Apelação Cível Nº 5004621-95.2018.4.04.7009/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LUIZ CARLOS LEITE (AUTOR)
RELATÓRIO
A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a concessão de aposentadoria à pessoa com deficiência, destacando que, caso não atendidos os requisitos para a este benefício, pretende a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Para tanto, requer o reconhecimento de tempo de serviço urbano, pertinente ao vínculo de emprego no período de 02/01/1986 a 31/08/1989, e de trabalho exercido em condições especiais nos períodos de 29/10/1984 a 31/05/1985, 02/01/1986 a 31/08/1989, 01/09/1989 a 11/06/1991 e 01/06/2002 a 11/01/2017.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 02/12/2019, cujo dispositivo tem o seguinte teor (ev. 65):
Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a:
a) averbar em favor da parte autora o vínculo empregatício mantido no período de 02/01/1986 a 31/08/1989 como tempo de contribuição e para fins carência, vedada a contagem concomitante do período em que esteve filiado como segurado autônomo;
b) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência, prevista na LC 142/2013, com DIB em 04/07/2017 (DER);
c) pagar em favor da parte autora as prestações vencidas, a contar da DIB, acrescidas de correção monetária a partir do vencimento de cada prestação e de juros de mora, a contar da citação, nos termos da fundamentação da sentença.
O INSS apelou, alegando que a visão monocular, por si só, não enseja a concessão de aposentadoria à pessoa com deficiência prevista na LC nº 142/2013.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Aposentadoria da pessoa com deficiência
O benefício em questão é previsto no § 1º do artigo 201 da Constituição Federal. Acerca deste dispõe a Lei Complementar nº 142/2013:
"Art. 2º Para o reconhecimento do direito à aposentadoria de que trata esta Lei Complementar, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Art. 3º É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou
IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
Parágrafo único. Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar.
Art. 4º A avaliação da deficiência será médica e funcional, nos termos do Regulamento.
Art. 5º O grau de deficiência será atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim.
Art. 6º A contagem de tempo de contribuição na condição de segurado com deficiência será objeto de comprovação, exclusivamente, na forma desta Lei Complementar.
§ 1º A existência de deficiência anterior à data da vigência desta Lei Complementar deverá ser certificada, inclusive quanto ao seu grau, por ocasião da primeira avaliação, sendo obrigatória a fixação da data provável do início da deficiência.
§ 2º A comprovação de tempo de contribuição na condição de segurado com deficiência em período anterior à entrada em vigor desta Lei Complementar não será admitida por meio de prova exclusivamente testemunhal.
Art. 7º Se o segurado, após a filiação ao RGPS, tornar-se pessoa com deficiência, ou tiver seu grau de deficiência alterado, os parâmetros mencionados no art. 3o serão proporcionalmente ajustados, considerando-se o número de anos em que o segurado exerceu atividade laboral sem deficiência e com deficiência, observado o grau de deficiência correspondente, nos termos do regulamento a que se refere o parágrafo único do art. 3º desta Lei Complementar".
Referida lei complementar estabeleceu, ainda, que regulamento do Poder Executivo definiria o que é deficiência grave, moderada e leve (art. 3º, parágrafo único), bem como que a avaliação da deficiência deveria ser médica e funcional (art. 4º).
O Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 8.145/2013, regulamentou a mencionada lei complementar e estabeleceu que a perícia deveria ser realizada nos termos de ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União (Decreto 3.048/99, art. 70-D). Esse ato conjunto de que trata o artigo 70-D do Decreto nº 3.048/99 foi editado por meio da Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP nº 01, de 27/01/2014, a qual aprovou o instrumento destinado à avaliação do segurado da Previdência Social e à identificação dos graus de deficiência.
Assim, estabeleceu-se que o grau de deficiência deveria ser atestado por perícia do INSS, mediante avaliação funcional realizada com base no conceito de funcionalidade disposto na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF, da Organização Mundial de Saúde, e mediante aplicação do Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria - IFBrA (parágrafo primeiro do artigo 2º).
De acordo com a Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP nº 01, de 27.01.2014, o critério para a classificação da deficiência em grave, moderada e leve é:
(i) deficiência grave quando a pontuação for menor ou igual a 5.739;
(ii) deficiência moderada quando a pontuação total for maior ou igual a 5.740 e menor ou igual a 6.354;
(iii) deficiência leve quando a pontuação total for maior ou igual a 6.355 e menor ou igual a 7.584.
(iv) pontuação insuficiente para concessão do benefício quando a pontuação for maior ou igual a 7.585.
Assim, se na soma da pontuação dos laudos da perícia médica e do serviço social o segurado obtiver pontuação menor ou igual a 7.584, terá direito ao benefício com tempo de contribuição reduzido. Caso contrário, não será possível aplicar a Lei Complementar 142/2013.
No caso dos autos, diverge-se acerca da designação de visão monocular como deficiência e, a partir de tal caracterização, da graduação de tal deficiência (grave, moderada, leve).
Para elucidar a questão relativa ao grau de deficiência, foi determinada a realização de perícia médica judicial, oportunidade em que se constatou que o autor apresenta visão monocular (CID H54.4) desde os 12 anos de idade, decorrente de processo traumático. Concluiu o perito que, dentro dos parâmetros apontados pela LC 142/2013, a deficiência do autor é considerada leve (evento 29, LAUDOPERIC1).
O INSS, nas razões recursais, insurge-se, justamente, acerca do ponto.
Sem razão, contudo.
Valho-me de voto proferido acerca do reconhecimento da condição de deficiente ao portador de visão monocular para o fim de concessão de aposentadoria prevista no § 1º do artigo 201 da Constituição Federal na Apelação Cível TRF4 Nº 5059181-72.2017.4.04.9999/SC, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Desembargador Federal Jorge Antonio Maurique, em 02/02/2018, cujo excerto passo a transcrever:
(...)
Em consulta ao texto da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - "CIF", supra sublinhada (disponível em http://www.inr.pt/uploads/docs/cif/CIF_port_%202004.pdf), colhem-se os seguintes dados que referem a visão monocular de proximidade e profundidade como componentes das funções da visão (Capítulo 2, pag. 61), verbis:
b210 Funções da visão
funções sensoriais relacionadas com a percepção da presença de luz e a forma, tamanho, formato e cor do estímulo visual
Inclui: funções da acuidade visual; funções do campo visual; qualidade da visão; funções relacionadas com a percepção da luz e cor, acuidade visual da visão ao longe e ao perto, visão monocular e binocular; qualidade da imagem visual; deficiências, tais como, miopia, hipermetropia, astigmatismo, hemianopsia, cegueira para as cores, visão em túnel, escotoma central e periférico, diplopia, cegueira nocturna e adaptabilidade à luz
(...)
b2100 Funções da acuidade visual
funções visuais que permitem sentir a forma e o contorno, tanto binocular como monocular, para a visão ao longe e ao perto
b21001 Acuidade monocular da visão ao longe
funções visuais que permitem sentir o tamanho, a forma e o contorno de objectos distantes do olho utilizando apenas o olho direito ou o esquerdo
b21003 Acuidade monocular da visão ao perto
funções visuais que permitem sentir o tamanho, a forma e o contorno de objectos próximos o olho, utilizando apenas o olho direito ou o esquerdo
A dinâmica da aposentadoria especial do deficiente prevista na referida lei complementar, especificamente no art. 2º, revela a adoção do modelo biopsicossocial para verificação da deficiência bem como de seus níveis. O decreto regulamentador, acima reproduzido, conferiu ao INSS a atribuição de aferir a deficiência, por meio da "perícia biopsicossocial", recurso utilizado para determinar a viabilidade do benefício.
Diante da dificuldade da concretização de direitos sociais, de natureza prestacional, e sobretudo em se tratando das complexidade e das críticas opostas ao instrumento de avaliação aplicado pelo INSS (perícia biopsicossocial), é de grande importância o papel do Poder Judiciário para efetivação do direito à aposentadoria especial dos deficientes, conforme se colhe da lição doutrinária (MAUSS, Adriano; COSTA, José Ricardo Caetano. Aposentadoria especial dos deficientes. Aspectos legais, processuais e administrativos. São Paulo: Ltr. 2015. p. 27-29 e 162):
Por se tratar de uma Constituição programática, principiológica, procedimental e comunitária, como bem frisou Gisele Cittadino, para a concretização e efetivação dos direitos sociais que dela promanam é necessária a intervenção, cooperação de todos os Poderes da República: (...) justamente por demonstrarem que a postura proativa e criadora do Poder Judiciário pode forjar a regulamentação dos direitos sociais lançados na Carta Maior vigente (...). A redução em cinco anos para homens e mulheres, similar aos benefícios por idade concedidos aos trabalhadores rurícolas, reconhece o esforço maior que fazem os deficientes na consecução de seus misteres. É uma espécie de compensação, via redução do tempo etário, pelo esforço e esmero dos deficientes para superar as barreiras e os obstáculos que lhes são impostos.
(...)
Por certo que somente a dinâmica da Previdência Social, enquanto política pública, bem como o Poder Judiciário Federal, especialmente através dos Juizados Especiais Federais, poderão apontar se os preceitos constantes na LC 142/13 serão ou não cumpridos.
Não se pode perder de vista que se está diante de direito, a toda evidência, de estatura constitucional (art. 201, § 1º, da Constituição), assim como o é a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, pacto internacional aprovado segundo o rito do art. 5º, § 3, da Constituição, equivalente, portanto, às emendas constitucionais. Deste último, extraio os seguintes dispositivos:
Artigo 1
Propósito
O propósito da presente Convenção é promover, proteger e assegurar o exercício pleno e eqüitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente.
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.
Artigo 28
Padrão de vida e proteção social adequados
(...)
2. Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à proteção social e ao exercício desse direito sem discriminação baseada na deficiência, e tomarão as medidas apropriadas para salvaguardar e promover a realização desse direito, tais como:
(...)
e) Assegurar igual acesso de pessoas com deficiência a programas e benefícios de aposentadoria.
O Estado brasileiro deu fiel comprimento à obrigação assumida no âmbito internacional, assim como o legislador complementar, ao editar a LC 142, honrou a promessa do Poder Constituinte ao prever regras diferenciadas para a aposentadoria da pessoa com deficiência.
A pretensão do recorrente diz respeito à aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência (incisos I, II e III do art. 3º da lei, enquanto inciso IV do mesmo dispositivo prevê a aposentadoria por idade).
Examinando o recente tratamento jurisprudencial desta Corte conferido ao portador de visão monocular, é possível constatar, uma distinção na abordagem dessa moléstia, de acordo com a natureza do direito (administrativo, previdenciário, tributário etc.), consoante se depreende das seguintes ementas:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO RETIDO. CANDIDATO PORTADOR DE DEFIFICIÊNCIA. CONCURSO PÚBLICO. VISÃO MONOCULAR. A alegação de superveniente perda do objeto em razão da nomeação do agravante é absolutamente desprovida de fundamento. O candidato com visão monocular, embora não se enquadre nas hipóteses de deficiência visual previstas no Decreto nº 3.298/99 ou no Decreto nº 5.296/04, deve ser considerado como portador de deficiência física para fins de disputa de vagas reservadas em concurso público, nos termos do art. 5º, § 2º, da Lei nº 8.112/90. Súmula 377 do STJ. Em que pese a boa fé do co-réu, último nomeado na ordem de classificação, tenho que o requerido não detém direito adquirido à nomeação. O ato administrativo que tornou a nomeação do referido co-réu sem efeito foi orientado estritamente pela determinação judicial deste juízo, em sede de liminar, que teve por objetivo resguardar o direito à nomeação da parte autora. (TRF4, AC 5000710-30.2014.404.7134, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 20/10/2016)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO. ART. 6º, XIV, DA LEI 7.713/1988. CEGUEIRA. VISÃO MONOCULAR. 1. A lei não distingue, para efeitos da isenção, quais espécies de cegueira estariam beneficiadas ou se a patologia teria que comprometer toda a visão, não cabendo ao intérprete fazê-lo. Logo, portador de visão monocular tem direito à isenção do imposto de renda. 2. No caso em tela, há elementos suficientes nos autos no sentido do cumprimento dos requisitos para o gozo da isenção por parte do agravante. 3. Quanto ao perigo de dano, entendo que, considerada a situação no caso concreto, maior lesão e de mais difícil reparação seria negar ao contribuinte o gozo de benefício fiscal, com base meramente em critério de ordem formal. (TRF4, AG 5022010-42.2016.404.0000, PRIMEIRA TURMA, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 18/08/2016)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE. SEGURADO ESPECIAL. VISÃO MONOCULAR. INCAPACIDADE PARCIAL. REINSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CRITÉRIO ECONÔMICO. VULNERABILIDADE SOCIAL NÃO COMPROVADA. Para a concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade é necessário o preenchimento dos requisitos de qualidade de segurado e incapacidade, enquanto para os benefícios assistenciais, além da incapacidade, também se faz necessária a presença da situação de risco social. Sendo o demandante portador de visão monocular, a qual não incapacita para as atividades rurículas, conforme entendimento da 3ª Sessão desta Corte, improcedem os pedidos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Havendo condições de reinserção no mercado de trabalho, dada a pouca idade do requerente, não é devido o benefício assistencial. Se o cenário probatório não comprova as alegações do interessado quanto à sua condição socioeconômica de vulnerabilidade e desamparo, não há como considerar configurado pressuposto essencial à concessão do benefício assistencial. (TRF4, AC 0002474-77.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 13/05/2016)
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. RENDA FAMILIAR. ART. 20, §3º, DA LEI 8.742/93. RELATIVIZAÇÃO DO CRITÉRIO ECONÔMICO OBJETIVO. STJ E STF. PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DO LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. VISÃO MONOCULAR. TRABALHADOR RURAL. FLEXIBILIZAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TUTELA ESPECÍFICA. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1.(...). 4. Importante destacar que a visão monocular afeta a visão de profundidade, tornando-se imprescindível analisar o caso concreto, ou seja, se as limitações decorrentes da patologia comprometem ou não o desempenho das atividades usuais do autor. No caso em apreço, o requerente trabalhava com instrumentos cortantes na atividade rural (corte de pinus), o que, consabidamente, envolve riscos à integridade física, exigindo boa visão para assegurar que o labor seja realizado com segurança, razão pela qual resta reconhecida a incapacidade. 5. Declarada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, os juros moratórios devem ser equivalentes aos índices de juros aplicáveis à caderneta de poupança (STJ, REsp 1.270.439/PR, 1ª Seção, Relator Ministro Castro Meira, 26/06/2013). No que tange à correção monetária, permanece a aplicação da TR, como estabelecido naquela lei e demais índices oficiais consagrados pela jurisprudência. 6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. (TRF4, AC 0019412-50.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator LUIZ ANTONIO BONAT, D.E. 07/04/2016)
Note-se que é pacífica a jurisprudência, inclusive no âmbito do STJ (Súmula 377), no sentido de enquadrar o portador de visão monocular como pessoa com deficiência para efeito de reserva de vaga em concurso público.
Na seara tributária, o entendimento firmado foi o de abranger a cegueira monocular no benefício de isenção do IRPF, seguindo-se a máxima interpretativa, retratada no brocardo ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus (onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo).
Quanto aos precedentes de matéria previdenciária citados, convém ressaltar que, embora a visão monocular não seja entendida, via de regra, como moléstia incapacitante, para fins de obtenção de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou benefício assistencial, é possível afirmar que há incapacidade do segurado, conforme peculiaridades do caso concreto.
Na hipótese em tela, não se trata de benefício por incapacidade, destinado a atender o risco social doença, mas sim de aposentadoria mediante preenchimento de critérios diferenciados para a pessoa com deficiência.
Em vista disso, entende-se existente a condição de deficiência quando se examina a visão monocular, sob a perspectiva do benefício postulado no presente feito. No que tange ao tratamento jurisprudencial da matéria, a resistência se dá na concessão de benefícios por incapacidade ou assistencial, de caráter mais restritivo, porquanto a moléstia em questão não priva o segurado de continuar a exercer seu trabalho, via de regra. Distinta é a finalidade da aposentadoria por idade da pessoa com deficiência, pois essa modalidade, comparada aos benefícios por incapacidade, não interrompe extraordinariamente atividade laboral do trabalhador sadio em razão de um sinistro; põe fim, isso sim, ao curso natural da vida laboral do segurado que contribuiu longamente com o sistema securitário.
Considerando que o legislador elaborou uma gradação de rigor nos critérios de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com a intensidade da deficiência (leve, moderada e grave, conforme incisos I, II e III do art. 3º da lei de regência), ao mesmo tempo em que estabeleceu uma modalidade de aposentação por idade, independentemente do grau de deficiência (inciso IV do mesmo dispositivo), penso que a condição do portador de visão monocular revela, ao menos, uma deficiência do tipo "leve". Não há dúvidas de que aquele que é cego de um olho possui algum grau de deficiência.
Assim, com a finalidade de manter a coerência argumentativa, à vista dos precedentes mencionados, penso ser razoável a concessão de aposentadoria, ao portador de visão monocular, de acordo com o critério diferenciado do art. 3º, III, da LC 142/13.
Por fim, deduzo que a solução atende ao método de interpretação constitucional que recomenda máxima efetividade aos direitos fundamentais, positivado no art. 5º, §§ 3º e 4º, c/c art. 6º, caput, ambos da Lei Maior, com vistas à realização de sua função social. Além de conferir maior eficácia social ao segurado, tal conclusão elimina o risco de criar-se seja uma distinção injusta entre outras modalidades de deficiência de grau leve a serem ulteriormente reconhecidas pelo próprio INSS, ou o de deixar os portadores de cegueira monocular relegados à vala comum dos aposentados por idade que gozam da plenitude da capacidade visual, sem qualquer critério diferenciador.
Nessa linha, colaciono julgado que trata acerca do portador de visão monocular para fins de concessão de aposentadoria à pessoa com deficiência regida pela Lei Complementar 142/2003, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. REQUISITOS E CRITÉRIOS DIFERENCIADOS. ARTS. 6º E 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO. ARTS. 2º E 3º DA LC 142/2003. GRAUS DE DEFICIÊNCIA. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR. 1. A Constituição Federal previu, a partir da Emenda Constitucional nº 47, a concessão de aposentadoria aos segurados do Regime Geral da Previdência Social que sejam portadores de deficiência, mediante adoção de requisitos e critérios diferenciados, consoante seu art. 201, § 1º, regulado, no plano infraconstitucional, pela Lei Complementar 142/2003. 2. A jurisprudência, inclusive no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 377), enquadra o portador de visão monocular como pessoa com deficiência para efeito de reserva de vaga em concurso público. 3. No âmbito previdenciário, é razoável a concessão de aposentadoria, ao portador de visão monocular, de acordo com o critério diferenciado do art. 3º, III, da LC 142/2003. Precedente. (TRF4, AC 5024241-57.2017.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 07/02/2020)
No caso concreto, restam atendidos, portanto, os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa portadora de deficiência, quais sejam: (a) condição de deficiente (possuir impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas) e (b) tempo mínimo de contribuição de acordo com o sexo e o grau de deficiência (grave, moderada ou leve) ou (c) possuir 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
Assim, mantenho a sentença de procedência.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios de sucumbência são devidos pelo INSS, em regra, no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).
Improvido o apelo, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre o montante das parcelas vencidas, considerando as variáveis do art. 85, § 2º, I a IV, e § 11, do Código de Processo Civil, e o entendimento desta Turma em casos símeis:
PREVIDENCIÁRIO. (...) CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. (...) 6. Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região. Confirmada a sentença, majora-se a verba honorária, elevando-a para 15% sobre o montante das parcelas vencidas, consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (...) (TRF4, AC 5004859-05.2017.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, j. 27.02.2019)
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação: improvida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001765075v12 e do código CRC c70c6bed.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 29/7/2020, às 14:56:42
Conferência de autenticidade emitida em 06/08/2020 18:55:46.
Apelação Cível Nº 5004621-95.2018.4.04.7009/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LUIZ CARLOS LEITE (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. REQUISITOS E CRITÉRIOS DIFERENCIADOS. ARTS. 6º E 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO. ARTS. 2º E 3º DA LC 142/2003. GRAUS DE DEFICIÊNCIA. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR.
1. A Constituição Federal previu, a partir da Emenda Constitucional nº 47, a concessão de aposentadoria aos segurados do Regime Geral da Previdência Social que sejam portadores de deficiência, mediante adoção de requisitos e critérios diferenciados, consoante seu art. 201, § 1º, regulado, no plano infraconstitucional, pela Lei Complementar 142/2003.
2. A jurisprudência, inclusive no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 377), enquadra o portador de visão monocular como pessoa com deficiência para efeito de reserva de vaga em concurso público.
3. No âmbito previdenciário, é razoável a concessão de aposentadoria, ao portador de visão monocular, de acordo com o critério diferenciado do art. 3º, III, da LC 142/2003.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de julho de 2020.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001765076v3 e do código CRC 7248d1f3.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 29/7/2020, às 14:56:42
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 21/07/2020 A 28/07/2020
Apelação Cível Nº 5004621-95.2018.4.04.7009/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LUIZ CARLOS LEITE (AUTOR)
ADVOGADO: AURORA LÍLIA COMEL BUSATO (OAB PR016804)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 21/07/2020, às 00:00, a 28/07/2020, às 16:00, na sequência 1658, disponibilizada no DE de 10/07/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Conferência de autenticidade emitida em 06/08/2020 18:55:46.