Apelação Cível Nº 5013709-43.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OLDINA DE ALMEIDA
RELATÓRIO
OLDINA DE ALMEIDA ajuizou ação ordinária contra o INSS em 13/06/2019, postulando a concessão de aposentadoria rural por idade, desde a DER (11/03/2019), mediante o reconhecimento do período de gozo de auxílio-doença (24/04/2015 a 31/01/2019).
A sentença (Evento 22), proferida em 03/07/2020, julgou procedente o pedido, nos seguintes termos dispositivos:
Diante de todo o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos veiculados na inicial, para o fim de RECONHECER o efetivo exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, na condição de segurada especial, por parte de OLDINA DE ALMEIDA, pelo tempo de carência exigido, e, consequentemente, restando preenchidos os requisitos legais, DECLARAR seu direito à aposentadoria por idade, nos termos dos arts. 48 e 49 da Lei. 8.213/91, a contar da data do requerimento administrativo (11/03/2019).
CONDENO a autarquia requerida ao pagamento retroativo do benefício, acrescendo-se às parcelas vencidas e não pagas correção monetária desde quando devidas, e juros moratórios a contar da citação.
A correção monetária deverá se dar pelo INPC e, quanto aos juros moratórios, deverão ser observados os mesmos índices aplicáveis à Caderneta de Poupança.
Honorários advocatícios:
São devidos honorários pelo INSS no percentual de 10% das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 do TRF4.
Custas processuais:
O INSS é isento de custas.
Responde, a autarquia, pela integralidade das despesas processuais.
Disposições finais
Havendo recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para contrarrazões e, após, remetam-se os autos ao Egrégio TRF-4.
Sentença não sujeita a reexame necessária, porquanto o proveito econômico obtido pela parte autora, aferível por simples cálculo, não atinge o limite previsto no art. 496, §3º, I, do CPC.
O INSS apelou (Evento 26), alegando que o período de auxílio-doença não pode ser considerado como carência para fins de concessão de aposentadoria por idade como rurícola. Afirma que a autora somente conta com os 167 meses de atividade rural reconhecidos administrativamente, aquém dos 180 necessários.
Com contrarrazões, veio o processo a este Tribunal.
VOTO
Sentença não sujeita ao reexame necessário
MÉRITO
A sentença assim examinou a controvérsia:
Partindo dessas premissas, cumpre consignar que são considerados como prova material:
a) Contratos de arrendamento e de parceria rural, com vigências de março de 1999 a março de 2005 e de setembro de 2005 a setembro de 2010, respectivamente (fls. 20/21);
b) Matrícula de fração de imóvel rural adquirida pela autora em 11/12/2013 (fls. 22/26);
c) Certificado de cadastro de imóvel rural utilizado pela autora, relativos aos exercícios de 2006, 2007, 2008 e 2009 (fl. 27);
d) Escritura pública de inventário e partilha, em que a autora figura como inventariante e herdeira de fração de imóvel rural, lavrada em 11/12/2013 (fls. 28/29);
e) Notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas em nome da autora, relativas aos períodos de 05/2000 a 01/2014 e de 03/2019 (fls.30/53);
Além disso, a prova testemunhal produzida por ocasião da justificação (fls. 81/91) veio a corroborar a documentação juntada aos autos, restando explicitado que a autora sempre exerceu atividade rural em regime de economia familiar enquanto possuía condições de saúde para tanto, tendo retomado o labor rural tão logo cessou sua condição incapacitante, em 2019.
Cabe assinalar, no caso, que a autora esteve em gozo de benefício de auxílio-doença de 24/04/2015 a 31/01/2019, sendo certo que a possibilidade de cômputo de tal interregno para efeito de carência, quando intercalado por períodos de efetivo exercício de labor rural, decorre de expressa disposição legal1, não havendo margem para interpretação diversa, quanto menos em desfavor do segurado.
Ao encontro desse entendimento, oportuno colacionar a ementa do julgamento proferido no Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº Nº 5004482-98.2013.4.04.7113/RS, do TRF-4:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CARÁTER NÃO CONTRIBUTIVO. PERÍODOS DE AUXÍLIO-DOENÇA. APROVEITAMENTO PARA CONTAGEM DE TEMPO EM APOSENTADORIA RURAL POR IDADE QUANDO INTERCALADOS POR EXERCÍCIO DE ATIVIDADE QUE QUALIFIQUE O REQUERENTE COMO SEGURADO ESPECIAL. POSSIBILIDADE. 1. Tratando-se de benefício de caráter não contributivo, como é a aposentadoria por idade do trabalhador rural, é possível que seja computado no tempo de carência os períodos de gozo de auxílio-doença, desde que intercalados com períodos de exercício de atividade que qualifique o requerente como segurado especial. 2. Incidente da parte autora conhecido e provido. (TRF4 5004482-98.2013.404.7113, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Leonardo Castanho Mendes, juntado aos autos em 24/02/2016) (grifei).
No caso vertente, as notas fiscais de fls.30/53 e a propriedade sobre imóvel rural de fls.22/23 já se revelariam suficientes para comprovar o exercício de labor rural por parte da autora, em regime de economia familiar, intercaladamente ao período de fruição de benefício por incapacidade.
Como visto, a despeito da conclusão exarada pelo Autarquia ré no processo administrativo, existe nos autos início de prova documental suficiente para atestar que a autora, desde, pelo menos, o ano de 2000, até a data do requerimento administrativo (11/03/2019), desenvolveu atividades agrícolas em regime de economia familiar, nos termos do que prevê o art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, de forma intercalada com período de percepção de benefício de auxílio-doença na qualidade de segurada especial.
O tempo de trabalho rural desenvolvido pela autora, somado ao interregno em que ela esteve em gozo de auxílio-doença, perfaz aproximadamente 20 (vinte) anos, computáveis para efeito de carência, tempo mais que suficiente para autorizar o acolhimento do pedido de aposentadoria formulado na inicial.
Observo que, conforme corretamente apontado pela autora na inicial, a controvérsia se limita à possibilidade do cômputo de gozo de auxílio-doença para fins de carência. Isso porque, conforme salientado na própria apelação, a Autarquia já computou os demais períodos como atividade rural, tanto antes como depois do gozo de auxílio-doença (Evento 26-APELAÇÃO-1).
O INSS reconheceu em favor da autora como atividade rural em regime de economia familiar os lapsos de 01/12/2000 a 13/04/2003, 01/01/2004 a 23/04/2015 e 01/02/2019 a 11/03/2019. Os intervalos não reconhecidos são um pequeno lapso de atividade urbana (14/04/2003 a 31/12/2003) e o lapso de fruição de auxílio-doença (24/04/2015 a 31/01/2019).
CÔMPUTO DE PERÍODOS DE AUXÍLIO-DOENÇA PARA FINS DE CARÊNCIA
O Supremo Tribunal Federal apreciou a controvérsia em recurso submetido à sistemática da repercussão geral (RE 583.834), estabelecendo que o cômputo do auxílio-doença somente é possível quando o período de afastamento é intercalado com atividade laborativa, ou seja, quando há recolhimento de contribuições. O julgado foi assim ementado:
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. CARÁTER CONTRIBUTIVO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. COMPETÊNCIA REGULAMENTAR. LIMITES.
1. O caráter contributivo do regime geral da previdência social (caput do art. 201 da CF) a princípio impede a contagem de tempo ficto de contribuição.
2. O § 5º do art. 29 da Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) é exceção razoável à regra proibitiva de tempo de contribuição ficto com apoio no inciso II do art. 55 da mesma Lei. E é aplicável somente às situações em que a aposentadoria por invalidez seja precedida do recebimento de auxílio-doença durante período de afastamento intercalado com atividade laborativa, em que há recolhimento da contribuição previdenciária. Entendimento, esse, que não foi modificado pela Lei nº 9.876/99.
3. O § 7º do art. 36 do Decreto nº 3.048/1999 não ultrapassou os limites da competência regulamentar porque apenas explicitou a adequada interpretação do inciso II e do § 5º do art. 29 em combinação com o inciso II do art. 55 e com os arts. 44 e 61, todos da Lei nº 8.213/1991.
4. A extensão de efeitos financeiros de lei nova a benefício previdenciário anterior à respectiva vigência ofende tanto o inciso XXXVI do art. 5º quanto o § 5º do art. 195 da Constituição Federal. Precedentes: REs 416.827 e 415.454, ambos da relatoria do Ministro Gilmar Mendes. 5. Recurso extraordinário com repercussão geral a que se dá provimento.
(RE 583834, Tribunal Pleno, Rel. Ayres Brito, 14/02/2012)
No caso, tendo o próprio INSS reconhecido os períodos anteriores e posteriores ao auxílio-doença, não há motivo para deixar de reconhecer o período de fruição de benefício por incapacidade para fins de carência.
Noto, por fim, que o breve período de emprego com registro em CTPS não obsta a concessão, por se tratar de um lapso muito curto, cerca de oito meses. Mantém-se a sentença.
CONSECTÁRIOS
Majoração dos honorários de sucumbência
Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo negado provimento ao recurso, majoro os honorários fixados na sentença em 20%, observados os limites máximos das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85.
Os demais consectários foram todos fixados conforme o entendimento desta Corte.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
CONCLUSÃO
Negado provimento à apelação. Majoração da verba honorária.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001955460v9 e do código CRC d32f4d18.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 9/9/2020, às 19:43:11
Conferência de autenticidade emitida em 18/09/2020 04:01:20.
Apelação Cível Nº 5013709-43.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OLDINA DE ALMEIDA
EMENTA
previdenciário. aposentadoria por idade rural. utilização de auxílio-doença para fins de carência. possibilidade. implantação.
1. Possibilidade de cômputo do período de auxílio-doença para fins de carência, desde que intercalado entre períodos contributivos. Tema 88 do STF.
2. Ordem para implantação imediata do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de setembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001955461v5 e do código CRC 7e758025.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 9/9/2020, às 19:43:11
Conferência de autenticidade emitida em 18/09/2020 04:01:20.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 01/09/2020 A 09/09/2020
Apelação Cível Nº 5013709-43.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OLDINA DE ALMEIDA
ADVOGADO: LORIVAL FALLER (OAB RS085580)
ADVOGADO: JUCELIA APARECIDA SEGALLA (OAB RS064595)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/09/2020, às 00:00, a 09/09/2020, às 14:00, na sequência 288, disponibilizada no DE de 21/08/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 18/09/2020 04:01:20.