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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. ARRENDAMENTO DE PARTE DO IMÓVEL RURAL. TRF4. 0009870-08.2014.4.04.9999...

Data da publicação: 29/06/2020, 09:52:48

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. ARRENDAMENTO DE PARTE DO IMÓVEL RURAL. 1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual. 2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural. 3. O arrendamento de parte da propriedade rural não descaracteriza a condição de segurado especial, na medida em que o conjunto probatório demonstrou que o grupo familiar permaneceu laborando na parte restante do imóvel. (TRF4, APELREEX 0009870-08.2014.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 27/04/2017)


D.E.

Publicado em 28/04/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0009870-08.2014.4.04.9999/RS
RELATORA
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO
:
Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO
:
CLICERIO ANDREA BAPTISTELLA STEFANELLO
ADVOGADO
:
Adalberto Luiz Piovesan
REMETENTE
:
JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE FAXINAL DO SOTURNO/RS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. ARRENDAMENTO DE PARTE DO IMÓVEL RURAL.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. O arrendamento de parte da propriedade rural não descaracteriza a condição de segurado especial, na medida em que o conjunto probatório demonstrou que o grupo familiar permaneceu laborando na parte restante do imóvel.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa e negar provimento à apelação do INSS, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 19 de abril de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8796588v9 e, se solicitado, do código CRC A3F6A3AC.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Salise Monteiro Sanchotene
Data e Hora: 20/04/2017 15:44




APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0009870-08.2014.4.04.9999/RS
RELATORA
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO
:
Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO
:
CLICERIO ANDREA BAPTISTELLA STEFANELLO
ADVOGADO
:
Adalberto Luiz Piovesan
REMETENTE
:
JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE FAXINAL DO SOTURNO/RS
RELATÓRIO
CLICÉRIO ANDREA BAPTISTELLA STEFANELLO ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a contar do requerimento administrativo, formulado em 11/01/2011.

Na sentença (16/05/2013) foi julgado procedente o pedido, condenando-se o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural a partir de 11/01/2011. Condenou a Autarquia ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação e, ainda, a implantação do benefício no prazo de 45 dias.

O INSS apelou sustentando, em síntese, não estar comprovado o exercício de atividade rural no período de carência exigido em lei, sendo insuficiente a prova exclusivamente testemunhal. Alegou que o autor afirmou, na entrevista rural realizada, que arrenda metade de suas terras para José Rossato criar gado e, assim, frisou que a agricultura familiar é mero complemento da renda do autor. Postulou a fixação da data de início do benefício em 12/12/2012, data do encerramento da instrução, ou, subsidiariamente, em 27/06/2011, qual seja, a data de ajuizamento da ação.

Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial

Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".

O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.

Nesse sentido, as sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou assegurassem ao autor direito equivalente ao valor de sessenta salários mínimos ou mais.

A superveniência dos novos parâmetros (NCPC, art. 496, § 3º), aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença, traz a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas. Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC - a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.

No entanto, em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).

Nesses termos, em atenção ao precedente citado, o conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observará os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.

Registre-se que no caso dos autos não se pode invocar o preceito da Súmula 490 do STJ, segundo a qual a dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.

No caso concreto, o valor do proveito econômico outorgado em sentença à parte autora da demanda é mensurável por simples cálculo aritmético.

Desse modo, para aferir a aplicabilidade ou não do disposto no § 2º do art. 475 do CPC/73 em comento, é irrelevante o valor que tenha sido atribuído pela parte sua peça inicial, servindo como parâmetro o valor econômico expresso na sentença condenatória que julga a causa.

Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO. INTELIGÊNCIA DO § 2º DO ART. 475 DO CPC, COM A REDAÇÃO DA LEI 10.352/01. 1. Nos termos do art. 475, § 2º, do CPC, a sentença não está sujeita a reexame necessário quando "a condenação, ou o direito o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos". Considera-se "valor certo", para esse efeito, o que decorre de uma sentença líquida, tal como prevê o art. 459 e seu parágrafo, combinado com o art. 286 do CPC. 2. Os pressupostos normativos para a dispensa do reexame têm natureza estritamente econômica e são aferidos, não pelos elementos da demanda (petição inicial ou valor da causa), e sim pelos que decorrem da sentença que a julga. (...) 5. Embargos de divergência providos. (EREsp 600.596/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 23/11/2009)

A sentença de 21 de maio de 2015 condenou o INSS ao pagamento de aposentadoria no valor de um salário mínimo desde a data de 11 de janiero de 2011, quando manejado o requerimento administrativo (DER).

De acordo com a Planilha de Cálculos da Justiça Federal (Programa JUSPREV II - cálculo que acompanha este voto), de 11 de janeiro de 2011 a 21 de maio de 2013, a Autarquia Previdenciária não pagou à parte autora o valor de R$ 20.789,27 ( vinte mil e setecentos e oitenta e nove reais e vinte e sete centavos), atualizados monetariamente, quantia equivalente a pouco mais de 30 (trinta) salários mínimos em 2013, resultando, portanto, na condenação em montante manifestamente inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos.

Trata-se, como visto, de valor facilmente estimável, o que atribui liquidez ao julgado.

Cabe salientar que se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido.

Não por outra razão é que se toma o valor das parcelas vencidas até a data da decisão de procedência, para fins de aferição do montante da condenação sobre o qual incidirão os honorários advocatícios, nos termos da Súmula 111 do STJ. Não se aplicam à hipótese, as regras de estimativa do valor da causa. Trata-se, no momento, de condenação.

A propósito, vale colacionar as palavras do Ministro Humberto Martins no Resp 1577902 (decisão de 16-02-2016) que bem espelha a hipótese dos autos:

(...) aplica-se o entendimento de que "É líquida a sentença que contém em si todos os elementos que permitem definir a quantidade de bens a serem prestados, dependendo apenas de cálculos aritméticos apurados mediante critérios constantes do próprio título ou de fontes oficiais públicas e objetivamente conhecidas." (REsp 937.082/MG, Rei. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONA QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 13/10/2008).
(...) Dessa forma, tratando-se de titulo judicial líquido, cujo valor da condenação não supera 60 (sessenta) salários mínimos, a aplicação do disposto no art. 475, §2º, do CPC é medida que se impõe.
Ademais, apesar de o discurso da autarquia previdenciária normalmente girar em torno do argumento de que defende o interesse público, fato é que sua atuação é restrita à defesa do próprio INSS, e não do interesse público ou da sociedade." (...) (grifei)

Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor inferior a sessenta salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.

Mérito

Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.

Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.

Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.

No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).

Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.

Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.

No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.

A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.

Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.

O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.

A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.

Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.

Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 10/11/2010 (fl. 09) e requereu o benefício na via administrativa em 11/01/2011 (fl. 109). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 174 (cento e setenta e quatro) meses anteriores ao implemento do requisito etário ou nos 180 (cento e oitenta meses) anteriores ao requerimento administrativo, mesmo que de forma descontínua.

Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:

a) Certidão do registro de imóveis do município de Júlio de Castilhos, datada de 09/05/1954, dando conta do imóvel rural adquirido pelo autor em decorrência do falecimento de seu pai, consistente em 17 hectares (fls. 11 e 14);

b) Escritura de imóvel rural, consistente em 8,5 hectares, adquirido pelo requerente em 26/07/1978 (fls. 17/25);

c) Escritura de imóvel rural, adquirido pelo requerente em 18/09/1991, consistente em 10 hectares (fls. 27/28);

d) Notas fiscais de produtor rural, em nome do autor, datadas de 1997, 1998, 2002, 2003 e 2005 a 2010 (fls. 29/30, 42/43, 49/50, 52/53, 56/57, 64/65, 72/73, 80/81, 88/89, 96/97);

e) Declaração de ITR, datadas de 1997 a 2002 e 2004 a 2010 (fls. 31, 35, 37, 40, 41, 45/48, 55, 59/63, 67/71, 75/79, 83/87, 91/95, 99/104);

f) Declaração de propriedade rural, datada de 11/01/2011, dando contas das três propriedade do autor em Nova Palma, que totalizam 35,5 hectares (fl. 108).

Veio aos autos, também, declaração de exercício de atividade rural pela parte autora, no período de 01/1994 a 12/2001, firmada em 06/01/2011, pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Palma (fl. 105/106). Tal declaração, contudo, não consubstancia início de prova material, uma vez que representa mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório.

De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.

Na audiência de instrução, realizada em 12/12/2012, foram ouvidas duas testemunhas e um informante (fls. 127/130), as quais confirmaram o trabalho rural da parte autora, em regime de economia familiar, no período correspondente à carência.

Inácio Rossato Scolari disse conhecer o autor há mais de 30 anos; que desde muito pequeno, com 10 anos de idade, ele trabalha na agricultura; que planta feijão, milho, trigo, batata e mandioca para as despesas da casa; que somente o excedente é vendido; que o autor não possui maquinário nem conta com a ajuda de empregados; que somente cinco hectares são plantados.

Antonio Rossato Piovesan afirmou que conhece o requerente há mais de 30 anos; que ele trabalha na agricultura desde os dez ou doze anos de idade até os dias atuais; que a agricultura é de pequeno porte e plantam feijão, milho, trigo, batata e mandioca para o próprio gasto; que não possui maquinários nem empregados; que ocupa para plantação cerca de seis hectares.

Odacir Busatto disse que o autor trabalha desde muito pequeno na agricultura; que o conhece há mais de 30 anos; que planta feijão, milho, trigo, batata e mandioca para o próprio consumo; que o trabalho é feito a boi, sem a ajuda de empregados ou maquinário; que a plantação ocupa cerca de cinco hectares da propriedade.

A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente da atividade rural da parte autora, na condição de segurado, no período de carência legalmente exigido.

Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cuja pesquisa acompanha este voto, observa-se que o autor não possui registro de vínculos empregatícios, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, sobrevive unicamente das lidas rurais.

O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural desde longa data até, no mínimo, a ocasião em que requerido o benefício perante o INSS.

Ainda, segundo se depreende da prova carreada aos autos, o autor arrendou parte do seu imóvel rural (fl. 122). Entretanto, tal situação não é óbice ao reconhecimento de sua condição de segurado especial. Isso porque ocorreu o arrendamento apenas de parte da propriedade do requerente, sendo possível, assim, que o grupo familiar continuasse a exercer o labor agrícola na área restante.

Com a publicação, em 24-09-2003, do Decreto n. 4.845, que acrescentou o § 18.º ao art. 9.º do Regulamento da Previdência Social (Dec. n. 3.048/99), a existência de contrato de arrendamento de área de até 50% do imóvel rural não descaracteriza a condição de segurado especial do arrendador, se este permanece trabalhando na atividade agrícola.

Veja-se o teor do dispositivo em comento:

Art. 1º O art. 9º do Regulamento da Previdência social, aprovado pelo Decreto nº 3.048 de 6 de maio de 1999, passa a vigorar com as seguintes alterações:
Art. 9º (...)
§ 18. Não descaracteriza a condição de segurado especial a outorga de até cinqüenta por cento de imóvel rural, cuja área total seja de no máximo quatro módulos fiscais, por meio de contrato de parceria ou meação, desde que outorgante e outorgado continuem a exercer a respectiva atividade individualmente ou em regime de economia familiar.
Art. 2º Este Decreto entre em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de 22 de novembro de 2000 para fins da caracterização como segurado especial da Previdência Social, mas não gerando efeitos financeiros retroativos.

O próprio INSS, seguindo o determinado pelo decreto referido, alterou suas orientações internas, conferindo a seguinte redação ao § 7.º do art. 13 da Instrução Normativa INSS/DC n. 100, de 18 de dezembro de 2003:

Art. 13 (...)
§ 7º Considera-se segurado especial o parceiro outorgante proprietário de imóvel rural com área total de no máximo quatro módulos fiscais, que ceder em parceria ou meação até cinqüenta por cento da área de seu imóvel rural e continuar a exercer a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, conforme disposto no Decreto nº 4.845, de 24 de setembro de 2003, publicado no Diário Oficial da União em 25 de setembro de 2003.

Aquela disposição legal foi repetida no inciso I do § 9.º do art. 12 da Lei n. 8.212/91, introduzido pela Lei n. 11.718, de 20-06-2008.

Observo, no entanto, que antes mesmo da edição das normas acima elencadas, já era consagrado o entendimento de que o arrendamento de parte da propriedade não descaracteriza, por si só, a condição de segurado especial, de modo que a situação em comento não se presta para retirar do autor sua qualidade de rurícola.
Assim, havendo o autor completado 60 (sessenta) anos em 10/11/2010 (fl. 09) e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural por período superior a 174 (cento e setenta e quatro) meses, contados, retroativamente, de 2010, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da data do requerimento administrativo (11/01/2011 )

Termo Inicial

O termo inicial da aposentação há de ser a data do requerimento administrativo, por expressa dicção legal (art. 49, inc. II, da Lei n. 8.213/91) e em atenção ao direito adquirido (art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal), pouco importando que a prova do trabalho rural tenha sido completada em juízo.

Honorários advocatícios

Os honorários advocatícios devem ser mantidos em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, a teor das Súmulas 111 do Superior Tribunal de Justiça e 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Antecipação de tutela

Mantida a antecipação da tutela, já tendo o INSS implantando o benefício em favor da parte autora (fl. 144v.).
Conclusão

Mantida a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria por idade rural. Não conhecida a remessa necessária, pois o valor da condenação permaneceu abaixo dos 60 salários mínimos. O apelo da autarquia resta improvido.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/04/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0009870-08.2014.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00015985020118210096
RELATOR
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
PRESIDENTE
:
Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida
PROCURADOR
:
Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO
:
Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO
:
CLICERIO ANDREA BAPTISTELLA STEFANELLO
ADVOGADO
:
Adalberto Luiz Piovesan
REMETENTE
:
JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE FAXINAL DO SOTURNO/RS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/04/2017, na seqüência 588, disponibilizada no DE de 03/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
VOTANTE(S)
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria


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