIAGO MATHIAS GENRO SCHNEIDER (OAB RS065722)
ADVOGADO: GUILHERME PACHECO MONTEIRO (OAB RS066153)
ADVOGADO: ROGERIO VIOLA COELHO (OAB RS004655)
ADVOGADO: MARCO AURELIO PEREIRA DA SILVA (OAB RS031485)
ADVOGADO: JEFFERSON DOS SANTOS ALVES (OAB RS089504)
ADVOGADO: PEDRO HENRIQUE KOECHE CUNHA (OAB RS104102)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente a ação nos seguintes termos:
Ante o exposto, mantenho a decisão que antecipou os efeitos da tutela e, no mérito, julgo procedente a ação para reconhecer a ilegalidade do ato administrativo que determinou a redução do benefício de que é titular a Autora, determinando à UFRGS que restabeleça o pagamento da pensão sem qualquer redução nos vencimentos a título de alteração da forma de cálculo, tudo nos termos da fundamentação.
Condeno a ré, ainda, a restituir os valores eventualmente descontados do contracheque da Autora, acrescidos de juros e correção monetária nos termos da fundamentação.
Condeno a UFRGS ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, atualizado monetariamente desde o ajuizamento da ação, na forma do art. 85, § 4º, III do CPC.
Sentença sujeita à remessa necessária.
Em suas razões recursais, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul defendeu que: (a) quanto à alegação de decadência, sem razão a r. sentença porquanto não se tem notícia do registro da aposentadoria (do servidor Ernani Carvalho Gonçalves) nem da pensão da Autora, consoante consulta acostada no E18_OUT2 dos autos originais; (b) no caso presente se está cobrando apenas os valores recebidos no último quinquênio; (c) quanto à supressão da parcela pondere-se que não se trata de anulação de ato administrativo do qual decorreram efeitos favoráveis aos servidores, na esteira do disposto pelo aludido art. 54, da Lei 9.784/99, mas sim de adequação do ato complexo de aposentadoria, ou do pensionamento, aos ditames legais; e (d) o fato que a Apelada recebeu pagamento indevido, em face de equívoco – erro material -, sendo evidente o locupletamento sem causa em desfavor do erário e, de outro lado, o respeito ao contraditório e à ampla defesa na órbita administrativa. Nesses termos, pugnou seja recebido e provido o presente recurso, para modificar a sentença apelada, inicialmente (a) para que seja afastada a decadência, e quanto ao mérito, (b) julgando-se TOTALMENTE IMPROCEDENTE a demanda, (c) com a imediata reversão da tutela de urgência e a inversão dos ônus sucumbenciais, inclusive os honorários advocatícios; (d) com a determinação de devolução dos valores recebidos sob o pálio da decisão liminar, (e) permitindo-se a sua execução nos próprios autos judiciais, e, (f) sucessivamente, a fixação dos juros e correção monetária de acordo com a atual redação do art. 1º-F, da Lei 9.494/97 ou consoante a modulação em definitivo pelo STF.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Ao analisar o pleito deduzido na inicial, o magistrado a quo assim sentenciou:
Trata-se de ação de Procedimento Comum ajuizada por IRACEMA GARCIA GONÇALVES contra UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL com pedido de tutela de urgência para que seja determinada à demandada a manutenção ou restabelecimento da pensão percebida pela autora e a cessação ou não efetivação de descontos. Narra que foi notificada por meio do Ofício nº 1116/DAP/PROGESP acerca da existência erro no cômputo das licenças prêmio do instituidor da pensão, uma vez que o mesmo teria gozado da licença “no período de março a agosto de 1972”, o que impactaria no valor do seu benefício. Em função da alegada irregularidade, a Universidade anunciou “alteração na composição dos proventos, que passarão a ser proporcionais à razão de 34/35 anos, e exclusão da parcela correspondente à vantagem do artigo 192, I, da Lei nº 8.112/90”, informando a necessidade de devolução do valor de R$ 16.730,12 (dezesseis mil setecentos e trinta reais e doze centavos). Defendeu a ocorrência de decadência do direito de a Administração de anular seus próprios atos, considerando que a forma de cálculo da pensão titularizada pela autora perdura há mais de 25 anos, consolidando a decadência prevista no art. nº 54 da Lei nº 9.784/99. Sustentou que a pretensão de "alteração do valor da pensão da autora não decorre da análise da aposentadoria da instituição da pensão pelo TCU", e sim de "claro ato administrativo, sequer cabendo discutir, no caso concreto, o prazo decadencial de que dispõe o TCU para analisar os atos de aposentadoria/instituição de pensão dos servidores públicos federais". Arguiu a impossibilidade de restituição de valores recebidos de boa-fé Colacionou jurisprudência. Juntou documentos.
Foi deferido o benefício da gratuidade da justiça (evento 3).
Intimada, a UFRGS manifestou-se no evento 8. Defendeu que o ato de concessão de aposentadoria se trata de ato complexo, de forma que apenas é considerado válido e eficaz quando recebe o registro pelo Tribunal de Contas. Alegou ser devida a restituição dos valores, ainda que recebidos de boa-fé e tendo natureza alimentar, a fim de se evitar enriquecimento ilícito. Afirma que, no caso dos autos, não houve interpretação errônea de lei, nem mesmo mudança de interpretação. Juntou documentos.
Foi deferida a tutela de urgência (evento 11).
Citada, a UFRGS contestou o feito (evento 18). Alegou que a Administração, em observância à legalidade, revisou a pensão da autora, sendo observado o direito à ampla defesa e contraditório na via administrativa, inclusive com a interposição de recurso pela parte autora. Afastou a ocorrência de decadência, porque o ato de concessão de pensão é ato complexo que, muito embora produza efeitos desde a sua edição, se torna perfeitamente acabado somente após a manifestação final do Tribunal de Contas. Apontou que a revisão efetuada está dentro do prazo decadencial, ainda mais porque a pensão da Autora ainda não teria sido homologada pelo TCU, propugnando pela improcedência da ação.
A parte Autora juntou réplica (evento 22) .
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório. Decido.
II - FUNDAMENTAÇÃO
Postula a autora o restabelecimento do pagamento integral da sua pensão deixada por servidor falecido, bem como a condenação da ré ao pagamento das diferenças estipendiais. Argumenta que possui direito adquirido ao pagamento do benefício sem a redução propugnada pela Administração, apontando a ocorrência da decadência do direito de a Administração revisar o ato de pensionamento, porquanto já decorridos mais de 05 anos da data da concessão do benefício.
Na análise do pleito antecipatório, foi proferida a seguinte decisão:
Afirma o autor que já teria decorrido o lapso temporal de mais de cinco anos entre a concessão da aposentadoria e a decisão do TCU e cancelamento da aposentadoria, sustentando a ocorrência de decadência do prazo para a Administração rever seus próprios atos.
Defende a União, outrossim, que o prazo de decadência começa a fluir apenas a partir da homologação do ato de concessão do benefício de aposentadoria pelo Tribunal de Contas da União. Segundo a tese esboçada, em não havendo a referida homologação do ato de aposentadoria do Autor, não há que se falar em fluência do prazo decadencial, podendo, portanto, proceder a Administração à revisão da concessão ou dos critérios de cálculo o que, de fato, foi feito no caso em apreço.
Em casos análogos a este feito envolvendo matéria afeta à decadência administrativa, tenho, até então, entendido que a aposentação é ato complexo e, portanto, somente se aperfeiçoaria com o exame e registro pelo Tribunal de Contas da União, marco a partir do qual iniciaria o prazo decadencial para a Administração rever os seus próprios atos.
Entretanto, analisando a matéria com mais profundidade e, alterando o meu entendimento anterior, tenho que a interpretação que mais se aproxima do ideal de Justiça é assimilar que a homologação do ato de aposentação pelo TCU possui efeito meramente declaratório, tal como no seguinte julgado do STJ, que ora transcrevo:
ADMINISTRATIVO. ATO DE APOSENTADORIA. REVISÃO. PRAZO. INÍCIO.ATO DE CONCESSÃO. ART. 54 DA LEI N. 9.784/99. DECADÊNCIA CONFIGURADA. 1. A aposentadoria de servidor público não é ato complexo, pois não se conjugam as vontades da Administração e do Tribunal de Contas para concedê-la. São atos distintos e praticados no manejo de competências igualmente diversas, na medida em que a primeira concede e o segundo controla sua legalidade. 2. Aplica-se o prazo decadencial de cinco anos, previsto no art. 54 da Lei n. 9.784/99 aos processos de contas que tenham por objeto o exame da legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, ressalvadas as hipóteses em que comprovada a má-fé do destinatário do ato administrativo. 3. Transcorridos mais de cinco anos da entrada em vigor da Lei n. 9784/99 e o ato de revisão pelo TCU, caracterizada está a decadência. Agravo regimental improvido. (AGRESP 201100219342, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:14/04/2011 ..DTPB:.).
No voto supra transcrito, o Ministro, à época, consignou que 'o termo inicial do prazo decadencial para Administração Pública anular o ato de aposentadoria se dá com concessão do próprio ato pela Administração, e não da homologação pelo Tribunal de Contas, por ter natureza jurídica meramente declaratória.' (AgRg. REsp 1.233.820/RS).
Desse modo, o prazo decadencial de cinco anos começa a fluir a partir da publicação do ato originário da aposentadoria, desimportando o momento de sua homologação pelo TCU.
Contudo, não ignorando este Juízo a posição da jurisprudência em contrário a respeito do tema, há precedentes que corroboram o entendimento de que não é crível pretender-se à Administração Pública prazo eterno para a revisão dos seus atos, não sendo razoável que o administrado fique à espera de tal providência indefinidamente, em evidente prejuízo aos princípios da estabilidade e segurança jurídicas. No caso em apreço, não há notícias nos autos de que o órgão de controle tenha homologado o benefício da parte autora, o qual foi deferido, gize-se, em 1992.
Nessa esteira, colaciono os seguintes precedentes que reforçam o entendimento supra aduzido:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. PROVENTOS DE APOSENTADORIA. DECADÊNCIA. SEGURANÇA JURÍDICA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEVIDO PROCESSO LEGAL. AMPLA DEFESA. CONTRADITÓRIO. 1. Examinando-se a questão posta sob exame à luz do Princípio da Segurança Jurídica, princípio basilar do Estado Democrático de Direito, outra alternativa não resta senão manter o pagamento da parcela em discussão como forma de assegurar a estabilidade das relações jurídicas, pois não é razoável aceitar, depois de tão longo período, que possa a Administração Pública rever seus atos. 2. Assegurado à parte autora o respeito às garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. (TRF4, APELREEX 2003.72.05.006355-4, Quarta Turma, Relator Candido Alfredo Silva Leal Junior, D.E. 04/11/2014)
PROCESSO CIVIL, ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. COMPETÊNCIA. OBJETO FINAL DA AÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA. CONTAGEM RECÍPROCA EM REGIMES DISTINTOS. INDENIZAÇÃO DO TEMPO DE LABOR RURAL RECONHECIDO. REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO PELA ADMINISTRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI Nº 9.784/99. PRINCÍPIO DA ESTABILIDADE NAS RELAÇÕES JURÍDICAS. EXAME DA LEGALIDADE PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. EFEITOS. NATUREZA DECLARATÓRIA. PEDIDO DE REVISÃO, PELO SERVIDOR INATIVO, DO SEU ATO DE APOSENTADORIA PARA INCLUSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO INSALUBRE. DESCABIMENTO. ART. 1º DO DECRETO N.º 20.910/32. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. (...) 3. Incide ao caso o disposto no art. 54 da Lei nº 9.784/99, que prevê que o direito da Administração de anular seus próprios atos, quando deles decorram efeitos favoráveis aos destinatários, decai em 5 (cinco) anos, contados da data em que foram praticados, salvo se comprovada má-fé, assegurando a estabilidade das relações jurídicas no Estado de Direito. 4. Hipótese em que a demandante aposentou-se em 1996, porém em 2007 foi comunicada que seu ato de aposentadoria estava sendo questionado pelo Ministério da Saúde, o que afigura-se ilegal, visto que o direito de revisão já havia sido atingido pela decadência. 5. O marco prescricional inicia-se na data de publicação do ato de aposentadoria, sendo irrelevante a data de seu registro e exame pelo Tribunal de Contas da União, ante a natureza meramente declaratória daquele ato. Precedentes do STJ e deste TRF. (...) (TRF4, APELREEX 0047866-51.2007.404.7100, 3ª Turma, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 22/04/2010).
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ARTIGO DO 535 DO CPC. APOSENTADORIA. REVISÃO. ARTIGO 54 DA LEI N. 9.784/99. PRAZO DECADENCIAL. TERMO INICIAL CONTADO DO ATO DE CONCESSÃO. OCORRÊNCIA. DEMAIS QUESTÕES PREJUDICADAS.1. A violação do artigo 535 do CPC, não se efetivou no caso dos autos, uma vez que não se vislumbra omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido capaz de tornar nula a decisão impugnada no especial. A Corte de origem apreciou a demanda de modo suficiente, havendo se pronunciado acerca de todas as questões relevantes.2. Em se tratando de atos de verificação de concessões de aposentadoria, deve ser aplicado o prazo decadencial de cinco anos, previsto no art. 54 da Lei n. 9.784/99, contados da concessão da aposentadoria, com base no princípio da segurança jurídica, ressalvadas as hipóteses em que comprovada a má-fé do destinatário do ato administrativo.3. Na espécie, portanto, havendo a concessão da aposentadoria sido deferida em 19/10/93, a sua revisão pela Administração somente em 01/12/2003 não mais pode operar efeitos em face da decadência.4. Ressalte-se que, como bem salientou o acórdão recorrido, a discussão das demais questões torna-se prejudicada diante do reconhecimento da decadência na hipótese. 5. Recurso especial não provido. (REsp n° 201101191421, RESP - RECURSO ESPECIAL - 1255618, Relator Mauro Campbell Marques, STJ, Segunda Turma, DJE 08/09/2011).
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO ESPECIAL. REQUISITOS. TESES E DISPOSITIVOS NÃO PREQUESTIONADOS.INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 282/STF E SÚMULA N. 211/STJ.SERVIDOR PÚBLICO. SÚMULA VINCULANTE N.3/STF. OBSERVÂNCIA DA AMPLA DEFESA. TRANSCURSO IN ALBIS DO PRAZO DE CINCO ANOS DA CONCESSÃO DA PENSÃO. OBRIGATORIEDADE. TRIBUNAL DE CONTAS. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 54 DA LEI N. 9.784/99. DECADÊNCIA CONFIGURADA.1. Para fins de conhecimento do recurso especial, é indispensável a prévia manifestação do Tribunal a quo acerca das teses e artigos legais suscitados, ou seja, a ausência de prequestionamento impede o conhecimento do recurso, no ponto. Incidência das Súmulas n. 282 do STF, por analogia, e n. 211 do STJ.2. A jurisprudência da Suprema Corte proferiu entendimento segundo o qual, embora o enunciado de Súmula Vinculante n. 3/STF dispense a observância da ampla defesa nos casos de revisão de pedido inicial de pensão, esta se torna obrigatória quando transcorrido in albis o prazo de cinco anos do ato de concessão da aposentadoria, em respeito ao princípio da segurança jurídica.3. Nos casos de aposentadoria e pensão de servidor público, a atuação do Tribunal de Contas deve ocorrer em observância com os princípios da segurança jurídica e razoabilidade, não podendo durar por prazo indeterminado. Assim, impõe-se a determinação de limite temporal razoável para que a incerteza do ato não venha se prolongar ad eternum.4. No caso em análise, o benefício da pensão foi concedida à recorrente em 1991, e foi revogado em 2001. Ou seja, após dez anos de concessão da pensão. Destarte, inequívoca o reconhecimento da decadência do direito da administração em rever a concessão da pensão da recorrente, diante da incidência do prazo quinquenal previsto no artigo 54 da Lei n. 9.784/99, e em respeito ao princípio da segurança jurídica.5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. (RESP 201002093597, RESP - RECURSO ESPECIAL - 1220999, Relator Mauro Campbell Marques, 2ª Turma do STJ, DJE 11/05/2011).
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. FUNÇÃO COMISSIONADA. TRANSFORMAÇÃO EM VPNI. REVISÃO DE APOSENTADORIA. DECADÊNCIA. Embora a concessão de aposentadoria consubstancie ato administrativo complexo, aperfeiçoando-se com a apreciação da legalidade pelo TCU, não é razoável que o servidor aguarde tal providência indefinidamente, devendo-se preservar a estabilidade das relações jurídicas firmadas e o direito adquirido e incorporado ao patrimônio material e moral do particular. Impõe-se, portanto, que a verificação da legalidade do mesmo aconteça em lapso temporal razoável, sob pena de decadência. (AC - APELAÇÃO CIVEL 5011992-21.2010.404.7000, UF: PR, Data da Decisão: 19/10/2011, Orgão Julgador: TERCEIRA TURMA, Fonte D.E. 20/10/2011, Relatora MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA).
ADMINISTRATIVO. BENEFÍCIO INDEVIDO. ANULAÇÃO DO ATO. DECADÊNCIA.SITUAÇÃO CONSOLIDADA COM O TEMPO. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA.1. Cuidam os autos de Mandado de Segurança impetrado contra ato do Delegado Regional do Ministério do Trabalho do Rio de Janeiro que exigiu que a impetrante optasse por uma das pensões recebidas, por morte ou aposentadoria.2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, em atenção ao princípio da segurança jurídica e à existência de situação fática consolidada pelo decurso do tempo, a Administração não pode rever o ato concessivo de pensão especial por morte, paga por mais de cinco anos, sem que tenha sido comprovada amá-fé por parte do beneficiário.3. Agravo Regimental não provido. (AGRESP 201001076024, Relator(a) HERMAN BENJAMIN, STJ, Segunda Turma, DJE DATA:04/02/2011).
MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NEGATIVA DE REGISTRO A APOSENTADORIA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.1. O impetrante se volta contra o acórdão do TCU, publicado no Diário Oficial da União. Não exatamente contra o IBGE, para que este comprove o recolhimento das questionadas contribuições previdenciárias. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada.2. Infundada alegação de carência de ação, por ausência de direito líquido e certo. Preliminar que se confunde com o mérito da impetração.3. A inércia da Corte de Contas, por mais de cinco anos, a contar da aposentadoria, consolidou afirmativamente a expectativa do ex-servidor quanto ao recebimento de verba de caráter alimentar. Esse aspecto temporal diz intimamente com: a) o princípio da segurança jurídica, projeção objetiva do princípio da dignidade da pessoa humana e elemento conceitual do Estado de Direito; b) a lealdade, um dos conteúdos do princípio constitucional da moralidade administrativa (caput do art. 37). São de se reconhecer, portanto, certas situações jurídicas subjetivas ante o Poder Público, mormente quando tais situações se formalizam por ato de qualquer das instâncias administrativas desse Poder, como se dá com o ato formal de aposentadoria.4. A manifestação do órgão constitucional de controle externo há de se formalizar em tempo que não desborde das pautas elementares da razoabilidade. Todo o Direito Positivo é permeado por essa preocupação com o tempo enquanto figura jurídica, para que sua prolongada passagem em aberto não opere como fator de séria instabilidade inter-subjetiva ou mesmo intergrupal. A própria Constituição Federal de 1988 dá conta de institutos que têm no perfazimento de um certo lapso temporal a sua própria razão de ser. Pelo que existe uma espécie de tempo constitucional médio que resume em si, objetivamente, o desejado critério da razoabilidade. Tempo que é de cinco anos (inciso XXIX do art. 7º e arts. 183 e 191 da CF; bem como art. 19 do ADCT).5. O prazo de cinco anos é de ser aplicado aos processos de contas que tenham por objeto o exame de legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões. Transcorrido in albis o interregno qüinqüenal, a contar da aposentadoria, é de se convocar os particulares para participarem do processo de seu interesse, a fim de desfrutar das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (inciso LV do art. 5º).6. Segurança concedida. (MS 25116MS - MANDADO DE SEGURANÇA, Relator(a) AYRES BRITTO, STF, Plenário 08/09/2010).
Assim, não obstante o entendimento de parte da jurisprudência de que o ato de concessão de aposentadoria é complexo a necessitar de homologação do TCU, entendo que a análise da legalidade do ato deve ocorrer em prazo razoável, admitindo-se como tal o previsto na Lei n° 9784/99, qual seja, 05 anos.
Diante do exposto, pois, há que se reconhecer o decurso do prazo decadencial, com fundamento nos princípios da segurança jurídica e razoabilidade, porquanto decorreu prazo superior a 05 anos, conforme art. 54 da Lei n° 9.784/99.
Ante o exposto, defiro o pedido de tutela de urgência para determinar à Universidade Federal do Rio Grande do Sul que mantenha ou restabeleça o pagamento da pensão percebida pela autora na mesma forma em que calculada originalmente, abstendo-se de exigir a devolução de valores ou proceder à restituição ao erário mediante desconto dos valores que julga pagos a maior, até o julgamento final da lide.
Com efeito, resta claro nos autos que os proventos da parte autora foram reduzidos após o transcurso do prazo decadencial, o que gera a nulidade do ato impugnado, devendo ser confirmada integralmente a decisão liminar.
(...)
A tais fundamentos, não foram opostos argumentos idôneos a infirmar o convencimento do julgador, motivo pelo qual a sentença merece ser integralmente mantida.
O ato revisional ora impugnado encontra óbice na decadência, tendo em vista que a supressão da verba incorporada aos proventos da autora decorreu não de atuação do Tribunal de Contas da União, no exercício de controle externo de legalidade do ato de concessão inicial de aposentadorias/pensões, mas, sim, de revisão do ato de concessão de vantagens pela própria UFRGS, impondo-se a observância do prazo decadencial previsto na Lei nº 9.784/1999.
Com efeito, os órgãos da Administração Pública, no exercício de seu poder/dever de autotutela, estão sujeitos ao prazo decadencial de cinco anos para "anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários" (art. 54 da Lei n.º 9.784/99), assim como às regras de tramitação do processo administrativo, inclusive as relativas à preclusão e à coisa julgada administrativa, quando a questão não envolver ilegalidade do ato.
Ilustram tal entendimento:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REVISÃO DE PROVENTOS. ANUÊNIOS. DECADÊNCIA. VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. INVIABILIDADE. BOA-FÉ. 1. Os órgãos da Administração Pública, no exercício de seu poder/dever de autotutela, estão sujeitos ao prazo decadencial de cinco anos para "anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários" (art. 54 da Lei n.º 9.784/99), assim como às regras de tramitação do processo administrativo, inclusive as relativas à preclusão e à coisa julgada administrativa, quando a questão não envolver ilegalidade do ato. 2. Inexigível a devolução de verbas remuneratórias, recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005184-47.2017.4.04.7002, 4ª Turma, Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 19/06/2019)
DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. ACLARATÓRIOS REJEITADOS. 1. Ao analisar o processo, percebe-se que ha três ações conexas em que houve decisão desta Corte Superior, quais sejam: AgInt Resp 1643363/ES; AResp 1241492/ES e RESP 1638365/ES. Todas essas tinham como matéria de fundo a decadência administrativa (art. 54 da Lei 9.784/99) e chegou-se a conclusão que, nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, a Administração Pública tem o poder/dever de rever e anular seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade. No entanto, se do ato ilegal decorrem efeitos favoráveis ao administrado, é obrigatória a instauração de processo administrativo prévio, com a observância do devido processo legal, bem como a observância do prazo decadencial de cinco anos, previsto no art. supracitado. 2. Acontece que o acórdão recorrido concluiu que (e-STJ fl. 577): "Quanto à questão prejudicial colocada no primeiro grau de jurisdição, evidencia-se, no presente caso, a partir do confronto entre a data da notória suplantação da VPNI da Lei nº 10.483/2002 pela VPNI da MPv nº 301/2006 (convertida na Lei nº 11.355/2006) em junho de 2006 e a data da tomada da primeira medida administrativa impugnatória da validade da continuidade de seu pagamento e impositora da respectiva recomposição fazendária em abril de 2010 (cf. fls. 299-302 c/c 330/1) ainda que bem antes da efetiva supressão de seu pagamento , a não-ocorrência de decadência do direito de realizar a supressão de seu pagamento e a reposição ao erário mediante desconto estipendial da VPNI percebida, conforme o art. 54 da Lei nº 9.784/1999 (aplicável, em complementação do art. 114 da Lei nº 8.112/1990, a partir de autorização dada por meio do art. 69 daquela Lei; e, pelo critério da especialidade, em detrimento do art. 103-A da Lei nº 8.213/1991)". 3. Isto é, pela análise das provas e fatos, nesse caso, o Tribunal a quo concluiu que não havia ocorrido a decadência, porquanto a data da tomada da primeira medida administrativa impugnatória da validade da continuidade do pagamento e impositora da respectiva recomposição fazendária se deu em abril de 2010, ou seja, antes dos cinco anos. 4. Já nos outros casos citados pela parte recorrente como conexos, analisando o acórdão, verifica-se que a revisão do ato administrativo se deu após os cinco anos e, portanto, haveria acontecido a decadência. Para melhor exemplificar, cita-se o que consta na decisão do REsp 1638356: "Da leitura do acórdão recorrido, observa-se que a revisão do ato administrativo se deu apenas em fevereiro de 2014, a partir de quando foram suprimidas as rubricas, por ocasião da vigência da Lei 11.355/06, que reestruturou a remuneração dos servidores. Portanto, entre a entrada em vigor da Lei 11.355/06, até a data da revisão do ato, em fevereiro de 2014, decorreu lapso temporal superior a 5 anos. Assim, configura-se a decadência do direito de a Administração rever o ato em questão". 5. Sendo assim, no presente caso, tendo em vista os argumentos trazidos pela acórdão recorrido, seria necessário rever os fatos e provas do processo, o que faz trazer à tona à súmula 7 desta Corte Superior. 6. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgInt no REsp 1668439/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 27/06/2018 - grifei)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REVISÃO DE APOSENTADORIA. DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. REGISTRO PELO TCU. ATO ADMINISTRATIVO COMPLEXO. INAPLICABILIDADE. ARTIGO 2º DA LEI Nº 8.911/1994. 1. No exercício do poder/dever de auto-tutela, os órgãos da Administração Pública estão sujeitos ao prazo decadencial de cinco anos para 'anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários', nos termos do art. 54 da Lei n.º 9.784/99. A inexistência de decadência para o exercício do controle externo de legalidade do ato de concessão do benefício é restrita ao Tribunal de Contas da União. 2. O direito do autor à manutenção da vantagem prevista no artigo 2º da Lei nº 8.911/1994, inexistindo ilegalidade na sua concessão. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5064084-25.2014.4.04.7100, 4ª Turma , Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 01/02/2018)
Outrossim, em relação às verbas remuneratórias recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração, é cediço que sua devolução é inexigível:
ADMINISTRATIVO. PAGAMENTO A MAIOR. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ OBJETIVA. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E DEFINITIVIDADE DO PAGAMENTO. RESTITUIÇÃO DE VALORES. DESCABIMENTO. 1. No julgamento do REsp 1.244.182/PB, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, ficou estabelecido o entendimento de que, nos casos em que o pagamento indevido foi efetivado em favor de servidor público, em decorrência de interpretação equivocada ou de má aplicação da lei por parte da Administração, a verba não está sujeita à devolução, presumindo-se a boa-fé do servidor. 2. Na linha do julgado precitado, o elemento configurador da boa-fé objetiva é a inequívoca compreensão, pelo beneficiado, do caráter legal e definitivo do pagamento. 3. No caso dos autos, o pagamento originado de decisão administrativa, devidamente motivada, gera presunção de legitimidade. 4. Recurso Especial não provido. (STJ, 2ª Turma, REsp 1590238/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, julgado em 03/05/2016, DJe 25/05/2016)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. URP DE FEVEREIRO DE 1989. REESTRUTURAÇÃO DE CARREIRA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. BOA-FÉ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Inexigível a devolução de verbas remuneratórias recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração. Nos termos do art. 86, caput, do CPC/2015, se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA nº 5004755-42.2015.404.7102, Rel. Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/07/2016)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. URP DE FEVEREIRO DE 1989. REESTRUTURAÇÃO DE CARREIRA. ABSORÇÃO. DECADÊNCIA. COISA JULGADA. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO. INVIÁVEL. A regra prevista no art. 54 da Lei n.º 9.784/99 não se aplica às hipóteses em que a outorga da vantagem, posteriormente suprimida, decorre de decisão judicial. A decisão judicial proferida no Juízo trabalhista tem seus efeitos limitados à vigência do contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas, mesmo que sobre ela tenha se operado a coisa julgada. Com o advento da Lei n.º 8.112/1990, as relações de trabalho, estabelecidas com a Administração Pública, embora de trato sucessivo, foram extintas, remanescendo apenas a garantia da irredutibilidade nominal e global da remuneração dos servidores enquadrados no regime jurídico único. A eficácia do título judicial perdura enquanto estiver em vigor a lei que o fundamentou, não podendo surtir efeitos após a revogação do regime jurídico existente à época (art. 471, inciso I, do CPC), pois 'não há direito adquirido a regime jurídico-funcional pertinente à composição dos vencimentos ou à permanência do regime legal de reajuste de vantagem, desde que eventual modificação introduzida por ato legislativo superveniente preserve o montante global da remuneração' (STF, 2ª Turma, RE-AgR 433621, Relator Ministro Eros Grau, DJE 14.03.2008). Não há amparo legal para que os servidores das instituições federais de ensino, que foram contemplados com a reestruturação de suas carreiras pelas Leis n.ºs 11.087/2005, 11.091/2005 e 11.784/2008, permaneçam recebendo a parcela referente a URP de fevereiro de 1989, que foi absorvida pelo novo padrão remuneratório. A jurisprudência desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de ser inviável a exigência de devolução de valores pagos a maior quando recebidos de boa-fé pelo servidor/pensionista. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA nº 5006307-50.2012.404.7101, Rel. Juiz Federal EDUARDO VANDRÉ O L GARCIA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 26/07/2016)
Dos juros de mora e correção monetária
Sobre o tema (n.º 810), manifestou-se o e. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 870.947/SE, sob a sistemática de repercussão geral, nos seguintes termos:
I - O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09;
II - O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.
Eis a ementa do referido julgado:
DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CRFB, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DE CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA, QUANDO ORIUNDAS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CRFB, ART. 5º, CAPUT). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput), no seu núcleo essencial, revela que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, os quais devem observar os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito; nas hipóteses de relação jurídica diversa da tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto legal supramencionado. 2. O direito fundamental de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII) repugna o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, porquanto a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. 3. A correção monetária tem como escopo preservar o poder aquisitivo da moeda diante da sua desvalorização nominal provocada pela inflação. É que a moeda fiduciária, enquanto instrumento de troca, só tem valor na medida em que capaz de ser transformada em bens e serviços. A inflação, por representar o aumento persistente e generalizado do nível de preços, distorce, no tempo, a correspondência entre valores real e nominal (cf. MANKIW, N.G. Macroeconomia. Rio de Janeiro, LTC 2010, p. 94; DORNBUSH, R.; FISCHER, S. e STARTZ, R. Macroeconomia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 2009, p. 10; BLANCHARD, O. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2006, p. 29). 4. A correção monetária e a inflação, posto fenômenos econômicos conexos, exigem, por imperativo de adequação lógica, que os instrumentos destinados a realizar a primeira sejam capazes de capturar a segunda, razão pela qual os índices de correção monetária devem consubstanciar autênticos índices de preços. 5. Recurso extraordinário parcialmente provido.
A decisão é vinculante para os demais órgãos do Poder Judiciário e tem eficácia retroativa (art. 102, § 3º, da CRFB, c/c art. 927, inciso III, do CPC), uma vez que não houve a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do artigo 1º- F da Lei n.º 9.494/1997, na redação dada pela Lei n.º 11.960/2009, na parte em que disciplinou a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública, conforme o deliberado por aquela e. Corte em sede de embargos de declaração:
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão nesta quinta-feira (3), concluiu que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para a atualização de débitos judiciais das Fazendas Públicas (precatórios) aplica-se de junho de 2009 em diante. A decisão foi tomada no julgamento de embargos de declaração no Recurso Extraordinário (RE) 870974, com repercussão geral reconhecida.
Nos embargos, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e diversos estados defendiam a possibilidade de a decisão valer a partir de data diversa do julgamento de mérito do RE, ocorrido em 2017, para que a decisão, que considerou inconstitucional a utilização da Taxa Referencial (TR) na correção dessas dívidas, tivesse eficácia apenas a partir da conclusão do julgamento.
Prevaleceu, por maioria, o entendimento de que não cabe a modulação, ressaltando-se que, caso a eficácia da decisão fosse adiada, haveria prejuízo para um grande número de pessoas. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há pelo menos 174 mil processos no país sobre o tema aguardando a aplicação da repercussão geral. (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=425451 - grifei)
Nessa linha, o pronunciamento do Colendo Superior Tribunal de Justiça nos REsp n.ºs 1.495.146/MG, 1.492.221/PR e 1.495.144/RS, na sistemática de recurso repetitivo:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART.1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A INDÉBITO TRIBUTÁRIO. TESES JURÍDICAS FIXADAS. 1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza. 1.1. Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção monetária. No presente julgamento, o estabelecimento de índices que devem ser aplicados a título de correção monetária não implica pré-fixação (ou fixação apriorística) de taxa de atualização monetária. Do contrário, a decisão baseia-se em índices que, atualmente, refletem a correção monetária ocorrida no período correspondente. Nesse contexto, em relação às situações futuras, a aplicação dos índices em comento, sobretudo o INPC e o IPCA-E, é legítima enquanto tais índices sejam capazes de captar o fenômeno inflacionário. 1.2. Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão. A modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo, desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em relação aos casos em que não ocorreu expedição ou pagamento de precatório. 2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação jurídico-tributária. 3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação. 3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral. As condenações judiciais de natureza administrativa em geral sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros demora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada acumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E. 3.1.1 Condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos. As condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês (capitalização simples); correção monetária: índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês; correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção monetária: IPCA-E. 3.1.2 Condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas. No âmbito das condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas existem regras específicas, no que concerne aos juros moratórios e compensatórios, razão pela qual não se justifica a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei11.960/2009), nem para compensação da mora nem para remuneração do capital. 3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária. As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária,no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006,que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art.1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009). 3.3 Condenações judiciais de natureza tributária. A correção monetária e a taxa de juros de mora incidentes na repetição de indébitos tributários devem corresponder às utilizadas na cobrança de tributo pago em atraso. Não havendo disposição legal específica, os juros de mora são calculados à taxa de 1% ao mês (art. 161, § 1º, do CTN). Observada a regra isonômica e havendo previsão na legislação da entidade tributante, é legítima a utilização da taxa Selic, sendo vedada sua cumulação com quaisquer outros índices. 4. Preservação da coisa julgada. Não obstante os índices estabelecidos para atualização monetária e compensação da mora, de acordo com a natureza da condenação imposta à Fazenda Pública, cumpre ressalvar eventual coisa julgada que tenha determinado a aplicação de índices diversos, cuja constitucionalidade/legalidade há de ser aferida no caso concreto. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO. 5. Em se tratando de dívida de natureza tributária, não é possível a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei11.960/2009) - nem para atualização monetária nem para compensação da mora -, razão pela qual não se justifica a reforma do acórdão recorrido. 6. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, c/c o art. 256-N e seguintes do RISTJ. (REsp 1495146 / MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, 1ª Seção, DJe 02/03/2018 - Recurso Repetitivo - Tema 905).
À vista de tais fundamentos, é de se reconhecer aplicável o IPCA-e para atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública, a partir de junho de 2009.
Dado o improvimento do recurso, acresça-se ao montante já arbitrado a título de honorários advocatícios o equivalente a 1% (um por cento) do valor da causa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa necessária.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001625921v4 e do código CRC 8586183e.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5070902-51.2018.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS (RÉU)
APELADO: IRACEMA GARCIA GONCALVES (AUTOR)
ADVOGADO: THIAGO MATHIAS GENRO SCHNEIDER (OAB RS065722)
ADVOGADO: GUILHERME PACHECO MONTEIRO (OAB RS066153)
ADVOGADO: ROGERIO VIOLA COELHO (OAB RS004655)
ADVOGADO: MARCO AURELIO PEREIRA DA SILVA (OAB RS031485)
ADVOGADO: JEFFERSON DOS SANTOS ALVES (OAB RS089504)
ADVOGADO: PEDRO HENRIQUE KOECHE CUNHA (OAB RS104102)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. Revisão de proventos. CÔMPUTO EQUIVOCADO DE LICENÇA-PRÊMIO. decadência. valores pagos indevidamente. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. inviabilidade. BOA-FÉ.
1. Os órgãos da Administração Pública, no exercício de seu poder/dever de autotutela, estão sujeitos ao prazo decadencial de cinco anos para "anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários" (art. 54 da Lei n.º 9.784/99), assim como às regras de tramitação do processo administrativo, inclusive as relativas à preclusão e à coisa julgada administrativa, quando a questão não envolver ilegalidade do ato.
2. Inexigível a devolução de verbas remuneratórias, recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de março de 2020.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001625922v3 e do código CRC 81ca8447.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 11/03/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5070902-51.2018.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON
APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS (RÉU)
APELADO: IRACEMA GARCIA GONCALVES (AUTOR)
ADVOGADO: THIAGO MATHIAS GENRO SCHNEIDER (OAB RS065722)
ADVOGADO: GUILHERME PACHECO MONTEIRO (OAB RS066153)
ADVOGADO: ROGERIO VIOLA COELHO (OAB RS004655)
ADVOGADO: MARCO AURELIO PEREIRA DA SILVA (OAB RS031485)
ADVOGADO: JEFFERSON DOS SANTOS ALVES (OAB RS089504)
ADVOGADO: PEDRO HENRIQUE KOECHE CUNHA (OAB RS104102)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 11/03/2020, na sequência 848, disponibilizada no DE de 20/02/2020.
Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA NECESSÁRIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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