
Agravo de Instrumento Nº 5026647-55.2024.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
RELATÓRIO
A UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO interpõe agravo de instrumento contra decisão (
na origem), integrada pela que deferiu o pedido de tutela de urgência determinando ao réus o fornecimento dos medicamentos Dabrafenibe e Trametinibe para o tratamento de Melanoma Maligno (CID10 C43).A agravante destaca, inicialmente, o caráter irreversível da antecipação de tutela concedida na origem, a evidenciar o dano de difícil reparação apto a justificar a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Alega que é indispensável perícia prévia à concessão da medida urgente. Sustenta que não houve comprovação da imprescindibilidade do medicamento e a ineficácia da política pública. Discorre acerca da doença e do fármaco postulado, bem como sobre as alternativas disponíveis no SUS. Narra acerca do processo para incorporação de novas tecnologias, destacando a imprescindibilidade da análise dos protocolos e das decisões da CONITEC. Refere o alto custo do tratamento. Subsidiariamente, requer a repartição de custos pro rata e ressarcimento administrativo; seja determinada a observância do CAP/PMVG e a utilização da Denominação Comum Brasileira; a fixação de contracautelas, a ampliação do prazo para cumprimento da obrigação e o afastamento da determinação de bloqueio de verbas públicas.
O pedido de atribuição de efeito suspensivo foi indeferido.
Oportunizadas contrarrazões, veio o processo para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Do Direito à Saúde
O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Não se trata de direito absoluto, uma vez que é desarrazoado exigir do Estado que custeie todo e qualquer tratamento de saúde aos cidadãos, pois os recursos do SUS são limitados, de modo que compete ao Estado formular e executar políticas públicas universais e igualitárias.
O Supremo Tribunal Federal, interpretando o art. 196 da Constituição Federal e dedicando-se sobre a complexidade da efetividade dos direitos sociais e da chamada judicialização da saúde, estabeleceu alguns parâmetros e critérios relevantes na atuação do Poder Judiciário, mais precisamente na questão do fornecimento de medicamentos e tratamentos pleiteados em face dos entes políticos, assentando que “esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais e econômicas, ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize” (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070).
Do mesmo julgado se infere que a mera alegação da "reserva do possível" não é suficiente para justificar o descumprimento dos deveres constitucionais impostos ao Poder Público, mormente quando preenchidos os requisitos citados. Nesse sentido, a posição do Supremo Tribunal Federal:
Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.
(...) entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde - que se qualifica como direito subjetivo inalienável a todos assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput", e art. 196) - ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo, uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem, ao julgador, uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas.
(...) a missão institucional desta Suprema Corte, como guardiã da superioridade da Constituição da República, impõe, aos seus Juízes, o compromisso de fazer prevalecer os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais avultam, por sua inegável precedência, o direito à vida e o direito à saúde. (STA 175, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 30/04/2010)
De sua parte, o Superior Tribunal de Justiça ao apreciar o Tema Repetitivo nº 106 estabeleceu requisitos para fins de concessão de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (REsp nº 1.657.156/RJ, rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 04/05/2018):
TESE FIXADA: A tese fixada no julgamento repetitivo passa a ser: A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:
i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.
Prosseguindo no julgamento do Tema nº 1234 (RE 1.366.243, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2024, DJe 19/09/2024), o Supremo Tribunal Federal, ao homologar acordo interfederativo, traçou diretrizes que devem ser observadas pelo julgador nas demandas que objetivam o fornecimento de medicamentos no âmbito do Sistema Único de Saúde:
I - Competência
1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS, mas com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG - situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC.
1.1) Existindo mais de um medicamento do mesmo princípio ativo e não sendo solicitado um fármaco específico, considera-se, para efeito de competência, aquele listado no menor valor na lista CMED (PMVG, situado na alíquota zero).
1.2) No caso de inexistir valor fixado na lista CMED, considera-se o valor do tratamento anual do medicamento solicitado na demanda, podendo o magistrado, em caso de impugnação pela parte requerida, solicitar auxílio à CMED, na forma do art. 7º da Lei 10.742/2003.
1.3) Caso inexista resposta em tempo hábil da CMED, o juiz analisará de acordo com o orçamento trazido pela parte autora.
1.4) No caso de cumulação de pedidos, para fins de competência, será considerado apenas o valor do(s) medicamento(s) não incorporado(s) que deverá(ão) ser somado(s), independentemente da existência de cumulação alternativa de outros pedidos envolvendo obrigação de fazer, pagar ou de entregar coisa certa.
II - Definição de Medicamentos Não Incorporados
2.1) Consideram-se medicamentos não incorporados aqueles que não constam na política pública do SUS; medicamentos previstos nos PCDTs para outras finalidades; medicamentos sem registro na ANVISA; e medicamentos off label sem PCDT ou que não integrem listas do componente básico.
2.1.1) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na tese fixada no tema 500 da sistemática da repercussão geral, é mantida a competência da Justiça Federal em relação às ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa, as quais deverão necessariamente ser propostas em face da União, observadas as especificidades já definidas no aludido tema.
III - Custeio
3) As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.
3.1) Figurando somente a União no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do Estado ou Município para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão, o que não importará em responsabilidade financeira nem em ônus de sucumbência, devendo ser realizado o ressarcimento pela via acima indicada em caso de eventual custo financeiro ser arcado pelos referidos entes.
3.2) Na determinação judicial de fornecimento do medicamento, o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas acima descritas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.
3.3) As ações que permanecerem na Justiça Estadual e cuidarem de medicamentos não incorporados, as quais impuserem condenações aos Estados e Municípios, serão ressarcidas pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES ou ao FMS). Figurando somente um dos entes no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do outro para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão.
3.3.1) O ressarcimento descrito no item 3.3 ocorrerá no percentual de 65% (sessenta e cinco por cento) dos desembolsos decorrentes de condenações oriundas de ações cujo valor da causa seja superior a 7 (sete) e inferior a 210 (duzentos e dez) salários mínimos, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.
3.4) Para fins de ressarcimento interfederativo, quanto aos medicamentos para tratamento oncológico, as ações ajuizadas previamente a 10 de junho de 2024 serão ressarcidas pela União na proporção de 80% (oitenta por cento) do valor total pago por Estados e por Municípios, independentemente do trânsito em julgado da decisão, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias. O ressarcimento para os casos posteriores a 10 de junho de 2024 deverá ser pactuado na CIT, no mesmo prazo.
IV - Análise judicial do ato administrativo de indeferimento de medicamento pelo SUS
4) Sob pena de nulidade do ato jurisdicional (art. 489, § 1º, V e VI, c/c art. 927, III, §1º, ambos do CPC), o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo da não incorporação pela Conitec e da negativa de fornecimento na via administrativa, tal como acordado entre os Entes Federativos em autocomposição no Supremo Tribunal Federal.
4.1) No exercício do controle de legalidade, o Poder Judiciário não pode substituir a vontade do administrador, mas tão somente verificar se o ato administrativo específico daquele caso concreto está em conformidade com as balizas presentes na Constituição Federal, na legislação de regência e na política pública no SUS.
4.2) A análise jurisdicional do ato administrativo que indefere o fornecimento de medicamento não incorporado restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de não incorporação e do ato administrativo questionado, à luz do controle de legalidade e da teoria dos motivos determinantes, não sendo possível incursão no mérito administrativo, ressalvada a cognição do ato administrativo discricionário, o qual se vincula à existência, à veracidade e à legitimidade dos motivos apontados como fundamentos para a sua adoção, a sujeitar o ente público aos seus termos.
4.3) Tratando-se de medicamento não incorporado, é do autor da ação o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS.
4.4) Conforme decisão da STA 175-AgR, não basta a simples alegação de necessidade do medicamento, mesmo que acompanhada de relatório médico, sendo necessária a demonstração de que a opinião do profissional encontra respaldo em evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados, revisão sistemática ou meta-análise.
V- Plataforma Nacional
5) Os Entes Federativos, em governança colaborativa com o Poder Judiciário, implementarão uma plataforma nacional que centralize todas as informações relativas às demandas administrativas e judiciais de acesso a fármaco, de fácil consulta e informação ao cidadão, na qual constarão dados básicos para possibilitar a análise e eventual resolução administrativa, além de posterior controle judicial.
5.1) A porta de ingresso à plataforma será via prescrições eletrônicas, devidamente certificadas, possibilitando o controle ético da prescrição, a posteriori, mediante ofício do Ente Federativo ao respectivo conselho profissional.
5.2) A plataforma nacional visa a orientar todos os atores ligados ao sistema público de saúde, possibilitando a eficiência da análise pelo Poder Público e compartilhamento de informações com o Poder Judiciário, mediante a criação de fluxos de atendimento diferenciado, a depender de a solicitação estar ou não incluída na política pública de assistência farmacêutica do SUS e de acordo com os fluxos administrativos aprovados pelos próprios Entes Federativos em autocomposição.
5.3) A plataforma, entre outras medidas, deverá identificar quem é o responsável pelo custeio e fornecimento administrativo entre os Entes Federativos, com base nas responsabilidades e fluxos definidos em autocomposição entre todos os Entes Federativos, além de possibilitar o monitoramento dos pacientes beneficiários de decisões judiciais, com permissão de consulta virtual dos dados centralizados nacionalmente, pela simples consulta pelo CPF, nome de medicamento, CID, entre outros, com a observância da Lei Geral de Proteção da Dados e demais legislações quanto ao tratamento de dados pessoais sensíveis.
5.4) O serviço de saúde cujo profissional prescrever medicamento não incorporado ao SUS deverá assumir a responsabilidade contínua pelo acompanhamento clínico do paciente, apresentando, periodicamente, relatório atualizado do estado clínico do paciente, com informações detalhadas sobre o progresso do tratamento, incluindo melhorias, estabilizações ou deteriorações no estado de saúde do paciente, assim como qualquer mudança relevante no plano terapêutico.
VI - Medicamentos incorporados
6) Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido.
6.1) A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, anexados ao presente acórdão.
As teses supra transcritas converteram-se na edição da Súmula Vinculante nº 60, em 20/09/2024, com a seguinte redação:
Súmula vinculante 60 - O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede pública de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos 3 (três) acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243).
De todo o exposto, infere-se que tendo havido decisão administrativa da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC), é vedado ao julgador adentrar no mérito administrativo para substituir a vontade da autoridade competente, restringindo-se a análise jurisdicional ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato.
Restou, igualmente, assentado no precedente que, tratando-se de medicamento não incorporado, incumbe ao autor o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado no âmbito do SUS, igualmente eficaz para o seu tratamento. No ponto, impende destacar excerto do voto-condutor do Ministro Gilmar Mendes acerca das evidências científicas de alto grau de confiabilidade:
Para fins de interpretação autêntica e para que não pairem dúvidas quanto à expressão “evidências científicas de alto nível, tais como ensaios clínicos randomizados, estudos de coorte, estudos de caso-controle, revisão sistemática ou meta-análise”, do item 4.1.1 acima, deve ser considerada como a comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, da acurácia, da efetividade, da segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, apenas por meio de ensaios clínicos randomizados, revisão sistemática ou meta-análise. Isso porque, no nível hierárquico de evidências científicas, são os estudos mais adequados do ponto de vista de fortalecimento da política pública de saúde, por meio das instâncias de validação e de incorporação devidas. Dessa forma, excluem-se os estudos de coorte e estudos de caso-controle, não homologando o acordo quanto a tal aspecto.
Por fim, todas as diretrizes foram ratificadas por ocasião do julgamento de mérito do Tema 06 do Supremo Tribunal Federal (RE 566471, Relator Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 26/09/2024, DJe 30/09/2024), em regime de repercussão geral:
1. A ausência de inclusão de medicamento nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUME, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo.
2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação:
(a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item '4' do Tema 1234 da repercussão geral;
(b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011;
(c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;
(d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise;
(e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e
(f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.
3. Sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do artigo 489, § 1º, incisos V e VI, e artigo 927, inciso III, § 1º, ambos do Código de Processo Civil, o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente:
(a) analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo de não incorporação pela Conitec ou da negativa de fornecimento da via administrativa, à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, especialmente a política pública do SUS, não sendo possível a incursão no mérito do ato administrativo;
(b) aferir a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, previstos no item 2, a partir da prévia consulta ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível na respectiva jurisdição, ou a entes ou pessoas com expertise técnica na área, não podendo fundamentar a sua decisão unicamente em prescrição, relatório ou laudo médico juntado aos autos pelo autor da ação; e
(c) no caso de deferimento judicial do fármaco, oficiar aos órgãos competentes para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS.
Com essas considerações, passo ao exame do caso concreto.
Os relatórios médicos anexados na origem relatam que a autora é portadora de Melanoma Maligno, estágio clínico IV, metastático (CID C43.9), apresentando genotipagem positiva para mutação BRAF V600E. Foi submetida a tratamento oncológico com o uso de Pembrolizumabe como primeira linha de tratamento, apresentando progressão da doença, sendo indicado o uso da associação medicamentosa requerida com o objetivo de prolongar a sobrevida e o tempo livre de progressão da doença (
e na origem).A Nota Técnica produzida pelo Telessaúde/RS exarou, inicialmente, parecer desfavorável à dispensação em razão da ausência de comprovação, nos autos, da mutação no gene BRAF (
na origem).Após a apresentação de novos documentos pela parte autora, foi solicitada nova avaliação ao órgão de assessoramento, cujo parecer permaneceu desfavorável à entrega dos medicamentos, centrando sua conclusão na negativa de custo-efetividade da medicação. Confira-se (
na origem):Refiro, desde já, que a Nota Técnica do Telessaúde, firmada através de protocolo preconizado pelo Conselho Nacional de Justiça com a finalidade de obter elementos de evidência científica para subsidiar decisões em matéria de saúde, é meio hábil para dar cumprimento à exigência de prova atestando a adequação e necessidade da tutela de saúde postulada, nos termos da Súmula 101 desta Corte. Deste modo, existindo prova suficiente para a apreciação da tutela de urgência, não se há de exigir a realização de perícia para este fim, ainda que não reste obstada a complementação da prova produzida, a prudente critério do Juízo Singular.
Com efeito, a parte autora utilizou-se de tratamentos disponibilizados pelos SUS que foram ineficazes, tendo progredido a moléstia para tornar o melanoma metastático.
Saliento que os medicamentos requeridos estão registrados na ANVISA e a indicação clínica está de acordo com o registro, a teor da nota técnica que, a despeito de concluir desfavoravelmente à dispensação dos medicamentos, atesta que existe evidência de boa qualidade metodológica demonstrando que a combinação de DABRAFENIBE e TRAMETINIBE é eficaz quando comparada à quimioterapia para o tratamento de pacientes com melanoma metastático avançado com mutação V600E no gene BRAF, o que justifica sua disponibilização.
Colhe-se, ainda, do parecer (
na origem):Ressalto que a análise da CONITEC acerca da associação medicamentosa, com parecer desfavorável à incorporação no âmbito do SUS, deu-se para o tratamento em primeira linha, não sendo essa a situação da agravada.
Demais, a prova técnica registra que os medicamentos estão previstos no PCDT para o tratamento de pacientes com mutação V600E no gene BRAF, como é o caso do autos, além de referir que há evidências científicas de alto nível que asseguram a eficácia e adequação dos fármacos.
Nesse contexto, tenho por imprescindível os fármacos postulados, cuja eficácia e adequação foram atestadas pelo médico assistente e pelo órgão de assessoramento do Poder Judiciário.
Nesse sentido, já decidiu o TRF4:
SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. TRAMETINIBE E DABRAFENIBE. MELANOMA MALIGNO DE PELE METASTÁTICO. IMPRESCINDIBILIDADE E ADEQUAÇÃO. TRATAMENTO EM UNACON/CACON. PRESUNÇÃO DE ACERTO PARA FINS DE TUTELA DE URGÊNCIA. 1. Comprovado por Nota Técnica e perícia judicial que os medicamentos são imprescindíveis e adequados ao caso concreto. 2. No que tange à necessidade de realização de perícia prévia ao deferimento da medida de urgência, esta Turma tem flexibilizado tal exigência quando a parte realiza seu tratamento oncológico pelo SUS, em instituição credenciada como CACON/UNACON, porquanto se presume, nesses casos, o acerto da prescrição médica. 3. Cumpre destacar que os órgãos do Poder Judiciário não se encontram vinculados a eventual recomendação desfavorável da CONITEC (TRF4, AC 5019222-78.2019.4.04.7201, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 24/03/2022). 4. Levando em conta que o objeto do feito originário consiste no fornecimento de medicação oncológica, a responsabilidade financeira da aludida prestação é atribuível ao ente federal, de forma que não há falar em financiamento pro rata da prestação. 5. No tocante à forma de ressarcimento, aplicável o entendimento desta Turma no sentido de que "eventual ressarcimento, a cargo da União, pode se dar na via administrativa. Nada impede, porém, em havendo inércia do ente federal, que o Estado de Santa Catarina proponha execução judicial, a ser distribuída por dependência ao caderno processual originário, com seguimento em autos apartados" (AI n.º 5058450-95.2020.4.04.0000, Relator Desembargador Federal CELSO KIPPER, juntado aos autos em 22-07-2021). (TRF4, AG 5000816-05.2024.4.04.0000, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 15/04/2024)
APELAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIA JUDICIAL. DABRAFENIBE. TRAMETINIBE. MELANOMA MALIGNO DE PELE. CABIMENTO. CUSTEIO DA OBRIGAÇÃO. - É firme o entendimento deste Tribunal de que a prova pericial pode ser substituída por nota técnica do NAT-Jus, conforme também corrobora o Enunciado nº 83 das Jornadas de Direito da Saúde, do Conselho Nacional de Justiça. Cerceamento de defesa não evidenciado pela mera negativa de perícia judicial. - O Superior Tribunal de Justiça em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos assentou que a concessão de remédios não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa da comprovação da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento; da ineficácia do tratamento fornecido pelo sistema público de saúde; da incapacidade financeira do postulante e da existência de registro na ANVISA (REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25/04/2018, DJe 04/05/2018). - Caso concreto em que restou demonstrada, por meio de nota técnica, a adequação do tratamento com dabrafenibe e trametinibe para melanoma maligno de pele metastático. - Conforme decidido no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, é solidária a responsabilidade dos réus pela implementação do tratamento. No entanto, impõe ao juízo direcionar o cumprimento da obrigação conforme as regras de repartição de competência do SUS, o que impõe verificar se o medicamento é ou não padronizado. Cabe à União suportar a integralidade do ônus financeiro, por se tratar de medicamento oncológico, a teor do artigo 8°, II, da Portaria nº 876/2013, do Ministério da Saúde. (TRF4, AC 5000682-53.2022.4.04.7111, SEXTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 14/12/2023)
Com esses contornos, a concessão judicial da associação medicamentosa deve ser mantida.
Do Cumprimento da Obrigação
Com o julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.366.243, o Supremo Tribunal Federal, ao dispor sobre o custeio dos medicamentos incorporados ou não incorporados concedidos judicialmente, afastou a respectiva matéria do Tema 793 da Suprema Corte, com as seguintes considerações:
"Para que não ocorram dúvidas quanto ao precedente a ser seguido e diante da continência entre dois paradigmas de repercussão geral, por reputar explicitado de forma mais clara nestes acordos interfederativos, que dispõem sobre medicamentos incorporados e não incorporados no âmbito do SUS, de forma exaustiva, esclareço que está excluída a presente matéria do tema 793 desta Corte"
A Corte fixou a seguinte tese de repercussão geral (Tema 1234) acerca do custeio e responsabilidades dos entes da federação:
III - Custeio
3) As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.
3.1) Figurando somente a União no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do Estado ou Município para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão, o que não importará em responsabilidade financeira nem em ônus de sucumbência, devendo ser realizado o ressarcimento pela via acima indicada em caso de eventual custo financeiro ser arcado pelos referidos entes.
3.2) Na determinação judicial de fornecimento do medicamento, o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas acima descritas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.
(...)
3.4) Para fins de ressarcimento interfederativo, quanto aos medicamentos para tratamento oncológico, as ações ajuizadas previamente a 10 de junho de 2024 serão ressarcidas pela União na proporção de 80% (oitenta por cento) do valor total pago por Estados e por Municípios, independentemente do trânsito em julgado da decisão, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias. O ressarcimento para os casos posteriores a 10 de junho de 2024 deverá ser pactuado na CIT, no mesmo prazo.
(...)
VI - Medicamentos incorporados
6) Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido.
6.1) A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, anexados ao presente acórdão.
Assim, em que pese seja o cumprimento da obrigação exigível contra os réus solidariamente, compete à União o custeio integral do tratamento. Havendo condenação supletiva dos entes federados, deverá ocorrer o ressarcimento em face da União, na esfera administrativa, nos exatos termos definidos no precedente mencionado, o qual foi consolidado na Súmula Vinculante nº 60 do STF.
Portanto, embora a responsabilidade pelo custeio e aquisição (parcial ou total) do medicamento seja atribuída à União, confere-se ao Estado o encargo da dispensação do fármaco, em razão de sua expertise e maior proximidade com o cidadão.
Do Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG)
Havendo necessidade de aquisição judicial do medicamento, deve ser observado, de rigor, as teses assentadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de mérito do Tema nº 1.234, item 3.2, que assim dispõe:
3.2) Na determinação judicial de fornecimento do medicamento, o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas acima descritas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.
Do Prazo
Para o cumprimento da tutela de urgência, de regra, o prazo de 15 (quinze) dias é razoável para a satisfação ordinária de medida antecipatória, em conformidade com a jurisprudência deste colegiado (TRF4, AG nº 5038804-70.2018.4.04.0000, Des. Federal Celso Kipper, julgado em 20/03/2019; AG nº 5030488-34.2019.4.04.0000, Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, julgado em 03/09/2019).
Considerando a inexistência de circunstâncias extraordinárias nos autos que justifiquem a ampliação do prazo fixado na decisão agravada, cabe sua manutenção, pois em consonância com o entendimento desta Turma.
Das Contracautelas
Mantenho as contracautelas fixadas pelo juízo de primeiro grau, pois suficientes e adequadas ao caso concreto.
Do Uso da Denominação Comum Brasileira
Não se conhece do pedido, uma vez que a decisão se utilizou da referida denominação.
Bloqueio de Verbas Públicas
Quanto ao bloqueio de verbas públicas, ressalto que a Primeira Seção do egrégio Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.069.810/RS, em 23/10/2013, sob a sistemática de recurso repetitivo, consolidou o entendimento no sentido de que é cabível o bloqueio de verba pública em ação que se pleiteia o fornecimento de medicamentos, aplicável nas hipóteses em que restar demonstrado o descumprimento da determinação judicial.
Nessa hipótese, portanto, a decisão que determina o bloqueio de contas da União, sob qualquer rubrica, encontra-se em consonância com precedente do STJ, como no caso sub judice.
Nesse sentido, veja-se a jurisprudência desta Corte:
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE. 1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.069.810/RS, sob a sistemática de recurso repetitivo, consolidou o entendimento no sentido de que é cabível o bloqueio de verba pública em ação em que pleiteado o fornecimento de medicamentos, quando não houver o cumprimento espontâneo da decisão judicial. A concretização da medida constritiva, contudo, deve atingir verbas vinculadas ao sistema público de saúde, ou seja, valores originariamente destinados à saúde. 2. Também é viável bloqueio de verbas que, em virtude de cancelamentos ou retificações de requisições já expedidas, será devolvida ao Tribunal (e, posteriormente, ao Tesouro Nacional), nos termos do art. 37 da Resolução n.º 458, de 04/10/2017, do CJF. Assim, por terem perdido a destinação orçamentária original, tais verbas serão utilizadas como forma de coagir o Poder Público no cumprimento da ordem judicial em questão de saúde. (TRF4, AG 5027776-66.2022.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 27/10/2022)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. BLOQUEIO DE VALORES DE VERBA PÚBLICA. REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. PRECATÓRIO. 1. Cabível o bloqueio de verba pública em ação que se pleiteia o fornecimento de medicamentos de acordo com a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.069.810/RS, sob a sistemática de recurso repetitivo. 2. A decisão que determina o bloqueio de contas da União, sob qualquer rubrica, encontra-se em consonância com precedente do STJ. 3. Hipótese que que se trata de valores originariamente decorrentes de condenações judiciais impostas à Fazenda Pública Federal que, por conta de cancelamento, serão devolvidos ao Tribunal e tem como destinação final o retorno Tesouro Nacional, sem qualquer finalidade orçamentária específica. (TRF4, AG 5034194-20.2022.4.04.0000, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 13/10/2022)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. VERBAS NÃO VINCULADAS AO SUS. 1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.069.810/RS, sob a sistemática de recurso repetitivo, consolidou o entendimento no sentido de que é cabível o bloqueio de verba pública em ação em que pleiteado o fornecimento de medicamentos, quando não houver o cumprimento espontâneo da decisão judicial.2. Admite-se o bloqueio de contas da União, sob qualquer rubrica, considerando a inoperância da ré em dar efetividade ao cumprimento da determinação judicial que diz respeito ao acesso à saúde. (TRF4, AG 5029534-80.2022.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 26/10/2022)
Ressalto que a hipótese recursal não diz respeito a bloqueio de valores relacionados à Lei nº 13.463/17, que dispõe sobre o cancelamento de precatórios e RPV’s pagos há mais de dois anos, sem levantamento pela parte, e tampouco de valores que serão utilizados para o pagamento de requisições já inscritas.
Tampouco há desvio às regras constitucionais atinentes ao regime de pagamento de precatórios, uma vez que há desvinculação da destinação orçamentária original, sendo de se sublinhar que não se trata de quitação de obrigação de pagar mas de utilização excepcional de verba desvinculada a fim orçamentário específico para assegurar o cumprimento de obrigação de fazer que tutela a saúde (vide AG 5038364-06.2020.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 13/08/2020).
Ademais, o próprio Pretório Excelso já definiu a questão de forma diversa da apontada pelo recurso da União, ao expressamente afastar a aplicabilidade do art. 100 da CRFB quando se trata de medida que busca assegurar o cumprimento de decisões judiciais, em decisão que colho o ensejo para citar:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS. FORNECIMENTO A PACIENTES CARENTES. OBRIGAÇÃO DO ESTADO.I - O acórdão recorrido decidiu a questão dos autos com base na legislação processual que visa assegurar o cumprimento das decisões judiciais. Inadmissibilidade do RE, porquanto a ofensa à Constituição, se existente, seria indireta. II - A disciplina do art. 100 da CF cuida do regime especial dos precatórios, tendo aplicação somente nas hipóteses de execução de sentença condenatória, o que não é o caso dos autos. Inaplicável o dispositivo constitucional, não se verifica a apontada violação à Constituição Federal. III - Possibilidade de bloqueio de valores a fim de assegurar o fornecimento gratuito de medicamentos em favor de pessoas hipossuficientes. Precedentes. IV - Agravo regimental improvido (AI 553712 AgR, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJe-104 5-6-2009 -grifei).
Agravo regimental no agravo de instrumento. Direito à saúde. Fornecimento de medicamento. Bloqueio de verbas públicas. Possibilidade. Repercussão geral reconhecida. Precedentes. 1. O acórdão recorrido dá efetividade aos dispositivos constitucionais que regem o direito à saúde. 2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal fixou-se no sentido da possibilidade do bloqueio de verbas públicas para a garantia do fornecimento de medicamentos, questão que teve, inclusive, a repercussão geral reconhecida nos autos do RE nº 607.582/RS. 3. Agravo regimental não provido. (AI-AgR 639436- AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO, Relator Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, Sessão Virtual de 7.9.2018 a 14.9.2018, STF.)
Com relação ao alcance e à amplitude da referida medida constritivo, é entendimento pacífico neste Regional de que o bloqueio não precisa, necessariamente, estar adstrito a valores vinculados ao sistema público de saúde, sobretudo à luz da maior efetividade na satisfação do direito à saúde, indispensável à realização prática do princípio da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. BLOQUEIO/SEQUESTRO DE VERBAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE. 1. O bloqueio/sequestro de verbas públicas tencionado a instrumentalizar a entrega de medicamentos pode ser judicialmente deferido, porquanto configura medida necessária à efetivação do direito à saúde. Precedentes do STJ. 2. Com relação ao alcance e à amplitude da referida medida constritiva, esta Turma entende que o bloqueio pode recair sobre quaisquer rubricas, com vistas a compelir o réu ao cumprimento da determinação judicial atinente às prestações de saúde. (TRF4, AG 5059878-15.2020.4.04.0000, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 19/03/2021)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS. BLOQUEIO DE VALORES. POSSIBILIDADE. 1. Admite-se o bloqueio de contas da União, sob qualquer rubrica, considerando-se a inoperância da parte ré em dar efetividade ao cumprimento da determinação judicial que diz respeito ao acesso à saúde. 2. Caracterizado o descumprimento injustificado de atender ao comando judicial com a urgência que a situação exige, é viável o bloqueio de valores depositados em outras ações judiciais ou, ainda, sob outras rubricas. 3. Agravo ao qual se nega provimento. (TRF4, AG 5060107-72.2020.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/04/2021)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. SEQUESTRO DE VALORES RESTITUÍDOS AO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL PELO CANCELAMENTO OU RETIFICAÇÃO DE PRECATÓRIO OU DE REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. POSSIBILIDADE. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS NÃO VINCULADAS AO FUNDO NACIONAL DE SAÚDE. VIABILIDADE. 1. É permitida a utilização, de forma emergencial, de montante que foi devolvido ao tribunal para assegurar o cumprimento de obrigação de fazer. 2. Diante da impossibilidade de obter êxito no bloqueio de valores nas contas da União vinculadas ao Fundo Nacional de Saúde, justifica-se, em caráter excepcional, que a medida alcance quantias depositadas em contas públicas diversas. (TRF4, AG 5008306-83.2021.4.04.0000, QUINTA TURMA,
Prequestionamento
Por fim, nos termos do art. 1.025 do CPC, resta garantido o acesso às instâncias superiores.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004644521v8 e do código CRC d9c0c325.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 24/10/2024, às 17:26:57
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Agravo de Instrumento Nº 5026647-55.2024.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. MELANOMA maligno. abrafenibe e Trametinibe. EFICÁCIA COMPROVADA. direcionamento da obrigação. bloqueio de verbas públicas. prazo. contracautelas.
1. O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.
2. Sob pena de nulidade, a análise judicial do ato administrativo de indeferimento de medicamento pelo SUS deve observar todas as diretrizes assentadas nos julgamentos de mérito dos RE 1.366.243 (Tema nº 1.234) e RE 566471 (Tema 06).
3. Ainda, justifica-se a atuação judicial para garantir, de forma equilibrada, assistência terapêutica integral ao cidadão consoante definido pelas Leis nº 8.080/90 e 12.401/2011, de modo a não prejudicar um direito fundamental e, tampouco, inviabilizar o sistema de saúde pública.
4. Estando os medicamentos previstos no PCFT para o tratamento de pacientes portadores de melanoma maligno com mutação V600E no gene BRAF e comprovada a existência de evidências científicas de alto nível acerca da eficácia dos fármacos, deve ser judicialmente deferida a dispensação.
5. Em que pese seja o cumprimento da obrigação exigível contra os réus solidariamente, compete à União o custeio integral do tratamento. Havendo condenação supletiva dos entes federados, deverá ocorrer o ressarcimento em face da União, na esfera administrativa, nos exatos termos definidos no Tema nº 1.234, o qual foi consolidado na Súmula Vinculante nº 60 do STF.
6. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas em valor superior ao teto do PMVG, consoante item 3.2 do julgamento de mérito do Tema nº 1.234.
7. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.069.810/RS, sob a sistemática de recurso repetitivo, consolidou o entendimento no sentido de que é cabível o bloqueio de verba pública em ação em que pleiteado o fornecimento de medicamentos, quando não houver o cumprimento espontâneo da decisão judicial.
8. Mostra-se razoável o prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento da obrigação de medida antecipatória em matéria de saúde.
9. Tratando-se de fornecimento de medicamento por prazo indeterminado, cabe a fixação de contracautelas, como forma de afastar o desperdício e a inutilidade do fornecimento do medicamento de alto custo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de outubro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004644522v6 e do código CRC 6d4b2543.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 15/10/2024 A 22/10/2024
Agravo de Instrumento Nº 5026647-55.2024.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 15/10/2024, às 00:00, a 22/10/2024, às 16:00, na sequência 902, disponibilizada no DE de 04/10/2024.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 19:53:23.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas