Agravo de Instrumento Nº 5012990-51.2021.4.04.0000/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001097-68.2019.8.24.0218/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
AGRAVANTE: GRACIEMA MACHADO DA LUZ
ADVOGADO: Claudia Hoffmann (OAB SC031500)
ADVOGADO: CAMILA PRONER (OAB SC031819)
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto por GRACIEMA MACHADO DA LUZ em face de decisão que, em cumprimento de sentença, determinou que a habilitação dos herdeiros naqueles autos deve seguir a lei civil (evento 01 - DECISÃO/4 - fls. 62 e 68/69).
A decisão ora recorrida traz a seguinte fundamentação:
Embora a então companheira do falecido seja a única legitimada para o percebimento de pensão por morte pelo fato de os descendentes do instituidor possuírem idade superior a 21 anos (evento 62.2), os valores que estão sendo executados nestes autos referem-se à parcelas que lhe eram devidas em vida, ou seja, à sua aposentadoria, que integraria seu patrimônio jurídico e que, portanto, deve ser objeto de sucessão prevista na lei civil – tais valores não se confundem, pois, com a pensão por morte devida a partir do falecimento.
Assim, intime-se a parte exequente, pela última vez, para dar cumprimento ao despacho do evento 64, no prazo de 30 dias, sob pena de extinção do processo.
Essa decisão foi objeto de embargos de declaração, os quais foram assim resolvidos:
ALCIDES DA LUZ opôs os presentes embargos de declaração, sustentando que a decisão proferida no evento 71 foi omissa ao não aplicar o art. 112 da Lei n. 8.213/1991.
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório.
Decido.
Os presentes embargos são tempestivos, a teor do contido no art. 1.023 do CPC.
Por previsão expressa do art. 1.022 do mesmo diploma legal, cabem embargos aclaratórios quando existe a necessidade de esclarecer obscuridade ou eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento, e corrigir erro material.
No caso em apreço, constato que não há qualquer omissão na espancada decisão, visto que, como lá fundamentado, os valores já integravam o patrimônio jurídico do falecido antes do passamento e, portanto, devem ser objeto de sucessão prevista na lei civil.
De todo modo, consigno, em acréscimo, que tais valores não podem se confudir com a pensão por morte devida a partir do falecimento, sob pena de se estar concedendo benefício à dependente antes de os seus requisitos terem sido preenchidos: a ocorrência da morte. E não há dúvida que, quando se concede benefício sem preenchimento de requisitos legais, compromete-se o equilíbrio do sistema atuarial que rege a previdência, embora, no caso concreto, a concessão da aposentadoria já estivesse assegurada.
Fica claro, então, que a dependente só faz jus aos valores a partir do termo inicial da pensão por morte reconhecida, enquanto os herdeiros, no que ela possivelmente se inclui ao lado dos filhos do falecido, possuem direito aos valores pretéritos, que já constituíam um crédito vultoso do segurado, antes do falecimento.
Note-se que, por ser uma reserva expressiva, o valor certamente iria formar patrimônio e compor a herança dos herdeiros, de modo que não podem os valores ganharem destinação totalmente diversa pelo simples fato de, mesmo após a sentença, mas antes de o segurado perceber o valor, este vier a falecer.
Assim, entendo que se está diante de clássico caso de antinomia de segundo grau (Lei Especial n. 8.213/1991 contra leis mais recentes – CC/02 e CPC/2015), situação que há de ser resolvida de acordo com o caso concreto ou, então, com o prevalecimento da lei mais nova, como defende a doutrina majoritária, na leitura do art. 2º da LINDB.
E, pelas razões acima, é que entendo que as leis mais recentes devem ser aplicadas em detrimento do art. 112 da Lei n. 8.213/1991, evitando-se, assim, uma velada retroação do benefício de pensão por morte sem preenchimento de requisitos (a morte) e, ao mesmo tempo, sem frustrar o direito de herança dos herdeiros aos quais, como é bom lembrar, não apenas são transmitidos créditos, mas também débitos, nos limites da herança.
Logo, inexiste qualquer vício a inquinar o decisório guerreado, devendo a parte, se assim entender, manifestar sua rebeldia à decisão manejando a via recursal adequada.
Diante do exposto, rejeito os presentes embargos de declaração.
Intimem-se, inclusive o procurador da parte exequente para, pela última vez, para dar cumprimento ao despacho do evento 64, no prazo de 30 dias, sob pena de extinção do processo.
A parte agravante pede seja reconhecido seu direito à assistência judiciária gratuita.
Argumenta que é a única dependente que o segurado deixou, devendo receber o valor em cobrança nos autos em sua totalidade. Invoca o artigo 112 da Lei nº 8.213/1991.
Apresenta os seguintes pedidos:
Diante do exposto, o Agravante requer:
a) que o presente Agravo de Instrumento seja recebido;
b) a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária em favor da Agravante;
c) Que seja deferida liminarmente a tutela de urgência, com a expedição do competente alvará à cônjuge do de cujus;
d) Que a decisão do juízo a quo seja reformada, nos termos das razões ora apresentadas, prestigiando o artigo 112 da Lei 8.213/91, determinando que o valor não recebido em vida pelo segurado seja pago a sua dependente habilitada à pensão por morte.
O pedido de antecipação da tutela recursal foi deferido em parte (evento 4).
Sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A decisão inicial, que deferiu, em parte, a antecipação da tutela recursal, traz a seguinte fundamentação:
Prefacialmente, verifica-se que não houve manifestação na origem acerca do pedido de reconhecimento do direito à assistência judiciária gratuita, de forma que ele não pode ser conhecido, per saltum, no julgamento deste agravo de instrumento.
Passa-se, assim, à análise sobre o pedido de expedição de alvará judicial de levantamento de valores.
Compulsando os autos de origem, observa-se que, por ora, não foi analisado o pedido de habilitação processual da agravante, como sucessora do exequente.
O juízo de origem, na decisão agravada, entendeu que a habilitação dos herdeiros nos autos deve ocorrer na forma da lei civil, afastando a aplicação do disposto no artigo 112 da Lei nº 8.213/1991 e concedendo prazo para a habilitação.
Assim, revela-se prematura a discussão sobre o levantamento dos valores, na medida em que sequer a habilitação da parte agravante foi analisada na decisão agravada.
Dessa forma, é possível o conhecimento em parte do presente agravo de instrumento, apenas no que se refere à legislação aplicável na sucessão processual.
Pois bem.
No caso, estão em cobrança valores relativos a benefício previdenciário, de forma que a habilitação dos herdeiros nos autos ocorre na forma do artigo 112 da Lei nº 8.213/91, que assim dispõe:
Art. 112. O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.
Observa-se que parte agravante informou que está recebendo o benefício de pensão por morte decorrente da aposentadoria concedida nos autos (evento 01, DECISÃO/4, fl. 52).
Confiram-se, a propósito, precedentes deste Tribunal a respeito da matéria:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. FALECIMENTO DA SEGURADA. HABILITAÇÃO DOS SUCESSORES. ART. 112 DA LEI DE BENEFÍCIOS. DESNECESSIDADE DA ABERTURA DE INVENTÁRIO. 1. Dispõe o art. 112 da Lei de Benefícios que os valores não recebidos em vida pelos segurados serão pagos aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, não os havendo, aos sucessores, na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento. 2. Assim, por expressa dicção legal, basta que o habilitando seja dependente do segurado para ser considerado parte legítima e admitido a propor ação ou dar-lhe prosseguimento, sem maiores formalidades. Se não há dependentes inscritos, há de se observar a ordem de vocação sucessória posta no Código Civil, com a expressa dispensa de abertura de inventário ou arrolamento, sem prejuízo de que, nos casos em que houver inventário ou arrolamento, o espólio seja representado nos autos pelo inventariante. (TRF4, AG 5019252-51.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 18/02/2021)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PEDIDO DE SUCESSÃO PROCESSUAL. CERTIDÃO DE DEPENDENTES HABILITADOS À PENSÃO POR MORTE. EXIGÊNCIA DESNECESSÁRIA. 1. Dispõe o artigo 112 da Lei de Benefícios que os valores não recebidos em vida pelos segurados serão pagos aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, não os havendo, aos sucessores, na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento. 2. Os documentos acostados aos autos de origem pela agravante são suficientes à demonstração de que a esposa do segurado é a única pessoa habilitada à percepção da pensão por morte do instituidor, pois não revelam a existência de co-pensionista. 2. Diante disso, não se justifica a exigência de apresentação de Certidão, a ser fornecida pelo INSS, com a designação de todos os eventuais dependentes habilitados à pensão por morte. 3. Agravo de instrumento provido. (TRF4, AG 5010740-79.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 21/08/2020)
Destaca-se, ainda, que a Terceira Seção deste Tribunal, por meio de incidente de assunção de competência - IAC, firmou a seguinte tese (Tema nº 02):
Aplicabilidade do artigo 112 da Lei nº 8.213/91 no tocante à sucessão nos processos de execução que visam ao pagamento de valores devidos em vida ao segurado.
Confira-se, por fim, precedente do Superior Tribunal de Justiça nessa mesma linha:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES NÃO RECEBIDOS EM VIDA. PENSIONISTA. LEGITIMIDADE. INVENTÁRIO OU ARROLAMENTO DE BENS. DESNECESSIDADE.
1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2).
2. Segundo a jurisprudência do STJ, em observância ao princípio da especialidade, há prevalência do art. 112 da Lei n. 8.213/1991 sobre as normas do diploma processual civil, motivo pelo qual os dependentes e, na falta deles, os sucessores do falecido, possuem legitimidade para pleitear valores não recebidos em vida pelo de cujus, independentemente de inventário ou arrolamento de bens.
3. Hipótese em que reconhecida a legitimidade de pensionista para perceber os valores devidos ao servidor falecido e não pagos em vida, não havendo que se falar em concorrência com os demais herdeiros.
4. Agravo interno desprovido.
(STJ, AgInt no REsp 1865204/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 30/11/2020, DJe 03/12/2020) (Grifei.)
Dessa forma, verifica-se a probabilidade do direito invocado pela agravante no ponto.
Tudo indica que o caso não comporta o pagamento dos valores não recebidos em vida pelo segurado aos seus sucessores, na forma da lei civil, e sim à sua dependente, habilitada à pensão por morte.
Nessa perspectiva, impõe-se suspender o processamento de qualquer habilitação dos sucessores na forma da lei civil, assim como os efeitos de eventual habilitação nesse sentido, que já tenha sido deferida.
Todavia, não se justifica, por ora, autorizar o imediato levantamento dos valores questionados, pela agravante, até que este agravo de instrumento seja definitivamente julgado.
Ante o exposto, defiro em parte o pedido de antecipação da tutela recursal, para suspender o levantamento dos valores questionados, até que este agravo de instrumento seja julgado.
Em cognição mais exauriente, tem-se que deve ser mantido o entendimento que fundamentou a decisão transcrita.
Os créditos de natureza previdenciária não recebidos em vida pelo segurado serão pagos aos seus dependentes habilitados à pensão por morte e, na apenas falta desses, aos seus sucessores, independentemente de inventário ou arrolamento (artigo 112 da Lei nº 8.213/91).
A questão foi sedimentadada pela Terceira Seção deste Tribunal, por meio de incidente de assunção de competência - IAC, no qual foi firmada a seguinte tese (Tema nº 02):
Aplicabilidade do artigo 112 da Lei nº 8.213/91 no tocante à sucessão nos processos de execução que visam ao pagamento de valores devidos em vida ao segurado.
Ante o exposto, voto por conhecer em parte do agravo de instrumento e, na porção conhecida, dar-lhe provimento.
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AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. FALECIMENTO. SUCESSÃO. HABILITAÇÃO. ART. 112 DA LEI 8.231/91. PREVALÊNCIA SOBRE A LEI COMUM. DEPENDENTES HABILITADOS À PENSÃO POR MORTE.
1. Dispõe o artigo 112 da Lei de Benefícios que os valores não recebidos em vida pelos segurados serão pagos aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, não os havendo, aos sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.
2. Agravo de instrumento provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do agravo de instrumento e, na porção conhecida, dar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 21 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002676666v4 e do código CRC 6167e17c.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 14/07/2021 A 21/07/2021
Agravo de Instrumento Nº 5012990-51.2021.4.04.0000/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
AGRAVANTE: GRACIEMA MACHADO DA LUZ
ADVOGADO: Claudia Hoffmann (OAB SC031500)
ADVOGADO: CAMILA PRONER (OAB SC031819)
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/07/2021, às 00:00, a 21/07/2021, às 16:00, na sequência 1253, disponibilizada no DE de 05/07/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E, NA PORÇÃO CONHECIDA, DAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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