Apelação Cível Nº 5004240-68.2020.4.04.7122/RS
RELATOR: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
APELANTE: JOSE LEANDRO NEVES CALPES (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença com o seguinte dispositivo (
):Ante o exposto, extingo o feito, sem julgamento do mérito, em face do disposto no art. 485, VI, do CPC, pela existência de falta de interesse de agir no(s) período(s) de 28/07/2003 a 20/01/2020, e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido postulado na inicial, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I do CPC, para determinar ao INSS que reconheça e averbe a especialidade do(s) período(s) de 01/03/1989 a 22/03/1996, convertendo-o(s) pelo fator 0,4 em tempo comum, para fins previdenciários.
Condeno as partes, na proporção de 60% do ônus para o(a) autor(a), por sua sucumbência majoritária (decaiu no pedido de concesssão da aposentadoria, seja especial ou por tempo de contribuição, e no pedido de danos morais), e 40% de ônus para o INSS, ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§2º e 4º, III, do CPC, sendo vedada a sua compensação nos termos do §14, parte final, desse mesmo artigo de lei.
A parte autora deverá suportar 60% do valor das custas judiciais, cuja exigibilidade, juntamente com os honorários advocatícios, resta suspensa haja vista a concessão da gratuidade de justiça (art. 98, §3º, CPC).
Demanda isenta de custas em relação ao INSS (art. 4º, incisos I e II, da Lei nº. 9.289/96).
Alega, o autor, em razões de recurso (
), que a exigência de prévio requerimento administrativo não se confunde com o exaurimento da via administrativa. Requer seja reconhecido o interesse do postulante quanto ao período de: 28/07/2003 a 20/01/2020 ou, sucessivamente, requer sejam considerados os laudos juntados aos autos ( , , ) para análise da especialidade do trabalho exercido na empresa Sopal - Sociedade de Ônibus Porto Alegrense. No mérito, afirma não ser possível a obtenção de formulários e laudo da empresa Combustíveis Butiá Ltda. quanto ao período de 05/03/1987 a 28/02/1989, tendo em vista que a empresa encerrou suas atividades. Discorre acerca do dano moral que alega ter sofrido em razão da negativa administrativa do benefício. Assevera não ser possível a sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios, visto que a sucumbência foi mínima. Afirma que a verba honorária deve ser majorada para 20% do valor da condenação. Requer a imediata implantação do benefício e a fixação de multa em caso de descumprimento da decisão judicial.Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos remetidos a este Regional.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Ausência de interesse processual
A sentença extinguiu o feito sem resolução de mérito, com fulcro no artigo 485, inciso VI, do CPC, no que se refere à especialidade do trabalho exercido de 28/07/2003 a 20/01/2020, nos termos seguintes:
Compulsando os autos constata-se que a parte autora, por ocasião do pedido administrativo (NB 196.740.228-8), não apresentou à Autarquia ré quaisquer documentos para fins de reconhecimento de atividade especial na(s) empresa(s) SOPAL - Sociedade de Ônibus Porto Alegrense Ltda. (de 28/07/2003 a 20/01/2020). Saliento que não se trata de reconhecimento da especialidade por categoria profissional, necessitando a comprovação da exposição a agentes nocivos.
Nesta linha, o e. Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n.º 631240, que trata do prévio requerimento administrativo para a concessão/revisão de benefício previdenciário assim decidiu:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.
(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014 - grifamos)
O caso em tela, conquanto tenha havido contestação, ainda que genérica, não pode se amoldar ao item 6, "ii", uma vez que a ação foi ajuizada em 13/07/2020, não entrando na regra de transição prevista no julgado.
Assim, tendo em vista que a parte autora não apresentou os formulários indispensáveis à análise da especialidade do período perante o INSS, não restou caracterizado o interesse de agir, porquanto à míngua de qualquer obstáculo imposto pela ré, não se aperfeiçoa a lide, razão pela qual é de ser extinto o feito sem julgamento do mérito por carência de ação.
Conforme o decidido pelo STF, está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico, para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, de modo que entendo pela manutenção da sentença de extinção do feito sem resolução do mérito quanto ao pedido de reconhecimento de tempo especial de 28/07/2003 a 20/01/2020, por ausência de prévio requerimento.
Atividade Especial
A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE 174.150-3/RJ, Rel. Min. Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:
a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento a determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo do trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula 198 do extinto TFR).
b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, "Para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções,v.g., periculosidade)" (TRF4, EINF 0010314-72.2009.404.7200, 3ª Seção, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei 8.213/91, art. 58, §1º) (TRF4, AC 2002.71.07.001611-3, 5ª Turma, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).
d) Em relação aos agentes nocivos físicos ruído, frio e calor, é necessária a apresentação de laudo técnico independentemente do período de prestação da atividade, dada a necessidade de medição da intensidade desses agentes nocivos. De qualquer modo, a partir de 01/01/2004, é suficiente a apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, elaborado conforme as exigências legais (TRF4, EINF 0010314-72.2009.404.7200, 3ª Seção, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
e) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
f) O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C).
g) Quanto aos efeitos da utilização de equipamento de proteção individual, "Se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Todavia, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJ 12/02/2015). Deve-se observar, contudo, que a adoção de EPI não deve ser considerada para fins de caracterização da atividade especial em tempo anterior a 03/12/1998, visto que esta exigência apenas foi disposta pela MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98 (IN INSS/PRES 77/2015, art. 279, §6º).
h) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no R Esp 1310034/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei 9.032/95.
i) Cabe destacar, no que tange aos agentes químicos constantes no anexo 13 da NR-15, que os riscos ocupacionais gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes. (APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010; EINF 5000295-67.2010.404.7108, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, 04/02/2015).
j) A habitualidade e a permanência para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser interpretadas no sentido de que tal exposição deve ser ínsita à prestação do serviço desempenhado pelo segurado, acontecendo em período razoável da sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual. Caso se admitisse o contrário, chegar-se-ia ao extremo de entender que nenhum trabalho faria jus àquela adjetivação.
k) Segundo a jurisprudência dominante deste Tribunal, a exposição a agentes biológicos não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que basta a existência de algum contato para que haja risco de contração de doenças (EIAC nº 1999.04.01.021460-0, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ de 05-10-2005). Note-se que a utilização de EPI, ainda que atenue, não elide a nocividade dos agentes biológicos.
Atividade de Frentista
A atividade de frentista não está prevista nos Anexos aos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 como categoria profissional. Já o Anexo 2 da NR-16 da Portaria 3.214/1978, do Ministério do Trabalho, esclarece que a atividade de "operação em postos de serviço e bombas de abastecimento de inflamáveis líquidos" é caracterizada como perigosa.
Havia controvérsia sobre o reconhecimento da especialidade das atividades tidas como perigosas exercidas após 06/03/1997, data de início da vigência do Decreto 2.172/1997. Porém, o STJ assim decidiu, no Tema 1.031 quanto à possibilidade de enquadramento da atividade de vigilante como perigosa:
5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração, pois o novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes considerados nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-somente, aqueles classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto qualquer referência a atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento de que está excluída da legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade. Essa conclusão, porém, seria a negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar na crença – nunca confirmada – de que as regras escritas podem mudar o mundo e as vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os acidentes, podem ser controlados pelos enunciados normativos.
6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso, o direito à aposentadoria especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua saúde ou a sua integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, § 1o. e 202, II da Constituição Federal. A interpretação da Lei Previdenciária não pode fugir dessas diretrizes constitucionais, sob pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele tem de específico, próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos e a garantia jurídica dos bens da vida digna, como inalienáveis Direitos Fundamentais.
7. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem os agentes perigosos não significa que eles – os agentes perigosos – tenham sido banidos das relações de trabalho, da vida laboral ou que a sua eficácia agressiva da saúde do Trabalhador tenha sido eliminada. Também não se pode intuir que não seja mais possível o reconhecimento judicial da especialidade da atividade, já que todo o ordenamento jurídico-constitucional, hierarquicamente superior, traz a garantia de proteção à integridade física e à saúde do Trabalhador. (grifos do original)
Portanto, resta superada a questão referente à possibilidade de reconhecimento da periculosidade como fator de enquadramento da atividade como tempo especial. No caso específico da exposição a inflamáveis, a periculosidade encontra-se prevista no art. 193 da CLT, com redação dada pela Lei 12.740/2012.
Ressalte-se que não se trata de equiparação a categoria profissional e, embora possa parecer lógico, pelo ramo de atividade da empresa de vínculo, que o cargo de frentista redunde na presunção do labor em área perigosa, não é o formulário dispensável, carecendo de interesse processual o segurado que pleitear seu enquadramento com base exclusivamente na anotação da CTPS.
Havendo comprovação do exercício de atividade laboral em posto de combustíveis, essencialmente no abastecimento de veículos, por meio da apresentação de PPP que descreva o local do trabalho e as atribuições do cargo, é possível o enquadramento como tempo especial.
Caso concreto
O autor requer o reconhecimento da especialidade do período de 05/03/1987 a 28/02/1989, tendo juntado apenas cópia da CTPS (
fl. 04). Segundo anotação na CTPS, o autor exerceu o cargo de auxiliar em posto de combustíveis. O autor requer o reconhecimento da especialidade do período, alegando ter laborado como frentista neste interregno. No entanto, não há outros documentos que comprovem o exercício da função de frentista.Nesse compasso, considerando a alegação do autor no sentido de que a empresa está desativada, a fim de comprovar o desempenho das funções de frentista de posto de combustíveis, o autor foi intimado (
) para apresentar declarações de eventuais testemunhas em vídeo, acompanhadas de documentos de identificação com foto, ou, em caso de impossibilidade, declarações escritas e devidamente assinadas. Ainda, deverão ser apresentadas CTPS das testemunhas, comprovando vínculo com a empresa em período concomitante ao trabalhado pelo autor. Porém, o requerente juntou declaração de apenas uma testemunha que laborou com o autor em período posterior ao lapso temporal que pretende, o segurado, o reconhecimento da especialidade.Assim, aplica-se a tese firmada no Tema 629 do STJ, no sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem julgamento do mérito e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários, no que concerne ao período de 05/03/1987 a 28/02/1989.
Reformada, portanto, a sentença.
Danos Morais:
A seguir transcrevo fundamentação da sentença proferida, nos autos, pela MM. Juíza Federal Substituta Fábia Souza Presser:
II.3.3 - Danos morais
O mero indeferimento do benefício na via administrativa, mesmo que esse ocorra de forma indevida, por si só, não gera a responsabilização civil do Estado pelo alegado dano moral.
Existe um espaço próprio do decidir administrativo dentro do qual a possibilidade do indeferimento é via admissível de ser adotada, em prazo razoável. Aliás, é da própria essência do procedimento administrativo a existência de um momento decisório, em que, analisados fatos e direito, acolhe-se, ou não, o pleito apresentado pelo administrado.
Em outras palavras, se houver possibilidade de decisão, existindo, portanto, opções, é esperado da Administração, do ponto de vista procedimental, que faça a escolha que entenda a adequada diante do princípio da legalidade. Se há, portanto, normativamente, a possibilidade de a Administração indeferir determinado pedido, o mero exercício desse poder-dever não deve ser tido como uma conduta geradora de dano moral.
Nesse contexto, não pode a resposta negativa dada pela Administração a determinado pedido ser compreendida como hábil a gerar dano moral, pois, em si, tal resposta é juridicamente possível, sendo intrínseca à dinâmica do procedimento administrativo.
Nessa linha, confiram-se os seguintes precedentes do TRF4:
EMENTA: APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL INCABÍVEL. 1. Reconhecido judicialmente tempo de serviço, procede o pedido de seu cômputo e de revisão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, com o consequente recebimento das prestações vencidas. 2. Incabível indenização por dano moral em razão da não revisão de benefício previdenciário, pois não possui o ato administrativo, de regra, o condão de provocar danos morais ao segurado (TRF4, APELREEX 5000332-03.2010.404.7009, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, D.E. 01/08/2013).(grifei)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DATA DE INÍCIO NO INÍCIO DA INCAPACIDADE FIXADO NO LAUDO PREFACIAL. 1. Havendo indicação precisa no laudo pericial da data de início da incapacidade - DII, esta será a data de início do benefício de aposentadoria por invalidez, no caso de incapacidade total e permanente. 2. Nas lides previdenciárias, o pensamento predominante tem entendido que o mero indeferimento do benefício postulado administrativamente, por si só, não gera dano moral indenizável, ainda que o ato administrativo venha a ser declarado ilícito em sede de controle jurisdicional, considerando-se que tal abalo não se mostra desarrazoado, vexatório ou constrangedor (TRF4, AC 5001594-66.2011.404.7004, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Paulo Paim da Silva, D.E. 20/06/2013).
Ainda, cumpre observar que meros incômodos ou aborrecimentos não são o bastante para ensejar à ocorrência de dano moral, o qual demanda, para sua configuração, a existência de fato dotado de gravidade capaz de gerar abalo profundo, ofensa a algum dos atributos da personalidade, e não apenas o mero dissabor decorrente de intercorrências do cotidiano. Assim, a ação da Autarquia ré não atingiu bens imateriais juridicamente protegidos. Na ausência de demonstração de consequências que tenham ultrapassado o ordinário inerente ao exercício da atividade-fim da Autarquia ré, não cabe a imposição de indenização por danos morais.
Por essas razões, rejeito o pedido de indenização formulado pelo(a) demandante.
A Decisão deve ser mantida, visto que o mero indeferimento do pedido administrativo não tem o condão de causar danos morais ao segurado.
Honorários advocatícios:
Considerando a sucumbência em maior monta por parte do autor, mantidos os ônus sucumbenciais conforme fixados na sentença.
Majoração recursal:
No tocante à majoração da verba honorária, a teor do disposto no §11 do art. 85 do CPC/2015, a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF assim decidiu:
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso, não preenchidos os requisitos acima elencados, não é devida a majoração de que trata o §11 do art. 85 do CPC/2015.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
Reformada a sentença, apenas para extinguir, sem resolução de mérito, o pedido relativo à especialidade do período: de 05/03/1987 a 28/02/1989.
No demais tópicos, mantida a sentença.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5004240-68.2020.4.04.7122/RS
RELATOR: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
APELANTE: JOSE LEANDRO NEVES CALPES (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
Aposentadoria especial. ausência de interesse processual. indispensabilidade do prévio requerimento administrativo. Tema 629 do STJ. indeferimento do pedido pela Administração. danos morais.
1. Está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário.
2. Segundo a tese firmada no Tema 629 do STJ, a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação.
3. O mero indeferimento do benefício na via administrativa, mesmo que esse ocorra de forma indevida, por si só, não gera a responsabilização civil do Estado pelo alegado dano moral, tal resposta é juridicamente possível, sendo intrínseca à dinâmica do procedimento administrativo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 18 de abril de 2023.
Documento eletrônico assinado por MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003835443v4 e do código CRC abfe17f1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Data e Hora: 18/4/2023, às 20:40:46
Conferência de autenticidade emitida em 25/04/2023 04:01:21.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 11/04/2023 A 18/04/2023
Apelação Cível Nº 5004240-68.2020.4.04.7122/RS
RELATOR: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: JOSE LEANDRO NEVES CALPES (AUTOR)
ADVOGADO(A): ROSARIA DE FATIMA DA SILVA BARCELLOS (OAB RS040459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/04/2023, às 00:00, a 18/04/2023, às 16:00, na sequência 26, disponibilizada no DE de 28/03/2023.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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