Apelação/Remessa Necessária Nº 5015024-29.2013.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MOACIR ANTONIO MENDES DA LUZ
RELATÓRIO
Trata-se de apelação do INSS contra sentença que julgou procedente o pedido inicial (evento 75), para:
"(...) Pelo exposto, acolho o pedido, na forma do art. 269, I, do CPC, para:
a) reconhecer o labor em condições especiais nos períodos de 24/03/1982 a 05/07/1983 e de 10/11/1988 a 28/04/1995;
b) reconhecer o direito à conversão em comuns dos tempos especiais agora reconhecidos, pelo fator de conversão 1,4;
c) condenar o INSS na obrigação de implantar o benefício de aposentadoria por contribuição do autor, com RMI de 100% do salário de benefício e aplicação do fator previdenciário, nos moldes da fundamentação;
d) condenar também o INSS a pagar as prestações em atraso desde a primeira DER (01/16/2011), corrigidas monetariamente desde o vencimento de cada parcela, pelo IGP-DI (art. 10 da Lei nº 9.711/98) e, a partir de abril de 2006, pelo INPC, aplicando-se juros de mora de 1% (um por cento) ao mês desde a citação;
e) condenar ainda o INSS ao pagamento de honorários advocatícios de 10% do valor das prestações devidas até a data da sentença".
O INSS recorre com o objetivo de excluir os períodos especiais reconhecidos na sentença e de modificar os critérios de atualização monetária e de juros (evento 80).
Com as contrarrazões (evento 83), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Remessa Oficial
A sentença recorrida foi publicada em data anterior a 18.03.2016, quando passou a vigorar o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.03.2015).
Nos termos do artigo 475 do Código de Processo Civil (1973), está sujeita à remessa ex officio a sentença prolatada contra as pessoas jurídicas de direito público nele nominadas, à exceção dos casos em que, por simples cálculos aritméticos, seja possível concluir que o montante da condenação ou o direito controvertido na causa é inferior a 60 salários mínimos.
Na hipótese dos autos, não sendo possível verificar de plano se o valor da condenação ou do direito controvertido excede ou não o limite legal de 60 salários mínimos (vigente à época da prolação da sentença), aplica-se a regra geral da remessa ex officio.
Atividade Especial
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo e. STJ em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado - que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998: REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 5-4-2011)
Isso posto, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28-4-1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), n° 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29-4-1995 e até 5-3-1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 5-3-1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova - considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 6-3-1997, quando vigente o Decreto n° 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n° 1.523/96 (convertida na Lei n° 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos n° 2.172/97 (Anexo IV) e n° 3.048/99.
d) a partir de 1-1-2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
No caso dos autos, a controvérsia diz respeito à especialidade - ou não - dos períodos de 24/03/1982 a 05/07/1983 e de 10/11/1988 a 28/04/1995.
A sentença resolveu a questão controvertida desta forma:
"(...) Dos períodos controversos.
A parte autora pretende o reconhecimento da especialidade dos períodos trabalhados de 24/03/1982 a 05/07/1983 e de 10/11/1988 a 28/04/1995.
No primeiro período (de 24/03/1982 a 05/07/1983) o autor trabalhou na empresa Plastipar Indústria e Comércio Ltda (atualmente Hettich do Brasil Ltda), no setor de 'estamparia', como auxiliar de produção, exposto a ruído de 98 dB(A), conforme consta no PPP anexado no evento 68, PROCADM2, fls. 14 e 15.
O INSS não reconheceu a especialidade desse período alegando que a técnica de aferição do ruído estava em desacordo com a metodologia definida na IN 45.
No evento 11 foi anexado laudo técnico da empresa elaborado em outubro de 1993, no qual estão expressos os níveis de ruído no setor de 'estamparia' (evento 11, LAU2, fl. 3)
Nesse setor, foi aferido o nível de ruído em 31 pontos, num total de 115 medições, variando entre 74 a 96 dB (A). Dessas, 98 estavam acima do limite de tolerância de 80 dB(A) vigente até 05/03/1997.
Se por um lado o valor de 98 dB(A), expresso no PPP (evento 68, PROCADM2, fls. 14 e 15), foi obtido através de técnica que não obedece ao estabelecido pela IN 45, por outro lado, ante a proporção explicitada no item anterior, qualquer que fosse a metodologia aplicada resultaria numa média superior a 80 dB(A).
Assim, tenho por reconhecida a especialidade do período de 24/03/1982 a 05/07/1983, ente a exposição do autor a ruído acima do limite de 80 dB(A) vigente até 05/03/1997.
No segundo período (de 10/11/1988 a 28/04/1995) o autor trabalhou na empresa Disapel Eletrodomésticos Ltda, como motorista, conforme consta no formulário anexado no evento 68 (PROCADM2, fls. 4/5).
O INSS não reconheceu a especialidade desse período alegando que o formulário não informa a intensidade do ruído e que a exposição a agentes químicos não era permanente.
Na CTPS do autor anexada no evento 1 (CTPS15, fl. 5) está anotado o vínculo do autor com a Disapel Eletrodomésticos Ltda, como motorista e nas alterações salariais não há registro de que sua função tenha sido alterada. A CTPS ainda traz a informação de que no vínculo anterior (Lojas Macabi) o autor já teria passado a exercer a função de motorista (evento 68, PROCADM1, fl. 25). O próprio INSS não contesta em nenhum momento a função exercida pelo autor, limitando-se a alegar a ausência de informação acerca dos agentes nocivos ou a intermitência da exposição a eles.
Assim, reconheço a especialidade também do período de 10/11/1988 a 28/04/1995, ante o enquadramento do autor no código 2.4.4 do quadro a que se refere o art. 2º do Decreto 53.831/64".
O INSS impugna os períodos reconhecidos, sob os argumentos de que a técnica de aferição do ruído no primeiro intervalo está em desacordo com a metodologia definida na IN 45, e que no segundo período não há prova suficiente do modelo de caminhão dirigido pela parte autora.
Contudo, conforme bem fundamentado na sentença recorrida, a prova produzida para o intervalo de 24/03/1982 a 05/07/1983 (evento 68, PROCADM2, fls. 14/15) demonstra que, ainda que se tivesse observado a metodologia prevista na IN 45, a média de ruído seria superior a 80 dB(A). A medição que embasa o PPP aferiu o nível de ruído em 115 medições realizadas em 31 pontos no ambiente de trabalho, variando entre 74 a 96 dB (A). Dessas, 98 medições estavam acima do limite de tolerância de 80 dB(A). Logo, resta demonstrada a especialidade para o período
Por sua vez, no intervalo de 10/11/1988 a 28/04/1995, o INSS impugna a validade do formulário juntado como prova (evento 68, PROCADM1, fl. 25), que descreve que, no desempenho de suas funções, o autor dirigia um caminhão trucado 15 ton. ou uma carreta, para a entrega de mercadorias. Ainda que o formulário tenha sido preenchido e assinado pelo síndico da massa falida do ex-empregador, o documento cumpre os seus requisitos formais e é firmado pelo representante legal da empresa, contendo dados que se presumem extraídos de documentos existentes em seu arquivo. Logo, e não tendo o INSS produzido prova em contrário, presumem-se verdadeiras as descrições contidas no formulário, sobre o desempenho da atividade específica de motorista de caminhão (o que é compatível com a atividade de motorista anotada na CTPS e com a natureza das atividades do ex-empregador, uma empresa distribuidora).
Desse modo, não procede o recurso do INSS no ponto.
Consectários da Condenação
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de 04/2006 (Lei n.º 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213/91), conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20.11.2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20.3.2018.
Juros Moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29.06.2009;
b) a partir de 30.06.2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, consoante decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20.11.2017, e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJE de 20.03.2018.
Ônus Sucumbenciais
Mantidos os ônus sucumbenciais conforme fixados na sentença.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes aos Tribunais Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos dispositivos na fundamentação do voto.
Conclusão
a) a remessa necessária e a apelação do INSS são parcialmente providas, apenas nos critérios de juros e atualização monetária.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000596519v9 e do código CRC 6a144efd.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5015024-29.2013.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MOACIR ANTONIO MENDES DA LUZ
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL EXPOSIÇÃO A RUÍDOS. MOTORISTA DE CAMINHÃO. ENQUADRAMENTO PELA CATEGORIA PROFISSIONAL ATÉ 28.04.1995. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS.
1. Atividade especial. Até 28.04.1995, é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional ou a indicação do agente agressivo; a partir de 29.04.1995, é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional, nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; e, a contar de 06.05.1997, a comprovação deve ser feita por formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por perícia técnica.
2. Considera-se como especial a atividade em que o segurado esteve exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até a data de 5.3.1997, por conta do enquadramento previsto nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Com a edição do Decreto 2.172/97, o limite passou a ser 90 decibéis, sendo reduzido para 85 decibéis, a contar de 19.11.2003, consoante previsto no Decreto 4.882/2003.
3. A atividade de motorista de ônibus ou de caminhão é enquadrada por categoria profissional até 28.04.1995. A parte autora comprova o desempenho da atividade.
4. Critérios de correção monetária e juros de mora consoante precedentes dos Tribunais Superiores (STF, RE 870.947 e STJ REsp 1.492.221).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 29 de agosto de 2018.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000596518v8 e do código CRC 4bd125ca.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/08/2018
Apelação/Remessa Necessária Nº 5015024-29.2013.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MOACIR ANTONIO MENDES DA LUZ
ADVOGADO: JACKSON ANDRÉ DOS SANTOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/08/2018, na seqüência 696, disponibilizada no DE de 13/08/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma Regional Suplementar do Paraná, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:40:14.