APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002134-94.2014.4.04.7009/PR
RELATOR | : | Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JORGE LUIZ XAVIER |
ADVOGADO | : | FABIANO LUIZ DE OLIVEIRA |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. FONTE DE CUSTEIO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
1. Diante da impossibilidade de quantificação do direito controvertido, a sentença não se sujeita à remessa necessária.
2. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de motorista de caminhão, em decorrência do enquadramento por categoria profissional.
3. O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática dos recursos representativos de controvérsia - art. 543-C, CPC/1973).
4. A exposição a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI e de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos.
5. É inadequado aferir-se a existência do direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
6. Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e não estando a decisão sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - Terceira Seção), o julgado deverá ser cumprido de pronto quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 30 (trinta) dias úteis.
7. A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de 4-2006 (Lei n.º 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213/91), conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018. Aplicáveis os juros de mora, de a) 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29-6-2009; b) a partir de 30-6-2009, de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, consoante decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018. .
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora, e, de ofício, determinar a adequação dos consectários legais e a implementação do benefício no prazo de trinta dias, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de maio de 2018.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9394207v10 e, se solicitado, do código CRC 96E95C2B. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002134-94.2014.4.04.7009/PR
RELATOR | : | Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JORGE LUIZ XAVIER |
ADVOGADO | : | FABIANO LUIZ DE OLIVEIRA |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Cuida-se de remessa oficial e de apelações interpostas da sentença assim proferida:
Em face ao exposto, rejeito a preliminar de incompetência e, no mérito, julgo procedente, com resolução de mérito, na forma do contido no art. 269, I, do CPC, o pedido de reconhecimento da índole especial das atividades desempenhadas nos períodos de 27/01/1987 a 31/03/1988, 01/04/1988 a 30/09/1988, 01/10/1988 a 31/07/1999 e de 01/08/1999 a 19/09/2008, para fins de aposentadoria.
Por outro lado, julgo improcedente, com resolução de mérito, o pedido de reconhecimento da condição especial das atividades desempenhadas entre 20/09/2008 e 17/10/2013 e, consequentemente, o pedido de concessão de benefício previdenciário de aposentadoria especial e respectivo pagamento de prestações atrasadas, juros e correção monetária.
Considerando a sucumbência recíproca, deixo de condenar as partes em honorários de sucumbência, nos termos do art. 21 do CPC.
Sem custas em razão do autor ser beneficiário da assistência judiciária e o INSS estar isento do pagamento de custas processuais quando demandando na Justiça Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).
Sentença sujeita a reexame necessário.
O autor apela, requerendo o enquadramento também por agentes químicos, embora não mencionado no PPP. Aduz que não houve mudança significativa no layout da empresa que justifique a redução drástica no nível de ruído. Refere que mesmo no período posterior à data do PPP continuou a exercer atividades especiais, como indicam os holerites e CNIS. Requer o reconhecimento como especial dos interregnos de 27/01/1987 a 31/03/1988, 01/04/1988 a 30/09/1988, 01/10/1988 a 31/07/1999, 01/08/1999 a 19/09/2008 e de 20/09/2008 a 17/10/2013 em razão da sujeição do autor ao agente ruído e agentes químicos.
O INSS recorre, postulando a reforma da sentença. No que diz respeito ao tempo de serviço especial, alega que não há documentos que comprovem o exercício de atividades sujeitas a condições prejudiciais à saúde ou integridade física da parte autora, inclusive pelo uso de EPI. Refere que não há fonte de custeio.
No evento 5, foi convertido o feito em diligência para realização de pericia judicial. Após, regularmente processados, subiram novamente os autos a este Tribunal.
É o relatório. Peço dia.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9394205v7 e, se solicitado, do código CRC 207D1BE8. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002134-94.2014.4.04.7009/PR
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APELANTE | : | JORGE LUIZ XAVIER |
ADVOGADO | : | FABIANO LUIZ DE OLIVEIRA |
APELADO | : | OS MESMOS |
VOTO
Não conhecimento da remessa necessária
Segundo o disposto no art. 475, § 2º, do antigo CPC, em vigor na época da prolação da sentença, não se aplica o reexame necessário, quando a condenação ou o direito controvertido for de valor certo, não excedente a sessenta salários mínimos.
Diante da controvérsia quanto à aplicação do § 2º do art. 475 do CPC, no caso em que a sentença proferida é ilíquida, o STJ editou a Súmula nº 490, in verbis: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas" (Corte Especial, julgado em 28/06/2012, DJe 01/08/2012).
No caso dos autos, embora a sentença tenha determinado obrigação de fazer ao INSS, o conteúdo é nitidamente declaratório e insuscetível de apuração em liquidação de sentença. Diante da impossibilidade de quantificação do direito controvertido, não conheço da remessa necessária.
Tempo de serviço especial - requisitos para reconhecimento
De início, ressalto que o reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18/11/2009; APELREEX 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 30/3/2010; APELREEX 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/3/2010; APELREEX 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 25/1/2010).
Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário inicialmente definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual a que se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;
b) a partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
É com fulcro nessas balizas, portanto, que se deve aferir a especialidade da atividade desempenhada pela parte autora.
Ruído
Como visto, em se tratando do agente nocivo ruído, o reconhecimento da especialidade do labor exige, em qualquer período, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Ou seja, não basta, aqui, mesmo no período anterior a 28/04/1995, o enquadramento por categoria profissional, sendo exigida prova da exposição ao agente nocivo.
É de se atentar, outrossim, às sucessivas alterações da legislação, que modificaram o limite mínimo de pressão sonora apta a configurar a insalubridade do ruído. Em resumo, tem-se o seguinte quadro: a) até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n. 53.831/64, tendo em vista que, até aquela data, são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nº 53.831/64, nº 72.771/73 e nº 83.080/79; b) de 06/03/1997 a 18/11/2003, exige-se a exposição a ruídos superiores a 90 decibéis (Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99, este na redação original); c) a partir de 19/11/2003, basta a exposição a ruídos superiores a 85 decibéis, conforme a alteração trazida pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, ao Decreto nº 3.048/99. Trata-se de entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento de recurso especial repetitivo (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Cumpre perquirir, também, sobre a possibilidade de o uso de EPI eficaz afastar a nocividade provocada pelo ruído, descaracterizando, assim, a especialidade desse tempo de serviço.
Primeiramente, note-se que a utilização de equipamentos de proteção individual só passou a ter relevância, para fins de reconhecimento das atividades exercidas em condições especiais, a partir da MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Trata-se, aliás, de entendimento sedimentado pelo próprio INSS na esfera administrativa (IN nº 45/2010, art. 238, § 6º).
No período posterior à MP nº 1.729/98, embora esteja assentada a relevância do uso do EPI para reconhecimento da especialidade do labor, subsiste acentuada controvérsia sobre a prova necessária para atestar a sua eficácia. Sobre o tema, inclusive, pende de julgamento, nesta Corte, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), no qual se discute "se a comprovação da eficácia do EPI, e consequente neutralização dos agentes nocivos, deve ser demonstrada somente pelo PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) ou requer dilação probatória pericial, especialmente a descrição do tipo de equipamento utilizado, intensidade de proteção proporcionada ao trabalhador, treinamento, uso efetivo do equipamento e a fiscalização pelo empregador" (Tema nº 15). Note-se que a admissão do incidente implicou a suspensão "dos processos já sentenciados ou já remetidos a este Tribunal Regional Federal ou às Turmas Recursais."
No caso, todavia, não é necessário perquirir acerca da prova da eficácia do EPI, de modo que não se cogita da suspensão acima aventada. É que, em se tratando do agente nocivo ruído, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano. Com efeito, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Por essa razão, o STF, no julgamento do ARE nº 664335 (tema reconhecido com repercussão geral sob o número 555), assentou a tese segundo a qual, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria."
Não destoa desse entendimento a jurisprudência sedimentada por esta Corte Regional, senão vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Comprovado o tempo de serviço urbano, por meio de prova material idônea, devem os períodos urbanos ser averbados previdenciariamente. 2. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados. 3. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 4. A exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. 5. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. Possível afastar o enquadramento da atividade especial somente quando comprovada a efetiva utilização de equipamentos de proteção individual que elidam a insalubridade. 6. Se o segurado implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional n.º 20/98, pelas Regras de Transição e/ou pelas Regras Permanentes, poderá inativar-se pela opção que lhe for mais vantajosa. 7. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5007203-21.2016.404.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 20/09/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. PINTORES DE PISTOLA. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. AGENTES QUÍMICOS - QUANTIDADE DE EXPOSIÇÃO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS. PERÍCIA EM DATA POSTERIOR AO LABOR. EPI. FONTE DE CUSTEIO. REQUISITOS IMPLEMENTADOS - DIREITO À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL. EXIGÊNCIA DE AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. ART. 57, §8º, DA LEI N. 8.213/91. INCONSTITUCIONALIDADE.CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.CUSTAS. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. (...) 10. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. Em se tratando de ruído nem mesmo a comprovação de que a utilização de protetores reduzia a intensidade do som a níveis inferiores aos máximos deve afastar o reconhecimento da especialidade da atividade, pois já comprovado que a exposição por períodos prolongados produz danos em decorrência das vibrações transmitidas, que não são eliminadas pelo uso do equipamento de proteção. 11. (...) (TRF4, AC 0015614-47.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 22/09/2017)
Tendo isso em vista, passo a examinar os períodos controversos.
Do caso concreto
O INSS impugnou a sentença, com relação aos períodos de atividade especial a seguir descritos:
- 27/01/1987 a 31/03/1988,
- 01/04/1988 a 30/09/1988,
- 01/10/1988 a 31/07/1999,
- 01/08/1999 a 19/09/2008.
Reporto-me, no particular, à sentença recorrida, que bem identificou os vínculos empregatícios do autor e as funções por ele desempenhadas, in verbis:
(...)
a) de 27/01/1987 a 31/03/1988
Trata-se de período em que o autor, no desempenho da função de Operador de Lavagem e Depuração, junto ao setor Celulose Sulfato Batch-Polpa, tinha como atribuições operar o sistema de lavagem de polpa do processo contínuo, através de comando de painel e observação de indicadores e registradores, controlando, corrigindo e regulando o funcionamento de moinhos desintegradores, refinadores, filtros lavradores, tanques depósito de licor e polpa lavada.
Quanto aos fatores de risco a que estava exposto no período, o formulário cita, com base em laudo técnico contemporâneo, a existência de ruído aferido em intensidade de 88 a 90 dB(A).
Anexo à inicial também foi apresentado laudo técnico da empresa, datado de 06/09/1995 (extemporâneo, portanto), que cita a existência de ruído de 97,9 dB(A) para a função (evento 1 - LAU9).
Apesar da aparente divergência entre a informação contida no formulário com o laudo extemporâneo, fato é que ambos indicam condições de trabalho consideradas prejudiciais à saúde do trabalhador, já que acima do limite de tolerância que, à época, era 80 dB(A).
Dessa forma, reconheço a natureza especial das atividades desempenhadas pela parte autora no período de 27/01/1987 a 31/03/1988, para fins de aposentadoria.
b) de 01/04/1988 a 30/09/1988
Neste período o autor exerceu a função de Operador de Celulose, quando estava lotado no setor Celulose Sulfato Esco, sendo que as atribuições de seu cargo consistiam em auxiliar nas operações do digestor Esco e do sistema de lavagem, inspecionando o funcionamento das válvulas, motores, redutores, sistema depurador de água de selagem, filtros lavadores, transportadores de cavaco e rosca abastecedora do digestor.
Segundo o formulário PPP, o fator de risco existente era apenas o ruído, aferido em intensidade de 90 a 92 dB (A), fazendo referência à laudo contemporâneo, conforme descrito no campo 16.
Embora não tenha sido apresentado o laudo técnico contemporâneo, percebe-se que o laudo de 06/09/1995 indica ruído de 99,9 dB(A) para a mesma função (evento1 - LAU9), o que somente vem a reforçar a conclusão de que o autor esteve exposto a ruídos acima do limite de tolerância no desempenho da referida função, o que implica em dizer que faz jus ao reconhecimento da condição especial da atividade desempenhada entre 01/04/1988 e 30/09/1988.
c) de 01/10/1988 a 31/07/1999
Trata-se de período em que o autor, no exercício da função de Operador Assistente Digestor SPCD, junto ao setor Celulose Sulfato Esco, tendo como atribuições controlar a produção de celulose, através de SPCD; auxiliar nas operações do digestor, coletando amostras de cavaco, de massas e de lixívia para análise; acompanhar a polpa na descarga do digestor quando em alteração de produção, verificando o funcionamento dos equipamentos; inspecionar os deletores de metais, fazendo manobras na área; verificar o nível de óleo dos refinadores, água de selagem, limpando medidor de alcali, separador de areia e separador de materiais pesados.
Segundo o conteúdo do formulário, o autor esteve exposto a ruídos de 90 a 92 dB(A) entre 01/10/1988 e 05/09/1995 e de 102 dB(A) de 06/09/1995 a 31/07/1999.
Levando-se em conta que o formulário foi emitido com base em laudos técnicos, devidamente indicados em campo próprio, tenho como possível o acolhimento de suas informações, que indicam que o autor, no desempenho de suas atividades, esteve exposto a ruídos acima dos limites de tolerância, observada a alteração ocorrida em 05/03/1997, conforme fundamentação.
Conclui-se, portanto, que o autor faz jus ao reconhecimento da condição especial das atividades desempenhadas no período de 01/10/1988 a 31/07/1999, para fins de aposentadoria.
d) entre 01/08/1999 e 18/05/2012
No último período descrito no formulário o autor desempenhou a função de Operador III DC2, no setor Celulose Kamyr, quando suas atribuições consistiam em controlar a produção de celulose, através de SDCD, acompanhando todas as fazes do processo produtivo, determinando as intervenções e as dosagens de químicos, utilidades, insumos e outras matérias-primas utilizadas no processo visando garantir a quantidade e a qualidade do produto; acompanhar e orientar as atividades realizadas pelos Operadores II e I da área; detectar avarias nos equipamentos de comando de controle de produção, observando o funcionamento e resposta ao acionamento nos teclados e contatando manutenção, evitando desvios no objetivo de produção quanto a quantidade e qualidade, garantindo disponibilidade dos equipamentos; preencher boletim de controle de produção, coletando dados e lançando no manual logger (PI), disponibilizando informações sobre o produto;realizar teste visual do produto, recebendo amostra do mesmo, coletado pelo operador de área, observando, analisando e interpretando a aparência do produto e certificar se o perfil do produto está coerente com as informações recebidas através dos monitores; controlar os impactos ambientais significativos, através de dados disponíveis nos monitores e resultados de testes laboratoriais, produzindo sem gerar impactos significativos ao meio ambiente; fazer as requisições de serviço, conforme check list de inspeção de equipamentos, consultando os serviços levantados no check list, aumentando a disponibilidade dos equipamentos; responsável pela liberação de PT (Permissão de Trabalho) para realização de trabalhos nas áreas; realizar registros nos livros de não conformidades, identificando-as no processo através do SDCD, atendendo ao sistema de qualidade e tomar ações necessárias; acompanhar a qualidade do produto, através da análise dos resultados de testes realizados no laboratório avaliando o andamento do processo; conduzir reuniões de gestão diária e DDSs conforme escala dos operadores determinada pela área.
Vê-se, desde logo, que as atribuições do cargo eram bastante diversificadas, havendo bastante variação nos níveis de ruído aferidos pela prova técnica, indicados no formulário com a seguinte individualização:
* de 01/08/1999 a 27/12/2000 - 102 dB;
* de 28/12/2000 a 29/11/2004 - 96 dB;
* de 30/11/2004 a 19/09/2008 - 89 dB;
* de 20/09/2008 a 28/02/2012 - 85 dB;
* a partir de 29/02/2012 - 76 dB.
A parte autora afirma que não há informação no formulário que justifique a drástica redução nos níveis de ruído a partir de 20/09/2008, defendendo a posição no sentido de ser considerados os níveis de ruído conforme laudos apresentados e formulário PPP referente a outro funcionário da mesma empresa (evento 1 - FORM13), que apresentam informações destoantes com as do formulário do autor.
Afirmou, ainda, que na emissão do formulário o responsável pelo preenchimento omitiu informações sobre a exposição a fatores de risco de natureza química, próprias da atividade.
Analisando-se o formulário PPP referente ao segurado Marco Antonio de Souza, de fato exerceu a mesma função que o autor (Operador III DC2), no mesmo setor (Celulose Kamyr), tendo as mesmas atribuições e em período coincidente (01/01/2001 a 10/05/2012). Para aquele segurado, o formulário indicou ruído de 96 dB(A) no período de 01/01/2001 a 29/11/2004, 89 dB(A) de 30/11/2004 a 19/09/2008 e de 85 dB(A) a partir de 20/09/2008.
Diante dessas divergências, determinou-se a expedição de ofício à empresa empregadora para que prestasse os esclarecimentos necessários ao seguro julgamento do presente processo (evento 16).
Em resposta (evento 19 - INF2), a empresa esclareceu as circunstâncias que justificaram o preenchimento do formulário do autor nos seguintes termos:
Em resposta ao Ofício 8373669 AUTOR : Jorge Luiz Xavier, esclarecemos que houveram mudanças significativas de 01/08/1999 a 18/05/2012 quanto a função do autor que passou de Operador de Assistente de Digestor para Operador III de DC2 e no Layout da área/ sala de controle (sala nova com isolamento acústico) devido a Ampliação da Fábrica- Projeto MA-1100 o que justifica a divergência dos níveis de Ruído para a função Operador III de DC2 (as funções exercidas por ele eram realizadas a distância SDCD- Sistema Digital de Sistema a Distância), eventualmente o autor realiza Inspeções em áreas em acompanhamento de processos, em decorrência disso há exposição a agentes químicaos com relação à atividade de Operador III - DC2, de forma eventual. A empresa fornece todos os EPIs específicos para a função, a fim de afastar as consequências da exposição a tais agentes agressivos, conforme descrição de cargo já citada no PPP.
Verifica-se, portanto, que a redução nos níveis de ruído decorre de alteração de estrutura do setor de trabalho, que passou a contar com sala dotada de isolamento acústico e equipamentos que permitiam o acompanhamento das atividades à distância. Além do mais, apesar de demonstrar a exposição a agentes de natureza química, esclarece que havia fornecimento e utilização de equipamentos de proteção individual capazes de neutralizar os efeitos nocivos da exposição, além de se tratar de exposição eventual.
Conclui-se, portanto, que os níveis de ruído a que o segurado esteve exposto superavam os limites de tolerância apenas de 01/08/1999 a 19/09/2008, que deverá ter sua natureza especial reconhecida para fins de aposentadoria.
e) de 19/05/2012 a 17/10/2013
Conforme se verifica da documentação que instrui os presentes autos, e como já sinalizado anteriormente, não há qualquer demonstração que a partir de 19/05/2012 o autor tenha permanecido nas mesmas atividades e sob as mesmas condições ambientais de trabalho.
Ademais, acolhendo-se tal afirmação, melhor sorte não socorre ao autor, posto que a prova técnica demonstra que a exposição a fatores de risco de natureza química da última atividade (Operador III DC2) era meramente eventual e tinha sua potencialidade lesiva eliminada pela utilização de EPIs e que o nível de ruído a que estava exposto (76 dB) não atingia o limite de tolerância vigente no período (85 dB).
Assim, não merece juízo de procedência a pretensão deduzida na inicial quanto a este período.
2.2.2. Da Aposentadoria Especial
Para o deferimento do benefício requerido pela parte autora (Aposentadoria Especial), deve o segurado contar com 25 anos de atividade qualificada como especial, ou, a depender do caso, 15 ou 20 anos.
No caso presente os períodos reconhecidos como de atividade especial em favor do autor são na modalidade que exigem 25 anos de tempo de serviço especial, segundo a regulamentação aplicável.
Administrativamente nenhum período laborativo do autor teve a condição especial reconhecida.
Assim, somando-se os períodos considerados como de atividade especial na presente sentença 27/01/1987 a 31/03/1988, 01/04/1988 a 30/09/1988, 01/10/1988 a 31/07/1999 e de 01/08/1999 a 19/09/2008, tem-se que o autor totaliza, até a data do requerimento administrativo, 21 anos, 7 meses e 25 dias, insuficientes ao deferimento do benefício de aposentadoria especial.
Os argumentos trazidos pelo INSS em suas razões de apelação devem ser rejeitados. Conforme amplamente fundamentado na transcrição acima, há suficiente prova documental a comprovar o exercício de atividades sujeitas a condições prejudiciais à saúde ou integridade física da parte autora. Com relação a utilização de EPI, no que diz respeito ao agente nocivo ruído, a tese defendida pela parte ré, em suas razões de apelação contraria frontalmente o entendimento manifestado no já destacado julgamento, pelo STF do ARE nº 664335 (Tema reconhecido com repercussão geral sob o número 555). Cumpre reforçar que não é necessário perquirir acerca da prova da eficácia do EPI, de modo que não se cogita da suspensão acima aventada. É que, em se tratando do agente nocivo ruído, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano. Tampouco se diga haver violação ao princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º). Isso porque a aposentadoria especial é prevista na própria Constituição Federal, de modo que a sua concessão independe da identificação da fonte de custeio, a qual, não obstante, consta no § 6º do art. 57 da Lei nº 8.213/91. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO DA RMI. POSSIBILIDADE. Constando dos autos a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço deve ser computado, juntamente com os períodos de labor urbano reconhecidos pelo INSS, para fins de revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Direito adquirido do autor à concessão do melhor benefício (RE nº 630.501/RS, Relatora Ministra Ellen Gracie, Plenário, DJE 26/08/2013). Havendo divergência entre o formulário PPP e a perícia judicial, impõe-se, com fundamento no princípio da precaução, acolher a conclusão da asserção mais protetiva da saúde do trabalhador, no caso a do formulário PPP. Nos termos do § 3º do art. 68 do Decreto 3.048/99, o formulário PPP é o documento exigido pela legislação previdenciária como meio de prova do exercício de atividades nocivas, sendo que, a partir de 01/01/2004, sua apresentação dispensa o laudo pericial para comprovação das condições nocivas de trabalho, porquanto deve ser emitido com base em "laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho", consoante preceitua o § 1º do art. 58 da LB. Precedentes da 3ª Seção desta Corte. O uso de equipamentos de proteção individual - EPI, no caso de exposição a ruído, ainda que reduza os níveis do agente físico a patamares inferiores aos previstos na legislação previdenciária, não descaracteriza a especialidade do labor. Entendimento em consonância com o julgamento pelo STF do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) nº 664.335, com repercussão geral reconhecida (Tema nº 555). É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora. Inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). O direito do trabalhador à proteção de sua saúde no ambiente do trabalho emana da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio constitucional da precedência do custeio. Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, no RESP nº 1.310.034/PR, representativo de controvérsia, consagrou que, após a Lei nº 9.032/95, somente se admite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço em condições especiais. Inviável, assim, diante dessa nova orientação jurisprudencial, a conversão do tempo de serviço comum em especial. (TRF4 5010402-28.2014.4.04.7207, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 14/11/2017)
Conforme se depreende das razões de apelação da parte autora, evento 31, a sentença foi impugnada, quanto ao não reconhecimento do seguinte período de tempo especial:
- 27/01/1987 a 31/03/1988;
- 01/04/1988 a 30/09/1988;
- 01/10/1988 a 31/07/1999;
- 01/08/1999 a 19/09/2008;
- 20/09/2008 a 17/10/2013.
Com relação aos períodos de 27/01/1987 a 31/03/1988; 01/04/1988 a 30/09/1988; 01/10/1988 a 31/07/1999 e 01/08/1999 a 19/09/2008, reputa-se ausência de interesse recursal, pois já houve reconhecimento da atividade especial nesses interregnos, na sentença recorrida. Com relação ao período de 20/09/2008 a 17/10/2013, foi determinada a baixa dos autos, em diligência, para produção de prova pericial judicial. O laudo técnico da perícia judicial realizada em 20/02/2017, na empresa Klabin S/A, localizada na Fazenda Monte Alegre s/n, Harmonia, no Município de Telêmaco Borba - PR (evento 68) indica exposição ao agente nocivo ruído, conforme se depreende da resposta aos quesitos a seguir transcrita:
(...)
b) O autor esteve exposto a agentes agressivos à saúde ou à integridade física, em nível acima do limite de tolerância, no exercício de todas as suas funções?
R: Sim, o Autor esteve exposto a agentes agressivos a sua integridade física no exercício de todas as suas funções.
d) Qual o nível equivalente de ruído? Como foi apurado?
As informações quanto a esse quesito devem estar embasadas em avaliação medida pelo próprio perito na empresa.
R: O nível de exposição (nível médio) segundo a NR -15 foi de 94,9 dB e conforme a Norma NHO-01 o nível equivalente foi de 99,0 dB. (...)
e) Ao responder o item anterior, especificar o nível de ruído em dB (A) a que o autor esteve exposto em cada uma das funções que desempenhou.
b) O autor esteve exposto a agentes agressivos à saúde ou à integridade física, em nível acima do limite de tolerância, no exercício de todas as suas funções?
o Autor esteve exposto a agentes agressivos a sua integridade física no exercício de todas as suas funções.
Destaco que a prova da especialidade pode ser aceita, mesmo que os laudos técnicos sejam extemporâneos aos períodos laborais mais longínquos. Sobre este aspecto, cumpre registrar que a avaliação do ambiente de trabalho e dos agentes nocivos não fica prejudicada, presumindo-se que a insalubridade hoje não seja maior do que em períodos remotos.
Diante de tais considerações, deve ser reconhecida a especialidade do interregno entre 20/09/2008 a 17/10/2013.
Tendo em vista que a especialidade já foi reconhecida em virtude da exposição a ruído, reputo prejudicada a alegação de exposição a agentes químicos, deixando, por conseguinte, de examiná-la.
Aposentadoria Especial
A contagem do tempo de atividade especial segue a tabela a seguir:
- 27/01/1987 a 31/03/1988: 1 ano, 02 meses e 05 dias;
- 01/04/1988 a 30/09/1988: 06 meses;
- 01/10/1988 a 31/07/1999: 10 anos, 10 meses e 01 dia;
- 01/08/1999 a 19/09/2008: 09 anos, 01 mês e 19 dias;
- 20/09/2008 a 17/10/2013: 05 anos e 28 dias.
Total: 26 anos, 08 meses e 23 dias.
Dirimida a questão acerca da comprovação do tempo de serviço controvertido, cabe a análise do direito à aposentadoria pretendida.
Para fazer jus à Aposentadoria Especial deve a parte autora preencher os requisitos previstos no art. 57 da Lei 8213/91, quais sejam, a carência de 180 contribuições, ressalvado o direito de incidência da tabela do art. 142 da referida lei àqueles segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24.07.1991 e o tempo de trabalho sujeito a condições prejudiciais à sua saúde ou à sua integridade física durante 15, 20 ou 25 anos, portanto, descabe a conversão de tempo de serviço especial em comum.
A carência foi devidamente cumprida e quanto ao tempo de contribuição, somando-se os períodos especiais reconhecidos na sentença, que não foram objeto de recurso (10 anos, 08 meses e 05 dias) com o tempo especial ora admitido (15 anos, 05 meses e 17 dias), a parte autora demonstra ter trabalhado em atividades especiais por 26 anos, 08 meses e 23 dias, o que lhe garante o direito à Aposentadoria Especial, a contar da data do requerimento administrativo, em 20-05-14 (DIB), sem a incidência do fator previdenciário, conforme determina o art. 29, II, da Lei 8.213/91.
Continuidade da Atividade Especial
A Corte Especial deste Tribunal (Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade n.º 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 24.05.2012) decidiu pela inconstitucionalidade do § 8.º do art. 57 da Lei de Benefícios, (a) por afronta ao princípio constitucional que garante o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5.º, XIII, da Constituição Federal de 1988; (b) porque a proibição de trabalho perigoso ou insalubre existente no art. 7.º, XXXIII, da Constituição Federal de 1988, só se destina aos menores de dezoito anos, não havendo vedação ao segurado aposentado; e (c) porque o art. 201, § 1.º, da Carta Magna de 1988, não estabelece qualquer condição ou restrição ao gozo da aposentadoria especial, assegurada, portanto, à parte autora a possibilidade de continuar exercendo atividades laborais sujeitas a condições nocivas após a implantação do benefício.
Ressalta-se que não se desconhece que a questão relativa à possibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde teve a repercussão geral reconhecida pelo STF no julgamento do RE 788.092/SC, posteriormente substituído pelo RE 791.961/PR (Tema 709). Não se desconhece, também, das razões proferidas pelo ilustre relator, Min. Dias Toffoli, no despacho que reconheceu a existência da repercussão geral da matéria, no sentido da constitucionalidade da regra insculpida no § 8.º do art. 57 da Lei 8.213/1991. Entretanto, pelos fundamentos acima declinados, mantenho a decisão da Corte Especial deste Regional até que haja o pronunciamento definitivo pela Suprema Corte.
Considerando a decisão do STF proferida em Questão de Ordem no RE 966.177/RS, em que essa Corte entendeu que a suspensão do processamento prevista no artigo 1.035, § 5º, do CPC/2015 não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral, mas sim ato discricionário do relator do recurso extraordinário paradigma, e considerando que não houve, até o presente momento, decisão nesse sentido por parte do relator do recurso paradigma da matéria discutida nos presentes autos, não é o caso de suspensão da tramitação deste feito.
Assim, cumpridas as exigências do artigo 57 da Lei n.º 8.213/91, deve o INSS conceder o benefício ora pretendido à parte autora, independente do afastamento do trabalho.
Juros moratórios e correção monetária
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de 4-2006 (Lei n.º 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213/91), conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018.
Juros moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29-6-2009;
b) a partir de 30-6-2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, consoante decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018."
Tutela específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado. Para tanto, fixo o prazo de 30 dias úteis.
Conclusão
Destarte, cumpre negar provimento ao recurso de apelação do INSS, mantendo-se os períodos de atividade especial já reconhecidos na sentença, dar parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora, para também reconhecer a atividade especial desempenhada entre 20/09/2008 e 17/10/2013, e, de ofício, adequar os consectários legais e determinar a implantação da tutela específica, nos termos da fundamentação. No que diz respeito à implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, deve ser mantida a sentença, por seus próprios fundamentos, tendo em vista que a parte autora implementou os requisitos para tal.
Ante o exposto, voto no sentido de não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora, e, de ofício, determinar a adequação dos consectários legais e a implementação do benefício no prazo de trinta dias.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/05/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002134-94.2014.4.04.7009/PR
ORIGEM: PR 50021349420144047009
RELATOR | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JORGE LUIZ XAVIER |
ADVOGADO | : | FABIANO LUIZ DE OLIVEIRA |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/05/2018, na seqüência 814, disponibilizada no DE de 14/05/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A ADEQUAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS E A IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO NO PRAZO DE TRINTA DIAS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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