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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL BOIA-FRIA. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE...

Data da publicação: 15/04/2021, 11:02:21

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL BOIA-FRIA. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO. BASE DE CÁLCULO. 1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea. 2. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural. 3. Esta Corte já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. 4. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício de atividade rural durante o período exigido em lei, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo. 5. Os honorários advocatícios devem incidir sobre o valor da condenação, o qual deve representar todo o proveito econômico obtido pelo autor com a demanda, independentemente de ter havido pagamentos de outra origem na via administrativa, numa relação extraprocessual entre o INSS e o segurado. (TRF4, AC 5026108-07.2020.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 08/04/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5026108-07.2020.4.04.9999/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: LUIZANDE SILVEIRA DE FREITAS

ADVOGADO: ANA DILENE WILHELM BERWANGER (OAB RS076496)

ADVOGADO: GABRIELA DE OLIVEIRA CARLOTTO (OAB RS100234)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de reexame necessário e apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS contra sentença publicada na vigência do novo CPC, cujo dispositivo tem o seguinte teor:

Ante ao exposto, com fulcro no art. 487 inciso I do CPC, julgo PROCEDENTE o pedido formulado por LUIZANDE SILVEIRA DE FREITAS em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL para condenar o requerido à implementação do benefício de aposentadoria por idade à parte autora, tendo em vista a condição de segurado especial e o cumprimento da carência exigida, a contar da data do requerimento administrativo (011.01.2017). Condeno, ainda, o requerido ao pagamento dos valores impagos, sobre os quais incidirão, como índice de atualização monetária, o INPC (modulação de efeitos realizada pelo STF na Questão de Ordem nas ADIs 4.357 e 4.425), além de juros, cuja incidência será única, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, admitida a compensação com valores já pagos ao Autor em caso de eventual deferimento administrativo do benefício. Condeno ainda o requerido ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação atualizado relativamente às parcelas em atraso até a data da sentença, excluídas as parcelas vincendas (Súmula 111 do STJ). Autarquia previdenciária isenta de custas. Registre-se Publique-se Intimem-se.

Acolhendo os declaratórios do INSS, o Juízo a quo decidiu que:

Assiste razão ao INSS, havendo necessidade de manifestação deste Juízo sobre os pontos elencados nos embargos declaratórios, suprindo a omissão. Esclareço que as parcelas pagas administrativamente não compõem a base de cálculo dos honorários advocatícios de sucumbência fixados na sentença. Outrossim, a sentença não fez constar a possibilidade de aplicação da deflação no cálculo de liquidação, o que desde já resta deferido, bem como não houve determinação de reexame necessário, o que se mostra necessário, consoante entendimento da Súmula nº 490 do STJ.

A parte autora recorre, alegando que é cabível a inclusão dos valores recebidos na via administrativa na base de cálculo dos honorários de sucumbência. Requer a dispensa do reexame necessário, por não estarem preenchidos os requisitos do art. 496, § 3°, I do CPC.

Em suas razões recursais, o INSS sustentaque não há nos autos início de prova material suficiente para o reconhecimento da condição de segurado especial. Aduz que o diarista rural não pode ser equiparado ao segurado especial, devendo recolher as contribuições previdenciárias como contribuinte individual para ter direito ao reconhecimento do tempo pleiteado.

Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Remessa necessária

A Turma tem decidido reiteradamente que "não está sujeita à remessa necessária a sentença proferida na vigência do CPC de 2015 quando é certo que a condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros, não excederá 1.000 (mil) salários mínimos" (5033464-24.2018.404.9999) - ARTUR CÉSAR DE SOUZA). Embora a sentença não contenha condenação líquida, é bem evidente que os atrasados compreendem parcelas vencidas, cuja soma não ultrapassa o teto de mil salários mínimos previsto no inciso I do § 3º do artigo 496 do CPC.

Juízo de admissibilidade

Os apelos preenchem os requisitos legais de admissibilidade.

Aposentadoria por Idade Rural

O exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ. Trata-se de exigência que vale tanto para o trabalho exercido em regime de economia familiar quanto para o trabalho exercido individualmente.

O rol de documentos do art. 106 da LBPS não é exaustivo, de forma que documentos outros, além dos ali relacionados, podem constituir início de prova material, que não deve ser compreendido como prova plena, senão como um sinal deixado no tempo acerca de fatos acontecidos no passado e que agora se pretendem demonstrar, com a necessária complementação por prova oral.

Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).

Sabe-se que quando a atividade rural é desenvolvida na qualidade de boia-fria, a ação deve ser analisada e interpretada de maneira sui generis, conforme entendimento já sedimentado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e ratificado pela recente decisão da sua Primeira Seção, no julgamento do REsp n.º 1.321.493/PR, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, no sentido de que, embora não se possa eximir, até mesmo o "boia-fria", da apresentação de um início de prova material, basta apresentação de prova material que ateste sua condição, mitigando a aplicação do disposto na Súmula n.º 149/STJ, porém, sem violá-la, desde que este início de prova seja complementado por idônea e robusta prova testemunhal.

Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.321.493/PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes a respeito do boia-fria:

RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.

1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.

2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.

3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.

4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.

6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso).

Ressalte-se que, no referido julgamento, o STJ manteve decisão deste Regional que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua CTPS, constando vínculo rural no intervalo de 01/06/1981 a 24/10/1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.

Outrossim, em recente decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.

2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).

3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.

4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.

5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.

6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.

7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.

(REsp 1.348.633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Primeira Seção, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014).

Caso Concreto

No caso em tela, a parte autora atingiu o requisito etário em 08/01/2017 e formulou o requerimento de aposentadoria por idade rural em 11/01/2017. Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou à entrada do requerimento administrativo ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.

Para comprovar o exercício de atividade rural, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos (Evento 3 - ANEXOS_PET4):

a) certidão de casamento celebrado no ano de 1980, indicando o autor como agricultor e sua esposa como doméstica (fl. 18);

b) notas fiscais do bloco de produtor rural do Autor dos anos de 1999 até 2016 (fls. 19/40, 42/43, 45/46, 48, 50, 52/53 e 55);

c) comprovantes de contribuição ao Sindicato Rural relativos aos anos de 1991 a 2016 (fls. 57/71);

d) comprovante de propriedade de imóvel rural (fls.72/79);

e) declaração de terceiro informando a condição do Autor de trabalhador rural em regime de economia familiar (fl. 84).

Os documentos acima citados são suficientes para servirem como início de prova material.

Na audiência de instrução e julgamento, realizada em 18/06/2019, foram ouvidas três testemunhas (evento 2 - APROP_CEF3, fl. 31), as quais foram uníssonas ao afirmar que o autor sempre exerceu atividade rural, na condição de diarista, e que depende do trabalho agrícola para a sua sobrevivência. Nesse sentido, bem assentou o Juízo a quo, ao prolatar a sentença, na parte que a seguir reproduzo:

A testemunha PEDRO ZAMBARDA referiu que o autor é agricultor, bem como que fazia parceria com o mesmo e que, nas horas vagas, o autor trabalhava como diarista. Alegou que o autor trabalhou como diarista para várias pessoas. Aduziu que o autor nunca se afastou da atividade rural. Apontou que o autor cuidava de gado, da lavoura, plantava. Disse que o autor era pago em dinheiro e, às vezes, em troca de mercadorias.
No mesmo sentido, a testemunha DARCI SILVA aduziu que o autor trabalha com várias pessoas, em tudo quanto é serviço, no campo, na lavoura. Apontou que o autor trabalha por dia. Referiu que algumas vezes já contratou o autor, e que o pagava por dia. Relatou que o sustento do autor vem deste trabalho rural, eis que sua esposa trabalha como diarista também.
ALFIRO FAGUNDES disse que o autor labora na área rural, como diarista, trabalhando em parceria e também plantando e colhendo. Referiu que o autor já trabalhou para várias pessoas conhecidas. Alegou que a esposa do autor também trabalha na lavoura.

Como se vê, restou comprovado o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima, pois a parte autora juntou aos autos início de prova material em nome próprio. Ademais, as testemunhas foram uníssonas no sentido de complementar os indícios documentais colacionados, mencionando o labor rural desempenhado pelo autor, na condição de diarista rural, no período de carência. Portanto, deve ser mantida a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria por idade rural, desde a data do requerimento administrativo (11/01/2017).

Quanto ao alegado pela Autarquia Previdenciária de que o trabalhador rural deve ser enquadrado como contribuinte individual, saliento que esta Corte já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial, de que trata o art. 11, VII, da 8.213/91, sendo dispensado o recolhimento das contribuições para fins de obtenção do benefício. Neste sentido:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. BOIA-FRIA. CARÊNCIA DE AÇÃO. PRÉVIO INGRESSO NA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. INTERESSE DE AGIR. PRETENSÃO RESISTIDA. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL COMPROVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. A falta de prévio ingresso na via administrativa não é óbice para que o segurado especial, na qualidade de boia-fria, postule diretamente, em juízo, a concessão de benefício previdenciário, em relevância da situação hipossuficiente intrínseca à sua natureza. Ademais, na hipótese dos autos, o Instituto demandado impugnou o mérito da ação, opondo resistência à pretensão pleiteada na inicial. 2. Tratando-se de trabalhadora rural que desenvolve a atividade na condição de boia-fria, o pedido deve ser analisado e interpretado de maneira sui generis, porquanto a jurisprudência tem se manifestado no sentido de acolher, em tal situação, a prova exclusivamente testemunhal (art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil). 3. Demonstradas a maternidade, a atividade rural e a qualidade de segurada especial durante o período de carência, tem direito a autora à percepção do salário-maternidade. 4. Versando a causa sobre o benefício de salário-maternidade, esses devem corresponder a R$ 510,00. No caso, o valor da condenação restringe-se a doze salários mínimos, sendo que o arbitramento da verba honorária em 20% sobre esse montante implicaria aviltação ao trabalho do patrono da autora. Mantidos os honorários fixados pelo juízo a quo, para evitar reformatio in pejus, bem como o aviltamento da remuneração do profissional que atuou na causa. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015249-66.2010.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, D.E. 22/11/2010)

Correção monetária e Juros de mora

Após o julgamento do RE n. 870.947 pelo Supremo Tribunal Federal (inclusive dos embargos de declaração), a Turma tem decidido da seguinte forma.

A correção monetária incide a contar do vencimento de cada prestação e é calculada pelos seguintes índices oficiais: [a] IGP-DI de 5-1996 a 3-2006, de acordo com o artigo 10 da Lei n. 9.711/1998 combinado com os §§ 5º e 6º do artigo 20 da Lei n. 8.880/1994; e, [b] INPC a partir de 4-2006, de acordo com a Lei n. 11.430/2006, que foi precedida pela MP n. 316/2006, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n. 8.213/1991 (o artigo 31 da Lei n. 10.741/2003 determina a aplicação do índice de reajustamento do RGPS às parcelas pagas em atraso).

A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo naquele julgamento. No recurso paradigma foi determinada a utilização do IPCA-E, como já o havia sido para o período subsequente à inscrição do precatório (ADI n. 4.357 e ADI n. 4.425).

O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.

É importante registrar que os índices em questão (INPC e IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947): 64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.

A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação, a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E aos de natureza assistencial.

Os juros de mora devem incidir a partir da citação. Até 29-6-2009 à taxa de 1% ao mês (artigo 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987), aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar (Súmula n. 75 do Tribunal).

A partir de então, deve haver incidência dos juros até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, de acordo com o artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/1997, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 11.960/2009. Eles devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez".

Honorários Advocatícios

A verba honorária deverá incidir mesmo com o reconhecimento administrativo do benefício no decorrer da ação, uma vez que a autarquia deu causa ao ajuizamento do feito.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. Extinto o feito por perda superveniente do objeto, a parte ré, por ter dado causa ao ajuizamento da ação, deve arcar com os encargos decorrentes, em atenção ao princípio da causalidade. (TRF4, AC 0018070-38.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/03/2015)

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. BASE DE CÁLCULO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE DE ABATIMENTO DE VALORES. COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS NA AÇÃO PRINCIPAL E NA EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. É possível a manutenção do benefício concedido administrativamente no curso da ação e, concomitantemente, a execução das parcelas do benefício postulado na via judicial até a data da implantação administrativa. 2. Considerando a condenação em sua parte principal, mesmo que o título executivo não preveja o abatimento, sobre o montante devido na condenação, dos valores recebidos a título de outros benefícios inacumuláveis, tem-se que tal desconto deve ser considerado para fins de execução dos valores em atraso do segurado, sob pena de o Judiciário chancelar enriquecimento sem causa deste, o que seria totalmente despropositado. 3. Contudo, deve-se ter em mente que o desconto dos valores pagos na via administrativa ocorre unicamente para evitar o enriquecimento sem causa do segurado. Isso significa que a necessidade de proceder a esse abatimento de valores não se aplica em outras situações, tais como no caso do cálculo dos honorários advocatícios, que, diga-se, pertencem ao advogado (art. 23 da Lei 8.906/94 - Estatuto da OAB). Em relação à verba honorária em demandas previdenciárias, tendo sido fixada pelo título executivo em percentual sobre o valor da condenação, o "valor da condenação" para esse fim deve representar todo o proveito econômico obtido pelo autor com a demanda, independentemente de ter havido pagamentos de outra origem na via administrativa, numa relação extraprocessual entre o INSS e o segurado. 4. Inviável a compensação da verba honorária fixada na ação principal com a fixada nos embargos à execução (TRF4, Embargos Infringentes Nº 0000568-57.2011.404.9999, 3ª Seção, de minha relatoria, D.E. 25/10/2011). (TRF4, AC 0023607-78.2014.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 18/02/2015)

APELAÇÃO CIVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. BASE DE CÁLCULO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ABATIMENTO DAS VERBAS RECEBIDAS NA VIA ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE. VERBA AUTÔNOMA DO ADVOGADO. 1. A compensação de verbas devidas em razão de aposentadoria por tempo de serviço concedida judicialmente com aquelas recebidas, administrativamente, a título de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez não tem o condão de excluir as primeiras do valor da condenação, sobre o qual incidirá a verba honorária. Precedentes da Corte. 2. Dispõe o art. 23 da Lei nº 8.906/94 que "os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor". 3. Pode-se dizer, portanto, que o título judicial contém dois credores: o autor, em relação ao principal; e o advogado, quanto à verba honorária. São créditos distintos, de titularidade de pessoas diversas, o que por si só afasta a vinculação entre ambos, no caso de renúncia quanto à execução do valor principal ou na hipótese de não haver diferenças a título de principal, face ao abatimento das parcelas já recebidas administrativamente, devendo ser apurado o valor da condenação, mesmo que por cálculo hipotético, apenas para dimensionar o valor dos honorários, sob pena de se aviltar o direito do advogado, autônomo em relação ao principal. (TRF4, AC 0001973-26.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 17/11/2014)

O apelo da parte autora deve ser provido, reformando-se a sentença, no ponto.

No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):

É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:

a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;

b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;

c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.

No caso concreto, com relação ao apelo do INSS, estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.

Assim, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios em 50% sobre o valor anteriormente fixado.

Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)

A renda mensal do benefício, em face da ausência de efeito suspensivo de qualquer outro recurso, deve ser implementada em 45 dias a partir da intimação. A parte interessada deverá indicar, em 10 dias, o eventual desinteresse no cumprimento do acórdão.

Conclusão

- remessa necessária não conhecida;

- recurso do INSS desprovido;

- apelo da parte autora provido para afastar o reexame necessário, bem como para estabelecer que a base de cálculo da verba honorária deve abarcar todo o valor da condenação, inclusive os valores recebidos na via administrativa.

- verba honorária majorada conforme o art. 85, §11, do NCPC;

- determinada a imediata implantação do benefício.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por não conhecer do reexame necessário, dar provimento à apelação da parte autora, negar provimento ao recurso do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão.



Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002384741v18 e do código CRC 16bf909f.Informações adicionais da assinatura:
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5026108-07.2020.4.04.9999
40002384741.V18


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5026108-07.2020.4.04.9999/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: LUIZANDE SILVEIRA DE FREITAS

ADVOGADO: ANA DILENE WILHELM BERWANGER (OAB RS076496)

ADVOGADO: GABRIELA DE OLIVEIRA CARLOTTO (OAB RS100234)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL BOIA-FRIA. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO. honorários advocatícios. reconhecimento administrativo. base de cálculo.

1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea.

2. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.

3. Esta Corte já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário.

4. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício de atividade rural durante o período exigido em lei, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo.

5. Os honorários advocatícios devem incidir sobre o valor da condenação, o qual deve representar todo o proveito econômico obtido pelo autor com a demanda, independentemente de ter havido pagamentos de outra origem na via administrativa, numa relação extraprocessual entre o INSS e o segurado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer do reexame necessário, dar provimento à apelação da parte autora, negar provimento ao recurso do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 30 de março de 2021.



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5026108-07.2020.4.04.9999
40002384742 .V4


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 23/03/2021 A 30/03/2021

Apelação Cível Nº 5026108-07.2020.4.04.9999/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO

SUSTENTAÇÃO DE ARGUMENTOS: JANE LUCIA WILHELM BERWANGER por LUIZANDE SILVEIRA DE FREITAS

APELANTE: LUIZANDE SILVEIRA DE FREITAS

ADVOGADO: GABRIELA DE OLIVEIRA CARLOTTO (OAB RS100234)

ADVOGADO: ANA DILENE WILHELM BERWANGER (OAB RS076496)

ADVOGADO: JANE LUCIA WILHELM BERWANGER (OAB RS046917)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/03/2021, às 00:00, a 30/03/2021, às 14:00, na sequência 1014, disponibilizada no DE de 12/03/2021.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DO REEXAME NECESSÁRIO, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



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