Apelação Cível Nº 5002439-29.2020.4.04.7216/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002439-29.2020.4.04.7216/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MANOEL GOULART (AUTOR)
ADVOGADO(A): VILMAR SUTIL DA ROSA (OAB SC012093)
RELATÓRIO
A sentença do evento 39 assim relatou o feito:
O autor pretende o reconhecimento do exercício de atividade urbana (08/09/1994 a 30/09/1996) e especial, no regime de 25 anos (01/12/1984 a 16/07/1986, 17/11/2005 a 12/06/2011 e 17/10/2016 a 15/08/2017), e a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER do benefício nº 186.698880-5 (27/12/2018), ou de quando preenchidos os requisitos para tanto (reafirmação da DER).
Requereu a gratuidade da justiça, valorou a causa em R$ 69.149,28 e anexou documentos.
A decisão do evento 03 concedeu a gratuidade de justiça ao autor.
O INSS apresentou contestação, alegando a necessidade de renúncia expressa aos valores excedentes ao JEF. No mérito, defendeu a improcedência da ação, mediante fundamentação padronizada.
O autor se manifestou em réplica, impugnando a contestação e reiterando os pedidos iniciais.
A equipe CEAB DJ INSS anexou documentos.
O autor requereu a expedição de ofício a empresa ex-empregadora e anexou PPRA.
Após, vieram os autos conclusos para sentença.
Seu dispositivo tem o seguinte teor:
Ante o exposto,
a) preliminarmente, declaro a ausência de interesse processual do(a) autor(a) no tocante aos pedidos de reconhecimento do(s) período(s) especial(is) de 01/12/1984 a 16/07/1986 e 17/11/2005 a 12/05/2011 e urbano de 08/09/1994 a 30/09/1996, extinguindo o processo sem exame de mérito nesses pontos, com base no art. 485, VI, do CPC;
b) no mérito, ACOLHO em parte os demais pedidos formulados na ação, resolvendo-o na forma do art. 487, I, do CPC, para:
b.1) declarar que o(a) autor(a) exerceu atividade sujeita a condições especiais, no regime de 25 anos, no(s) período(s) de 17/10/2016 a 15/08/2017, condenando o INSS a averbá-lo(s) para fins previdenciários, com a possibilidade de conversão para tempo comum;
b.2) condenar o INSS a conceder à parte autora aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com o coeficiente de 70%, calculada de acordo com a Lei 9.876/99 e com a incidência do fator previdenciário, a partir da DER reafirmada para 13/11/2019;
b.3) condenar o INSS a pagar ao(à) autor(a) as prestações vencidas até a data de implantação do benefício, de acordo com os critérios de juros e correção monetária previstos na fundamentação.
b.4) condenar o INSS ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono do(a) autor(a), fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (art. 85, § 2º, e 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil), consideradas as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111 do STJ; STJ, AgInt no REsp 1.888.117/SP, Primeira Turma; STJ, AgInt no REsp 1.884.102/SP, Segunda Turma).
Demanda isenta de custas (art. 4º da Lei nº 9.289/1996).
Sentença não sujeita ao reexame necessário (STJ. Recurso Especial nº 1.735.097/RS, Relator Min. Gurgel de Faria, julgado em 08/10/2019).
Irresignado, o INSS apelou.
Destaca-se, em suas razões de apelação, o seguinte trecho:
REJEIÇÃO DO PEDIDO DE REAFIRMAÇÃO JUDICIAL DA DER NAS HIPÓTESES DE IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ENTRE A CONCLUSÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO E O AJUIZAMENTO DA AÇÃO JUDICIAL.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir o REsp nº 1.727.063/SP sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema Repetitivo n° 995), fixou entendimento sobre a possibilidade de reafirmação judicial da DER nas hipóteses em que o implemento dos requisitos ocorra em momento posterior ao ajuizamento da ação, observado, dentre outros critérios, o contraditório.
Desse modo, não se mostra possível a aplicação do instituto da reafirmação judicial da DER nas hipóteses em que a implementação dos requisitos se deu entre a conclusão do processo administrativo e o ajuizamento da ação, conforme reiterado nos esclarecimentos prestados no voto do Relator Ministro Mauro Campbell Marques quando do julgamento dos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 1.727.063 – SP opostos pelo Instituto de Direito Previdenciário-IBDP, verbis:
“(...)A obscuridade não se apresenta no voto condutor do acórdão embargado. A assertiva de que não são devidas parcelas anteriores ao ajuizamento da ação reforça o entendimento firmado de que o termo inicial para pagamento do benefício corresponde ao momento processual em que reconhecidos os requisitos do benefício; não há quinquênio anterior a ser pago. Se preenchidos os requisitos antes do ajuizamento da ação, não ocorrerá a reafirmação da DER, fenômeno que instrumentaliza o processo previdenciário de modo a garantir sua duração razoável, tratando-se de prestação jurisdicional de natureza fundamental. (...)" Destacou-se
O questionamento formulado no recurso era justamente no sentido de garantir pagamento das diferenças para o momento do implemento dos requisitos quando este ocorresse antes do ajuizamento da ação, tendo o STJ assinalado, de forma cristalina, não ser possível a reafirmação judicial da DER em tais hipóteses.
Doravante, qualquer entendimento que não esteja em consonância com a tese fixada no recurso especial repetitivo, de observância obrigatória, contraria a regra do artigo 927, inciso III, do CPC.
Além disso, enfatiza-se a necessidade de novo requerimento administrativo para possibilitar ao INSS a apreciação do novo fato ocorrido (por exemplo, inclusão de tempo de contribuição, o advento da idade, a vigência de nova lei) após a conclusão do requerimento administrativo e anteriormente ao ajuizamento da ação judicial.
Em regra, quando um beneficiário da previdência social intenta uma ação judicial contra o INSS sem provocar previamente a Autarquia Previdenciária, inexiste lesão ou ameaça de lesão ao suposto direito subjetivo do proponente.
Incumbe ao autor da ação demonstrar concretamente a existência do direito violado ou, ao menos, uma ameaça concreta de violação mediante conduta comissiva ou omissiva do réu, sob pena de inexistir uma demanda a ser apreciada pelo Poder Judiciário.
É que quando o INSS não tem a oportunidade de se manifestar administrativamente sobre o mérito da concessão de um benefício previdenciário ou assistencial, a rigor não há uma pretensão resistida a ser submetida ao crivo do Estado-juiz, pois o Estado-administrador não exerceu a função administrativa que ordinariamente lhe incumbe por única responsabilidade do requerente.
Logo, a provocação do Poder Judiciário exige o preenchimento de determinados requisitos. Nessa linha, o Código de Processo Civil claramente prevê o interesse processual como uma das condições da ação, consoante dispõe o artigo 17, de sorte que na sua ausência o processo deve ser extinto sem resolução de mérito (art. 485, VI, do CPC).
Entender de modo contrário é subverter a ordem jurídica, com a assunção pelo Poder Judiciário do papel que deve ser desempenhado pelo INSS no sentido de analisar e conceder os benefícios previdenciários. Ademais, importante lembrar que a própria tese da reafirmação judicial da DER parte de uma premissa inequívoca, qual seja, o indeferimento do INSS que se questiona é correto e lícito.
Assim, de forma a resguardar as esferas de atribuições de cada Poder, deve-se resguardar o exercício de suas atribuições pelo INSS, com indicação ao segurado de buscar novamente o pleito no âmbito administrativo, o que ensejará nova decisão pela Autarquia em observância aos novos fatores que alteraram as circunstâncias fáticas objetos da decisão anterior e evitará que todas as demandas previdenciárias sejam levadas ao Judiciário.
Nesse sentido, quando do julgamento do Recurso Extraordinário-Re 631.240/MG em sede de repercussão geral (rel. Min. Roberto Barroso, jul. 03/09/2014), restou pacificado pelo Supremo Tribunal Federal entendimento pela necessidade da comprovação do interesse-necessidade de agir para propor ação judicial contra o INSS, sob pena de extinção terminativa da demanda.
Ora, qualquer entendimento no sentido de se aceitar o requerimento de benefício formulado tão somente em juízo nesses casos, resulta evidente afronta ao entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal-STF no julgamento do RE 631.240/MG.
Assim, por todo o exposto, em caso de acolhimento da pretensão autoral, o que se aventa amparado pelo princípio da eventualidade, por se tratar de situação em que o INSS indeferiu o benefício de modo acertado, os efeitos financeiros devem incidir a partir da propositura da demanda e os juros de mora devem ser computados após o decurso do prazo de 45 dias, em caso de descumprimento da obrigação de fazer.
REAFIRMAÇÃO DA DER - TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS
Conforme restou recentemente decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos Declaratórios no RECURSO ESPECIAL Nº 1.727.063-SP (2018/0046508-9), em que relator o Min. Mauro Campbell Marques, havendo a reafirmação da DER para data anterior ao ajuizamento da ação, o termo inicial dos efeitos financeiros deve ser fixado a partir da propositura da demanda, pois o direito é reconhecido no curso do processo:
"No caso da reafirmação da DER, conforme delimitado no acórdão embargado, o direito é reconhecido no curso do processo, não havendo que se falar em parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação". (Embargos Declaratórios no RECURSO ESPECIAL Nº 1.727.063 - SP - 2018/0046508-9, Relator o Min. Mauro Campbell Marques, decisão de 21/05/2020).
Também em mais recente ainda decisão, publicada em 01/10/2020, foram acolhidos os embargos declaratórios opostos pelo INSS para se reconhecer que, embora se possa fixar o termo inicial do benefício na data de implemento dos requisitos, os efeitos financeiros terão como termo inicial a data da citação válida da Autarquia Previdenciária:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.REAFIRMAÇÃO DA DER. TESE FIRMADA POR ESTA CORTE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. OMISSÃO VERIFICADA QUANTO AOS EFEITOS FINANCEIROS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DO INSS ACOLHIDOS, SEM EFEITOS INFRINGENTES, PARA SANAR A OMISSÃO APONTADA.
1. O acórdão recorrido reconheceu a possibilidade de apreciação de fatos supervenientes ao indeferimento administrativo, dando provimento ao Recurso Especial do Segurado, nos termos da orientação fixada por esta Corte no julgamento do Tema 995/STJ.
2. Contudo, como pontua o INSS, o acórdão foi omissão no tocante ao termo inicial dos efeitos financeiros da decisão, impondo-se a sua correção.
3. No julgamento dos Embargos de Declaração opostos no REsp. REsp.1.727.063/SP, a Primeira Seção desta Corte assentou a orientação deq ue quanto aos valores retroativos não se pode considerar razoável o pagamento de parcelas pretéritas, pois o direito é reconhecido no curso do processo, após o ajuizamento da ação, devendo ser fixado o termo inicial do benefício pela decisão que reconhecer o direito, na data em que preenchidos os requisitos para a concessão do benefício, em diante, sem pagamento de valores pretéritos.
4. Embargos de Declaração do INSS acolhidos, sem efeitos infringentes, para sanar omissão quanto ao termo inicial dos efeitos financeiros de benefício em que se reconhece devida a reafirmação da DER. (EDcl no AgInt no REsp 1689733/PR, EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2017/0191398-8, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1ª Turma, j. 28/09/2020, DJe 01/10/2020).
O item 3 do voto proferido pelo Excelentíssimo Ministro no julgamento referente à Ementa acima transcrita deixa claro que o termo inicial dos efeitos financeiros quando houver reafirmação da DER deve necessariamente ser a data da citação:
"(...)
3. Nesse cenário, embora se possa então fixar o termo inicial do benefício na data de implemento dos requisitos, os efeitos financeiros terão como termo inicial a data da citação válida da Autarquia Previdenciária.
4. Ante o exposto, acolhem-se os Embargos de Declaração do INSS para sanar a omissão apontada, sem efeitos infringentes. É como voto."
REAFIRMAÇÃO DA DER - NÃO INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS NO CÁLCULO DE LIQUIDAÇÃO
Conforme restou também decidido pelo STJ no julgamento dos Embargos Declaratórios no RE 1.727.063-SP, em havendo a reafirmação da DER, não devem incidir juros moratórios porque o benefício só é devido a partir da data em que o juiz ou Tribunal reconhece o direito, isto é, da data da sentença ou acórdão. Os juros de mora apenas incidirão no caso de demora no cumprimento da obrigação de fazer:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. REAFIRMAÇÃO DA DER (DATA DE ENTRADA DO REQUERIMENTO). CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, SEM EFEITO MODIFICATIVO.
1. Embargos de declaração opostos pelo INSS, em que aponta obscuridade e contradição quanto ao termo inicial do benefício reconhecido após reafirmada a data de entrada do requerimento.
2. É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
3. Conforme delimitado no acórdão embargado, quanto aos valores retroativos, não se pode considerar razoável o pagamento de parcelas pretéritas, pois o direito é reconhecido no curso do processo, após o ajuizamento da ação, devendo ser fixado o termo inicial do benefício pela decisão que reconhecer o direito, na data em que preenchidos os requisitos para concessão do benefício, em diante, sem pagamento de valores pretéritos.
4. O prévio requerimento administrativo já foi tema decidido pelo Supremo Tribunal Federal, julgamento do RE 641.240/MG. Assim, mister o prévio requerimento administrativo, para posterior ajuizamento da ação, nas hipóteses ali delimitadas, o que não corresponde à tese sustentada de que a reafirmação da DER implica na burla do novel requerimento.
5. Quanto à mora, é sabido que a execução contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a primeira consiste na implantação do benefício, a segunda, no pagamento de parcelas vencidas a serem liquidadas e quitadas pela via do precatório ou do RPV. No caso de o INSS não efetivar a implantação do benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, surgirão, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora. Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, embutidos no requisitório de pequeno valor.
6. Quanto à obscuridade apontada, referente ao momento processual oportuno para se reafirmar a DER, afirma-se que o julgamento do recurso de apelação pode ser convertido em diligência para o fim de produção da prova. 7. Embargos de declaração acolhidos, sem efeito modificativo
No caso concreto, NÃO HOUVE mora da autarquia a justificar a incidência de juros.
Por oportuno, informa-se que nos autos do processo número 50015563920174047135 o magistrado, com base no julgamento dos quatro Embargos Declaratórios opostos em relação ao Tema 995 do STJ, acolheu a impugnação ao cálculo apresentada pelo INSS para afastar a incidência dos juros de mora. Destacou-se que eles apenas são devidos na hipótese de restar caracterizada a demora no cumprimento da obrigação, ou seja, de ser ultrapassado o prazo de 45 dias:
(...)
Em relação aos juros moratórios, o Tema 995 do Superior Tribunal de Justiça teve julgado quatro embargos declaratórios após o julgamento da ação principal, sendo que a posição atual é que somente seriam devidos juros moratórios a partir do descumprimento da ordem para implantar o benefício pelo INSS, não havendo que se falar em mora anterior da Autarquia. Isto, inclusive, tem sido explicitado nos atuais julgamentos da 3ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul (5006861-39.2018.4.04.7112, TERCEIRA TURMA RECURSAL DO RS, Relatora para Acórdão JACQUELINE MICHELS BILHALVA, julgado em 07/10/2020), órgão que exarou o acórdão anterior.
Justamente para evitar este tipo de situação é que este Juízo possui o entendimento de ser adequado suspender os processos até o trânsito em julgado dos Temas Repetitivos.
No presente caso, como a Autarquia cumpriu com a ordem de implantação do benefício dentro do prazo referido no Tema 995, entendo que os juros de mora são indevidos.
Remetam-se os autos à Contadoria para retificação dos cálculos.
Após, intimem-se as partes da presente decisão e dos cálculos retificados.
Nada sendo requerido, expeça-se as requisições de pagamento, observando-se o pedido de destaque dos honorários contratuais. (Processo 50015563920174047135, Juiz Fed. Alessandro Dutra Lucarelli, decisão proferida em 13/10/2020).
Instado, o autor ofereceu contrarrazões.
Vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Da possibilidade de reafirmação da DER
O Superior Tribunal de Justiça, analisando o Tema 995 - possibilidade da reafirmação da DER com o cômputo de tempo de contribuição após o ajuizamento da ação - firmou a seguinte tese:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
Confira-se a ementa do respectivo julgado:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. REAFIRMAÇÃO DA DER (DATA DE ENTRADA DO REQUERIMENTO). CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. O comando do artigo 493 do CPC/2015 autoriza a compreensão de que a autoridade judicial deve resolver a lide conforme o estado em que ela se encontra. Consiste em um dever do julgador considerar o fato superveniente que interfira na relação jurídica e que contenha um liame com a causa de pedir.
2. O fato superveniente a ser considerado pelo julgador deve guardar pertinência com a causa de pedir e pedido constantes na petição inicial, não servindo de fundamento para alterar os limites da demanda fixados após a estabilização da relação jurídico-processual.
3. A reafirmação da DER (data de entrada do requerimento administrativo), objeto do presente recurso, é um fenômeno típico do direito previdenciário e também do direito processual civil previdenciário. Ocorre quando se reconhece o benefício por fato superveniente ao requerimento, fixando-se a data de início do benefício para o momento do adimplemento dos requisitos legais do benefício previdenciário.
4. Tese representativa da controvérsia fixada nos seguintes termos: É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
5. No tocante aos honorários de advogado sucumbenciais, descabe sua fixação, quando o INSS reconhecer a procedência do pedido à luz do fato novo.
6. Recurso especial conhecido e provido, para anular o acórdão proferido em embargos de declaração, determinando ao Tribunal a quo um novo julgamento do recurso, admitindo-se a reafirmação da DER.
Julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos.
(REsp 1727063/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/10/2019, DJe 02/12/2019)
No referido precedente do Superior Tribunal de Justiça, tratava-se apenas da possibilidade de reafirmação da DER para momento posterior à data do ajuizamento, não abordando aqueles casos específicos em que a DER é reafirmada para a data do ajuizamento ou para momento anterior a ela.
Tal não implica, todavia, a impossibilidade de reafirmar-se a DER para momento anterior ao ajuizamento segundo os parâmetros traçados pelo precedente de observância obrigatória.
Trata-se apenas de ausência de deliberação acerca de tal possibilidade e não de impossibilidade de tal reafirmação.
Nessa perspectiva, tem-se que a tese firmada relativa ao Tema em assunto (STJ nº 995) também se aplica àqueles casos em que o implemento dos requisitos para a aposentadoria é posterior à DER, porém, anterior ao encerramento do processo administrativo.
Note-se que o próprio INSS permite a reafirmação do requerimento quando o segurado, no curso do processo administrativo, venha a preencher os requisitos para a concessão do benefício mais vantajoso.
A propósito, confira-se o teor da Instrução Normativa 77/2015, in verbis:
Art. 690. Se durante a análise do requerimento for verificado que na DER o segurado não satisfazia os requisitos para o reconhecimento do direito, mas que os implementou em momento posterior, deverá o servidor informar ao interessado sobre a possibilidade de reafirmação da DER, exigindo-se para sua efetivação a expressa concordância por escrito.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se a todas as situações que resultem em benefício mais vantajoso ao interessado.
Confira-se, ainda, o teor da Instrução Normativa 128/2022, no mesmo sentido:
Art. 577. Por ocasião da decisão, em se tratando de requerimento de benefício, deverá o INSS:
I - reconhecer o benefício mais vantajoso, se houver provas no processo administrativo da aquisição de direito a mais de um benefício, mediante a apresentação dos demonstrativos financeiros de cada um deles; e
II - verificar se, não satisfeito os requisitos para o reconhecimento do direito na data de entrada do requerimento do benefício, se estes foram implementados em momento posterior, antes da decisão do INSS, caso em que o requerimento poderá ser reafirmado para a data em que satisfizer os requisitos, exigindo-se, para tanto, a concordância formal do interessado, admitida a sua manifestação de vontade por meio eletrônico.
Nessa toada, não há falar em impossibilidade de reafirmação no caso dos autos.
Dos efeitos financeiros
O INSS aponta que o caso dos autos não permite a reafirmação da DER. Subsidiariamente, em sendo admitida, refere que os efeitos financeiros da condenação devem ser fixados na data da citação.
A sentença reconheceu que o implemento dos requisitos foi alcançado em 13/11/2019 (último dia de vigência das regras pré-reforma da Previdência - art. 3º da EC 103/2019).
Esse marco (13-11-2019) é posterior à DER, sendo anterior ao ajuizamento da ação (19-12-2020), bem como ao encerramento do processo administrativo (agosto de 2019).
Resta avaliar se é caso de alteração do marco inicial fixado na sentença.
Na fundamentação do acórdão que julgou os embargos de declaração opostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS no julgamento do REsp 1.727.063/SP, Tema 995, o Superior Tribunal de Justiça definiu que, caso "reconhecido o benefício por intermédio da reafirmação da DER, seu termo inicial corresponderá ao momento em que reconhecido o direito, sem atrasados".
A ementa do julgado esclarece que o termo inicial do benefício é o momento do preenchimento dos requisitos. Confira-se (com destaque):
3. Conforme delimitado no acórdão embargado, quanto aos valores retroativos, não se pode considerar razoável o pagamento de parcelas pretéritas, pois o direito é reconhecido no curso do processo, após o ajuizamento da ação, devendo ser fixado o termo inicial do benefício pela decisão que reconhecer o direito, na data em que preenchidos os requisitos para concessão do benefício, em diante, sem pagamento de valores pretéritos.
Deste modo, a decisão que determina a reafirmação da DER deve fixar o termo inicial do benefício na data em que preenchidos os requisitos, sendo os efeitos financeiros da concessão devidos dessa data em diante.
Contudo, é preciso salientar que o precedente do Superior Tribunal de Justiça tratava apenas da possibilidade de reafirmação da DER para momento posterior à data do ajuizamento, não abrangendo os casos em que a DER é reafirmada para a data do ajuizamento ou para momento anterior a ela.
No caso dos autos, tendo em vista que o implemento dos requisitos para a concessão do benefício ocorreu em momento posterior ao encerramento do processo administrativo, a parte requerente tem direito ao benefício de aposentadoria especial com efeitos financeiros a partir do ajuizamento da ação.
Confira-se, a propósito, mutatis mutandis, o seguinte precedente:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DE AMBAS AS PARTES. REAFIRMAÇÃO DA DER. O SEGURADO TRABALHOU EM ATIVIDADES SUJEITAS A CONDIÇÕES ESPECIAIS POR TEMPO SUFICIENTE E CUMPRIU OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL EM DATA ANTERIOR AO ENCERRAMENTO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. ELE TEM DIREITO AO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA ESPECIAL COM EFEITOS FINANCEIROS A PARTIR DA DER REAFIRMADA E NÃO APENAS DO INÍCIO DA DEMANDA. PRETENSÃO DO INSS RELATIVA AOS ACESSÓRIOS DA DÍVIDA PREJUDICADA EM FACE DO JULGAMENTO, PELO SUPREMO TRIBUNAL, DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RE N. 870.947. (TRF4 5001681-86.2011.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 08/08/2020)
Nessas condições, o marco inicial da aposentadoria por tempo de contribuição deve ser fixado na data do ajuizamento da ação, merecendo reforma parcial a sentença.
Atualização monetária e juros de mora
A atualização monetária (que fluirá desde a data de vencimento de cada prestação) e os juros de mora (que fluirão desde a data da citação) seguirão:
a) até 08/12/2021, os parâmetros estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo nº 905, para as condenações judiciais de natureza previdenciária, os quais estão assim enunciados na tese então firmada:
3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.
(...)
3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
b) a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), acumulado mensalmente (artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, que entrou em vigor na data de sua publicação).
Especificamente quanto aos juros de mora, cumpre consignar que, nos casos de reafirmação da DER, seu termo inicial deve ser fixado desde quando devido o benefício, e não desde a citação, nas hipóteses em que computados, para a apuração do tempo mínimo, períodos de atividade laboral posteriores ao ajuizamento da ação, uma vez que presente fato novo a afastar a mora do INSS no momento da citação.
Já nas hipóteses, como a deste feito, em que não restaram computados, para a apuração do tempo mínimo, períodos de atividade laboral posteriores ao ajuizamento da ação, o marco inicial dos juros deve ser fixado na data da citação, dada a ausência do citado fato novo.
Isso porque, quando do indeferimento do pedido administrativo (ou seja, antes do ajuizamento desta demanda), somando-se os períodos de atividade especial e os de atividade urbana comum, o segurado fazia jus à jubilação, estando presente a mora, portanto, quando da citação.
Consequentemente, também neste tocante, a insurgência não merece prosperar.
Honorários sucumbenciais
Restam mantidos os parâmetros da condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícos em favor do advogado do autor, nos modes delineados pela sentença, todavia, com a redução da respectiva base de cálculo, em face do provimento parcial da apelação do INSS no que tange ao marco inicial do benefício.
Não são devidos honorários recursais.
Tutela específica
A 3ª Seção deste Tribunal firmou o entendimento no sentido de que, esgotadas as instâncias ordinárias, faz-se possível determinar o cumprimento da parcela do julgado relativa à obrigação de fazer, que consiste na implantação do benefício concedido ou restabelecido, para tal fim não havendo necessidade de requerimento do segurado ou dependente ao qual a medida aproveita (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007).
Louvando-me no referido precedente e nas disposições do artigo 497 do CPC, determino a implantação do benefício, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício.
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Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
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Apelação Cível Nº 5002439-29.2020.4.04.7216/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002439-29.2020.4.04.7216/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MANOEL GOULART (AUTOR)
ADVOGADO(A): VILMAR SUTIL DA ROSA (OAB SC012093)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. reafirmação da der. marco inicial do benefício. delimitação. juros de mora. incidência a partir da citação no caso dos autos.
1. Aplica-se o Tema 995 STJ ao caso concreto, especialmente no que diz respeito à possibilidade de reafirmação da DER na hipótese de implemento dos requisitos para a aposentadoria no período posterior ao encerramento do processo administrativo e anterior ao ajuizamento da demanda, fixando-se a DIB a partir do ajuizamento da ação, e não desde a citação, como pretende o INSS.
2. Nos casos de reafirmação da DER, quanto aos juros de mora, tem-se que seu termo inicial deve ser fixado desde a citação nas hipóteses em que não foram computados, para a apuração do tempo mínimo, períodos de atividade laboral posteriores ao ajuizamento da ação.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 14 de março de 2023.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/03/2023 A 14/03/2023
Apelação Cível Nº 5002439-29.2020.4.04.7216/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MANOEL GOULART (AUTOR)
ADVOGADO(A): VILMAR SUTIL DA ROSA (OAB SC012093)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/03/2023, às 00:00, a 14/03/2023, às 16:00, na sequência 1221, disponibilizada no DE de 24/02/2023.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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