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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. TRF4. 5023692-66.2020.4.04.9999...

Data da publicação: 28/03/2024, 11:01:46

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. 1. Tem direito à aposentadoria por idade rural a contar da data de entrada do requerimento administrativo, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que implementa os requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias. 2. Não se concede a aposentadoria quando não restar demonstrado nos autos que a parte autora exerceu atividade rural nos 180 meses que antecedem o implemento do requisito etário ou anteriores ao requerimento administrativo. (TRF4, AC 5023692-66.2020.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator ANA CRISTINA FERRO BLASI, juntado aos autos em 20/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5023692-66.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

APELANTE: MALI PERREIRA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

MALI PERREIRA propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 01/05/2019, postulando a concessão de aposentadoria por idade rural, a contar da data de entrada do requerimento administrativo (DER en 14/12/2017), mediante o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 01/01/95 a 31/12/1995, de 01/01/1998 a 30/09/2001, de 01/06/2005 a 30/06/2010, de 01/09/2010 a 30/08/2014 e de 01/01/2015 a 31/12/2016.

Sobreveio sentença (evento 64, OUT1), que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, condenado a parte autora em honorários arbitrados em R$ 1.000,00. Suspensa a exigibilidade em razão da AJG.

A parte autora, em suas razões (evento 70, APELAÇÃO1), sustenta ser devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, sob o argumento de início de prova material do labor campesino, em parceira agrícola, diarista e trabalhadora volante e que que não perdeu a qualidade de trabalhadora rural em razão do trabalho urbano do marido. Postula a fixação dos honorários em 15% sobre o valor da condenação.

Com contrarrazões (evento 74, CONTRAZ1), subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Da aposentadoria rural por idade

São requisitos para a concessão de aposentadoria rural por idade, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.

Registro que a descontinuidade apontada em sede legislativa diz respeito a pequenos intervalos de afastamento da atividade rural dentro do período de carência, inexistindo a hipótese legal de cômputo de períodos pretéritos totalmente extemporâneos.

Neste sentido, em relação ao requisito temporal do cumprimento da carência, o entendimento deste Tribunal (ênfase acrescentada):

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. INSUFICIENTE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. O trabalhador rural que preencher os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei nº 8.213/91, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade. 2. Não restou demonstrado nos autos que a parte autora exerceu atividade rural nos 180 meses que antecedem o implemento do requisito etário ou anteriores ao requerimento administrativo. (TRF4, AC 5006874-68.2022.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 01/03/2023)

Quanto à carência, há regra de transição para os segurados obrigatórios previstos no art. 11, I,"a", IV ou VII: (a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".

Na aplicação da aludida tabela do art. 142, a quantidade de meses de exercício de atividade rural exigida é a correspondente ao ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).

Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.

Caso o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 05 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.

A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.

Atividade Rural em Regime de Economia Familiar

O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a apresentação de início de prova material, complementado por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas -, não sendo esta admitida exclusivamente, salvo caso fortuito ou força maior. Tudo conforme o art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91 e reafirmado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).

Nesse contexto probatório: (a) a lista dos meios de comprovação do exercício da atividade rural (art. 106 da Lei de Benefícios) é exemplificativa, em face do princípio da proteção social adequada, decorrente do art. 194 da Constituição da República de 1988; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral - ou com a autodeclaração rural -, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido; (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural (REsp. n.º 980.065/SP, DJU, Seção 1, 17-12-2007; REsp. n.º 637.437/PB, DJU, Seção 1, de 13-09-2004; REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).

Consideradas, contudo, as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental que abranja todo o período postulado, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal - ou, como já dito, pelo autodeclaração rural -, nada impedindo que sejam contemplados documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem à conclusão pela existência e/ou continuidade da atividade rural.

Ademais, restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".

O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios, por sua vez, define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade familiar respectiva, via de regra, são formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros, ou seja, em nome daquele considerado o arrimo de família. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam-se em início de prova material do labor rural de outro, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".

No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo recentemente a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo tal questão maiores digressões.

Da prova da atividade rural prestada como boia-fria

A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:

RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.

1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.

2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.

3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.

4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.

6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.

Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista, safrista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes.

Cediço que os citados trabalhadores exercem suas respectivas atividades em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.

Nesta linha, fixou-se o entendimento do Tema Repetitivo 554:

Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Cumpre salientar, também, que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período postulado. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se optar pelas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório.

Em suma, é dizer que nos casos de trabalhadores informais, especialmente em relação ao labor rural exercido como boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente tem registradas suas relações de emprego.

Caso concreto - Períodos rurais controvertidos

A autora, MALI PERREIRA, nascida em 11/12/1962, filha de Walter Bugs e Hilda Bugs (evento 1, CARTA3), pleiteia o reconhecimento do exercício de trabalho rural, especificamente, entre 01/01/1991 e 31/01/1997, 01/01/1998 e 30/09/2001, 01/06/2005 e 30/06/2010 e, por fim, 01/09/2014 a 31/12/2017.

O pedido restou afastado pela sentença, sob o fundamento de : da prova testemunhal colhida entendo não caracterizado o labor rural como segurada especial pela parte autora nos termos em que requer seja reconhecido.

Para comprovar o efetivo trabalho agrícola, foram trazidos aos autos alguns documentos, dentre os quais se destacam:

- certidão de casamento da autora com Florinal Pereira em 1983, constando seu esposo como agricultor (evento 1, PROCADM6, fl.5);

- certidão de nascimento de filha do casal constando ambos como agricultores em 1983 (evento 1, PROCADM6, fls. 14 e ss);

- notas fiscais em nome do marido da autora entre entre 1988 e 2001 (evento 1, PROCADM6, fls. 17 e ss) e entre 2011 e 2017 (evento 1, PROCADM6, fls.36 e ss).

- decisão administrativa com a justificativa do indeferimento do pedido de aposentadoria, com as homologações de alguns períodos (01/01/1991 a 31/12/1994, 01/01/1996 a 31/12/1997, 01/09/2014 a 31/12/2014 e 01/01/2017 a 14/12/2017) e as desconsiderações dos interregnos aqui pleiteados (evento 1, PROCADM7, fl.19).

No que pertine à prova oral, em que pese a conclusão sentencial, da leitura dos trechos referidos pela magistrada de origem, ressai, claramente, que a autora sempre esteve ligada ao trabalho campesino, ora trabalhando para o Sr. Luiz Antonio Cavalleri, ora para o pai do sr. Arnei Goelzer, ou ainda, para o Sr. Hilário Valdameri.

Afasto a ponderação a quo sobre : Na sequência, Hilário Valdameri afirmou que a requerente é sua vizinha há aproximadamente 3 anos e "de vez em quando faz algum bico pra ganhar algum troco" (19min04seg), sendo o seu esposo aposentado, o que indica que mesmo sem perceber aposentadoria por idade que ora pleiteia ou outra espécie de benefício, a autora não se dedica ao trabalho rural em regime de economia familiar dele extraindo sua renda e subsistência, nos termos exigidos para fazer jus ao enquadramento.

Com efeito, o CNIS (evento 82, INFBEN2) indica que o marido da requerente recebeu auxílio por incapacidade no valor de R$ 937,00, em 16/1/2017 e aposentadoria por invalidez no valor de R$ 1.045,00. Benefício esse cessado em 27/11/2020, com o óbito do cônjuge, sendo a autora titular de pensão por morte advinda de tal prestação (81.1).

A situação do esposo da autora como aposentado por invalidez apenas reforça a necessidade do trabalho no campo para a própria subsistência da autora. A percepção de aposentadoria pelo marido da recorrente não desqualifica a condição de segurada especial da parte autora, uma vez demonstrado que a indigitada renda não era suficiente para tornar dispensável o labor agrícola para a subsistência do núcleo familiar. O numerário acima indica que o benefício era de 1 (um) salário mínimo mensal.

No que pertine ao depoimento de Luiz Antonio Cavalleri, verifico que a ausência de contrato escrito sobre o sistema de parceria pactuado entre a testemunha e a autora não descaracteriza o trabalho rural diante das demais provas materiais.

Desta feita, verifico que as testemunhas inquiridas em audiência judicial confirmaram o trabalho rural da autora plantando milho e feijão, criando animais para consumo próprio. Por sua vez, a documentação apresentada constitui início razoável de prova material do labor rural nos períodos entre 1988 a 2001 e de 2011 a 2017.

Em paralelo, não se pode olvidar dos efeitos prospectivos e retrospectivos do conjunto probatório quando da análise de tempo rural, sendo possível estender-se temporalmente os marcos de início e término da atividade campesina. Em alinho, o princípio da continuidade do trabalho ligado à terra, autorizando a verificação de trabalho rural em regime de economia familiar mesmo diante da ausência de documentação ano a ano.

Do atendimento dos requisitos para a concessão do benefício

No que concerne ao requisito etário, é possível verificar que a parte autora completou 55 anos de idade em 11/12/2017, de modo que a carência incidente na espécia corresponde a 180 meses anteriores à implementação da idade ou ao requerimento administrativo, que retroagiria a 2002, ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.

Nesse quadrante, mesmo com ora reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, no período de 1988 a 2001 e de 2011 a 2017, ainda que se estendam efeitos à documentação, conforme acima referido, há hiato temporal impeditivo da concessão do benefício pleiteado.

Extinção sem resolução do mérito

Em razão da escassez de provas, a considerar a decisão proferida nos autos do REsp nº 1.352.721/SP, Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça no seguinte sentido:

A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.

Em suma, o STJ estabeleceu o entendimento de que na hipótese de ajuizamento de ação com pedido de cômputo de tempo rural, a ausência/insuficiência de prova material não é causa de improcedência do pedido, mas, sim, de extinção sem resolução de mérito. Assegura-se, com isso que, caso o segurado especial venha a obter outros documentos que possam ser considerados prova material do trabalho rural, a oportunidade de ajuizamento de nova ação sem o risco de ser extinta em razão da coisa julgada.

Creio que o caso em tela se amolda à orientação traçada no julgamento do Recurso Especial acima citado, pois ausente início de prova material em relação ao referido lapso.

Assim, considerando a ausência de prova material apta a comprovar o efetivo exercício do labor rural, dou parcial provimento ao apelo da parte autora para extinguir o feito, sem resolução de mérito, forte no artigo 485, inc. IV, do CPC, quanto ao pedido de reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 01/06/2005 a 30/06/2010.

De forma esquemática, tem-se:

(i) 01/01/1991 a 31/12/1994 = reconhecido administrativamente;

(ii) 01/01/1995 a 31/12/1995 = ora concedido na esfera recursal;

(iii) 01/01/1996 a 31/12/1997 = reconhecido administrativamente;

(iv) 01/01/1998 a 30/09/2001 = ora concedido na esfera recursal;

(v) 01/10/2001 a 31/05/2005 = não há referências postulatórias tanto em sede administrativa quanto judicial;

(v) 01/06/2005 a 30/06/2010 = extinto sem resolução do mérito;

(vi) 01/07/2010 a 31/08/2014 = ora concedido na esfera recursal;

(vii) 01/09/2014 a 31/12/2014 = reconhecido administrativamente;

(viii) 01/01/2015 a 31/12/2016 = ora concedido na esfera recursal.

Ou seja, há trabalho rural em regime de economia familiar de 01/01/1994 a 30/09/2001. Então, há interregno sem pedido de reconhecimento de aberbação na qualidade de segurado especial, seguido de extinção do feito sem resolução do mérito. E, mais um período como rural entre 01/07/2010 a 14/12/2017.

Desta feita, repiso, dentro do período de carência, qual seja, de 2002 a 2017, somente há comprovação dos 7 últimos anos, descumprindo-se, portanto, os requisitos legais de concessão do benefício previdenciário ora postulado.

Deixo de analisar o pedido, sob a hipótese de aposentadoria na modalidade 'híbrida', uma vez que a autora não detém vinculos formais de emprego (81.2).

Honorários

A parte autora obteve sucesso em parte de seu pleito, sendo-lhe reconhecidos períodos como segurada rural (de 01/01/95 a 31/12/1995, de 01/01/1998 a 30/09/2001, de 01/09/2010 a 30/08/2014 e de 01/01/2015 a 31/12/2016). Porém, o desiderato de concessão de aposentadoria não foi alcançado, mantendo a sua sucumbência.

Em razão do parcial provimento da apelação, não há falar em aplicação da majoração de honorários prevista no artigo 85, §11, do CPC.

Mantida a suspensão da exigibilidade da referida verba, por força da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor, no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC/2015, comprovar eventual alteração da situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Conclusão

Reformada a sentença para reconhecer como tempo rural os períodos de 01/01/1995 a 31/12/1995, 01/01/1998 a 30/09/2001, 01/07/2010 a 31/08/2014 e 01/01/2015 a 31/12/2016, bem como, extinguir o feito sem resolução do mérito de 01/06/2005 a 30/06/2010.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004383013v30 e do código CRC ed55127c.Informações adicionais da assinatura:
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5023692-66.2020.4.04.9999
40004383013.V30


Conferência de autenticidade emitida em 28/03/2024 08:01:45.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5023692-66.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

APELANTE: MALI PERREIRA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.

1. Tem direito à aposentadoria por idade rural a contar da data de entrada do requerimento administrativo, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que implementa os requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.

2. Não se concede a aposentadoria quando não restar demonstrado nos autos que a parte autora exerceu atividade rural nos 180 meses que antecedem o implemento do requisito etário ou anteriores ao requerimento administrativo.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 19 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004383014v6 e do código CRC 450aa6a6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA FERRO BLASI
Data e Hora: 20/3/2024, às 14:22:15


5023692-66.2020.4.04.9999
40004383014 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 28/03/2024 08:01:45.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 19/03/2024

Apelação Cível Nº 5023692-66.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES

APELANTE: MALI PERREIRA

ADVOGADO(A): RICARDO JOSÉ MORESCO (OAB SC018017)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 19/03/2024, na sequência 82, disponibilizada no DE de 08/03/2024.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 28/03/2024 08:01:45.

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