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AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGURO-DESEMPREGO. DECISÃO JUDICIAL. REVERSÃO. REPETIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. EFEITO SUSPENSIV...

Data da publicação: 07/07/2020, 06:37:41

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGURO-DESEMPREGO. DECISÃO JUDICIAL. REVERSÃO. REPETIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFERIDO. 1. A melhor interpretação a ser conferida aos casos em que se discute a (ir)repetibilidade da verba alimentar percebida deve ser a de que deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo e ratificada em sentença, ou deferida na própria sentença, tem-se por irrepetível o montante percebido. 2. A ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais. (TRF4, AG 5010986-12.2019.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 19/11/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5010986-12.2019.4.04.0000/SC

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: ADAO SIMAO

ADVOGADO: FERNANDA RECCO (OAB SC017256)

ADVOGADO: EZEQUIEL BORGES DAGOSTIM (OAB SC036218)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão proferida em ação de procedimento comum, nos seguintes termos:

I - RELATÓRIO

Trata-se de ação de procedimento comum ajuizada por ADAO SIMAO em face da UNIÃO, objetivando seja declarada a nulidade do ato administrativo que determinou a restituição dos valores por si recebidos a título de seguro-desemprego (requerimento nº 7746085965), bem como seja declarado "o direito do requerente ao recebimento do seguro desemprego [sic] formulado no requerimento n.° 7746085965, por preencher os requisitos necessários para obtenção do benefício, já reconhecido no processo n.° 5010054-14.2017.4.04.7204, confirmando os efeitos da tutela".

Em sede de tutela de urgência requereu provimento jurisdicional que determine "a suspensão dos procedimentos de cobrança ref. ao processo administrativo n.° 47523.000038/2019-65, que postula a restituição dos valores recebidos pelo requerente a título de seguro desemprego [sic]".

Para tanto disse, em resumo, que, na data de 05/07/2017, foi dispensado sem justa causa. Afirmou que, "tendo laborado por 23 meses na antiga empregadora procurou a [sic] Ministério do Trabalho e Emprego para dar encaminhamento ao seu seguro desemprego [sic]. Entretanto, no ato foi informado que não poderia dar entrada no seu benefício, pois em 07/2011 passou a a [sic] verter contribuições na qualidade de contribuinte individual, presumindo o órgão a percepção de renda própria". Aduziu que, "embora sem qualquer impedimento legal", o requerimento, nº 7746085965, foi indeferido. Asseverou que "impetrou mandado de segurança que tramitou perante essa justiça especializada sob o n.° 5010054-14.2017.4.04.7204, sendo que, por meio de decisão interlocutória, confirmada por sentença, foi deferido ao requerente o direito ao recebimento do seguro desemprego, ao passo que, preenchido os requisitos na data do requerimento para obtenção do benefício. Ocorre que, a União obteve êxito em seu recurso de apelação, sendo então reformada a sentença". Por conta disso, recebeu "o ofício n.° 00164/2019/SEGAB/SPE/SRTb/SC, decorrente do processo n.° 47523.000038/2019-65 notificando-o para que promova a devolução dos valores recebidos indevidamente decorrentes da liminar deferida no processo n.° 5010054-14.2017.4.04.7204". Argumentou que "não cabe ao requerido a cobrança dos valores pagos a título de seguro desemprego [sic] ao requerente, ao passo que recebidos com amparo em decisão judicial e de boa-fé, ausente ilegalidade ou fraude por parte do beneficiário" (evento 1).

Determinou-se a intimação do autor para emendar a inicial (evento 3), o que foi cumprido (evento 6).

Deferiu-se a benesse da gratuidade da justiça, retificou-se o valor da causa e determinou-se nova intimação do autor para emendar a inicial (evento 8), o que também foi cumprido (evento 11).

Determinou-se a citação e a intimação da ré para manifestar-se sobre o pedido de tutela e eventual interesse na autocomposição, sem prejuízo da apresentação de contestação no prazo legal (evento 16).

Sobreveio a manifestação da ré, na qual sustentou, em síntese, o não preenchimento dos requisitos legais para deferimento do pedido de tutela de urgência (evento 20).

Os autos vieram conclusos.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Nos termos do art. 300 do CPC e seus parágrafos, o juiz poderá conceder a tutela provisória de urgência "quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo".

Como referido no relatório, no mandado de segurança nº 5010054-14.2017.4.04.7204, impetrado pelo ora autor, foi deferido o pedido liminar para "determinar que a autoridade impetrada, no prazo de 5 dias, proceda à implantação do seguro-desemprego em prol do impetrante, com o pagamento das parcelas devidas". Após, sobreveio sentença, que ratificou a decisão liminar e concedeu a ordem. A União, então, interpôs apelação, a qual o Tribunal Regional Federal da 4ª Região deu provimento, nos seguintes termos (grifos meus e no original):

Inicialmente, registro que o fato de a prova juntada na inicial ser ou não suficiente para o adequado desfecho do feito não impede o processamento do presente mandado de segurança.

Passo ao exame do mérito da apelação.

O impetrante requereu o benefício de seguro-desemprego pela despedida sem justa causa ocorrida em 05/07/2017 (evento 1 - ANEXO6 do processo originário), sobrevindo a notificação: "Percepção de renda própria: Contribuinte Individual. Início da Contribuição: 07/2011" (evento 1 - PROCADM7 do processo originário).

O documento denominado "Remunerações" do Portal do Trabalhador mostra recolhimentos mensais como contribuinte individual entre 07/2011 e 11/2017 (evento 10 - pp. 3-8 do processo originário). Portanto, durante longo intervalo de tempo.

Ademais, no evento 29 do processo originário, a União juntou imagens extraídas do facebook nas quais se constata que o impetrante tem o empreendimento denominado "AG Móveis Sob Medida" com exposição de trabalhos e disponibilidade para realização de orçamentos, havendo postagens com data anterior à demissão.

O impetrante, após vista do material acostado, esclareceu que, sem renda e sem o seguro-desemprego, teve que buscar meios de prover o sustento de sua família, passando a produzir móveis em parceria, disponibilizando seu contato para fomentar as vendas (evento 45 do processo originário).

Na espécie, entendo que razão assiste à apelante.

Não se trata de negar o benefício do seguro-desemprego simplesmente porque há recolhimento como contribuinte individual.

O longo período de recolhimento de contribuição previdenciária como contribuinte individual (segurado obrigatório) acrescido das imagens do evento 29 do processo originário não permitem a certeza de que o impetrante não aufere renda suficiente para sua manutenção e de sua família.

Observo que o art. 3º da Lei 7.998/90 prevê que terá direito ao seguro-desemprego o trabalhador dispensado sem justa causa que comprove, dentre outras coisas, não possuir renda própria de qualquer natureza suficiente à sua manutenção e de sua família.

Como se vê, é ônus do trabalhador comprovar que não possui renda suficiente e o impetrante, através das provas acostadas, não logrou êxito em afastar as dúvidas suscitadas pela parte impetrada.

Para o devido desfecho da lide, seria necessária dilação probatória, oportunizando, inclusive, à parte contrária a produção de provas. Contudo, isso não é admitido em sede de mandado de segurança.

É certo que a via do mandado de segurança é estreita e não se admitem outras provas, mas também é certo que o julgador precisa de prova concreta para intervir na atuação administrativa.

Por ora, com base no que consta neste mandado de segurança, entendo cabível a reforma da sentença, porque não demonstrado o direito líquido e certo da parte impetrante à liberação das parcelas de seguro-desemprego.

Contudo, fica aberto à parte interessada recorrer à via ordinária para provar seu direito e buscar o que pretende.

Ante o exposto, voto por dar provimento à remessa necessária e à apelação.

Por conta disso, a União, através do processo administrativo n° 47523.000038/2019-65, postulou a restituição dos valores recebidos pelo autor a título de seguro-desemprego. O autor, por sua vez, com a presente ação objetiva seja declarada a nulidade do ato administrativo que determinou a restituição dos valores por si recebidos, bem como seja declarado seu direito ao recebimento do seguro-desemprego.

É preciso decidir, portanto, se a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários - como o seguro-desemprego, nos termos do art. 201, III, da Constituição Federal e do art. 1º da Lei nº 8.213/91 - indevidamente recebidos.

Pois bem, a questão é controvertida na jurisprudência. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.401.560/MT (tema 692), ocorrido em 12/02/2014, fixou a seguinte tese: "A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos".

Contudo, posteriormente, a Suprema Corte prolatou diversas decisões em sentido contrário, conforme segue (grifei):

AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. JUIZ CLASSISTA. FÉRIAS ANUAIS DE SESSENTA DIAS. CONCESSÃO PREVISTA NO REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO VIGENTE À ÉPOCA. NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA E BOA-FÉ DO IMPETRANTE A CONJURAR A NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO. 1. Na ausência, à época dos pagamentos glosados pela autoridade impetrada, de decisão prévia e específica desta Suprema Corte, a respeito do tema das férias anuais de juízes classistas, resulta evidenciada dúvida plausível quanto à legalidade dos atos autorizadores dos mencionados pagamentos, praticados em conformidade com o então disciplinado no Regimento Interno do TRT da 15ª Região, aspecto que, aliado à boa-fé do impetrante e à natureza alimentar dos valores recebidos, afasta, na espécie, o dever de devolução de valores ao erário. 2. Decisão agravada proferida em sintonia com os seguintes precedentes: MS 27467 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 28.9.2015; AI 490551 AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe de 03.9.2010; e MS 26085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 13.6.2008. Agravo regimental conhecido e não provido. (MS 28165 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-077 DIVULG 20-04-2016 PUBLIC 22-04-2016)

SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE 1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010) 2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua restituição. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (MS 25921 AgR-segundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/09/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 25-09-2015 PUBLIC 28-09-2015)

AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. EX-JUIZ CLASSISTA. RESSARCIMENTO DE VALORES RECEBIDOS REFERENTES A FÉRIAS CONCEDIDAS INDEVIDAMENTE. DECADÊNCIA EM RELAÇÃO À DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS ATÉ 01/2001. EM RELAÇÃO ÀS DEMAIS PARCELAS, CONSTATAÇÃO DE EVIDENTE BOA-FÉ DO IMPETRANTE, DA INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DA LEI E DO CARÁTER ALIMENTÍCIO DOS VALORES PERCEBIDOS. NÃO DEMONSTRAÇÃO, PELA RECORRENTE, DE INEXISTÊNCIA DE DÚVIDA RAZOÁVEL EM RELAÇÃO À MATÉRIA TRATADA NO MANDADO DE SEGURANÇA. GOZO DAS FÉRIAS CONFORME REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO VIGENTE À ÉPOCA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES CONSISTE EM OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. As férias concedidas de forma indevida foram gozadas na forma prevista no regimento interno do TRT 15ª Região vigente à época. 2. Os valores cuja devolução foi determinada pelo TCU referem-se ao período de 21/5/1999 a 20/12/2004. Quanto às parcelas percebidas antes de 01/2001, o lapso temporal entre a data de recebimento destas pelo impetrante e a data de 05/1/2006, quando obteve ciência sobre a decisão do TCU que, primeiramente, determinou a devolução dos valores, é superior aos cinco anos previstos no art. 54 da Lei nº 9.784/1999. 4. Em relação às demais parcelas, ou seja, posteriores a 01/2001, constatei a presença dos requisitos da boa-fé do impetrante, aliado à ocorrência de errônea interpretação da Lei e ao caráter alimentício dos valores percebidos 5. Ademais, não houve demonstração, pela recorrente, que a matéria tratada no presente mandado de segurança, qual seja, o direito a férias de 60 dias para juízes classistas, resta pacificada nesta Corte. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (MS 27467 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/09/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 25-09-2015 PUBLIC 28-09-2015)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. 2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 734242 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015)

Impende ressaltar que essa jurisprudência foi posteriormente formada mesmo o Supremo Tribunal Federal não tendo reconhecido repercussão geral nas controvérsias relativas à devolução de valores recebidos de boa-fé em virtude de erro da administração e de concessão de tutela antecipada posteriormente revogada, por considerar que o seu exame dependeria de prévia análise da norma infraconstitucional (AI n. 841.473-RG, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 17/06/2011, e ARE n. 722.421-RG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 19/03/2015).

Diante dessa situação, o STJ acolheu questão de ordem no Recurso Especial nº 1.734.698/SP, para dar prosseguimento à proposta de revisão do entendimento firmado no Recurso Especial Repetitivo nº 1.401.560/MT (tema 692). Veja-se (grifei):

PROCESSUAL CIVIL. QUESTÃO DE ORDEM EM RECURSO ESPECIAL. RECURSOS REPETITIVOS. COMPETÊNCIA DA PRIMEIRA SEÇÃO DESTA CORTE SUPERIOR. PROPOSTA DE REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO TEMA REPETITIVO 692/STJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR REVOGADA POSTERIORMENTE. JURISPRUDÊNCIA CONTRÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA MATÉRIA. VARIEDADE DE SITUAÇÕES JURÍDICAS ENSEJADORAS DE DÚVIDAS SOBRE A APLICAÇÃO DO PRECEDENTE. ART. 927, § 4º, DO CPC/2015. ARTS. 256-S, 256-T, 256-U E 256-V DO RISTJ. QUESTÃO DE ORDEM ACOLHIDA. 1. O art. 927, § 4º, do CPC/2015 permite a revisão de entendimento firmado em tese repetitiva, visto que assegurados os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. Tal previsão se encontra regulamentada pelos arts. 256-S e seguintes do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, com a redação dada pela Emenda Regimental n. 24, de 28 de setembro de 2016. 2. Com a finalidade de rever o Tema 692/STJ, firmado sob a sistemática dos recursos repetitivos, resultado do julgamento do REsp 1.401.560/MT, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ acórdão Ministro Ari Pargendler, julgado em 12/2/2014, é formulada a presente questão de ordem. 3. A proposta de revisão de entendimento tem como fundamentos principais a variedade de situações que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva relacionada ao Tema 692/STJ, bem como a jurisprudência do STF, estabelecida em sentido contrário, mesmo que não tendo sido com repercussão geral ou em controle concentrado de constitucionalidade. 4. Nesse sentido, a tese repetitiva alusiva ao Tema 692 merece ser revisitada para que, com um debate mais ampliado e consequencialista da decisão, sejam enfrentados todos os pontos relevantes. Assim, a tese de que a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos pode ser reafirmada, restringida no seu âmbito de alcance ou mesmo cancelada. Mas tudo com a consideração necessária de todas as situações trazidas, sejam no âmbito das questões debatidas nos processos nos quais proposta a questão de ordem, sejam em referência ao próprio entendimento do STF na matéria. 5. Questão de ordem acolhida. (STJ, QO no REsp 1734698/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/11/2018, DJe 03/12/2018)

E do corpo do acórdão constou (grifei):

Ante o exposto, submeto o feito à Primeira Seção do STJ, em questão de ordem, e proponho o prosseguimento desta Proposta de Revisão de Entendimento firmado em tese repetitiva relativa ao Tema 692/ST, com os seguintes encaminhamentos:

a) a autuação como "Proposta de Revisão de Entendimento Firmado em Tema Repetitivo";

b) a suspensão do processamento de todos os processos ainda sem trânsito em julgado, individuais ou coletivos, que versem acerca da questão submetida à revisão pertinente ao Tema n. 692/STJ e tramitem no território nacional, com a ressalva de incidentes, questões e tutelas, que sejam interpostas a título geral de provimentos de urgência nos processos objeto do sobrestamento;

c) a comunicação, com cópia do acórdão, aos Ministros da Primeira Seção do STJ e aos Presidentes dos Tribunais Regionais Federais, Tribunais de Justiça e à Turma Nacional de Uniformização;

d) a oitiva do Ministério Público Federal, nos termos do § 2º do art. 256-T do RISTJ, que terá vista dos autos pelo prazo improrrogável de quinze dias para manifestar-se sobre o mérito da revisão de entendimento, ora proposta.

Ou seja, no caso dos autos, o pedido de tutela de urgência deverá ser analisado e, após, o processo deverá ser suspenso, no aguardo de ulterior deliberação do STJ na proposta de revisão do entendimento firmado no Recurso Especial Repetitivo nº 1.401.560/MT (tema 692).

E, quanto à tutela de urgência, entendo que deve prevalecer o entendimento do STF, posterior ao julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.401.560/MT (tema 692), no sentido de que "o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar" (ARE 734242 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015).

Caracterizado, portanto, o fumus boni iuris. O periculum in mora, por sua vez, está consubstanciado no fato de o autor já ter sido oficiado para restituir os valores recebidos a título de seguro-desemprego (evento 1 - OFIC4).

Assim, presentes os requisitos autorizadores, o deferimento do pedido de tutela de urgência é medida que se impõe.

III - DECISÃO

Ante o exposto, DEFIRO o pedido de tutela de urgência para determinar a suspensão dos procedimentos de cobrança referentes ao processo administrativo n° 47523.000038/2019-65, relativo à restituição dos valores recebidos pelo autor a título de seguro-desemprego.

Intimem-se.

Preclusa, suspenda-se o processo até ulterior deliberação do STJ na proposta de revisão do entendimento firmado no Recurso Especial Repetitivo nº 1.401.560/MT (tema 692).

Em suas razões, a agravante alegou que: (a) Não há ainda, a mínima plausibilidade jurídica na pretensão antecipatória. Eis que é fato incontroverso nos autos que o autor auferiu o pagamento das parcelas do seu seguro-desemprego com amparo em um provimento liminar deferido em mandado de segurança com este fim. Isto é, o benefício auferido pelo autor foi-lhe pago por força de uma decisão judicial de caráter temporário e precário. Sempre soube o demandante, portanto, que a qualquer tempo aquela decisão poderia ser revertida ou cassada pela sentença que dirimiu o mandamus, ou mesmo em grau de recurso pelo tribunal ad quem; (b) confunde o autor o seu caso com o entendimento da jurisprudência pátria que assegura ao servidor interessado a manutenção de pagamento indevido que auferiu com boa fé, em face a interpretação equivocada de lei pela administração pública. Nada tem isto a ver com o presente caso. Já que, na espécie, o demandante não auferiu o pagamento das parcelas do seguro-desemprego de boa fé e por erro da administração em interpretação da lei. Mas sim, por força de provimento liminar deferido de forma temporária e precária, pois, sujeito a reversão pelo próprio juízo ou pela instância superior, e (c) Não há que se falar em boa fé ou decisão eficaz, no caso. Mas sim, em pagamento que se tornou indevido a partir do momento em que o tribunal de segundo grau cassou em seus efeitos a liminar e a sentença proferidas na primeira instância. Sendo indevido o pagamento por cassação dos efeitos da liminar anteriormente deferida. Cabe ao autor restituir ao erário o valor auferido indevidamente. Nesses termos, pugnou pela concessão do efeito suspensivo ao recurso e, ao final, seu provimento.

No evento 5 (DESPADEC1), foi indeferido o pedido de efeito suspensivo.

Sem contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Por ocasião da análise do pedido de efeito suspensivo, foi prolatada decisão nos seguintes termos:

Em que pese ponderáveis os argumentos deduzidos pela agravante, não há, nos autos, razões para a reforma da decisão, que deve ser mantida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Ao apreciar questão similar no agravo de instrumento n.º 5007546-08.2019.4.04.0000/SC, a eminente Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA teceu considerações que peço vênia para reproduzir e adotar integralmente, verbis:

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto em face de decisão que indeferiu o pedido de devolução das parcelas pagas à parte impetrante, proferida sob os seguintes fundamentos:

Com o retorno dos autos da Superior Instância, as partes foram intimadas para requererem o que de direito (evento 35).

A União veio aos autos informar que houve a reforma da sentença pelo TRF da 4º Região, que reconheceu, de ofício, a decadência do direito de impetração da ação, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC. Requereu a intimação autoral para proceder a restituição dos valores relativos às parcelas de seguro desemprego liberadas em obediência à decisão liminar proferida nestes autos (evento 41).

Decido.

O impetrante recebeu as parcelas do seguro desemprego em razão de decisão liminar, posteriormente confirmada por sentença.

Destarte inegável a boa fé do impetrante com relação ao recebimento do benefício em questão, visto que deferido judicialmente.

Assim, não se afigura razoável exigir a devolução do benefício concedido judicialmente, de caráter alimentar e recebido de boa fé.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. BENEFÍCIO PERCEBIDO POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. NATUREZA ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. MANUTENÇÃO. CUSTAS.
1. Manutenção da sentença que concedeu o auxílio-doença entre a DER e a data do parto, pois comprovada a incapacidade laborativa nesse período. 2. Desconto dos valores já pagos em razão da tutela antecipada. 3. Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, é descabida a cobrança de valores recebidos em razão de decisão judicial posteriormente revogada. Precedentes da 3º Seção deste Tribunal. Boa-fé e natureza alimentar da prestação. (TRF4, Apelação/Remessa Necessária n. 5071525-85.2017.4.04.9999, Sexta Turma, Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Data da decisão: 01/08/2018)

Por similitude:

Ademais, importante destacar que houve o reconhecimento, por parte do Tribunal, da impossibilidade de utilização do mandamus, em face do transcurso do prazo decadencial, e não da inexistência do direito ao recebimento do benefício em questão.

E, este juízo mesmo, que já reconhecera a decadência, passou a afastá-la, com base em julgados do do TRF, agora, neste caso concreto, de ofício a decretou. Cito:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SEGURO-DESEMPREGO. REQUERIMENTO. PRAZO. Descabido o indeferimento do pedido de seguro-desemprego unicamente pelo motivo de que postulado fora do prazo de 120 dias previsto em resolução do CODEFAT, porque a limitação mencionada não encontra amparo legal, uma vez que a Lei 7.998/1990 não prevê prazo máximo para o requerimento do benefício em questão. (TRF4 5001978-69.2015.4.04.7107, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 07/08/2015)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SEGURO-DESEMPREGO. REQUERIMENTO DO BENEFÍCIO. PRAZO. LEI 7.998/90. AUSÊNCIA DE PRAZO MÁXIMO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A Lei nº 7.998/90 não estipula prazo máximo para o deferimento do benefício, motivo pelo qual tem-se que o art. 14 da Resolução nº 467/2005 - CODEFAT, ao estabelecer o prazo de 120 dias a contar da data da demissão, impõe uma limitação indevida ao exercício do direito, sem amparo legal, inovando restritivamente o ordenamento jurídico. 2. Existente o alegado direito líquido e certo, a ser amparado em sede de mandado de segurança, é de ser mantida a sentença que concedeu a ordem. (TRF4 5062013-50.2014.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 11/06/2015)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SEGURO-DESEMPREGO. LEI N.º 7.998/1990. REQUERIMENTO. ADMINISTRATIVO. RESOLUÇÃO N.º 19/1991-CODEFAT. PRAZO DE 120 DIAS. ILEGALIDADE. A Lei n.º 7.998/1990, que regula a concessão de benefício de seguro-desemprego, não estabelece prazo máximo para a formulação de pedido administrativo, dispondo apenas que o requerimento deve ser pleiteado a partir do sétimo dia da rescisão do contrato de trabalho (art. 6º). A norma da Resolução n.º 19/1991-CODEFAT, que impõe o encaminhamento de requerimento de seguro-desemprego até 120º (centésimo vigésimo) dia subsequente à data de sua demissão, cria uma limitação a direito, sem amparo legal, inovando restritivamente o ordenamento jurídico. Ainda que se reconheça a possibilidade de a Administração disciplinar, por meio de ato normativo infralegal, os procedimentos necessários ao recebimento do benefício na via administrativa, observados os limites de comprometimento dos recursos do FAT (art. 2º-C, § 2º, da Lei n.º 7.998/1990), não lhe é dado estabelecer condições que impliquem a perda do direito previsto em lei, sem o respectivo amparo legal. (TRF4, AC 5015906-21.2014.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 18/11/2014)

Pretendendo a União a devolução das parcelas deverá interpor ação própria (de cobrança), eis que assim o impetrante terá possibilidade de defender o seu direito ao recebimento do benefício, que, ressalte-se, na presente ação restou analisado e deferido.

Pelo exposto, indefiro o pedido da União formulado no evento 41.

Intimem-se.

Sustentou, a parte agravante, que, inicialmente, foi deferida a tutela de urgência, que foi confirmada em sentença e, posteriormente, essa foi reformada, havendo sido declarada a decadência do direito postulado pela parte impetrante. Assim, por decorrência lógica, necessário se faz restituir-se o estado anterior, devendo o agravado responder por eventuais prejuízos que a efetivação da mencionada tutela tenha causado. Arguiu que a provisoriedade, com possibilidade de reversão à situação anterior, é marca indelével da tutela de urgência, sobretudo daquela de natureza antecipatória, sendo que o CPC/15 abre margem para o entendimento de que a execução da tutela antecipatória e a execução provisória constituem atos jurídicos lícitos que podem dar causa, quando indevidos, à restituição ao estado anterior e/ou à indenização. Colacionou jurisprudências acerca da possibilidade de restituição ao status quo ante. Aduziu que, no que diz respeito à responsabilização do beneficiário, ou ao desfazimento da tutela provisória, não se aplica a ressalva prevista no art. 297 do CPC/15. Registrou que a indiscutível relevância do direito material deduzido no processo não é suficiente para afastar as regras processuais que, no interesse da parte prejudicada, determinam e regulam o restabelecimento do estado de fato anterior, sob pena de efeitos absolutamente irreversíveis, com graves e injustos prejuízos ao erário. Alegou que os recursos destinados ao pagamento do seguro desemprego são originados do FAT, de forma que a concessão do benefício a quem não o tem direito, acaba por comprometer o pagamento daqueles que preenchem todos os requisitos destinados à percepção da referida benesse, o que importa em enriquecimento ilícito, além de mácula ao princípio da isonomia. Afirmou que, ao contrário do que consta da decisão agravada, no caso dos autos não está em jogo a boa ou a má-fé do agravado, mas os riscos inerentes às tutelas de urgência. Quanto ao caráter alimentar do salário do desemprego, defendeu o mesmo não conduz, necessariamente, à irrepetibilidade, conforme julgamento do STJ em REsp (de nº 1.401.560/MT) representativo da controvérsia, no qual também foi apreciada hipótese de benefício previdenciário. Desta forma, de acordo com o disposto no art. 927, III, do CPC/15, o entendimento adotado pelo referido REsp é de observância obrigatória e vinculante pelos demais Juízes e Tribunais, não havendo espaço para adoção de tese diversa, salvo se devidamente comprovada a ocorrência de distinguishing. Ademais, sustentou que a arguição de que a agravante deve, caso entenda ser titular do direito à restituição dos valores pagos, ingressar com demanda judicial própria, além de não estar fundamentada, contraria o disposto no art. 520, II, do CPC/15, aplicável ao regime de efetivação das tutelas provisória por força do art. 297, parágrafo único, do referido diploma processual, de acordo com o qual a restituição das partes ao estado de fato anterior deve se dar nos mesmos autos. Requereu a reforma da decisão recorrida, a fim de que seja determinado ao agravado que restitua as parcelas de seguro-desemprego indevidamente recebidas, nos próprios autos do mandado de segurança que tramita no Juízo de origem.

É o relatório.

Primeiramente, destaco que nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil/2015, em vigor desde 18 de março de 2016, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869/1973, não se aplicando retroativamente, contudo, aos atos processuais já praticados e às situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.

No caso em tela, a decisão agravada foi publicada na vigência do CPC/2015, portanto, necessária a análise sob a ótica da lei atualmente em vigor.

Do caso concreto

Trata-se de liberação e pagamento das parcelas de seguro-desemprego à parte impetrante, em caráter liminar, deferida no Mandado de Segurança nº 5017360-77.2016.4.04.7201/SC e confirmada em sentença, porém, cassada por este Regional no julgamento de remessa necessária ocorrido em 27/09/2017.

No tocante à aplicação ou não, no caso concreto, do princípio da irrepetibilidade ou não-devolução de verba alimentar recebida por força de tutela antecipada posteriormente revogada, já externei meu entendimento nos autos da AC nº 5002261-30.2017.404.7202, o qual segue transcrito:

"(...) O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.401.560, efetuado em regime de recurso repetitivo, entendeu possível a repetição de valores recebidos do erário no influxo dos efeitos de antecipação de tutela posteriormente revogada, em face da precariedade da decisão judicial que a justifica, sob pena de caracterização de enriquecimento ilícito, ainda que se trate de verba alimentar e esteja caracterizada a boa-fé subjetiva, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C DO CPC/1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. ARTIGO 115 DA LEI 8.213/1991. CABIMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. Inicialmente é necessário consignar que o presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo n. 2/STJ: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça." 2. Firmou-se em sede de representativo de controvérsia a orientação de que a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. 3. A principal argumentação trazida pela embargante consiste em que a tutela antecipada que lhe reconheceu o direito à aposentadoria por idade rural, posteriormente, revogada pelo Tribunal a quo, foi concedida de ofício pelo Magistrado de primeiro grau, sem que houvesse requerimento da parte nesse sentido. 4. A definitividade da decisão que antecipa liminarmente a tutela, na forma do artigo 273 do CPC/1973, não enseja a presunção, pelo segurado, de que os valores recebidos integram, em definitivo, o seu patrimônio. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada, consoante artigo 273, § 2º, do CPC/1973. 5. Quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Nos dizeres do Ministro Ari Pargendler, que inaugurou a divergência no âmbito do julgamento do representativo da controvérsia, mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo que recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no Juiz, ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. 6. Do texto legal contido no artigo 115 da Lei 8.213/1991, apesar de não expressamente prevista norma de desconto de valores recebidos a título de antecipação da tutela posteriormente revogada, é possível admitir, com base no inciso II e, eventualmente, no inciso VI, o ressarcimento pretendido. 7. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no REsp 1401560/MT, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2016, DJe 02/05/2016) (Grifou-se)

Tratando-se de recurso julgado em regime repetitivo, impõe-se a esta Corte render-se aos argumentos do Superior Tribunal de Justiça, entendendo devido o ressarcimento dos valores recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada.

Ressalte-se, contudo, que tal interpretação deve ser observada com temperamentos, impondo-se a devolução apenas nos casos em que a medida antecipatória/liminar não tenha sido confirmada em sentença ou em acórdão, porquanto nas demais situações, embora permaneça o caráter precário do provimento, presente se fez uma cognição exauriente acerca das provas e do direito postulado, o que concretiza a boa-fé objetiva do servidor.

Nesta linha de raciocínio, examinando os Embargos de Divergência nº 1.086.154, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em sessão realizada em 20/11/2013, por maioria, deixou assentado que 'Não está sujeito à repetição o valor correspondente a benefício previdenciário recebido por determinação de sentença que, confirmada em segunda instância, vem a ser reformada apenas no julgamento de recurso especial' (EREsp. 1.086.154-RS - Min. Nancy Andrighi - D.J. 19/03/2014).

Sustenta a eminente Relatora que:

A dupla conformidade entre a sentença e o acórdão gera a estabilização da decisão de primeira instância, de sorte que, de um lado, limita a possibilidade de recurso do vencido, tornando estável a relação jurídica submetida a julgamento; e, de outro, cria no vencedor a legítima expectativa de que é titular do direito reconhecido na sentença e confirmado pelo Tribunal de segunda instância.

Essa expectativa legitima de titularidade do direito, advinda de ordem judicial com força definitiva, é suficiente para caracterizar a boa-fé exigida de quem recebe a verba de natureza alimentar posteriormente cassada, porque, no mínimo, confia - e, de fato, deve confiar - no acerto do duplo julgamento.

(...) a ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais.

Conforme referido linhas acima, tenho que o mesmo raciocínio deve ser conferido aos casos em que, embora não presente a dupla conformidade, haja confirmação do direito em sentença ou concessão do objeto almejado em acórdão, eis que examinada a prova e o direito em cognição exauriente por magistrado.

Neste altura, importa referir que, se é dado ao homem médio criar expectativa legítima (boa-fé objetiva) na irrepetibilidade de verba paga por interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração - matéria reconhecida pela União por meio da edição da Súmula nº 34/AGU -, com muito mais força se mostra presente a boa-fé objetiva nos casos em que o direito é confirmado por um magistrado em cognição exauriente.

De outro lado, calha mencionar que não se está fazendo letra morta ao art. 297, § único, ao art. 519 e ao art. 296, bem como ao art. 520, I e II, que determinam a restituição ao estado anterior das partes em caso de reforma do julgado que ensejou a percepção de tutela provisória e o cumprimento provisório da sentença, respectivamente, porque tais dispositivos, embora constitucionais, devem ser lidos em interpretação conforme a Constituição, não maculando princípio fundamental da República, insculpido no art. 1º, III, da CF/88, que é a dignidade da pessoa humana, menos ainda afrontando a segurança jurídica consubstanciada na sedimentada jurisprudência que, por anos, assentou a irrepetibilidade da verba alimentar.

Assim, sopesando todas as questões acima delineadas, tenho que a melhor interpretação a ser conferida aos casos em que se discute a (ir)repetibilidade da verba alimentar percebida por servidor civil deve ser a seguinte:

a) deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo, posteriormente não ratificada em sentença, forçoso é a devolução da verba recebida precariamente;

b) deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo e ratificada em sentença, ou deferida na própria sentença, tem-se por irrepetível o montante percebido;

c) deferido o benefício em sede recursal, igualmente tem-se por irrepetível a verba. (...).

Na hipótese dos autos, a parte impetrante percebeu as parcelas de seguro-desemprego por força de medida liminar confirmada pela sentença, mas revogada por este Regional, de modo que o montante recebido se mostra irrepetível.

Nesse contexto, não verifico a existência dos requisitos necessários à suspensão da decisão recorrida, uma vez que encontra-se em consonância com o entendimento desta Turma.

Isto posto, indefiro o efeito suspensivo postulado.

Intimem-se, sendo que a parte agravada, inclusive, para os fins do artigo 1.019 do CPC/15.

Ante o exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo do presente agravo de instrumento.

Intimem-se, sendo a parte agravada para apresentar contrarrazões. Após, voltem conclusos.

Estando o decisum em consonância com a jurisprudência e as circunstâncias do caso concreto, não vejo motivos para alterar o posicionamento adotado, que mantenho integralmente.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001473569v2 e do código CRC be9407d5.Informações adicionais da assinatura:
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5010986-12.2019.4.04.0000
40001473569.V2


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5010986-12.2019.4.04.0000/SC

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: ADAO SIMAO

ADVOGADO: FERNANDA RECCO (OAB SC017256)

ADVOGADO: EZEQUIEL BORGES DAGOSTIM (OAB SC036218)

EMENTA

agravo de instrumento. seguro-desemprego. decisão judicial. reversão. repetibilidade. impossibilidade. boa-fé. dignidade da pessoa humana. efeito suspensivo. indeferido.

1. A melhor interpretação a ser conferida aos casos em que se discute a (ir)repetibilidade da verba alimentar percebida deve ser a de que deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo e ratificada em sentença, ou deferida na própria sentença, tem-se por irrepetível o montante percebido.

2. A ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 13 de novembro de 2019.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001473570v4 e do código CRC 3f485b28.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Data e Hora: 19/11/2019, às 14:12:51


5010986-12.2019.4.04.0000
40001473570 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:37:41.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 13/11/2019

Agravo de Instrumento Nº 5010986-12.2019.4.04.0000/SC

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES

SUSTENTAÇÃO ORAL: EZEQUIEL BORGES DAGOSTIM por ADAO SIMAO

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: ADAO SIMAO

ADVOGADO: FERNANDA RECCO (OAB SC017256)

ADVOGADO: EZEQUIEL BORGES DAGOSTIM (OAB SC036218)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 13/11/2019, às 13:30, na sequência 718, disponibilizada no DE de 22/10/2019.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DETERMINADA A JUNTADA DO VÍDEO DO JULGAMENTO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:37:41.

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