Apelação Cível Nº 5003162-23.2016.4.04.7011/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: ANTONIO LUCIO ZARANTONELO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
A parte autora ajuizou ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a revisão do seu benefício de aposentadoria por idade rural, com conversão em aposentadoria por idade com renda mensal pela média das contribuições ou em aposentadoria por tempo de contribuição, mediante reconhecimento de atividades rurais no período de 01/01/1960 até 18/12/2006 (DER), assim especificadas: de 01/01/1960 a 22/04/1985 como segurado especial em regime familiar; de 23/04/1985 a 30/05/1995, 01/08/1999 a 31/12/2003 e 01/01/2005 a 18/12/2006 como dirigente sindical licenciado da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Paraná; de 01/06/1995 a 30/07/1999 e 01/01/2003 a 31/12/2004 como Juiz Classista representante dos trabalhadores rurais do Paraná junto ao Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região.
Processado o feito, foi proferida sentença, publicada em 14/05/2018, cujo dispositivo ficou assim redigido (ev. 34):
Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos.
Condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§2º e 3º do CPC. Em virtude da gratuidade de justiça deferida ao autor (evento 3), declaro suspensa a exigibilidade de tais verbas nos termos do §2º e §3º artigo 98 do CPC.
Sentença não sujeita ao reexame necessário (art. 496, §3º, I, do CPC).
Eventual recurso de apelação deverá ser processado pela Secretaria na forma dos §§ 1º, 2º e 3º, do artigo 1.010 do CPC, observando-se, ainda, se for o caso, o disposto no §2º, do art. 1.009 do mesmo diploma legal.
Intimem-se.
A parte autora apela alegando, em suma, possuir direito à aposentadoria por idade pela média das contribuições vertidas. Afirma que possuía contribuições, as quais foram desconsideradas na apuração da renda mensal da aposentadoria. Sustenta que no período em que exerceu o cargo de dirigente sindical obteve remuneração mensal comprovada por recibos (ev. 1, CHEQ6-CHEQ15), recaindo sobre a entidade sindical a obrigação de repassar a contribuição. Assim, embora mantido o mesmo enquadramento de segurado especial, deve ser observado o valor da efetiva remuneração. E quanto ao período em que foi segurado especial, anterior a 1991, basta a prova da atividade, sendo desnecessárias as contribuições. Quanto aos intervalos como juiz classista, diz que houve recolhimento das contribuições pelo TRT da 9ª Região (ev. 1, PROCADM4 p. 4-6), fazendo jus ao seu cômputo para a aposentadoria por tempo de contribuição. Aduz que no período entre a vigência da Lei 8.112/90 até a edição da Medida Provisória 1.523/96 (01/01/1991 a 13/10/1996) as contribuições dos juízes classistas foram feitas para o Plano de Seguridade do Servidor Público Civil da União, pois foram considerados servidores públicos, e, após, voltaram a contribuir para o RGPS (ev. 48).
Com contrarrazões (ev. 51), vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Prescrição Quinquenal
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de caráter alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito.
Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação, conforme os termos da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
Aposentadoria por Idade "Mista" ou "Híbrida"
Contando o segurado com tempo de labor rural e urbano, é possível, em tese, a concessão da aposentadoria por idade com fundamento no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social.
A intenção da lei foi possibilitar ao trabalhador rural que não se enquadra na previsão do § 2º do aludido artigo a aposentadoria por idade com o aproveitamento das contribuições sob outra(s) categoria(s), porém com a elevação da idade mínima para 60 (sessenta) anos para a mulher e 65 (sessenta e cinco) anos para o homem.
Buscou-se, com isso, reparar eventuais injustiças em especial àquele trabalhador que conta com tempo campesino, porém insuficiente para a obtenção da aposentadoria rural, na medida em que possui, no seu histórico laboral, vínculos urbanos, o que, de certa forma, poderia justificar eventual descaracterização de sua condição de segurado especial. Em contrapartida, exige-se desse segurado a idade mínima superior àquela prevista para a aposentadoria rural por idade, pois majorada em cinco anos. O mesmo vale em relação ao trabalhador rural que migrou para o meio urbano, porém para fins de aposentadoria por idade, não conta com número necessário de contribuições para fins de carência, caso desconsiderado o tempo de labor rural.
Em função das inovações trazidas pela Lei nº 11.718/08, já não tão recentes, nem mais cabe indagar sobre a natureza jurídica da denominada aposentadoria mista ou híbrida, pois se pode afirmar que se trata de uma modalidade de aposentadoria urbana. Nessa modalidade o que ocorre, na verdade, é o aproveitamento do tempo de labor rural para efeitos de carência, mediante a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo. A reforçar isso, o § 4º, para efeitos do § 3º, do aludido artigo, dispõe que o cálculo da renda mensal do benefício será apurado em conformidade com o disposto no inciso II do artigo 29 da mesma Lei. Ora, ao fazer remissão a este artigo, e não ao artigo 39 da Lei de Benefícios, somente vem a confirmar que se trata de modalidade de aposentadoria urbana, ou, no mínimo, equiparada.
Com efeito, conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não importa o preenchimento simultâneo da idade e carência. Vale dizer: a implementação da carência exigida, antes mesmo do preenchimento do requisito etário, não constitui óbice para o seu deferimento; da mesma forma, a perda da condição de segurado.
A respeito dessa questão, o § 1º do artigo 3º da Lei nº 10.666/03, assim dispõe:
Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
Conclui-se, pois, que o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício, nos termos do já decidido pela 3ª Seção desta Corte, nos Embargos Infringentes nº 0008828-26.2011.404.9999 (Relator p/Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 10.01.2013).
Em suma, o que importa é contar com tempo de contribuição correspondente à carência exigida na data do requerimento do benefício, além da idade mínima. E esse tempo, tratando-se de aposentadoria híbrida ou mista, poderá ser preenchido com períodos de labor rural e urbano.
Esse entendimento, aliás, está em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. ART. 48, § 3º, DA LEI N. 8213/91. EXEGESE. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO QUE ANTECEDE O REQUERIMENTO. DESNECESSIDADE. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 8.213/91 PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. 1. A Lei 11.718/2008, ao alterar o art. 48 da Lei 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade, possibilitando que, na apuração do tempo de serviço, seja realizada a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano. 2. Para fins do aludido benefício, em que é considerado no cálculo tanto o tempo de serviço urbano quanto o de serviço rural, é irrelevante a natureza do trabalho exercido no momento anterior ao requerimento da aposentadoria. 3. O tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. 4. O cálculo do benefício ocorrerá na forma do disposto no inciso II do caput do art. 29 da Lei n. 8.213/91, sendo que, nas competências em que foi exercido o labor rurícola sem o recolhimento de contribuições, o valor a integrar o período básico de cálculo - PBC será o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. 5. A idade mínima para essa modalidade de benefício é a mesma exigida para a aposentadoria do trabalhador urbano, ou seja, 65 anos para o homem e 60 anos para a mulher, portanto, sem a redução de 5 anos a que faria jus o trabalhador exclusivamente rurícola. 6. Recurso especial improvido. (REsp 1476383/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, 1ª T., j. 01.10.2015)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI N. 8.213/1991. ART. 48, §§ 3º E 4º, DA LEI N. 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 11.718/2008. OBSERVÂNCIA. SÚMULA N. 83/STJ. 1. Os trabalhadores rurais que não satisfazem a condição para a aposentadoria do art. 48, §§ 1° e 2°, da Lei n. 8.213/91 podem computar períodos urbanos, pelo art. 48, § 3°, da mesma lei, que autoriza a carência híbrida. 2. No caso dos autos o Tribunal de origem, com amparo nos elementos fático-probatórios dos autos, concluiu que o segurado especial que comprove a condição de rurícola, mas não consiga cumprir o tempo rural de carência exigido na tabela de transição prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/1991 e que tenha contribuido sob outras categorias de segurado, poderá ter reconhecido o direito ao benefício aposentadoria por idade híbrida, desde que a soma do tempo rural com o de outra categoria implemente a carência necessária contida na Tabela. 3. Ficou consignado também que "o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo, no caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem)". 4. Das razões acima expendidas, verifica-se que o Tribunal a quo decidiu de acordo com jurisprudência desta Corte, de modo que se aplica à espécie o enunciado da Súmula n. 83/STJ. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1531534/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª T., j. 23.06.2015)
No caso em apreço, o autor é titular de aposentadoria por idade rural e entende cabível sua conversão em aposentadoria por idade pela média de suas contribuições vertidas à Autarquia Previdenciária, o que equivale à aposentadoria por idade híbrida (em que é possível computar períodos como segurado especial e períodos contributivos) ou em aposentadoria por tempo de contribuição.
A concessão da aposentadoria por idade híbrida ou urbana não se mostra possível no caso, pois na DER, em 2006, o autor não havia implementado o requisito etário de 65 anos, vez que, tendo nascido em 19/08/1945, atingiu a idade mínima para o benefício somente em 2010. Nesse caso, eventual concessão de aposentadoria diversa em momento posterior ao requerimento de benefício configuraria desaposentação.
Mérito. Aposentadoria por tempo de contribuição
No período anterior à Emenda Constitucional nº 103/2019, de 13.11.2019, e respeitadas as alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 20/1998, a aposentadoria por tempo de contribuição é devida à/ao segurada/segurado que tenha laborado por 25/30 anos (proporcional) ou 30/35 anos (integral), desde que cumprida a carência de 180 contribuições (artigos 25, II, 52, 53 da Lei 8.213/91 e 201, § 7º, I, da Constituição Federal), observada regra de transição prevista no artigo 142 da Lei de Benefícios, para os filiados à Previdência Social até 24.07.1991.
Atividade Rural (Segurado Especial)
O artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, bem como o art. 127, V, do Decreto nº 3.048/99, expressamente autorizam o aproveitamento do tempo de serviço rural trabalhado até 31/10/1991, independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias para a averbação de tempo de contribuição, exceto no que se refere à carência.
Ainda, o art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, estendeu a condição de segurado a todos os integrantes do grupo familiar que laboram em regime de economia familiar, sem a necessidade de recolhimento das contribuições quanto ao período exercido antes da Lei nº 8.213/91 (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10-11-2003).
Para a comprovação do tempo de atividade rural é necessário início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal, salvo caso fortuito ou força maior, conforme o artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Ainda, quanto à questão da prova, cabe ressaltar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no artigo 106 da Lei n. 8.213, de 1991, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (STJ, AgRg no AREsp 327.119, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho,1ª T., j. 2.6.2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (STJ, Tema 554, REsp n.º 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., j. 10.10.2012); e (d) é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577 do STJ).
Salienta-se que a declaração de sindicato de trabalhadores rurais, sem a respectiva homologação do INSS e isoladamente considerada, não se consubstancia em início de prova material, uma vez que constitui mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório. (TRF4, EINF 2006.71.99.000415-1, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 19.09.2008).
Destaque-se, ainda, que é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental. De fato, o artigo 11, § 1 º, da Lei n. 8.213, de 1991, define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem em condições de mútua dependência e colaboração. Nesse contexto, os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. No que se refere à idade mínima para o reconhecimento do trabalho rural, a Súmula nº 05 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais uniformizou o seguinte entendimento: "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários".
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 16 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também desimportar se o cônjuge recebe alguma remuneração que complemente a renda familiar, mas que não retire a natureza de subsistência da renda advinda da atividade rural, ou seja que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como "boias-frias", diaristas ou volantes, considerando a informalidade com que é prestado o trabalho no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça é de que o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material referente ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto quando demonstrada a ocorrência de caso fortuito ou força maior, os termos do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10.10.2012, recurso representativo da controvérsia).
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do artigo 11, VII da Lei nº 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação "empregador II-b" nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar (artigo 1º, II, b, do Decreto-Lei nº 1166, de 15.4.1971).
Cumpre salientar também que muitas vezes a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante.
Vale reiterar que, nos termos do artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, é admitido o cômputo de tempo de serviço de trabalho rural que realizou atividade em regime de economia familiar anterior à data de início de sua vigência, para concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. ATIVIDADE URBANA. CTPS. PROVA PLENA. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. INAPLICABILIDADE. CONCESSÃO DA APOSENTADORIA. OPÇÃO PELA RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários, a partir dos 12 anos, pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. O reconhecimento de tempo de serviço prestado na área rural até 31-10-1991, para efeito de concessão de benefício no Regime Geral da Previdência Social, não está condicionado ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, exceto para efeito de carência. (...) (APELREEX nº 0004672-19.2016.404.9999, TRF/4ª Região, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, 14-06-2017)
Interpretado o referido dispositivo legal em consonância com o artigo 39 da mesma Lei, constata-se que o trabalhador rural deve proceder ao pagamento da contribuição facultativa na forma do artigo 21 da Lei nº 8.212/1991, caso pretenda se habilitar à aposentadoria por tempo de contribuição. Esse é o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça:
O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas. (Súmula 272, Terceira Seção, julgado em 11/09/2002, DJ 19/09/2002, p. 191)
Assim, com relação ao tempo de serviço rural ulterior à Lei de Benefícios (competência de novembro de 1991, conforme disposto no artigo 192 do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto n° 357/91), o aproveitamento condiciona-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, de acordo com o artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91 e Súmula 272 do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÕES. REMESSA EX OFFICIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. ATIVIDADE ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. (...) 3. A prova material é corroborado pela prova testemunhal produzida em juízo, uníssona e consistente, tendo as testemunhas inquiridas afirmado que a parte autora exerceu atividade rural no período em questão. Contudo, na hipótese em que o serviço rural for posterior à vigência da Lei 8.213/91, o computo do referido tempo fica condicionado ao recolhimento das contribuições previdenciárias (Súmula 272 do STJ). Logo, não tendo a parte autora comprovado o recolhimento das respectivas contribuições, merece ser averbado apenas o período até 31-10-1991. (...) (TRF4 5012124-04.2012.4.04.7002, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 02.10.2018)
Atividade urbana
A comprovação de tempo de atividade urbana deve observar o disposto no art. 55 da Lei nº 8.213/91, § 3º, que dispõe:
Art. 55 A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Nesse sentido, entende-se como início de prova material a existência de documentos que demonstrem o trabalho exercido pelo segurado, tais como anotações existentes na CTPS, fichas de empregados, livro de frequência, recibos de pagamento.
Acerca dos dados anotados em CTPS, já se pronunciou o TST no Enunciado n.º 12:
As anotações apostas pelo empregador na carteira profissional do empregado não geram presunção "juris et jure", mas apenas "juris tantum". (RA 28/1969, DO-GB 21-08-1969).
Assim, acaso demonstrado eventual vício que afaste a fidedignidade da anotação na CTPS, a presunção relativa de veracidade resta afastada e, em consequência, o ônus da prova passa a ser da parte autora.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE URBANA. AVERBAÇÃO. REGISTRO EM CTPS. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados. Precedentes. (TRF4, AC 5015442-15.2018.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 03/07/2020)
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. TEMPO DE SERVIÇO. REGISTRO EM CTPS. VÍNCULO. EFEITO FINANCEIROS. 1. O tempo de serviço urbano pode ser comprovado por documentação idônea, gozando as anotações em CTPS de presunção juris tantum de veracidade, sendo, ademais, ônus do empregador os recolhimentos das contribuições devidas que, se não efetuadas, não pode implicar em ônus ao empregado. 2. Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à revisão da aposentadoria por idade, cujos efeitos financeiros devem ser contados a contar da Data de Entrada do Requerimento - DER, respeitada eventual prescrição quinquenal. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça. (TRF4, AC 5009618-90.2014.4.04.7000, TTRS/PR, Rel. Des. Federal Márcio Antônio Rocha, 16/07/2020)
Caso Concreto
A sentença, da lavra do MM. Juiz Federal, Dr. EMANUEL ALBERTO SPERANDIO GARCIA GIMENES, examinou e decidiu com precisão todos os pontos relevantes da lide, devolvidos à apreciação do Tribunal, assim como o respectivo conjunto probatório produzido nos autos. As questões suscitadas no recurso não têm o condão de ilidir os fundamentos da decisão recorrida. Evidenciando-se a desnecessidade da construção de nova fundamentação jurídica, destinada à confirmação da bem lançada sentença, transcrevo e adoto como razões de decidir os seus fundamentos, in verbis:
(...)
Do pedido de reconhecimento do exercício da atividade rural de 01/01/1960 a 18/12/2006
Em audiência foi ouvido o autor e três testemunhas.
O autor (VIDEO2) alegou que começou a trabalhar na roça com 7 anos de idade, no sítio Santo Antônio, de seu pai, de 4 alqueires e meio em que a família trabalhava (seus pais, ele e seus três irmãos), até a geada, no café e que estudou na escola rural. Acrescentou que trabalhou no sítio até 1985 e depois disso foi trabalhar em Curitiba, como dirigente sindical, onde ficou até 2006. Informou que a Federação (o tesoureiro) que ficava obrigada aos recolhimentos previdenciários. Respondeu que era licenciado e como tal não podia trabalhar na roça. Atualmente, trabalha e reside em um sítio. Respondeu que foi juiz classista, representante dos empregados, por mais de 4 anos.
A testemunha Rosário da Costa (VIDEO3) alegou que conheceu o autor ainda criança, ocasião em que residiam em sítios quase vizinhos e época em que ambos eram formadores de café. Acrescentou que o autor ficou no sítio até 1984/85. Depois que saiu do sítio, o autor foi para Curitiba. Após a geada do café, todos os agricultores foram trabalhar com lavoura branca (milho, feijão e algodão).
A testemunha Nilson Scarpin (VIDEO4) alegou que o autor vivia da agricultura de 1960 a 1985. Acrescentou que o autor estudou até o primeiro ano do primário. Informou uqe logo após o autor se casar ele continuou residindo no sítio. Depois que saiu do sítio, o autor foi para Curitiba. Respondeu que chegou a ver o autor fazendo diversos serviços rurais. Respondeu que atualmente o autor está cuidando de um sítio.
A testemunha Ilton Irineu da Silva (VIDEO5) alegou que conheceu o autor no sindicato, em Curitiba, em maio de 1985. Respondeu que o autor recebia salário e se licenciou um período do sindicato para ser juiz classista. Respondeu que só o diretor licenciado que recebia salário, os demais membros da diretoria só recebiam diárias.
No processo administrativo há a declaração do autor de que exerceu atividade rural, como segurado especial na Água do Tigre, de 19/08/1957 a 1981 [em 1981 deixou o trabalho na lavoura para prestar serviço no sindicato, o melhor como dirigente sindical representando os trabalhadores rurais - fl. 48 do PA, evento 16 - PROCADM2]; atas de posses do sindicato dos trabalhadores rurais de Sertanópolis que informam que o autor foi empossado como diretor do sindicato dos trabalhadores rurais de Sertanópolis em 24/07/1976 e como presidente do sindicato em 17/07/1979, 24/07/1982; ata de posse datada de 23/04/1985, feita na sede da Federação do Estado do Paraná (em Curitiba) que cita o nome do autor como membro efetivo da diretoria (fl. 28 do PA, evento 16 - PROCADM2) e em 13/04/1988 como secretário geral. Consta ainda que, em Curtiba, ele foi empossado presidente da Federação para o triênio 1991/1994 (fl. 34 do PA) e 1995/1999 (fl. 38 do PA) e como vice-presidente no triênio de 2003/2007 (fl. 40 do PA).
Do processo administrativo constam ainda (evento 1 - PROCADM4) :
a) declaração emitida pelo sindicato de que o autor trabalhou no meio rural, em economia familiar, de 19/08/1957 a 1981;
b) certidão de nascimento do autor, datada de 1945, em que seu pai foi qualificado como 'avrador';
c) certidão de nascimento de sua filha Maria, datada de 1966, em que ele (autor) foi qualificado como 'lavrador';
d) certidão de nascimento de sua filha Rosinete, datada de 1970, em que consta o seu domicílio na Água do Tigre;
e) certidão de nascimento do seu filho Wagner, datada de 1979, em que ele (autor) foi qualificado como 'lavrador';
f) certidão de casamento do autor, datda de 1965, em que foi qualificado como 'lavrador';
g) registro de imóvel rural de 18 alqueires em nome do pai do autor e de seus tios a prenotação de 4,50 alqueires em nome de seus pais e a venda desse imóvel em 23/08/1985.
Assim, há nos autos provas plenas de que o autor exerceu atividade rural, sendo essa a razão pela qual a Autarquia lhe concedeu o benefício de aposentadoria por idade rural. Contudo, tais documentos comprovam a sua atividade até o ano de 1979 (certidão de nascimento de seu filho Wagner) e que ele ainda estava na cidade de Sertanópolis no ano de 1982 (ocasião em que foi empossado presidente do sindicato por um triênio). De 1982 a 1985, inexistem documentos, observando-se que o próprio autor informou no INSS (e foi corroborado na declaração do sindicato) que ele teria permanecido na propriedade de seu pai até 1981, propriedade essa que foi vendida em 23/08/1985.
Em que pese o autor e suas testemunhas terem informado que ele teria trabalhado no sitio de seu pai até o ano de 1985, administrativamente, o autor informou que deixou essa atividade em 1981. Como ainda em 1982 ele constou da ata do sindicato da cidade de Sertanópolis, reputo que deixou a atividade rurícola em 1982, eis que não há como se ter certeza de que ele tenha se mudado para Curitiba apenas em 1985 [em que pese constar da ata de 1982 a sua nomeação para o triênio, não há nos autos prova de que nesses 3 anos posteriores a 1982 ele tenha efetivamente ficado em Sertanópolis, observando-se já foi na cidade de Curitiba o seu cargo subsequente, na federação, local em que com certeza ele já residia bem antes dessa data].
Assim, conforme já citado, tendo o autor informado (e constado na declaração emitida pelo sindicato) que trabalhou no meio rural até o ano de 1981 e existindo nos autos a prova de que em 07/1982 ele ainda estava em Sertanópolis, reconheço o trabalho rural por ele exercido no período de 19/08/1957 a 24/07/1982. Contudo, como esse reconhecimento já foi feito pelo INSS por ocasião da concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, só haverá a a necessidade de averbação desse período em caso de procedência do pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, que passo a analisar abaixo:
Do pedido de reconhecimento do vínculo empregatício urbano na atividade exercida como dirigente sindical da categoria de trabalhadores rurais nos períodos de 23-04-1985 a30-05-1995, 01-08-1999 a 31-12-2003 e 01-01-2005 a 18-12-2006
Aduz o autor ter exercido a atividade de dirigente sindical nos períodos acima delimitados e que nesses períodos a responsabilidade pelos recolhimentos previdenciários seria de seu empregador, eis que seu vínculo empregatício seria como empregado do sindicato.
Sem razão, contudo.
O dirigente sindical da categoria de trabalhadores rurais para ser eleito deve comprovar o efetivo exercício da atividade rural nos dois anos que antecedem a eleição. Essa comprovação é feita para que ele mantenha o mesmo enquadramento que detinha no RGPS no perído anterior ao exercício de seu mandato. Se fosse para ser considerado empregado do sindicato (atividade urbana, portanto), a legislação não estabeleceria esses requisitos para que o dirigente fosse eleito.
Confirmando isso, no próprio art. 11 da Lei Previdenciária, temos que:
(...)
§ 4º O dirigente sindical mantém, durante o exercício do mandato eletivo, o mesmo enquadramento no Regime Geral de Previdência Social-RGPS de antes da investidura.
(...)
§ 9o Não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de:
IV – exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais;
A adição do § 9º, no artigo supracitado da Lei dos Benefícios, incluído pela Lei n.º 11.718/2008, veio a confirmar a hipótese de compatibilidade entre o exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais e da atividade rural na condição de segurado especial, sendo essa a razão pela qual não incidem as contribuições previstas nos arts. 20, 21 e 22 da Lei nº 8.212/91 sobre os valores pagos pela entidade sindical ao dirigente, qualificado como segurado especial.
Assim, correta a atuação da Autarquia quando concedeu ao autor o benefício de aposentadoria por idade rural, eis que, havendo o reconhecimento acerca de sua qualidade de segurado especial, não houve a perda superveniente dessa qualidade com o exercício da atividade de dirigente sindical, uma vez que a legislação de regência estabeleceu a presunção legal de que, durante o exercício do mandato eletivo, o dirigente sindical mantém o mesmo enquadramento no Regime Geral de Previdência Social de antes da investidura, sem estabelecer qualquer tipo de exceção a essa regra, do que se depreende, inclusive em razão da inclusão do § 9º, Inc. IV, ao artigo 11 do mesmo diploma legal, ser plenamente aplicável tal regramento aos segurados especiais. Nesse sentido, mutatis mutandis:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL COMO 'BÓIA-FRIA'. DIRIGENTE SINDICAL.INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. TUTELA ESPECÍFICA. 1.O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. 'O dirigente sindical mantém, durante o exercício do mandato eletivo, o mesmo enquadramento no Regime Geral dePrevidência Social - RGPS de antes da investidura' art. 11, §4º, da Lei8.213/91. 3. Restando comprovado nos autos o requisito etário e o exercício da atividade rural no período de carência, é de ser concedida a aposentadoria por idade rural à parte autora a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91. 4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4 5051545-26.2015.404.9999,SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em24/02/2017)
Dessa feita, julgo improcedente o pedido formulado na exordial para o reconhecimento de vínculo empregatício urbano da atividade exercida pelo autor como dirigente sindical da categoria de trabalhadores rurais nos períodos de 23-04-1985a30-05-1995, 01-08-1999 a 31-12-2003 e 01-01-2005 a 18-12-2006, nos termos da fundamentação.
Do pedido de reconhecimento dos períodos de 01-06-1995 a 30-07-1999 e de 01-01-2003 a 31-12-2004 como juiz classista
Há no processo administrativo as declarações emitidas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região que comprovam o exercício da atividade exercida pelo autor nos interregnos acima. Contudo, para a utilização desses períodos no cálculo do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o tempo de atividade rural não contará para carência, razão pela qual, mais uma vez, correta a atuação da Autarquia em desconsiderá-los, eis que o único benefício possível ao autor na data da DER (18/12/2006), era o de aposentadoria por idade rural, no valor de 1 (um) salário mínimo, conforme planilha abaixo:
Data inicial | Data Final | Fator | Conta p/ carência ? | Tempo até 18/12/2006 (DER) | Carência |
19/08/1957 | 24/07/1982 | 1,00 | Não | 24 anos, 11 meses e 6 dias | 0 |
01/06/1995 | 30/07/1999 | 1,00 | Sim | 4 anos, 2 meses e 0 dia | 50 |
01/01/2003 | 31/12/2004 | 1,00 | Sim | 2 anos, 0 mês e 0 dia | 24 |
Marco temporal | Tempo total | Carência | Idade | |
Até 16/12/98 (EC 20/98) | 28 anos, 5 meses e 22 dias | 43 meses | 53 anos e 3 meses | |
Até 28/11/99 (L. 9.876/99) | 29 anos, 1 mês e 6 dias | 50 meses | 54 anos e 3 meses | |
Até a DER (18/12/2006) | 31 anos, 1 mês e 6 dias | 74 meses | 61 anos e 4 meses |
Tempo mínimo para aposentação: | 30 anos, 7 meses e 9 dias |
Nessas condições, a parte autora, em 16/12/1998, não tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não preenchia o tempo mínimo de serviço (30 anos) e a carência (102 contribuições).
Posteriormente, em 28/11/1999, não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição (30 anos), a carência (108 contribuições) e o pedágio (0 ano, 7 meses e 9 dias).
Por fim, em 18/12/2006 (DER) não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição porque não preenchia a carência (150 contribuições).
(...)
Segurado Especial
A sentença reconheceu o trabalho rural exercido pelo autor no período de 19/08/1957 a 24/07/1982, mas considerou que igual reconhecimento fora feito pelo INSS por ocasião da concessão do benefício de aposentadoria por idade rural. Ponderou, então, que só haveria a necessidade de averbação desse período em caso de procedência do pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, caso reconhecido tempo de contribuição suficiente.
Dirigente Sindical
Com efeito, pela redação do art. 11, §4º, da Lei 8.213/91, o dirigente sindical mantém, durante o exercício do mandato eletivo, o mesmo enquadramento no Regime Geral de Previdência Social - RGPS de antes da investidura. E de acordo com o art. 530, III, da CLT, o dirigente sindical, para ser eleito, deve comprovar o efetivo exercício da atividade nos dois anos que antecederam à eleição, mantém o mesmo enquadramento que detinha no RGPS no período anterior ao exercício de seu mandato.
Não há falar, assim, em consideração da remuneração percebida na condição de dirigente do sindicado dos trabalhadores rurais, mormente porque não demonstrado o recolhimento das respectivas contribuições ao INSS.
Nesses termos:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL COMO "BÓIA-FRIA". DIRIGENTE SINDICAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. "O dirigente sindical mantém, durante o exercício do mandato eletivo, o mesmo enquadramento no Regime Geral de Previdência Social - RGPS de antes da investidura" art. 11, §4º, da Lei 8.213/91. 3. Restando comprovado nos autos o requisito etário e o exercício de atividade rural no período de carência, é de ser concedida a aposentadoria por idade rural à parte autora a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91. 4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4 5051545-26.2015.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 24/02/2017) g.n.
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO DE DIRIGENTE SINDICAL. POSSIBILIDADE. INEXIGÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO. 1. O tempo de serviço rural anterior à vigência da Lei 8.213/91 pode ser computado para a aposentadoria por tempo de serviço, sem o recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, por força do §2º do seu art. 55, salvo para fins de carência. Precedentes do STJ e do STF. 2. No caso dos autos, a manutenção da qualidade de segurado especial do autor decorre do teor do art. 11, §4º, da Lei 8.213/91, c/c art. 530, III, da CLT, segundo os quais, o dirigente sindical, que para ser eleito deve comprovar o efetivo exercício da atividade nos dois anos que antecederam à eleição, mantém o mesmo enquadramento que detinha no RGPS no período anterior ao exercício de seu mandato. 3. Estando a qualidade de segurado especial do autor reconhecida administrativamente tanto nos períodos anteriores quanto nos posteriores ao exercício do cargo de Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, deve o período correspondente ser reconhecido e averbado para fins previdenciários. 4. Comprovado o exercício de atividade sindical, o qual deve ser acrescido ao tempo reconhecido pelo INSS, tem o segurado direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, nas condições que lhe sejam mais favoráveis, em respeito ao direito adquirido e às regras de transição, tudo nos termos dos artigos 5º, inciso XXXVI, da CF, 3º e 9º da EC 20/98 e 3º e 6º da Lei 9.876/99. (TRF4, APELREEX 2002.71.13.003314-6, QUINTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, D.E. 28/06/2010) g.n.
Juiz Classista
Quanto ao período em que o autor atuou como Juiz Classista, bem observou a sentença haver no processo administrativo declarações emitidas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região que comprovam o exercício da atividade exercida pelo autor nos interregnos acima. Contudo, para a utilização desses períodos no cálculo do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o tempo de atividade rural não contará para carência, razão pela qual, mais uma vez, correta a atuação da Autarquia em desconsiderá-los, eis que o único benefício possível ao autor na data da DER (18/12/2006), era o de aposentadoria por idade rural, no valor de 1 (um) salário mínimo, conforme planilha abaixo.
(...)
O apelo, destarte, não merece provimento.
Honorários Advocatícios
Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).
Improvido o apelo, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do benefício da gratuidade da justiça.
Custas
Fica suspensa a exigibilidade das custas devidas pela parte autora, em face da assistência judiciária gratuita deferida no evento 3.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação da parte autora: improvida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002655930v9 e do código CRC bf4394cb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 14/7/2021, às 6:22:30
Conferência de autenticidade emitida em 22/07/2021 04:00:59.
Apelação Cível Nº 5003162-23.2016.4.04.7011/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: ANTONIO LUCIO ZARANTONELO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria por idade híbrida. APOSENTADORIA POR tempo de contribuição. REQUISITOS. dirigente sindical. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL.
Tem direito à aposentadoria por idade, mediante conjugação de tempo de serviço/contribuição rural e urbano durante o período de carência, nos termos do § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008, o segurado que cumpre o requisito etário de 60 anos, se mulher, ou 65 anos, se homem. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício.
No período anterior à Emenda Constitucional nº 103/2019, de 13.11.2019, e respeitadas as alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 20/1998, a aposentadoria por tempo de contribuição é devida à/ao segurada/segurado que tenha laborado por 25/30 anos (proporcional) ou 30/35 anos (integral), desde que cumprida a carência de 180 contribuições (artigos 25, II, 52, 53 da Lei 8.213/91 e 201, § 7º, I, da Constituição Federal), observada regra de transição prevista no artigo 142 da Lei de Benefícios, para os filiados à Previdência Social até 24.07.1991.
Nos termos do artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o cômputo de tempo de serviço de segurado trabalhador rural anterior à data de início de sua vigência, é admitido, para concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência. Com relação ao tempo de serviço rural ulterior à Lei de Benefícios (competência de novembro de 1991, conforme disposto no artigo 192 do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto n° 357/91), o aproveitamento condiciona-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, de acordo com o artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91 e Súmula 272 do Superior Tribunal de Justiça.
A manutenção da qualidade de segurado especial do autor decorre do teor do art. 11, §4º, da Lei 8.213/91, c/c art. 530, III, da CLT, segundo os quais, o dirigente sindical, que para ser eleito deve comprovar o efetivo exercício da atividade nos dois anos que antecederam à eleição, mantém o mesmo enquadramento que detinha no RGPS no período anterior ao exercício de seu mandato.
Não demonstrado o preenchimento dos requisitos, não é possível a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ou da aposentadoria por idade híbrida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 13 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002655931v3 e do código CRC 462289a7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 14/7/2021, às 6:22:30
Conferência de autenticidade emitida em 22/07/2021 04:00:59.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 06/07/2021 A 13/07/2021
Apelação Cível Nº 5003162-23.2016.4.04.7011/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: ANTONIO LUCIO ZARANTONELO (AUTOR)
ADVOGADO: MAURO LUCIO RODRIGUES (OAB PR026868)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 06/07/2021, às 00:00, a 13/07/2021, às 16:00, na sequência 319, disponibilizada no DE de 25/06/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 22/07/2021 04:00:59.