
Apelação Cível Nº 5015112-47.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARCANJELO DA SILVA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso parte ré contra sentença, prolatada em 18/03/2020, que julgou procedente o pedido de reconhecimento de labor rural de 01/01/1972 a 31/12/1973, 01/01/1975 a 31/12/1976 e de 05/09/1981 a 02/01/1984, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER, nestes termos:
Em suas razões recursais (e. 56.1), sustenta a parte autora, em síntese, que não restou suficientemente comprovado o efetivo labor rural nos períodos controversos. Alega, assim, que "referentemente ao período posterior ao seu casamento, não há nenhum documento em nome próprio que sirva para início de prova material de que o autor continuou a laborar nas lides campesinas em regime de economia familiar". Sustenta, ainda, que a confecção de CTPS em janeiro/1980, é indício de que a parte autora "pretendia se afastar do campo" após seu casamento.
Com as contrarrazões, foram remetidos os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Limites da controvérsia
Considerando-se que não se trata de hipótese de reexame obrigatório da sentença (art. 496, § 3º, inciso I, do CPC) e à vista dos limites da insurgência recursal, a questão controvertida nos autos cinge-se ao reconhecimento de labor rural de 01/01/1972 a 31/12/1973, 01/01/1975 a 31/12/1976 e de 05/09/1981 a 02/01/1984, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Tempo de serviço rural
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.
De outra parte, afigura-se possível o reconhecimento de atividade rural para fins previdenciários no período dos 12 a 14 anos de idade. A jurisprudência deste Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é pacífica nesse sentido (TRF4ªR - 3ª Seção, EI 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 12/03/2003; STJ - AgRg no RESP 419601/SC, 6ª T, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 18/04/2005, p. 399 e RESP 541103/RS, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 01/07/2004, p. 260; STF - AI 529694/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. em 15.02.2005).
Cumpre gizar, por oportuno, que recentemente o Colendo STJ consolidou seu entendimento a respeito da extensão de validade do início da prova material na recente Súmula nº 577, cujo enunciado dispõe ser "possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório".
Ademais, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. Assim, início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.
No caso sub judice, intenta a parte autora, com a presente demanda, o reconhecimento do tempo de labor rural nos períodos de reconhecimento de labor rural de 01/01/1972 a 31/12/1973, 01/01/1975 a 31/12/1976 e 05/09/1981 a 02/01/1984.
Compulsando os autos, destaco os seguintes documentos juntados para a comprovação da condição de segurado especial:
a) Matrícula do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Urussanga do imóvel rural pertencente ao pai do autor no período de 1974 a 2003 (e. 1.6, pp. 16/17);
b) Certidão do INCRA, informando a propriedade de imóvel rural pelo genitor do autor de 1978 a 1991 (e. 1.6, pp. 10/11);
d) Ficha de cadastro em sindicato de trabalhadores rurais, em nome do auor, informando adesão à agremiação em 1977 e com registro de recolhimento de contribuições sindicais de 1977 a 1990 (e. 1.7, pp. 01/02).
Em relação à prova oral, por ocasião da audiência de instrução, as testemunhas corroboraram a versão apresentada pela parte autora, consoante bem resumido pelo MM. Juízo a quo no seguinte excerto da sentença (e. 50.1):
Consoante se depreende, notadamente pelos documentos em nome do autor e supra referidos (e. 1.7, pp. 01/02), ao contrário do que aduz o recorrente, o conjunto probatório de natureza material não se limita apenas a documentação em nome do genitor do autor. De qualquer modo, trata-se de questão despicienda, os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Da mesma forma, a tese esgrimida pelo INSS em seu recurso, segundo a qual a confecção de CTPS em janeiro/1980 pelo autor seria indício de que pretendia se afastar do campo" após seu casamento não passa de mera ilação, sem força para infirmar o conjunto probatório analisado retro. De fato, o que se constata é que a parte ré não logrou apresentar, no caso dos autos, elementos objetivos e consistentes, aptos a desconstituir o cenário probatório apresentado pela parte autora.
Assim, tendo em conta as premissas anteriormente expressadas e o conteúdo da prova testemunhal, restou comprovado o tempo de atividade rural, na condição de segurado especial, de 01/01/1972 a 31/12/1973, 01/01/1975 a 31/12/1976 e 05/09/1981 a 02/01/1984, com a confirmação da sentença no ponto.
Conclusão quanto ao direito da parte autora
Confirma-se a sentença, que reconheceu como tempo de atividade rural, na condição de segurado especial, nos períodos de 01/01/1972 a 31/12/1973, 01/01/1975 a 31/12/1976 e 05/09/1981 a 02/01/1984, os quais, quando computados ao tempo averbado pelo INSS (31 anos, 11 meses e 07 dias, além de 310 meses de carência - e. 1.9), resultam no seguinte quadro:
Assim, em 03/04/2017 (DER), a parte autora tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 95 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015)
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
No caso dos autos, o magistrado singular corretamente observou os critérios supra referidos.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários Advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Dito isso, inicialmente, em atenção ao art. 1.013, § 3º, inciso III, do NCPC, forçoso reconhecer a nulidade da sentença citra petita, que diferiu para a execução a definição do percentual a ser estipulado a título de verba honorária.
Ademais, a verba honorária não incide sobre as parcelas devidas após a data da sentença, porquanto as inovações trazidas pela Lei nº 13.256/2016 não afastam a aplicação da Súmula nº 111 do STJ. Dito isso, os honorários são fixados em 10% sobre o valor da condenação, tendo em conta os critérios estatuídos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do NCPC, vedada a compensação (art. 85, § 14) e excluídas as parcelas vincendas, conforme a Súmula 76 desta Corte: Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Aplica-se, em razão da atuação dos procuradores das partes litigantes em sede de apelação, o comando do § 11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Mantida a sentença, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 12% (doze por cento) sobre as parcelas vencidas, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do art. 85 do NCPC.
Saliente-se, por oportuno, que o Plenário do STF decidiu que é devida a majoração da verba honorária mesmo quando não apresentada contrarrazões ou contraminuta pelo advogado, a fim de evitar a reiteração de recursos (AO 2063, AgR/CE, Rel. p/ acórdão Min. LUIZ FUX, j. 18-05-2017, Inf. 865/STF).
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
Confirma-se a sentença, que reconheceu como tempo de atividade rural, na condição de segurado especial, nos períodos de 01/01/1972 a 31/12/1973, 01/01/1975 a 31/12/1976 e 05/09/1981 a 02/01/1984, os quais, quando computados ao tempo averbado pelo INSS, asseguram à parte autora a concessão do benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO na DER (03/04/2017). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 95 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).
Nega-se provimento à apelação do INSS.
Determina-se a implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5015112-47.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARCANJELO DA SILVA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE ATIVIDADE RURAL. documentos em nome de genitor. admissibilidade. Súmula 73/trf4. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
3. Comprovado labor rural e a especialidade da atividade desempenhada nos períodos pugnados, tem a parte autora direito ao benefício pleiteado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de novembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002145605v3 e do código CRC 4c726ae8.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/11/2020 A 17/11/2020
Apelação Cível Nº 5015112-47.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARCANJELO DA SILVA
ADVOGADO: EDMAR VIANA (OAB SC009153)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/11/2020, às 00:00, a 17/11/2020, às 16:00, na sequência 339, disponibilizada no DE de 28/10/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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