Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N. º 1. 657....

Data da publicação: 26/04/2022, 11:01:05

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO STJ. TEMOZOLOMIDA. NEOPLASIA MALIGNA DA MEDULA ESPINHAL. NECESSIDADE COMPROVADA. CONCESSÃO JUDICIAL. CABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Conforme a regra da singularidade recursal estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil (art. 496, § 1º), tendo sido interpostas apelações pelos entes federados, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária. 2. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 3. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 4. In casu, o jurisperito chancelou a prescrição medicamentosa do profissional assistente, assentando a necessidade de utilização do fármaco pela parte autora. 5. Em não havendo situação excepcional a recomendar outro valor, os réus devem ser condenados em honorários advocatícios à razão de R$ 3.000,00 (três mil reais), pro rata. Precedentes desta Turma. (TRF4 5003013-45.2021.4.04.7207, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 18/04/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5003013-45.2021.4.04.7207/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: JEOVANE VANDRESEN MARQUES (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária movida por Jeovane Vandresen Marques contra a União e o Estado de Santa Catarina, objetivando o fornecimento gratuito do medicamento TEMOZOLOMIDA para o tratamento de doença oncológica que lhe acomete (neoplasia maligna da medula espinhal - CID C72).

Saneado e devidamente instruído o feito, a magistrada a quo, ao proferir sentença, em 26-01-2022 (evento 69), julgou procedente o pedido, confirmando, inclusive, a tutela de urgência anteriormente deferida, e condenou os réus ao pagamento, pro rata, de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atualizado da causa, conforme arts. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC.

Irresignado, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação (evento 76), alegando que os tratamentos oncológicos são de responsabilidade exclusiva da União, de modo que não caberia ao ente estadual responder por obrigação que não é de sua atribuição. Nesse sentido, pleiteia a modificação da sentença, determinando-se exclusivamente que a União financie e adquira o medicamento e que o Estado de Santa Catarina seja o responsável pelo armazenamento, manuseio e aplicação deste. Alternativamente, pleiteia o arbitramento dos honorários advocatícios em valor fixo, não superior a R$ 3.000,00.

A União também apelou (evento 75), alegando, preliminarmente, a incompetência absoluta do Juízo Federal para processar e julgar o feito. No mérito, requer a reforma do decisum hostilizado para o fim de que seja julgada improcedente a demanda. Para tanto, alega, nos termos da Portaria Conjunta SAES/SCTIE/MS nº 7, de 13 de abril de 2020, que existe política pública para tratamento da patologia que assola o autor, apontando a necessidade de prova de seu esgotamento ou de sua ineficácia. Discorre sobre o alto custo do fármaco, o processo de incorporação de novas tecnologias ao SUS, a medicina baseada em evidências, a relevância das decisões da CONITEC e a tese jurídica fixada pelo STJ no âmbito do Tema 106. Subsidiariamente, pede (i) o direcionamento da obrigação ao Estado de Santa Catarina, com repartição pro rata do ônus financeiro no âmbito administrativo, (ii) seja afastado o nome comercial do medicamento, (iii) a fixação de contracautelas, (iv) a observância do PMVG (Preço Máximo de Venda ao Governo) com a utilização do CAP (Coeficiente de Adequação de Preços) e (v) a estipulação dos honorários advocatícios por apreciação equitativa, na forma do art. 85, § 8º, do CPC.

Apresentadas as contrarrazões (evento 86), ascenderam os autos a esta Egrégia Corte, inclusive por força da remessa necessária.

É o sucinto relatório.

VOTO

Reexame necessário

Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual Diploma Processual Civil, não há falar em remessa oficial, porquanto foram interpostos recursos voluntários por ambos os entes públicos ocupantes do polo passivo desta demanda, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do vigente CPC. Com efeito, a redação do mencionado dispositivo é clara e inequívoca, não admitindo seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto excepcional e, sendo assim, há de ser restritivamente interpretado.

A propósito, Humberto Theodoro Júnior percucientemente observa que a novidade do CPC de 2015 é a supressão da superposição de remessa necessária e apelação. Se o recurso cabível já foi voluntariamente manifestado, o duplo grau já estará assegurado, não havendo necessidade de o juiz proceder à formalização da remessa oficial. (in Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 57. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 1101).

Nesta exata linha de conta, colaciona-se o seguinte aresto do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (TJ/RS, 9ª Câmara Cível, Apelação e Reexame Necessário nº 70076942127, Rel. Des. Carlos Eduardo Richinitti, julg. 30-05-2018)

No mesmo sentido, inclusive, pronunciou-se esta Turma Julgadora:

PREVIDENCIÁRIO. REEXAME (DES)NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO EM CASO DE RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS COMPROVADOS E NÃO QUESTIONADOS PELO APELANTE. ANULAÇÃO DA PERÍCIA. DESCABIMENTO. IMPUGNAÇÃO À PESSOA DO PERITO EM MOMENTO INOPORTUNO. PRECLUSÃO. 1. O reexame necessário é instituto de utilidade superada no processo civil diante da estruturação atual da Advocacia Pública, que inclusive percebe honorários advocatícios de sucumbência. Nada obstante, persiste positivado com aplicabilidade muito restrita. Considerada a redação do art. 496, § 1º, do NCPC, somente tem cabimento quando não houver apelação da Fazenda Pública. São incompatíveis e não convivem o apelo da Fazenda Pública e o reexame necessário, mera desconfiança em relação ao trabalho dos procuradores públicos, que compromete o tempo da Justiça, sobretudo da Federal. 2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter temporário da incapacidade. 3. In casu, pretendendo o INSS impugnar a nomeação do perito designado pelo juiz, deveria tê-lo feito, sob pena de preclusão, na primeira oportunidade em que tomou conhecimento de que a perícia seria realizada por aquele profissional. A impugnação do perito realizada após a perícia - a qual foi desfavorável ao Instituto - não tem o condão de afastar a preclusão. 4. Embora de acordo com o novo CPC não seja cabível agravo de instrumento da decisão interlocutória que rejeitou a impugnação do INSS ao perito, o que, em tese, poderia ensejar a aplicação do disposto no § 1º do art. 1.009, de modo a permitir que a matéria fosse reiterada em apelação, no caso, a referida impugnação ocorreu depois da realização da perícia, e não assim que o Instituto teve conhecimento de que a perícia seria realizada pelo profissional contestado, o que afasta a possibilidade de aplicação daquela regra. (TRF4, TRS/SC, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, unânime, julg. 12-12-2018).

Logo, conforme a regra da singularidade estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil, tendo sido, no caso, interpostas apelações por todos os entes federados, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.

Competência

Quanto à preliminar, não assiste razão ao ente federal, pois a responsabilidade solidária dos entes federativos implica, em regra, litisconsórcio facultativo, de modo que o polo passivo pode ser composto, a critério da parte proponente, por qualquer um deles, isolada ou conjuntamente, ressalvada, é claro, a presença obrigatória da União nos casos de tratamento, procedimento, material ou medicamento não padronizado no SUS ou cujo financiamento fique a cargo do ente federal (RE n.º 855.178 - Tema 793-STF).

No caso dos autos, o aforamento da demanda se deu originaria e exclusivamente no âmbito da Justiça Federal, tendo o autor movido a ação contra a União e o Estado de Santa Catarina (evento 1, INIC1, dos autos principais).

Com efeito, não há se falar em declinação do expediente para a Justiça Comum Estadual.

Mérito

A fim de evitar tautologia e, ao mesmo tempo, cumprir o dever constitucional de fundamentação das decisões judiciais, com homenagem ao princípio da economia processual, transcrevo, no que interessa, excerto do voto condutor por mim proferido - no bojo da qual analisei o quadro fático subjacente a esta causa - nos autos do Agravo de Instrumento n.º 5022669-75.2021.4.04.0000, oportunidade em que esta Turma, por unanimidade, manteve os efeitos da tutela provisória deferida na origem, a saber (evento 18, RELVOTO1):

[...]

De início, quanto à necessidade de que o deferimento de tutela provisória seja precedido de prova pericial ou parecer do NATJus/SC, tenho que a adoção inflexível deste critério acabaria por esvaziar o inescusável acautelamento judicial de casos urgentes, pois, na maior das vezes, a realização de perícia técnica não se dá initio litis. Ademais, a própria natureza sumária do juízo de cognição exarado em análise de eventual tutela provisória desobriga o julgador a revelar alto grau de certeza jurídica acerca da pretensão posta em juízo, bastando-lhe, para fins de sua outorga, a constatação da plausibilidade do direito material vindicado, assim como do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, nos termos do artigo 300, caput, do Novo Código de Processo Civil.

Compulsando os autos originários, vislumbro que tais requisitos restaram satisfeitos.

A uma porque este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar. A esse respeito, transcrevo os seguintes julgados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DEFERIMENTO. A parte autora realiza tratamento oncológico pelo Sistema Único de Saúde (SUS) junto a estabelecimento cadastrado como CACON (Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), afigurando-se prescindível a realização de perícia prévia à análise da antecipação de tutela postulada. (TRF4, AG 5016461-46.2019.4.04.0000, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, j. 31-07-2019)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ESGOTAMENTO DAS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS DISPONÍVEIS NO SUS. TUTELA PROVISÓRIA. DOENÇAS ONCOLÓGICAS. CACON/UNACON. PRESUNÇÃO DE ACERTO DA PRESCRIÇÃO MÉDICA. 1. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 3. In casu, a parte autora evidenciou a adequação do fármaco reclamado, bem como o fato de ter recebido tratamento fornecido pela rede pública, sem, contudo, alcançar resultados satisfatórios. 4. Este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar. (TRF4, AG 5025194-98.2019.4.04.0000, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Relator Des. Federal Celso Kipper, j. 28-08-2019, sem o grifo no original)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. MEDICAMENTOS. DOENÇA GRAVE. PERÍCIA. CACON. A ausência de perícia não obsta a concessão da tutela antecipada pois os estabelecimentos de saúde habilitados como CACON são competentes para indicar a medicação necessária e adequada no âmbito do sistema público de saúde. (TRF4, AG 5047808-68.2017.4.04.0000, Quarta Turma, Relator Des. Federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, juntado aos autos em 14/12/2017)

Veja-se, pois, que a inteligência firmada nesta Corte supervaloriza a orientação médica do profissional vinculado à Rede de Atenção Oncológica, sendo exatamente esta a hipótese sub examine, na qual a prescrição do fármaco se deu no âmbito do Hospital Nossa Senhora da Conceição (evento 01, LAUDO10, fl.09), em Tubarão-SC, nosocômio que ostenta a qualidade de UNACON.

A duas porque vão se somando, na plataforma pública e-NatJus, instituída pelo Conselho Nacional de Justiça, inúmeros pareceres favoráveis - alguns deles de autoria da equipe médica do renomado Hospital Israelita Albert Einstein - ao emprego da droga ora requestada no manejo da neoplasia medular.

Basta conferir, por exemplo, as recentes Notas Técnicas n.º 25.651, de 29-01-2021 (NatJus Nacional), n.º 19.694, de 26-02-2021 (NatJus/TJBA), n.º 17.558, de 11-09-2020 (NatJus/SC).

[...]

Nesse cenário, entendo que eventual perigo de irreversibilidade da medida deve curvar-se à verossimilhança das alegações autorais, que, in casu, revela-se patente.

Dessarte, assimilado o referido quadro fático-probante e havendo prova do registro do fármaco na ANVISA, entendo deva ser mantida a tutela de urgência deferida.

Dispositivo

Ante o exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo.

Diante do conteúdo da deliberação singular acima transcrito, não vejo razões para alterar o posicionamento liminar então adotado. Pelo contrário, constato a superveniência de perícia médica judicial na origem, dando conta de que EXISTE indicação técnica para o fornecimento da medicação pleiteada em detrimento das medicações disponíveis pelo SUS (evento 44, LAUDOPERIC1, fl. 07).

[...]

Não vejo motivos para alterar o entendimento acima externado, até porque não sobreveio ao expediente originário quaisquer provas ou fatos novos aptos a infirmá-lo, sendo o caso, portanto, de ratificação, no mérito, da sentença vergastada.

Responsabilidade financeira e direcionamento da obrigação

A norma constitucional extraída do artigo 196 da Carta Magna consagra a responsabilidade solidária dos entes federativos em matéria de saúde pública, eis que o vocábulo "Estado", considerado em sua maior amplitude, retrata o Poder Público como um todo, alcançando, indubitavelmente, a União, os Estados propriamente ditos, o Distrito Federal e os Municípios.

A reforçar tal ilação, o artigo 23, inciso II, bem como o artigo 198, caput e §1º, ambos do Texto Maior, trataram de firmar a competência comum das pessoas federativas com relação à prestação de serviços públicos de saúde e de instituir um Sistema Único de Saúde (SUS), cujo financiamento fosse levado a efeito a partir dos recursos orçamentários de todos os entes.

A jurisprudência corrente dos Tribunais Superiores orienta-se, de maneira uniforme, no sentido de que a responsabilidade dos entes federados traduz litisconsórcio passivo facultativo, de modo que, em ações deste jaez, é dado ao cidadão enfermo obter os medicamentos de que necessite perante quaisquer das pessoas políticas, cabendo-lhe, portanto, o direito subjetivo de demandá-las em conjunto ou isoladamente.

Nada obstante, destaco que o Supremo Tribunal Federal, na sessão de 23 de maio de 2019, ao julgar os embargos de declaração opostos pela União contra decisão do Plenário Virtual no RE n.º 855178/SE (Tema 793), com relatoria para o acórdão do Ministro Edson Fachin, fixou, por maioria, a seguinte tese de repercussão geral:

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro (grifei)

Embora a Corte Suprema tenha reafirmado sua jurisprudência prevalente - no sentido de reconhecer a responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de direito à saúde -, tratou de inovar no cenário jurídico, ao exigir, de forma expressa, que o magistrado direcione o cumprimento da obrigação, segundo as normas de repartição de competências, assim como condene a pessoa política legalmente responsável pelo financiamento da prestação sanitária a ressarcir quem suportou tal ônus.

In casu, levando em conta que o objeto do expediente originário consiste no fornecimento de medicação oncológica, a responsabilidade financeira de sua aquisição, consoante iterativa jurisprudência deste Regional, é exclusiva da União, não havendo se falar, pois, em financiamento pro rata da prestação sanitária.

Doutro vértice, o fato de a responsabilidade financeira de custear as drogas buscadas recair sobre o ente federal não impede o acionamento do corréu, haja vista o multicitado vínculo de solidariedade existente entre os ocupantes do polo passivo. De tal constatação apenas decorre, em verdade, que o Estado de Santa Catarina deve ser ressarcido na hipótese de ter despendido recursos financeiros com a execução da tutela, e não que deve ser excluído da lide ou que suas obrigações estejam adstritas, de forma apriorística, ao armazenamento, manuseio, aplicação ou entrega do fármaco requestado.

Como bem ventilado no voto condutor do Tema 793 do STF, ainda que as normas de regência (Lei 8.080/90 e alterações, Decreto 7.508/11, e as pactuações realizadas na Comissão Intergestores Tripartite) imputem expressamente a determinado ente a responsabilidade principal (de financiar a aquisição) pela prestação pleiteada, é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo, como responsável pela obrigação, para ampliar sua garantia, como decorrência da adoção da tese da solidariedade pelo dever geral de prestar saúde.

Obtempero, então, a necessidade de acolhimento parcial do recurso manejado pelo Estado catarinense para o fim de lhe resguardar o direito ao ressarcimento integral caso tenha arcado financeiramente com o cumprimento da obrigação estampada na sentença.

Registro, ainda, que eventual ressarcimento, a cargo da União, pode, sim, se dar na via administrativa. Nada impede, porém e em havendo inércia do ente federal, que o Estado de Santa Catarina proponha execução judicial, a ser distribuída por dependência ao caderno processual originário, com seguimento em autos apartados (Cf.: TRF4, AC 5005017-26.2019.4.04.7207, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 31/08/2021).

Quanto ao direcionamento da obrigação, invoco a compreensão do Superior Tribunal de Justiça de que a tese firmada no julgamento do Tema 793 pelo Supremo Tribunal Federal, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença (AgInt no CC n.º 166.964/RS, Rel. Min. Og Fernandes, 1ª Seção, j. 23/10/2019), razão pela qual relego ao juízo da execução o encargo de direcionar o cumprimento da ordem judicial.

Nome comercial

No ponto, a pretensão recursal da União há de ser agasalhada para o fim de excluir a vinculação da obrigação de entrega do fármaco a seu nome comercial, devendo ser observado, em verdade, apenas seu princípio ativo (TEMOZOLOMIDA) (Cf.: TRF4, Apelação Cível/Remessa Necessária n.º 5018872-27.2018.4.04.7201, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, j. 11-12-2019, sem o grifo no original).

Contracautelas

Considerando tratar-se de fármaco a ser utilizado com supervisão de profissional da rede de atenção oncológica do sistema público de saúde (Hospital Nossa Senhora da Conceição - evento 1, LAUDO10, fl. 09), tenho por desnecessária a fixação de medidas de contracautela (vide AI n.º 5042441-58.2020.4.04.0000, de minha relatoria, j. 17-02-2021).

Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) e Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG)

Inicialmente, examinando a normativa infralegal hasteada pela apelante1, entendo oportuno reproduzir o inteiro teor de seu artigo primeiro, caput e parágrafos:

Art. 1º As distribuidoras, as empresas produtoras de medicamentos, os representantes, os postos de medicamentos, as unidades volantes, as farmácias e drogarias, deverão aplicar o Coeficiente de Adequação de Preço - CAP ao preço dos produtos definidos no art. 2º desta Resolução, sempre que realizarem vendas destinadas a entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (grifei)

§ 1º O CAP, previsto na Resolução nº 2, de 5 de março de 2004, é um desconto mínimo obrigatório a ser aplicado sempre que forem realizadas vendas de medicamentos destinadas aos entes descritos no caput.

§ 2º A aplicação do CAP sobre o Preço Fábrica - PF resultará no Preço Máximo de Venda ao Governo - PMVG.

§ 3º O CAP será aplicado sobre o PF.

Certifico-me, pois, que a aplicação do CAP remanesce adstrita às compras realizadas por determinadas pessoas jurídicas de direito público.

Noutras palavras, os ocupantes do polo passivo é que devem se ater ao parâmetros de precificação insculpidos na norma de regência, até porque a ordem de fornecimento a eles foi expressamente direcionada.

O demandante - pessoa física - não pode ser obrigado a buscar um desconto que sequer lhe é destinado.

De qualquer sorte, na hipótese de efetivo descumprimento da providência satisfativa pelos réus, eventual bloqueio de valores - com lastro em orçamentos particulares apresentados pelo autor - prescindiria da observância do CAP e do PMVG. Isso porque, sopesada a devida cautela com o dinheiro público, a inércia da Administração, notadamente quando se trata de matéria sensível como o direito à saúde, não autoriza, penso eu, a imposição de ônus excessivo àquele que, por pelo menos duas vezes (na via administrativa e judicial), deixou de ser contemplado com a medicação necessária à melhoria de seu quadro clínico.

A propósito, este Colegiado assim decidiu de forma unânime:

SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CUMPRIMENTO DA TUTELA DE URGÊNCIA. COEFICIENTE DE ADEQUAÇÃO DE PREÇOS - CAP. 1. De acordo com a Resolução n. 3, de 02 de março de 2011, o Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) deve ser aplicado pelas distribuidoras, empresas produtoras de medicamentos, representantes, postos de medicamentos, unidades volantes, farmácias e drogarias, aos produtos definidos no art. 2º da Resolução, inclusive aos produtos comprados por força de decisão judicial, sempre que realizarem vendas destinadas a entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. 2. O presente caso não trata de compras de medicamentos realizadas por entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. 3. Não se pode exigir do usuário, em face do descumprimento da obrigação de fornecimento dos medicamentos por parte da administração pública, assumir o ônus de obter, para si, desconto que, consoante o ordenamento que rege a matéria, não lhe é destinado. (TRF4, AG 5019416-79.2021.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 31/08/2021, grifei)

Tema n.º 06 do STF

Relativamente à questão do alto custo do medicamento, registro que o RE n.º 566.471/RN (Tema 6 - STF), de Relatoria do Ministro Marco Aurélio Mello, teve sua repercussão geral reconhecida na vigência do CPC/1973 (em 15-11-2007) e não houve a determinação de suspensão dos feitos em todos os tribunais pátrios. Inaplicável, pois, o disposto no 1.037, II, do CPC/2015.

A despeito de o aludido recurso paradigma já ter sido julgado pelo Plenário da Suprema Corte, em 11-03-2020, assinalo que a respectiva tese de repercussão geral ainda não foi fixada e que, de qualquer sorte, como noticiado no sítio eletrônico oficial do STF, a vertente vencedora entendeu que, nos casos de remédios de alto custo não disponíveis no sistema, o Estado pode ser obrigado a fornecê-los, desde que comprovadas a extrema necessidade do medicamento e a incapacidade financeira do paciente e de sua família para sua aquisição2, inteligência esta adotada no julgamento do presente caso.

Honorários advocatícios

Tratando-se de causa afeta à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, a incidência da norma contida no artigo 85, §8º, do Novo Código de Processo Civil, revela-se de todo adequada, ficando a cargo do julgador, mediante apreciação equitativa, o arbitramento da verba honorária.

Em não havendo situação excepcional a recomendar outro valor, os réus devem ser condenados em honorários advocatícios à razão de R$ 3.000,00 (três mil reais), pro rata, consoante iterativa jurisprudência desta Turma.

No ponto, provejo ambos os recursos para redimensionar o valor devido a título de honorários de sucumbência.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e dar parcial provimento às apelações.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003161823v13 e do código CRC 599b7e05.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 12/4/2022, às 16:5:25


1. Resolução CMED n.º 3, de 02-03-2011, que dispõe sobre o Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) e o Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG)
2. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=439095&caixaBusca=N

5003013-45.2021.4.04.7207
40003161823.V13


Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2022 08:01:05.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5003013-45.2021.4.04.7207/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: JEOVANE VANDRESEN MARQUES (AUTOR)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO STJ. TEMOZOLOMIDA. NEOPLASIA MALIGNA DA MEDULA ESPINHAL. necessidade comprovada. concessão judicial. CABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

1. Conforme a regra da singularidade recursal estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil (art. 496, § 1º), tendo sido interpostas apelações pelos entes federados, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.

2. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.

3. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS.

4. In casu, o jurisperito chancelou a prescrição medicamentosa do profissional assistente, assentando a necessidade de utilização do fármaco pela parte autora.

5. Em não havendo situação excepcional a recomendar outro valor, os réus devem ser condenados em honorários advocatícios à razão de R$ 3.000,00 (três mil reais), pro rata. Precedentes desta Turma.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e dar parcial provimento às apelações, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 08 de abril de 2022.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003161824v3 e do código CRC 328c9959.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 12/4/2022, às 16:5:25


5003013-45.2021.4.04.7207
40003161824 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2022 08:01:05.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/04/2022 A 08/04/2022

Apelação/Remessa Necessária Nº 5003013-45.2021.4.04.7207/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: JEOVANE VANDRESEN MARQUES (AUTOR)

ADVOGADO: CAMILA MENDES PILON RICKEN (OAB SC035280)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/04/2022, às 00:00, a 08/04/2022, às 16:00, na sequência 756, disponibilizada no DE de 23/03/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E DAR PARCIAL PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2022 08:01:05.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora