Teste grátis agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TRF4. 5011292-22.2018.4.04.7208...

Data da publicação: 30/04/2021, 11:01:11

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. 1. A falta de previsão legal para o autônomo recolher um valor correspondente à aposentadoria especial não pode obstar-lhe o reconhecimento da especialidade, o que se constituiria em ato discriminatório, se ele exerceu a atividade sujeita a agentes nocivos previstos na legislação de regência. 2. Embora o segurado contribuinte individual que exerce atividade nociva figure como o único responsável pelo resguardo de sua integridade física, recaindo sobre ele o ônus de se preservar dos efeitos deletérios do trabalho, mediante efetivo emprego de EPIs, a aplicação de cremes de proteção para mãos não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes químicos agressivos à saúde, pois são equipamentos destinados apenas à proteção das mãos e dos braços, promovendo exclusivamente a proteção cutânea, enquanto o contato com hidrocarbonetos aromáticos acarreta danos ao organismo que extrapolam as patologias cutâneas. Idêntico raciocínio se aplica aos óculos de proteção e ao guarda-pó. 3. Tendo em conta o recente julgamento do Tema nº 709 pelo STF, reconhecendo a constitucionalidade da regra inserta no § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, o beneficiário da aposentadoria especial não pode continuar no exercício da atividade nociva ou a ela retornar, seja esta atividade aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. Implantado o benefício, seja na via administrativa, seja na judicial, o retorno voluntário ao trabalho nocivo ou a sua continuidade implicará na sua imediata suspensão. (TRF4, AC 5011292-22.2018.4.04.7208, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/04/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5011292-22.2018.4.04.7208/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: JULIANO GRACZCKI (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta contra sentença, publicada em 29/05/2019, proferida nos seguintes termos (evento 27):

Ante o exposto, rejeito os pedidos da parte autora, extinguindo o feito com apreciação do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados estes em 10 % sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º do CPC), ficando suspensa a exigibilidade por força da gratuidade de justiça concedida.

Em suas razões recursais, a parte autora requer a reforma do decisum, para que seja reconhecida a nocividade nos períodos de 01.07.1988 a 01.03.1990, 01.03.1990 a 31.10.1996, 01.07.1997 a 30.11.1998, 01.04.2000 a 31.12.2000, 01.07.2001 a 30.06.2002 e 01.04.2003 a 14.11.2016, com a consequente concessão da aposentadoria especial, a contar da DER (evento 33).

Com contrarrazões (evento 36), foram os autos remetidos a esta Corte para julgamento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Prescrição quinquenal

Em se tratando de benefício previdenciário de prestação continuada, a prescrição não atinge o fundo de direito, mas somente os créditos relativos às parcelas vencidas há mais de 5 (cinco) anos, contados da data do ajuizamento da ação, consoante a iterativa jurisprudência dos Tribunais. A prescrição quinquenal das prestações vencidas não reclamadas, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, historicamente sempre vigorou em ordenamento jurídico próprio, estando prevista atualmente no art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91. Dito isso, tendo a parte autora ajuizado a presente demanda em 29/09/2018 inexistem parcelas prescritas, porque não transcorrido um lustro entre as datas de entrada do requerimento administrativo (14/11/2016) e de propositura da ação.

Tempo especial de contribuinte individual

A falta de previsão legal para o autônomo recolher um valor correspondente à aposentadoria especial não pode obstar-lhe o reconhecimento da especialidade, o que se constituiria em ato discriminatório, se ele exerceu a atividade enquadrável como especial.

De fato, é assente na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a orientação de que o artigo 57 da Lei 8.213/91 não traça qualquer diferenciação entre as diversas categorias de segurados, permitindo o reconhecimento da especialidade da atividade laboral exercida pelo segurado contribuinte individual. O artigo 64 do Decreto 3.048/99 ao limitar a concessão do benefício aposentadoria especial e, por conseguinte, o reconhecimento do tempo de serviço especial, ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual cooperado, extrapola os limites da Lei de Benefícios que se propôs a regulamentar, razão pela qual deve ser reconhecida sua ilegalidade. Destarte, é possível o reconhecimento de tempo de serviço especial ao segurado contribuinte individual não cooperado, desde que comprovado, nos termos da lei vigente no momento da prestação do serviço, que a atividade foi exercida sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou sua integridade física” (AgRg no Resp 1.540.164, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 27/10/2015).

No mesmo sentido, as decisões proferidas pelo STJ no julgamento do REsp 1.436.794, do AgRg no Resp 1.422.313, AgRg no REsp 1.535.538 e AgRg no Resp 1.555.054.

Realmente, quanto ao reconhecimento de tempo especial na condição de contribuinte individual, esclareço que a Lei n. 8.213/91, ao mencionar a aposentadoria especial no artigo 18, inciso I, alínea “d”, como um dos benefícios devidos aos segurados, não faz nenhuma diferença entre as categorias de segurados. A dificuldade do contribuinte individual de comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física não justifica negar a possibilidade de reconhecimento de atividade especial” (STJ, Resp nº 1.585.009/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/03/2016).

Com efeito, nunca houve na legislação sobre a matéria vedação envolvendo o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas pelos contribuintes individuais (antigos autônomos), e assim tratamento normativo nesse sentido implicaria afronta injustificável ao princípio da isonomia, considerando que o fato gerador do benefício em tela sempre foi o exercício de labor em condições insalubres, penosas ou perigosas, desde a redação original do art. 31 da Lei nº 3.807/60 (atualmente, o art. 57 da Lei nº 8.213/91 utiliza a expressão condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física).

A Turma Nacional de Uniformização, no julgamento do PEDILEF nº 2008.71.95.002186-9, ocorrido em 29/03/2012 (DOU 27/04/2012), aliás, firmou a seguinte tese jurídica, consolidada com a edição da Súmula nº 62: O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física.

O fundamento da Súmula é idêntico ao adotado pelo STJ, segundo se infere do assentado pela TNU no julgamento do PEDILEF nº 2009.71.95.001907-7 (DOU 09/03/2012): Ao contribuinte individual é reconhecido o direito à aposentadoria especial, eis que não há na Lei n. 8.213/91 vedação à concessão do referido benefício a essa categoria de segurados. Atos administrativos do INSS não podem estabelecer restrições que não são previstas na legislação de regência.

Não há falar em afronta ao art. 195, § 5º, da Constituição Federal, ao argumento de que a Lei nº 9.732/98 criou contribuição para financiar a aposentadoria especial e que a contribuição só incide sobre as remunerações pagas ou creditadas aos segurados empregados e trabalhadores avulsos, não alcançando os segurados contribuintes individuais.

Sobre a questão, a Turma Nacional de Uniformização, no julgamento do PEDILEF nº 2008.71.95.002186-9, concluiu que a falta de previsão legal de contribuição adicional para aposentadoria especial (alíquota suplementar de riscos ambientais do trabalho) sobre salário de contribuição de segurado contribuinte individual não impede o reconhecimento de tempo de serviço especial. Do contrário, não seria possível reconhecer condição especial de trabalho para nenhuma categoria de segurado antes da Lei n. 9.732/98, que criou a contribuição adicional.

Dessa forma, a TNU considerou que já existia previsão de fonte de custeio de aposentadoria especial para todas as categorias de segurado desde antes da Lei n. 9.732/1998 e que a superveniência da criação de fonte de custeio adicional e específica não eliminaria a anterior fonte de custeio. Dessa forma, admitida a hipótese de que antes da Lei n. 9.732 não havia fonte de custeio para a aposentadoria especial, não teria sido possível conceder esse benefício para qualquer categoria de segurado antes da vigência da referida lei.

Nesse sentido, para evitar tautologia, adoto os fundamentos de excerto de voto do Relator Desembargador Federal Celso Kipper (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000024-65.2009.404.7210/SC, DE 31-10-2012):

De outra banda, é verdade que, a teor do art. 195, § 5º, da Constituição Federal, nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

No entanto, para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n. 8.212/91, os quais possuem o seguinte teor:

Art. 57 - (...) § 6º - O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inc. II do art. 22 da Lei 8.212, de 24/07/91, cujas alíquotas serão acrescidas de 12, 9 ou 6 pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição, respectivamente.

Art. 22 - (...) II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:

a) 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

b) 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

c) 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.

Ademais, não vejo óbice ao fato de a lei indicar como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal, dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.

Por fim, ressalto que, a rigor, sequer haveria, no caso, necessidade de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC n. 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE n. 220.742-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 03-03-1998; RE n. 170.574, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31-05-1994; AI n. 614.268 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20-11-2007; ADI n. 352-6, Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30-10-1997; RE n. 215.401-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 26-08-1997; AI n. 553.993, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28-09-2005), regra esta dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.

Diante dessas considerações, havendo prova do efetivo exercício de atividades em condições nocivas à saúde do trabalhador na condição de contribuinte individual e comprovado o recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, não há óbice ao cômputo do tempo de serviço como especial.

Limites da controvérsia

A pretensão articulada nos autos visa ao cômputo de tempo especial nos intervalos de 01.07.1988 a 01.03.1990, 01.03.1990 a 31.10.1996, 01.07.1997 a 30.11.1998, 01.04.2000 a 31.12.2000, 01.07.2001 a 30.06.2002 e 01.04.2003 a 14.11.2016, bem como à concessão da aposentadoria especial ao autor.

Exame do tempo especial no caso concreto

Na espécie, estas são as condições da prestação de serviço do autor:

1) Período: 01.07.1988 a 01.03.1990

Empresa: José Graczcki ME

Função(ões)/setor(es): aprendiz técnico em refrigeração

Agentes nocivos: hidrocarbonetos aromáticos (manipulação de graxa e óleos minerais)

Enquadramento legal: código 1.2.11 do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64; código 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e Anexo nº 13 da NR nº 15 do MTE (manipulação de óleos minerais ou outras substâncias cancergínas afins; emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos como solventes ou em limpeza de peças)

Provas: formulário PPP (evento 01, PPP8)

Conclusão: possível o enquadramento do labor como nocivo, pois devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no intervalo antes indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, a agentes químicos.

Ao contrário do que entendeu o julgador, somente com o advento do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as alterações trazidas ao art. 58 da Lei nº 8.213/91 pela MP nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), é que se passou a exigir, para a comprovação do tempo de serviço prestado em condições nocivas, a apresentação de formulário-padrão elaborado com base em laudo técnico ou, então, a perícia técnica. Portanto, não se tratando dos agentes físicos ruído, frio ou calor, com relação aos quais sempre foi necessária a apresentação de laudo técnico, e tendo sido prestado o labor em período anterior a 06/03/1997, o formulário-padrão é suficiente para a prova do exercício de atividade insalubre.

É verdade que o formulário PPP não indica a responsabilidade técnica pelos registros ambientais. Há que se atentar, no entanto, para o que determina o art. 268 da Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS:

Art. 268. Quando apresentado o PPP, deverão ser observadas, quanto ao preenchimento, para fins de comprovação de enquadramento de atividade exercida em condições especiais por exposição agentes nocivos, o seguinte:

I - para atividade exercida até 13 de outubro de 1996, véspera da publicação da MP nº 1.523, de 11 de outubro de 1996, quando não se tratar de ruído, fica dispensado o preenchimento do campo referente ao responsável pelos Registros Ambientais;

II - para atividade exercida até 13 de outubro de 1996, véspera da publicação da MP nº 1.523, de 11 de outubro de 1996, fica dispensado o preenchimento dos campos referentes às informações de EPC eficaz;

III - para atividade exercida até 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 02 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, fica dispensado o preenchimento dos campos referentes às informações de EPI eficaz;

IV - para atividade exercida até 31 de dezembro de 1998, fica dispensado o preenchimento do campo código de ocorrência GFIP; e

V - por força da Resolução do Conselho Federal de Medicina - CFM nº 1.715, de -8 de janeiro de 2004, não deve ser exigido o preenchimento dos campos de Resultados de Monitoração Biológica para qualquer período.

2) Períodos: 01.03.1990 a 31.10.1996, 01.07.1997 a 30.11.1998, 01.04.2000 a 31.12.2000, 01.07.2001 a 30.06.2002 e 01.04.2003 a 14.11.2016

Empresa: Refrigeração Graczcki Ltda. EPP

Função: técnico de manutenção (a partir de 01/04/2000, na condição de contribuinte individual)

Agentes nocivos: hidrocarbonetos aromáticos (manipulação de graxa, óleos minerais e querosene)

Enquadramento legal: código 1.2.11 do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64; código 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79; códigos 1.0.7 e 1.0.19 dos Anexos IV dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 e Anexo nº 13 da NR nº 15 do MTE (manipulação de óleos minerais ou outras substâncias cancergínas afins; emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos como solventes ou em limpeza de peças)

Provas: formulário PPP, com indicação do responsável técnico pelos registros ambientais (evento 01, PPP9), e LTCAT (evento 01, LAUDO10)

Conclusão: possível o enquadramento do labor como nocivo, pois devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora nos intervalos antes indicados, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, a agentes químicos.

De fato, a TNU, no julgamento do PEDILEF nº 2009.71.95.001828-0, representativo de controvérsia (Tema nº 53), ao analisar a questão pertinente a saber se a manipulação de óleos e graxas pode, em tese, configurar condição especial de trabalho para fins previdenciários, deixou assentada a tese de que a manipulação de óleos e graxas, desde que devidamente comprovado, configura atividade especial.

Por fim, necessário referir que, à vista da orientação sedimentada na Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, É possível, mesmo após a edição do decreto n°. 2.172/97, o reconhecimento da especialidade de atividade exercida com exposição nociva a "hidrocarbonetos", desde que, no caso concreto, reste comprovada a exposição aos agentes descritos itens 1.0.3, 1.0.7 e 1.0.19 do Anexo IV do decreto n. 2.172/97, assim como Anexo IV do decreto n. 3.048/99 (benzeno e seus compostos tóxicos, carvão mineral e seus derivados e outras substâncias químicas, respectivamente). (IUJEF nº 0007944-64.2009.404.7251, Relatora Juíza Federal Luísa Hickel Gamba, D.E. 15/12/2011).

Diversamente do que restou consignado na sentença, a nocividade do labor não foi neutralizada pela utilização de EPIs. O Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015). Todavia, o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. Tal interpretação, aliás, encontra respaldo no próprio regramento administrativo do INSS, conforme se infere da leitura do art. 279, § 6º, da IN nº 77/2015.

No que diz respeito à prova da eficácia dos EPIs/EPCs, a Terceira Seção desta Corte, na sessão de julgamento realizada em 22/11/2017, nos autos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000 (Tema nº 15), decidiu por estabelecer a tese jurídica de que a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário (Relator para acórdão Des. Federal Jorge Antonio Maurique, por maioria). Restou assentada no aresto, ainda, a orientação no sentido de que a simples declaração unilateral do empregador, no Perfil Profissiográfico Previdenciário, de fornecimento de equipamentos de proteção individual, isoladamente, não tem o condão de comprovar a efetiva neutralização do agente nocivo. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório.

Na situação em apreço, não restou demonstrado que a nocividade tenha sido neutralizada pelo uso de EPI eficazes.

É verdade que o segurado contribuinte individual que exerce atividade nociva figura como o único responsável pelo resguardo de sua integridade física, recaindo sobre ele o ônus de preservar-se dos efeitos deletérios do trabalho, mediante efetiva utilização de EPIs/EPCs. Assim, o fornecimento e a utilização de EPI eficaz, capaz de elidir a exposição do segurado a fatores agressivos à sua saúde e à sua integridade física, é dever atribuído ao contribuinte individual, pela assunção do risco inerente ao desempenho de atividade econômica nociva.

Não obstante, a utilização de cremes de proteção, devidamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposto o autor. Com efeito, tais cremes são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por não ocasionarem perda de tato ou movimentação dos trabalhadores. Exatamente em decorrência de tais características, torna-se impossível ao trabalhador a avaliação do nível de proteção a que está sujeito, considerando-se o desgaste natural da camada protetora proporcionada por tais cremes em virtude do manuseio de equipamentos, ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral em análise. Torna-se, destarte, praticamente impossível a manutenção de uma camada protetiva contínua e homogênea. Assim, inviável a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, ainda que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos.

De fato, o fornecimento, e até mesmo o uso eficaz, de creme protetor de segurança e luva para proteção contra óleos minerais e graxa são equipamentos destinados tão somente à proteção das mãos e dos braços, promovendo exclusivamente a proteção cutânea. Idêntico raciocínio se aplica aos óculos de proteção e ao guarda-pó. Ocorre que a exposição do trabalhador a hidrocarbonetos aromáticos causa danos ao organismo que extrapolam as patologias cutâneas.

Realmente, em caso análogo, este Regional já deixou assentado que o simples fornecimento pelo empregador de cremes de proteção para mãos não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes químicos nocivos à saúde. (REOAC nº 0005443-36.2012.404.9999, Quinta Turma, Relator Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, D.E. 05/10/2016).

Não se pode olvidar que óleos de origem mineral são substâncias consideradas insalubres, por conterem Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos, cuja principal via de absorção é a pele, podendo causar, além de dermatites e dermatoses, câncer cutâneo, o que permite afirmar que o exercício das atividades desempenhadas pela parte autora eram sim nocivas à sua saúde. Com efeito, esta Corte já sinalizou no sentido de que o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011) - sublinhei.

Com efeito, o Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria Interministerial nº 9, de 07 de outubro de 2014, publicando a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, sendo que arrolado no Grupo 1 - Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos, encontram-se listados "óleos minerais (não tratados ou pouco tratados)".

A respeito do tema, este Regional já decidiu que A exposição do trabalhador a hidrocarbonetos causa danos ao organismo que vão além de patologias cutâneas, de modo que a utilização de EPI promove, tão somente, a proteção cutânea. Assim, afastada a neutralização do agente nocivo pela utilização de EPI. (TRF4, AC nº 5009052-15.2012.4.04.7000, Sexta Turma, Relatora Juíza Federal Bianca Georgia Cruz Arenhart, juntado aos autos em 23/10/2016).

Quanto ao agente químico, segundo o código 1.0.0 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, como regra geral, o que determina o direito ao benefício é a exposição do trabalhador ao agente nocivo presente no ambiente de trabalho e no processo produtivo, em nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos. Não obstante, conforme o art. 278, § 1º, inciso I, da IN INSS/PRES nº 77/15, mantida, neste item, pela subsequente IN nº 85/16, a avaliação continua sendo qualitativa no caso do benzeno (Anexo 13-A da NR-15) e dos agentes químicos previstos, simultaneamente, no Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 e no Anexo 13 da NR-15, como é o caso dos hidrocarbonetos aromáticos. Vejamos:

Art. 278. Para fins da análise de caracterização da atividade exercida em condições especiais por exposição à agente nocivo, consideram- se:

I - nocividade: situação combinada ou não de substâncias, energias e demais fatores de riscos reconhecidos, presentes no ambiente de trabalho, capazes de trazer ou ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador; e

II - permanência: trabalho não ocasional nem intermitente no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do contribuinte individual cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, em decorrência da subordinação jurídica a qual se submete.

§ 1º Para a apuração do disposto no inciso I do caput, há que se considerar se a avaliação de riscos e do agente nocivo é:

I - apenas qualitativo, sendo a nocividade presumida e independente de mensuração, constatada pela simples presença do agente no ambiente de trabalho, conforme constante nos Anexos 6, 13 e 14 da Norma Regulamentadora nº 15 - NR-15 do MTE, e no Anexo IV do RPS, para os agentes iodo e níquel, a qual será comprovada mediante descrição:

a) das circunstâncias de exposição ocupacional a determinado agente nocivo ou associação de agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho durante toda a jornada;

b) de todas as fontes e possibilidades de liberação dos agentes mencionados na alínea "a"; e

c) dos meios de contato ou exposição dos trabalhadores, as vias de absorção, a intensidade da exposição, a frequência e a duração do contato;

II - quantitativo, sendo a nocividade considerada pela ultrapassagem dos limites de tolerância ou doses, dispostos nos Anexos 1, 2, 3, 5, 8, 11 e 12 da NR-15 do MTE, por meio da mensuração da intensidade ou da concentração consideradas no tempo efetivo da exposição no ambiente de trabalho.

De fato, relativamente aos agentes químicos constantes no Anexo 13 da NR-15, os riscos ocupacionais gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes (APELREEX nº 2002.70.05.008838-4, Relator Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Quinta Turma, D.E. 10/05/2010; EINF nº 5000295-67.2010.404.7108, Relator p/ Acórdão Desembargador Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Terceira Seção, julgado em 11.12.2014).

Sobre a habitualidade e a permanência na sujeição aos agentes agressivos, esta Corte deixou assentada a orientação de que, Para a caracterização da especialidade, não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). A habitualidade e permanência hábeis aos fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. (TRF4 5002256-80.2014.4.04.7212, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Des. Federal Celso Kipper, juntado aos autos em 06/06/2019).

Com efeito, A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. (TRF4, AC 5015734-75.2015.4.04.7001, Sexta Turma, Relatora Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 21/06/2019).

Deve-se lembrar, ademais, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.

A Turma Nacional de Uniformização, sobre a questão altercada, já se pronunciou no sentido de que a identificação entre o conceito de permanência com integralidade da jornada, constante na redação original do regulamento da previdência – Decreto 3.048/99 ("Art. 65. Considera-se tempo de trabalho, para efeito desta Subseção, os períodos correspondentes ao exercício de atividade permanente e habitual (não ocasional nem intermitente), durante a jornada integral, em cada vínculo trabalhista, sujeito a condições especiais...") já foi abandonada pela própria Previdência Social há quase uma década, quando o Decreto 4.882/2003 deu nova redação ao dispositivo, relacionando o conceito de permanência ao caráter indissociável da exposição em relação à atividade, e não mais à integralidade da jornada (“Art. 65. Considera-se trabalho permanente, para efeito desta Subseção, aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço”). (PEDILEF nº 244-06.2010.4.04.7250/SC, Relator Juiz Federal André Carvalho Monteiro, DJ 17/05/2013, DOU 31/05/2013).

Da suposta ausência de contribuição adicional como óbice ao reconhecimento da atividade especial. A inexistência de correlação com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º)

O argumento não prospera. É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.

O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.

De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).

Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.

Conclusão quanto ao tempo de atividade especial

Possível o reconhecimento da nocividade do labor nos períodos de 01.07.1988 a 01.03.1990, 01.03.1990 a 31.10.1996, 01.07.1997 a 30.11.1998, 01.04.2000 a 31.12.2000, 01.07.2001 a 30.06.2002 e 01.04.2003 a 14.11.2016.

Do direito da parte autora à concessão do benefício

A soma do tempo especial que está sendo reconhecido no acórdão totaliza 25 anos, 01 mês e 14 dias, suficientes à concessão da aposentadoria especial, a contar da DER (14.11.2016), bem como ao recebimento das parcelas devidas desde então.

Afastamento da atividade

Este Regional, tendo em conta o julgamento do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5001401-77.2012.404.0000, de fato, vinha decidindo pela desnecessidade de afastamento do segurado da atividade que o expunha a agentes nocivos, afirmando a inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 (Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira Do Valle Pereira, Corte Especial, julgado em 24/05/2012).

Ocorre que, recentemente, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do RE nº 791.961/PR, representativo de controvérsia (Tema nº 709), em decisão assim ementada (Relator Ministro Dias Toffoli, Plenário, DJe 19/08/2020):

Direito Previdenciário e Constitucional. Constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91. Percepção do benefício de aposentadoria especial independentemente do afastamento do beneficiário das atividades laborais nocivas a sua saúde. Impossibilidade. Recurso extraordinário parcialmente provido.

1. O art. 57,§ 8º, da Lei nº 8.213/91 é constitucional, inexistindo qualquer tipo de conflito entre ele e os arts. 5º, inciso XIII; 7º, inciso XXXIII; e 201,§ 1º, da Lei Fundamental. A norma se presta, de forma razoável e proporcional, para homenagear o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os direitos à saúde, à vida, ao ambiente de trabalho equilibrado e à redução dos riscos inerentes ao trabalho.

2. É vedada a simultaneidade entre a percepção da aposentadoria especial e o exercício de atividade especial, seja essa última aquela que deu causa à aposentação precoce ou não. A concomitância entre a aposentadoria e o labor especial acarreta a suspensão do pagamento do benefício previdenciário.

3. O tema da data de início da aposentadoria especial é regulado pelo art. 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91, que, por sua vez, remete ao art. 49 do mesmo diploma normativo. O art. 57,§ 8º, da Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social cuida de assunto distinto e, inexistindo incompatibilidade absoluta entre esse dispositivo e aqueles anteriormente citados, os quais também não são inconstitucionais, não há que se falar em fixação da DIB na data de afastamento da atividade, sob pena de violência à vontade e à prerrogativa do legislador, bem como de afronta à separação de Poderes.

4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.

5. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento. (Destaquei).

Assim, deve ser observada a imposição inserta no § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, implicando na suspensão do pagamento do benefício a permanência do segurado aposentado no exercício da atividade que o sujeite a agentes nocivos ou caso a ela retorne voluntariamente.

Vale ressaltar que o afastamento da atividade se torna exigível tão somente a partir da efetiva implantação do benefício, sem prejuízo às parcelas vencidas no curso do processo que culminou na concessão da aposentadoria especial, seja ele judicial ou administrativo.

Implantação do benefício

Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.

Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.

Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo índice oficial e aceito na jurisprudência, qual seja:

- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-10-2019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula nº 204 do STJ), até 29/06/2009. A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema nº 810 da repercussão geral (RE nº 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe nº 216, de 22/09/2017.

Honorários advocatícios

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do acórdão (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC.

Custas processuais: O INSS é isento do pagamento de custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Conclusão

Sentença reformada para (a) reconhecer a nocividade dos períodos de 01.07.1988 a 01.03.1990, 01.03.1990 a 31.10.1996, 01.07.1997 a 30.11.1998, 01.04.2000 a 31.12.2000, 01.07.2001 a 30.06.2002 e 01.04.2003 a 14.11.2016; (b) condenar o INSS a implantar em favor do autor a aposentadoria especial e a pagar as parcelas devidas desde a DER (14.11.2016), acrescidas de correção monetária e juros de mora, na forma da fundamentação, além de honorários advocatícios.

DISPOSITIVO

Pelo exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002333946v4 e do código CRC 4d2cb93b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/4/2021, às 11:29:22


5011292-22.2018.4.04.7208
40002333946.V4


Conferência de autenticidade emitida em 30/04/2021 08:01:10.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5011292-22.2018.4.04.7208/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: JULIANO GRACZCKI (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA especial. REQUISITOS PREENCHIDOS.

1. A falta de previsão legal para o autônomo recolher um valor correspondente à aposentadoria especial não pode obstar-lhe o reconhecimento da especialidade, o que se constituiria em ato discriminatório, se ele exerceu a atividade sujeita a agentes nocivos previstos na legislação de regência.

2. Embora o segurado contribuinte individual que exerce atividade nociva figure como o único responsável pelo resguardo de sua integridade física, recaindo sobre ele o ônus de se preservar dos efeitos deletérios do trabalho, mediante efetivo emprego de EPIs, a aplicação de cremes de proteção para mãos não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes químicos agressivos à saúde, pois são equipamentos destinados apenas à proteção das mãos e dos braços, promovendo exclusivamente a proteção cutânea, enquanto o contato com hidrocarbonetos aromáticos acarreta danos ao organismo que extrapolam as patologias cutâneas. Idêntico raciocínio se aplica aos óculos de proteção e ao guarda-pó.

3. Tendo em conta o recente julgamento do Tema nº 709 pelo STF, reconhecendo a constitucionalidade da regra inserta no § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, o beneficiário da aposentadoria especial não pode continuar no exercício da atividade nociva ou a ela retornar, seja esta atividade aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. Implantado o benefício, seja na via administrativa, seja na judicial, o retorno voluntário ao trabalho nocivo ou a sua continuidade implicará na sua imediata suspensão.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 19 de abril de 2021.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002333947v3 e do código CRC 65c3b9e2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/4/2021, às 11:29:22


5011292-22.2018.4.04.7208
40002333947 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 30/04/2021 08:01:10.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/04/2021 A 19/04/2021

Apelação Cível Nº 5011292-22.2018.4.04.7208/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

SUSTENTAÇÃO DE ARGUMENTOS: Fernando Damian Batschauer por JULIANO GRACZCKI

APELANTE: JULIANO GRACZCKI (AUTOR)

ADVOGADO: Fernando Damian Batschauer (OAB SC031574)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/04/2021, às 00:00, a 19/04/2021, às 16:00, na sequência 8, disponibilizada no DE de 29/03/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 30/04/2021 08:01:10.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Teste grátis agora!