Apelação Cível Nº 5006225-55.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MARCOS SEEFELD (AUTOR)
RELATÓRIO
A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a Data de Entrada do Requerimento - DER, mediante o reconhecimento da especialidade das atividades laborais nos períodos de 01/01/1986 a 28/02/1991 e de 15/05/1989 a 01/06/1990, como médico empregado, e de 28/03/1987 em diante, como médico autônomo, e de 23/11/1992 em diante, como professor, e, ainda, por meio da averbação dos períodos comuns de 16/02/1976 a 31/01/1978, 01/01/1986 a 28/08/1991 e 15/05/1989 a 01/06/1990, e a partir de 28/03/1987, como autônomo, e a partir de 23/11/1992, como professor.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 15/03/2019, cujo dispositivo tem o seguinte teor (ev. 89):
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, homologo o reconhecimento parcial da procedência do pedido, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, III, a, do Código de Processo Civil quanto ao cômputo dos períodos como empregado de 16/02/1976 a 31/01/1978, de 01/01/1986 a 14/05/1989, de 23/11/1992 a 22/06/2018 e como contribuinte individual de 01/11/1991 a 22/06/2018, e quanto ao restante julgo parcialmente procedente o pedido, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, o que faço para 1) condenar o INSS a averbar a) como tempo de contribuição urbano, na qualidade de empregado, o período de 09/02/1990 a 28/08/1991, observado o artigo 32 da Lei nº 8.213/91 quanto ao intervalo de 09/02/1990 a 01/06/1990; b) como tempo de contribuição urbano como contribuinte individual, de 28/03/1987 a 31/12/1988, computando-se as respectivas contribuições; c) como tempo especial, os períodos de 01/01/1986 a 14/05/1989, de 09/02/1990 a 01/06/1990 e de 01/11/1991 a 22/06/2018; 2) reconhecer o direito do autor à aposentadoria integral por tempo de contribuição, mediante aplicação dos critérios de cálculos vigentes nas datas de a) 16/12/1998 - EC 20/98, b) 28/11/1999 - Lei nº 9.876/99, e c) 22/01/2016 - DER; 3) condenar o INSS a efetuar os cálculos correspondentes às três datas em que reconhecido o direito do autor à aposentadoria, incluindo os valores vencidos desde a DER, corrigidos nos termos da fundamentação, a fim de viabilizar o exercício do direito de opção ao benefício mais vantajoso; e 4) condenar o INSS a implantar o benefício escolhido pelo autor, pagando-lhe as parcelas vencidas, corrigidas nos termos da fundamentação.
Dada a sucumbência mínima da parte autora, nos termos do artigo 86, parágrafo único, do Novo Código de Processo Civil, condeno o INSS ao pagamento integral dos honorários sucumbência fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, §3°, do Novo Código de Processo Civil, dependendo da apuração do montante em eventual cumprimento de sentença, sempre observando o §5° do artigo 85 do CPC. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4).
Condeno o INSS ainda a restituir as custas antecipadas pelo autor (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96).
Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões, por 15 dias. Com ou sem elas, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4º Região, conforme artigo 1.010, §3°, do NCPC.
Em que pese ilíquida a sentença, o valor da condenação claramente é inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Assim, dispensado o reexame necessário, nos termos do artigo 496, §3°, I, do NCPC.
Intimem-se.
Os embargos de declaração da parte autora foram providos, para suprir omissão quanto ao exame da especialidade do período de 09/02/1990 a 28/02/1991, bem como para corrigir erro material no cálculo do tempo de contribuição (ev. 89).
O INSS apelou alegando que a comprovação do labor urbano deve seguir o disposto nos arts. 55, §3º, da Lei nº 8.213/1991 e 62, §1º e §2º, do Decreto nº 3.048/1999. Aduziu que as anotações da CTPS não preponderam sobre os dados do CNIS. Afirmou que a correção de eventuais equívocos no CNIS dependem de validação administrativa pelo INSS, a ser feita por servidor da autarquia. Aduziu que não houve prova de habitualidade e permanência em atividades nocivas. Afirmou que não foi preenchida a idade para aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos do artigo 201, §7º, II, da Constituição Federal. Impugnou os índices dos consectários legais (ev. 94).
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Prescrição Quinquenal
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de caráter alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito.
Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação, conforme os termos da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
Averbação de Períodos Urbanos
A sentença examinou as provas e decidiu a questão nos seguintes termos, quanto à averbação dos períodos urbanos (ev. 89):
Do tempo como empregado não computado
O autor postula a averbação do tempo prestado ao RGPS não computado na aposentadoria estatutária. De acordo com a informação prestada pela autarquia estadual, teriam sido utilizados os períodos prestados a dois empregadores do RGPS: a Faculdade Evangélica do Paraná (de 01/03/1979 a 30/11/1979, de 03/03/1980 a 29/11/1980, de 04/03/1981 a 30/11/1981, de 01/03/1982 a 30/11/1982, 01/03/1983 a 30/11/1983 e de 01/03/1984 a 30/11/1984) e a Secretaria Estadual de Saúde - SESA, com a qual o autor manteve vínculo celetista de 15/05/1989 a 08/02/1990.
Os períodos cuja averbação ainda é controvertida teriam sido prestados a outros dois empregadores: Hospital Evangélico, de 15/05/1989 a 28/08/1991, e Fundação Caetano Munhoz da Rocha, de 15/05/1989 a 01/06/1990.
Não há óbice à multiplicidade de vínculos empregatícios ou mesmo ao desempenho de múltiplas atividades, inclusive sob diferentes categorias de contribuinte da Previdência Social. A lei veda somente a contagem do tempo em duplicidade (art. 96, I, L. 8.213/91). Ainda assim prevê tratamento diferenciado para as atividades concomitantes no tocante ao cálculo do salário de benefício - art. 32, L. 8.213/91.
A vedação à contagem dúplice obsta, no caso, o cômputo do período de 15/05/1989 a 08/02/1990, correspondente ao tempo de trabalho prestado à Secretaria Estadual de Saúde e já computado para a concessão da aposentadoria estatutária. O tempo remanescente, de 09/02/1990 a 28/08/1991, não foi computado para fins de concessão da aposentadoria estatutária. O INSS considera inviável o cômputo, invocando a vedação legal à contagem em duplicidade.
Sobre o tema, confira-se a redação dos artigos 94 e 96 da Lei nº 8.213/91:
Art. 94. Para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente.
§ 1o A compensação financeira será feita ao sistema a que o interessado estiver vinculado ao requerer o benefício pelos demais sistemas, em relação aos respectivos tempos de contribuição ou de serviço, conforme dispuser o Regulamento.
...
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes;
III - não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro;
IV - o tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de zero vírgula cinco por cento ao mês, capitalizados anualmente, e multa de dez por cento.
Note-se que o art. 96, II, da Lei nº 8.213/91 não foi interpretado pela jurisprudência pátria como óbice para recebimento de aposentadoria em regimes diversos, desde que, para tanto, não sejam utilizadas contribuições aproveitadas para um regime também em outro, por meio da contagem recíproca. Neste sentido, a seguinte ementa:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. PERÍODOS CONCOMITANTES. MANDATO ELETIVO. OPÇÃO DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES DE FORMA INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE. 1. Os artigos 94 e 96, da Lei nº 8.213/91, não proíbem toda e qualquer contagem de tempos de serviço concomitantes, prestados um como celetista e outro como estatutário; ao contrário, vedam unicamente a utilização de um destes períodos, por meio da contagem recíproca, para acréscimo de tempo de serviço e percepção de benefício no regime do outro. Precedentes. Havendo o autor laborado concomitantemente em atividades vinculadas a regimes previdenciários próprio e geral, pode o tempo de serviço referente ao RGPS ser utilizado como período contributivo para a concessão e cálculo da RMI de aposentadoria por idade urbana. 2. ... (TRF4, APELREEX 0011168-35.2014.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 20/03/2017)
Assim, faz jus o autor à averbação do período prestado ao RGPS e não utilizado pelo Regime Próprio.
No período a ser averbado verifica-se a concomitância parcial, de 09/02/1990 a 01/06/1990. Tal período deve ser, por óbvio, computado uma única vez, observando o artigo 32 da Lei nº 8.213/91 no que toca aos critérios de cálculo do salário de contribuição.
Procedente o pedido, no ponto, fazendo jus o autor à averbação do período de 09/02/1990 a 28/08/1991, observado o artigo 32 da Lei nº 8.213/91 quanto ao intervalo de 09/02/1990 a 01/06/1990.
Do tempo como autônomo/contribuinte individual não computado
Como visto, persiste a lide quanto à possibilidade de averbação do tempo de contribuição como contribuinte individual de 28/03/1987 a 31/10/1991.
De acordo com o extrato do CNIS (evento 19, PROCADM 1, p. 43-44), não constam recolhimentos como contribuinte individual antes de 01/04/2003. Trata-se da data em que entrou em vigor o art. 4º da Lei nº 10.666/03, a transferir à empresa a obrigação do recolhimento das contribuições do autônomo que lhe prestasse serviços. O regime legal dos recolhimentos do autônomo/contribuinte individual variou ao longo do período cuja averbação persiste litigiosa.
A Lei nº 3.807/60, com a redação dada pela Lei nº 6.887/80, estabelecia um sistema de responsabilidade dúplice, impondo ao tomador de serviços ressarcir o autônomo no valor correspondente a 8% da retribuição até o limite de um salário-de-contribuição e, superado esse valor, impunha-lhe a obrigação de recolher contribuição de 8% sobre o excedente. Assim, a responsabilidade pelo recolhimento da contribuição até o limite de um salário-de-contribuição recaía sobre o segurado, cabendo ao tomador de serviços apenas ressarci-lo. Conquanto o ônus econômico fosse transferido, a obrigação tributária ainda cabia ao trabalhador autônomo. Em sua redação original, a Lei nº 8.212/91 manteve a responsabilidade do autônomo pelos recolhimentos, sem ressarcimento ou recolhimento da empresa sobre o excedente.
À vista dessas alterações legislativas, verifica-se que para todo o período em litígio competia ao autor, na qualidade de contribuinte individual, efetuar os recolhimentos. Compete-lhe, portanto, a prova dos recolhimentos, bem como do desempenho da atividade para fins de cômputo do tempo correspondente. Se inexistentes os recolhimentos, admite-se ainda o cômputo do tempo mediante indenização e comprovado o efetivo desempenho do trabalho, mas sem efeitos para fins de carência (art. 27, II, L. 8.213/91).
O autor instruiu a inicial com discriminativos de pagamento de serviços do antigo MPAS/INAMPS abrangendo as seguintes competências (evento 1, OUT 19):
» de 03/1987 a 12/1987 (p. 7-16)
» de 01/1988 a 12/1988 (p. 40-51)
No mesmo arquivo (evento 1, OUT 19), constam recibos e declarações, a indicar a prestação de serviço como médico autônomo nas dependências do Hospital Evangélico. Tais documentos, conquanto indiquem o pagamento pelos serviços, não provam os recolhimentos à Previdência Social de responsabilidade do próprio autônomo na época. Como dito, a falta de comprovação dos recolhimentos não impede a averbação do tempo, mas a condiciona à efetiva indenização e, mesmo indenizado o tempo, não pode ele ser computado para fins de carência.
A estes documentos, somam-se:
a) Carnês de recolhimento ao INSS, referentes ao período de 11/1991 a 12/1997 (evento 1, CARNE_INSS 8, p. 1-52);
b) guias de recolhimento do contribuinte individual - GRCI de 01/1998 a 06/1999 (evento 1, CARNE_INSS 8, p. 53-69);
c) guias da previdência social - GPS de 07/1999 a 04/2003, de 11/2004, 02/2005 e 04/2008 (evento 1, CARNE_INSS 8, p. 70-115);
d) diploma de médico, expedido pela Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná em 22/12/1984, registrado no Ministério da Educação e Cultura - MEC em 24/01/1985 e no Conselho Regional de Medicina em 0102/1985 (evento 1, OUT 9);
e) declaração do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba de que o autor prestaria serviços como autônomo desde 1987 (evento 1, DECL 14);
f) alvará expedido pela Prefeitura Municipal de Curitiba, concedendo licença de localização ao autor para prestação de serviços como médico autônomo, de 09/01/1986 (evento 1, ALVARA 17);
g) correspondência emitida pelo INSS confirmando o recadastramento do autor como contribuinte individual, indicada a ocupação de médico (evento 1, OUT 18, p. 1);
h) carnê do ISS, exercício 1997, do Município de Curitiba/PR, constando como ramo de atividade "Médico autônomo" (evento 1, OUT 18, p. 2);
i) comunicação da UNIMED CURITIBA dirigida ao autor, informando discrepância entre os valores indicados no CNIS e aqueles constantes das GFIPs, acompanhada de quadro-resumo dos valores e guias correspondentes (evento 1, DECL 20);
j) declaração emitida pelo Conselho Regional de Medicina do Paraná - CRM/PR confirmando o pagamento pelo autor das anuidades referentes ao período de 1985 a 2017 (evento 32, DECL 3);
k) extratos de internações e altas de pacientes sob responsabilidade do autor, abrangendo os meses de 09/1995, 11/1995, 12/1995 e 01/1996 (evento 32, OUT 7, p. 5-9);
l) extratos de internações e altas de pacientes sob responsabilidade do autor, referentes aos meses de 04/2002 a 07/2002(evento 32, OUT 7, p. 12-28);
m) duas cartas relatando atendimento médico, sendo uma datada de 18/09/1997 e outra de 01/04/992 (evento 32, CARTA 8).
À vista desses documentos, pode-se concluir pelo desempenho da profissão de médico também como autônomo ao longo dos períodos pleiteados e cuja averbação não conflita com a vedação à contagem dúplice - de 28/03/1987 a 31/12/1988 e de 01/11/1991 a 22/06/2018. Este último período, como visto, foi objeto de reconhecimento administrativo.
Nesse contexto, parcialmente procedente o pedido, fazendo jus o autor à averbação, como tempo de contribuinte individual, de 28/03/1987 a 31/12/1988, computando-se as respectivas contribuições.
Nesse ponto, o INSS apelou alegando que a comprovação do labor urbano deve seguir o disposto nos arts. 55, §3º, da Lei nº 8.213/1991 e 62, §1º e §2º, do Decreto nº 3.048/1999. Aduziu que as anotações da CTPS não preponderam sobre os dados do CNIS. Afirmou que a correção de eventuais equívocos no CNIS dependem de validação administrativa pelo INSS, feita por servidor da autarquia.
Sem razão.
O art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/1991, dispunha o seguinte, na redação vigente à época da sentença (sublinhei):
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Atualmente, a redação é a seguinte (sublinhei):
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento.
Por sua vez, o art. 62, §1º e §2º, do Decreto nº 3.048/1999 (Regulamento da Previdência Social), dispunha o seguinte, à época da sentença:
Art. 62. A prova de tempo de serviço, considerado tempo de contribuição na forma do art. 60, observado o disposto no art. 19 e, no que couber, as peculiaridades do segurado de que tratam as alíneas "j" e "l" do inciso V do caput do art. 9º e do art. 11, é feita mediante documentos que comprovem o exercício de atividade nos períodos a serem contados, devendo esses documentos ser contemporâneos dos fatos a comprovar e mencionar as datas de início e término e, quando se tratar de trabalhador avulso, a duração do trabalho e a condição em que foi prestado.
§ 2o Subsidiariamente ao disposto no art. 19, servem para a prova do tempo de contribuição que trata o caput:
I - para os trabalhadores em geral, os documentos seguintes:
a) o contrato individual de trabalho, a Carteira Profissional, a Carteira de Trabalho e Previdência Social, a carteira de férias, a carteira sanitária, a caderneta de matrícula e a caderneta de contribuições dos extintos institutos de aposentadoria e pensões, a caderneta de inscrição pessoal visada pela Capitania dos Portos, pela Superintendência do Desenvolvimento da Pesca, pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas e declarações da Secretaria da Receita Federal do Brasil;
b) certidão de inscrição em órgão de fiscalização profissional, acompanhada do documento que prove o exercício da atividade;
c) contrato social e respectivo distrato, quando for o caso, ata de assembléia geral e registro de empresário; ou
d) certificado de sindicato ou órgão gestor de mão-de-obra que agrupa trabalhadores avulsos;
II - de exercício de atividade rural, alternativamente:
a) contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
b) contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
c) declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou, quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo INSS;
d) comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA;
e) bloco de notas do produtor rural;
f) notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 24 do art. 225, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
g) documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
h) comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção;
i) cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural;
j) licença de ocupação ou permissão outorgada pelo INCRA; ou
l) certidão fornecida pela Fundação Nacional do Índio - FUNAI, certificando a condição do índio como trabalhador rural, desde que homologada pelo INSS.
III - contrato social e respectivo distrato, quando for o caso, ata de assembléia geral e registro de firma individual;
IV - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
V - certificado de sindicato ou órgão gestor de mão-de-obra que agrupa trabalhadores avulsos;
VI - comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, no caso de produtores em regime de economia familiar;
VII - bloco de notas do produtor rural; ou
VIII - declaração de sindicato de trabalhadores rurais ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo Instituto Nacional do Seguro Social.
§ 3º Na falta de documento contemporâneo podem ser aceitos declaração do empregador ou seu preposto, atestado de empresa ainda existente, certificado ou certidão de entidade oficial dos quais constem os dados previstos no caput deste artigo, desde que extraídos de registros efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização do Instituto Nacional do Seguro Social.
O art. 19, a que o dispositivo acima faz referência, tem esta redação:
Art. 19. Os dados constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS relativos a vínculos, remunerações e contribuições valem como prova de filiação à previdência social, tempo de contribuição e salários-de-contribuição.
De início, aponto que o art. 62, §1º e §2º, do Decreto nº 3.048/1999, está atualmente revogado pelo Decreto nº 10.410/2020, razão por que não serve de lastro à argumentação recursal. De todo modo, o próprio dispositivo regulamentar dispunha (como se nota do trecho acima sublinhado) que a Carteira de Trabalho e Previdência Social é prova subsidiária para comprovação das informações do CNIS. Logo, havendo divergências nos dados do CNIS, é, sim, possível utilizar-se da CTPS como meio de prova para a respectiva correção.
Ainda, a alteração da redação do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, feita pela Lei nº 13.848, de 18.06.2019, no sentido de exigir prova material contemporânea, é posterior à DER e, inclusive, à sentença, não podendo prejudicar o segurado detes autos. Ainda assim, não desfavorece o autor, pois as provas trazidas aos autos, elencadas com precisão na sentença, são contemporâneas ao período pretendido, considerado o conjunto do acervo probatório.
Quanto à alegada preponderância do CNIS sobre a CTPS, o entendimento da jurisprudência é no sentido contrário ao postulado no apelo, considerando-se possível reconhecer o período de atividade urbana em vista da presunção relativa de veracidade da carteira de trabalho e previdência social - CTPS, sendo desnecessário haver registro de contribuições no CNIS. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. CTPS. PROVA PLENA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. ATIVIDADE ESPECIAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELA RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados, devendo a prova em contrário ser inequívoca. 2. a 6. (...) (TRF4, AC 5051359-32.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 24/05/2019)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. CTPS. PROVA PLENA. PERÍODO DE GRAÇA. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. (...) 2. O tempo de serviço urbano pode ser comprovado por documentação idônea, gozando as anotações em CTPS de presunção juris tantum de veracidade. É ônus do empregador os recolhimentos das contribuições devidas que, se não efetuadas, não pode implicar em ônus ao empregado. 3. a 5. (...) (art. 85, §11, CPC). (TRF4, AC 5000104-12.2016.4.04.7108, QUINTA TURMA, Relator ADRIANE BATTISTI, juntado aos autos em 16/05/2019)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS LEGAIS. CARÊNCIA. ATIVIDADE URBANA. CTPS. DUAS APOSENTADORIAS. REGIMES DISTINTOS. CONVERSÃO EM PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. a 2. (...) 3. A anotação na CTPS comprova, para todos os efeitos, o tempo de contribuição, a filiação à Previdência Social e o vínculo empregatício alegados, porquanto goza de presunção juris tantum de veracidade, nos termos da Súmula 12/TST. 4. a 5. (...) (TRF4 5024173-05.2015.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 15/04/2019)
Por fim, o argumento de que a correção de equívocos no CNIS depende de validação administrativa feita por servidor do INSS não prospera, haja vista que, se é dado à autarquia, de modo unilateral, corrigir erros nos registros do CNIS, tanto mais é dado ao Poder Judiciário fazê-lo mediante contraditório, em face da inafastabilidade do acesso à jurisdição e do controle judicial de atos administrativos.
No restante, a argumentação do recorrente é genérica, não apontando concretamente equívocos ou incorreções nos períodos averbados na sentença.
Em suma, nego provimento ao apelo do INSS nestes pontos.
Atividade Especial
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado, que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998 (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05.04.2011).
Tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28.4.1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29.4.1995 e até 5.3.1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 5.3.1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 6.3.1997, quando vigente o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99.
d) a partir de 1.1.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7.11.2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18.5.2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8.1.2010).
Equipamentos de Proteção Individual - EPI
A Medida Provisória n° 1.729/98 (posteriormente convertida na Lei 9.732/1998) alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha i) informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, e ii) recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Por esse motivo, em relação à atividade exercida no período anterior a 03.12.1998 (data da publicação da referida Medida Provisória), a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. O próprio INSS já adotou esse entendimento na Instrução Normativa n° 45/2010 (artigo 238, § 6º).
Em período posterior a 03.12.1998, foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal a existência de repercussão geral quanto ao tema (Tema 555). No julgamento do ARE 664.335 (Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, DJe 12.2.2015), a Corte Suprema fixou duas teses: 1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; 2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. Ou seja: nos casos de exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI, ou de menção em laudo pericial à neutralização de seus efeitos nocivos, uma vez que os equipamentos eventualmente utilizados não detêm a progressão das lesões auditivas decorrentes; em relação aos demais agentes, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência da utilização de EPI's é admissível, desde que estejam demonstradas no caso concreto a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade e, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador.
A matéria foi objeto de exame por esta Corte no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR Tema 15), tratando da eficácia dos EPI's na neutralização dos agentes nocivos. O acórdão foi assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) 5054341-77.2016.404.0000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Jorge Antonio Maurique,11.12.2017)
Como se vê, foi confirmado o entendimento acerca da necessidade de prova da neutralização da nocividade dos agentes agressivos, sendo relacionados ainda outras hipóteses em que a utilização de EPI não descaracteriza o labor especial (além do ruído, já afastado pela decisão do STF), consoante o seguinte trecho do voto condutor:
Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:
a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:
Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:
'§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)'
b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:
b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)
b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)
b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017)
Em suma, de acordo com a tese fixada por esta Corte no IRDR 15:
- quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, há a especialidade do período de atividade;
- quando a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, há possibilidade de questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI;
- a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: i) em períodos anteriores a 3.12.1998; ii) quando há enquadramento legal pela categoria profissional; iii) em relação aos agentes nocivos: ruído, biológicos, cancerígenos (como asbestos e benzeno) e periculosos (como eletricidade).
Outrossim, nos demais casos, mesmo que o PPP consigne a eficácia do EPI, restou garantida ao segurado a possibilidade de discutir a matéria e produzir provas no sentido de demonstrar a ineficácia do EPI e a permanência da especialidade do labor.
Por fim, entendo que os riscos à saúde ou exposição a perigo não podem ser gerados pelo próprio trabalhador, ou que se tenha na conduta do trabalhador o fator fundamental de agravamento de tais riscos. Ou seja, podendo tomar conduta que preserve a incolumidade física, opta por praticar conduta que acentue os riscos, concorrendo de forma acentuada na precariedade das condições de trabalho. Esse entendimento aplica-se principalmente nos casos de profissionais autônomos que negligenciam com seus ambientes de trabalho, não curando com seus próprios interesses, e com isso, posteriormente, imputam ao Estado os ônus de tal negligência.
Agentes Biológicos
De acordo com o entendimento fixado pela 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, é possível o reconhecimento da especialidade do labor exercido sob exposição a agentes biológicos nocivos:
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. - Tendo o embargante logrado comprovar o exercício de atividade em contato com agentes biológicos, de 01-03-1979 a 02-03-1987, 03-04- 1987 a 16-01-1989 e 15-02-1989 a 07-05-1997, faz jus ao reconhecimento da especialidade dos períodos, com a devida conversão, o que lhe assegura o direito à concessão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço proporcional, desde a data do requerimento administrativo, efetuado em 08-05-1997. (TRF4, EIAC 1999.04.01.021460-0, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, DJ 05.10.2005)
No mesmo sentido o entendimento desta Turma Regional Suplementar (TRF4, AC 5005415-63.2011.4.04.7009, Relator Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 20.08.2018).
Ademais, é firme o entendimento de que a utilização de Equipamento de Proteção Individual não afasta o reconhecimento da especialidade do trabalho exposto a tais agentes nocivos:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. PROVA DA EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. UTILIZAÇÃO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONTAGEM DE TEMPO COMUM PARA APOSENTADORIA ESPECIAL. BENEFÍCIO POSTERIOR À LEI Nº 9.032/1995. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TUTELA ESPECÍFICA. HONORÁRIOS. PREQUESTIONAMENTO. 1 a 8. (...) 9. Para fins de reconhecimento de atividade especial, em razão da exposição a agentes biológicos, não se exige comprovação do contato permanente a tais agentes nocivos, pressupondo-se o risco de contaminação, ainda que o trabalho tenha sido desempenhado com a utilização de EPI. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. 10. a 14. (...) (TRF4 5038030-56.2013.4.04.7100, 5ª T., Rel. Des. Federal Osni Cardoso Filho, 10.08.2018)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELA RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA. 1 a 3 (...). 4. A exposição a agentes biológicos não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho para caracterização da especialidade do labor, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco de contaminação. Ainda que ocorra a utilização de EPIs, eles não são capazes de elidir o risco proveniente do exercício da atividade com exposição a agentes de natureza infecto-contagiosa. 5 a 6. (...) (TRF4, AC 5005224-96.2013.4.04.7122, 6ª T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, 06.08.2018)
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. CABIMENTO. COISA JULGADA. AFASTADA. PRESCRIÇÃO PARCIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. AVERBAÇÃO DE TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS E BIOLÓGICOS. AFASTAMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. INCONSTITUCIONALIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. PRECEDENTE DO STF NO RE Nº 870.947. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. 1 a 10. (...). 11. Os riscos de contágio por agentes biológicos não são afastados pelo uso de EPI. 12 a 14. (...) (TRF4 5082278-82.2014.4.04.7000, Turma Regional Suplementar do PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 23.04.2018).
No que concerne especificamente às atividades desenvolvidas no âmbito hospitalar, expostas a agentes biológicos nocivos, encontram enquadramento nos códigos 1.3.2 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; 1.3.4 do Anexo I ao Decreto n.º 83.080/79; 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto n.º 2.172/97; e 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto n.º 3.048/99.
Outrossim, em se tratando de agentes biológicos, concluiu-se, no bojo de IRDR (Tema nº 15 deste Tribunal Regional Federal), ser dispensável a produção de prova sobre a eficácia do EPI, pois, segundo o item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS no ano de 2017, aprovado pela Resolução nº 600, de 10/08/2017, "como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação."
Além disso, "a exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes (TRF4, APELREEX 5002443-07.2012.404.7100/RS, 6ª T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, 26.07.2013). "Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente (TRF4, AC nº 2000.04.01.073799-6/PR, 6ª T., Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09.05.2001).
Conforme dispõe a NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao tratar da exposição a agentes biológicos em seu Anexo XIV, são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados.
Caso concreto
Fixadas estas premissas, prossegue-se com o exame dos períodos questionados.
No caso dos autos, a controvérsia diz respeito à especialidade de 01/01/1986 a 14/05/1989, 09/02/1990 a 01/06/1990 e 01/11/1991 a 22/06/2018.
A sentença examinou as provas e decidiu a questão com exatidão, mediante fundamentos com os quais concordo e utilizo como razões de decidir, nos seguintes termos (ev. 89):
Período: de 01/01/1986 a 28/02/1991
Empresa: Hospital Evangélico do Paraná/Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba
Atividade: médico
Agentes nocivos: enquadramento e biológicos
Documentos: CTPS (evento 19, PROCADM 1, p. 14) e formulário (evento 19, PROCADM 2, p. 1)
A anotação em CTPS confirma a contratação do autor como médico plantonista em 01/01/1986 com data de saída em 28/02/1991. Dada a utilização do período posterior na concessão da aposentadoria estatutária, o termo final da análise fica limitado a 14/05/1989
À época vigorava a possibilidade de enquadramento, constando a profissão de médico do item 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64 e 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79. Caracterizada, portanto, a especialidade por enquadramento.
A empregadora emitiu PPP abrangendo o período e indicando exposição habitual, porém intermitente, a agentes biológicos. O formulário informa o fornecimento de EPIs. Como visto, em se tratando de agentes biológicos a permanência da exposição não é essencial à caracterização da especialidade. Também não afasta a especialidade o fornecimento de EPI. Assim, caracterizada a especialidade também por exposição a agentes biológicos.
Parcialmente procedente o pedido, caracterizada a especialidade de 01/01/1986 a 14/05/1989.
Período: 15/05/1989 a 01/06/1990
Empresa: Fundação Caetano Munhoz da Rocha
Atividade: médico
Agentes nocivos: enquadramento
Documentos: CTPS (evento 19, PROCADM 1, p. 15)
A anotação em CTPS confirma a contratação do autor como médico em 15/05/1989, com data de saída em 01/06/1990. O termo inicial do período sob análise fica restrito a 09/02/1990, dada a utilização do período precedente na concessão da aposentadoria estatutária.
À época vigorava a possibilidade de enquadramento, constando a profissão de médico do item 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64 e 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79. Caracterizada, portanto, a especialidade por enquadramento.
Parcialmente procedente o pedido, no ponto, caracterizada a especialidade para o período de 09/02/1990 a 01/06/1990.
Período: de 23/11/1992 a 22/01/2016 (DER)
Empresa: Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba
Atividade: professor
Agente nocivo: enquadramento e químicos
Documentos: CTPS (evento 19, PROCADM 1, p. 15 e 24) e formulário (evento 19, PROCADM 2, p. 3)
A anotação em CTPS confirma a contratação do autor como professor em 23/11/1992, sem indicação da data de saída. O termo final do período sob análise corresponde à data de entrada do requerimento administrativo.
A empresa emitiu PPP a confirmar o desempenho da atividade professor, dividida em dois períodos: de 23/11/1992 a 01/12/1999, como professor auxiliar, e de 02/12/1999 em diante como professor assistente. As atividades atribuídas eram, entretanto, idênticas: ministrar aulas teóricas, elaborar e aplicar provas, corrigir e transmitir as notas à Secretaria. O formulário aponta, para essas atividades, exposição habitual e intermitente a agentes químicos - giz (calcário e sílica), sabão líquido e pó de giz.
Como visto, até 28/04/1995 vigorava a possibilidade de reconhecimento da especialidade por enquadramento da categoria profissional. O Decreto nº 53.831/64 enquadrava a atividade de magistério em seu item 2.1.4, sem qualquer especificação. Assim, resta caracterizada a especialidade, por enquadramento profissional, de 23/11/1992 a 28/04/1995.
No tocante aos agentes químicos, cumpre notar que o próprio PPP indica exposição intermitente, circunstância que obsta o reconhecimento da especialidade no tocante a essa categoria de agentes.
Parcialmente procedente o pedido, no ponto, caracterizada a especialidade por enquadramento de 23/11/1992 a 28/04/1995.
A sentença acima foi complementada pela decisão proferida em sede de embargos de declaração, cujos fundamentos igualmente agrego como razões de decidir do presente voto (ev. 101):
1) Omissão quanto à especialidade do período de 09/02/1990 a 28/02/1991, prestado ao Hospital Evangélico.
Da sentença embargada extraem-se os seguintes trechos:
"De acordo com a informação prestada pela autarquia estadual, teriam sido utilizados os períodos prestados a dois empregadores do RGPS: a Faculdade Evangélica do Paraná (de 01/03/1979 a 30/11/1979, de 03/03/1980 a 29/11/1980, de 04/03/1981 a 30/11/1981, de 01/03/1982 a 30/11/1982, 01/03/1983 a 30/11/1983 e de 01/03/1984 a 30/11/1984) e a Secretaria Estadual de Saúde - SESA, com a qual o autor manteve vínculo celetista de 15/05/1989 a 08/02/1990.
...
A vedação à contagem dúplice obsta, no caso, o cômputo do período de 15/05/1989 a 08/02/1990, correspondente ao tempo de trabalho prestado à Secretaria Estadual de Saúde e já computado para a concessão da aposentadoria estatutária. O tempo remanescente, de 09/02/1990 a 28/02/1991, não foi computado para fins de concessão da aposentadoria estatutária."
Ao analisar da especialidade do período trabalhado para o Hospital Evangélico, o Juízo fez constar:
"A anotação em CTPS confirma a contratação do autor como médico plantonista em 01/01/1986 com data de saída em 28/02/1991. Dada a utilização do período posterior na concessão da aposentadoria estatutária, o termo final da análise fica limitado a 14/05/1989."
O correto é, descontado o tempo já utilizado na aposentadoria estatutária, considerar o vínculo com Hospital Evangélico partido em dois períodos computáveis: de 01/01/1986 a 14/05/1989 e de 09/02/1990 a 28/02/1991. O primeiro foi analisado e teve sua especialidade reconhecida. Pende a análise do segundo.
Registro que o período faltante ainda se submetia ao enquadramento por categoria, incidentes na espécie os Decretos nº 53.831/64 (item 2.1.3) e 83.080/79 (anexo II, item 2.1.3).
Procedente o pedido, no ponto, fazendo jus o autor ao cômputo, como especial, do período de 09/02/1990 a 28/02/1991.
O argumento recursal do INSS no sentido da necessidade de exposição habitual e permanente a agentes biológicos nocivos foi refutado em tópico anterior da fundamentação deste voto.
Assim, nego provimento à apelação neste ponto.
Aposentadoria por tempo de contribuição
Mantida a sentença no mérito, conservo a decisão quanto ao cômputo do tempo de contribuição, feita deste modo, após correção de erro material conforme decisão proferida em sede de embargos de declaração (ev. 101):
2) Erro material
Com efeito, o fator de conversão adotado para o período de 24/04/2012 a 22/01/2016 - 0,4 - não é o correto, devendo ser grafado 1,4 considerando que o período em questão não foi objeto de averbação administrativa.
Ante a supressão da omissão e a correção do erro material, tem-se nova contagem de tempo para a aposentadoria:
RECONHECIDO NA FASE ADMINISTRATIVA | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | 21 | 1 | 15 | ||
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | 22 | 0 | 27 | ||
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 22/01/2016 | 3 | 8 | 29 | ||
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL | ||||||
Obs. | Data Inicial | Data Final | Anos | Meses | Dias | |
T. Comum | 16/02/1976 | 31/01/1978 | 1,0 | 1 | 11 | 16 |
T. Especial | 01/01/1986 | 14/05/1989 | 1,4 | 4 | 8 | 20 |
T. Especial | 09/02/1990 | 01/06/1990 | 1,4 | - | 5 | 8 |
T. Comum | 02/06/1990 | 28/02/1991 | 1,4 | 1 | - | 14 |
T. Especial | 01/11/1991 | 23/04/2012 | 1,4 | 28 | 8 | 2 |
T. Especial | 24/04/2012 | 22/01/2016 | 1,4 | 5 | 2 | 29 |
Subtotal | 42 | 0 | 29 | |
RESULTADO FINAL | ||||
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | 39 | 3 | 4 |
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | 41 | 6 | 15 |
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 22/01/2016 | 45 | 9 | 28 |
RECONHECIDO NA FASE ADMINISTRATIVA | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | 21 | 1 | 15 | ||
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | 22 | 0 | 27 | ||
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 22/01/2016 | 3 | 8 | 29 | ||
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL | ||||||
Obs. | Data Inicial | Data Final | Anos | Meses | Dias | |
T. Comum | 16/02/1976 | 31/01/1978 | 1,0 | 1 | 11 | 16 |
T. Especial | 01/01/1986 | 14/05/1989 | 1,4 | 4 | 8 | 20 |
T. Especial | 09/02/1990 | 01/06/1990 | 1,4 | - | 5 | 8 |
T. Comum | 02/06/1990 | 28/02/1991 | 1,4 | 1 | - | 14 |
T. Especial | 01/11/1991 | 23/04/2012 | 1,4 | 28 | 8 | 2 |
T. Especial | 24/04/2012 | 22/01/2016 | 1,4 | 5 | 2 | 29 |
Subtotal | 42 | 0 | 29 | |
RESULTADO FINAL | ||||
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | 39 | 3 | 4 |
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | 41 | 6 | 15 |
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 22/01/2016 | 45 | 9 | 28 |
Por oportuno, registro a ocorrência de outro erro material, quanto à grafia do termo final do período prestado ao Hospital Evangélico - Sociedade Beneficente Evangélica, pois na sentença embargada constou equivocadamente a data de 28/08/1991, quando o correto é 28/02/1991 - como indicado no pedido inicial.
Por fim, destaco que as alterações resultantes do acolhimento dos embargos não alteram as conclusões acerca do direito do autor à aposentadoria, nos moldes já firmados na sentença embargada. Com efeito, a nova contagem pouco difere da original, o que se explica pela concomitância parcial dos períodos trabalhados para o Hospital Evangélico e a Fundação Caetano Munhoz da Rocha.
Ademais, mantenho as conclusões da sentença acerca do exame dos requisitos para a concessão do benefício pretendido, as quais já refutam a alegação do INSS sobre a necessidade de idade mínima para o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, devendo-se apenas ajustar o cômputo do tempo contributivo de acordo com a decisão dos embargos de declaração, acima elencada. Veja-se a sentença, quanto aos temas em apreço (ev. 89):
Somando 42 anos, 3 meses e 12 dias, o autor faz jus à aposentadoria integral por tempo de serviço desde 22/01/2016 (DIB = DER). Verifica-se que o autor havia atendido ao tempo mínimo exigido para a aplicação das regras vigentes ao tempo EC 20/98, bem como ao tempo da Lei nº 9.876/99, fazendo jus à opção entre tais possibilidades.
A previsão de idade mínima nas regras permanentes da aposentadoria no RGPS, inicialmente prevista no projeto de emenda Constitucional, não foi aprovada, razão pela qual não é de ser exigida. Assim, restou esvaziada a possibilidade de opção pela regra de transição do art. 9º da emenda, a não ser no que toca à aposentadoria proporcional. Isso porque pelas regras temporárias do art. 9º o segurado tem que preencher não só um tempo adicional de contribuição (pedágio), mas também a idade mínima de 53 anos, ou 48 anos se mulher, não previstos nas regras permanentes. Portanto, mais favorável ao segurado que possui 35 anos de contribuição, ou 30 anos se mulher, a aposentadoria pelo novo regime instaurado a partir da Emenda Constitucional nº 20/98, se comparado com o regime instituído pela regra de transição. Nesse sentido, a lição dos magistrados federais Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, in Comentários à Lei de Benefícios de Previdência Social, Editora Livraria do Advogado, p. 183/184:
"Aos segurados já filiados à Previdência, ofertava-se uma regra de transição, mas para quem ingressar no sistema após a publicação da emenda seria possível, em tese, jubilar-se com 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, no caso das mulheres, independente do implemento do requisito etário (art. 201, § 7º, incisos I e II).
Com a derrubada do dispositivo que previa a idade mínima nas regras permanentes e sua manutenção apenas na regra transitória, criou-se uma situação esdrúxula, especialmente diante da possibilidade de opção pela aposentadoria de acordo com a regra permanente ou temporária (EC nº 20, art. 9º). É que, optando pela regra temporária, o segurado necessita atender ao requisito idade mínima e do pedágio. Pela regra permanente, restou esvaziada a regra temporária, a não ser no caso de aposentadoria proporcional, pois nenhum segurado irá optar pela regra temporária.
Derrotado politicamente no Congresso Nacional, ainda assim buscou o Poder Executivo a implantação da idade mínima. Primeiro, tentando forçar uma interpretação de que os incisos I e II do art. 201 da Constituição, com a redação dada pela EC 20, apresentam requisitos cumulativos, de modo que por ela estabelecidas para o Regime Geral de Previdência Social, discrepantemente mais benéficas em face da supressão total do requisito etário, elucubrou-se um outro viés para forçar o retardamento das aposentadorias: o fator previdenciário do qual tratamos nos comentários ao artigo 29."
Assim, não há que se invocar a idade mínima como óbice à aplicação dos critérios de cálculo vigentes à época da EC 20/98 ou da Lei nº 9.876/99.
Consectários da Condenação
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 810, RE 870.947, Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (embargos de declaração rejeitados sem modulação dos efeitos em 03.10.2019, trânsito em julgado em 03.03.2020), e do Superior Tribunal de Justiça no Tema 905, REsp. 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 , item "3.2" da decisão e da tese firmada.
Juros Moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29.06.2009;
b) a partir de 30.06.2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Tutela Antecipada
Quanto à antecipação dos efeitos da tutela, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (TRF4, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7, Rel. para Acórdão, Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 9.8.2007).
Assim sendo, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, após a manifestação de opção pela parte autora.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação a artigos do Código de Processo Civil e da Constituição Federal, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação do INSS: improvida;
- de ofício, é determinada a implantação do benefício no prazo de 45 dias, após a manifestação de opção pela parte autora
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002791795v8 e do código CRC f12a6eb7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 1/10/2021, às 9:54:48
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Apelação Cível Nº 5006225-55.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MARCOS SEEFELD (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria por tempo de contribuIção. Atividade especial. agentes nocivos. reconhecimento. conversão. AGENTES BIOLÓGICOS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DA CTPS.
É possível averbar o período de atividade como empregado, sem registro no CNIS ou recolhimento de contribuições previdenciárias pelo empregador, se devidamente anotado na carteira de trabalho e previdência social - CTPS, em vista da presunção relativa de veracidade das anotações nela constantes.
A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.
Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
Conforme entendimento firmado pela 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal, é cabível o reconhecimento da especialidade do trabalho exercido sob exposição a agentes biológicos. A exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente.
Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a conversão dos períodos de atividade especial, a partir da data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal.
Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de setembro de 2021.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002791798v3 e do código CRC 06877f20.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 21/09/2021 A 28/09/2021
Apelação Cível Nº 5006225-55.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MARCOS SEEFELD (AUTOR)
ADVOGADO: REGINA DE CÁSSIA BARBATO FABBRIS DA SILVA GONÇALVES (OAB PR054935)
ADVOGADO: RODRIGO CESAR BARBATO FABBRIS DA SILVA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 21/09/2021, às 00:00, a 28/09/2021, às 16:00, na sequência 775, disponibilizada no DE de 09/09/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
SUZANA ROESSING
Secretária
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