Apelação Cível Nº 5005955-19.2018.4.04.7122/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
APELANTE: PAULO ROBERTO COLLIONI DE FRAGA (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Paulo Roberto Collioni de Fraga propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 10/07/2018, postulando a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição de sua titularidade (NB 42/177.327.892-1), a fim de que seja convertida em aposentadoria especial, a contar da data de entrada do requerimento administrativo (16/06/2016).
Sobreveio sentença que julgou o pedido inicial parcialmente procedente, nos seguintes termos (
):I) Julgo parcialmente procedente o pedido (art. 487, I, do NCPC), para:
a) Indeferir o reconhecimento, para fins de averbação, do(s) período(s) de 22/07/1987 a 02/06/1993,como tempo especial;
b) Reconhecer, para fins de averbação, o(s) período(s) de 29/06/2012 a 18/06/2015 como tempo especial, convertendo-o(s) em comum mediante a multiplicação pelo fator de conversão 1,4;
c) Determinar à parte ré que revise o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 177.327.892-1) concedido à parte autora, mediante o recálculo da RMI/RMA, nos termos da presente fundamentação, com data de início de pagamento fixada no dia do requerimento administrativo (16/06/2016), com renda mensal inicial (RMI) correspondente a 100% do salário de benefício;
d) Condenar a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, da importância decorrente da presente decisão, resultante da soma das prestações vencidas entre a data de início do benefício e a data da implantação do benefício/revisão, após o trânsito em julgado, nos moldes acima definidos.
Tendo em conta os critérios dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC, inexistindo por ora motivo a ensejar diferenciado tratamento e majoração do percentual, fixo os honorários advocatícios no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor no § 3° daquele preceito, aplicando-se a evolução tratada no § 5º, conforme o valor da condenação a ser apurado quando da futura liquidação da sentença (inciso II do § 4º do art. 85 c/c o art. 509), esclarecendo que a base de cálculo da verba honorária compreenderá apenas a soma das prestações vencidas até a data de publicação desta sentença (Súmulas n. 76 do TRF-4 e 111 do STJ).
Verificada sucumbência de ambas as partes (proibida a compensação da verba honorária entre elas - art. 85, § 14), tendo em vista a rejeição do pedido de revisão da aposentadoria por tempo de contribuição e transformação em aposentadoria especial, bem como o de reconhecimento de especialidade de um dos dois períodos postulados e revisão para fins de recálculo da RMI, a teor do art. 86 do CPC os honorários deverão ser rateados no percentual de 50% a favor do autor e de 50% a favor do INSS, suspensa a exigibilidade da condenação em relação ao autor, em razão da concessão da gratuidade de justiça.
Deverá cada uma das partes, ainda, arcar o pagamento das custas processuais na mesma proporção, dispensado o seu pagamento pelo INSS, consoante o art. 4º da Lei n. 9.289/96, e suspensa a exigibilidade em face do autor, em razão da gratuidade.
Inconformadas, as partes interpuseram recursos de apelação.
A parte autora, em suas razões, sustenta ser devido o reconhecimento do tempo de serviço especial no intervalo de 22/07/1987 a 02/06/1993, defendendo ser possível a utilização de laudos similares e/ou emprestados para a averiguação das suas condições ambientais de labor, no desempenho da função de ajudante, mormente se considerado que a empresa empregadora encontra-se inativa. Ressalta que, no bojo de demanda previdenciária intentada por terceiro que desenvolveu a mesma função de ajudante, perante a mesma empregadora, foi realizado estudo técnico por similaridade, que comprova a exposição a óleos minerais e outros hidrocarbonetos derivados do petróleo. Requer a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial ou, de forma subsidiária, a conversão do feito em diligência, determinando-se a realização de perícia técnica e audiência de oitiva de testemunhas, o que não lhe foi oportunizado no juízo de origem, acarretando a ocorrência de cerceamento de defesa. Por fim, pugna pela majoração dos honorários sucumbenciais (
).O INSS, por sua vez, requer a aplicação da integralidade dos critérios fixados na Lei 11.960/09, a fim de afastar a capitalização dos juros moratórios (
).Oferecidas as contrarrazões pela parte autora (
), subiram os autos a esta Corte.É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Os apelos preenchem os requisitos legais de admissibilidade.
Preliminar de cerceamento de defesa
Alega a recorrente a ocorrência de cerceamento de defesa, em razão da não oportunização de realização de audiência de oitiva de testemunhas e de perícia técnica judicial.
No entanto, consigno que a produção de prova testemunhal, mesmo para casos nos quais se busca o reconhecimento de tempo especial, não pode ser deferida sem que haja nos autos um início de prova material que concretamente sinalize para o desempenho de determinadas funções/tarefas, indicativas de que o segurado esteve submetido a agentes nocivos.
Partindo-se dessa premissa, cumpre destacar que a juntada de CTPS com descrição de função genérica (serviços gerais, servente, auxiliar, ajudante ou outras similares), desempenhada em empresa inativa, não constitui início de prova material da atividade especial, não se podendo, em face disso, autorizar a produção de prova testemunhal para suprir a sua ausência. Nesse sentido, inclusive, o artigo 582 da Instrução Normativa 77/2015 do INSS, que admite a justificação administrativa para reconhecimento de tempo especial de empresa extinta, desde que haja início de prova material:
Art. 582. Quando o segurado não dispuser de formulário para análise de atividade especial e a empresa estiver legalmente extinta, a JA poderá ser processada, mediante requerimento, observado o § 1º e o caput do art. 261 e, ainda, as seguintes disposições:
I - quando se tratar de comprovação de enquadramento por categoria profissional ou atividade até 28 de abril de 1995, véspera da publicação da Lei nº 9.032, de 1995, na impossibilidade de enquadramento na forma dos arts. 269 a 275, a JA será instruída com base em outros documentos em que conste a função exercida, devendo ser verificada a correlação entre a atividade da empresa e a profissão do segurado; e
II - quando se tratar de exposição à qualquer agente nocivo em período anterior ou posterior à Lei nº 9.032, de 1995, a JA deverá ser instruída obrigatoriamente com a apresentação do laudo técnico de avaliação ambiental coletivo ou individual.
§ 1º Caso o laudo referido no inciso II seja extemporâneo ao período alegado, deverá atender às exigências do § 3º do art. 261.
§ 2º Para o disposto neste artigo, a comprovação da extinção da empresa far-se-á observando-se os §§ 3º e 4º do art. 270.
§ 3º A JA processada na hipótese do inciso II deste artigo dependerá da análise da perícia médica, devendo a conclusão do mérito ser realizada pelo servidor que a autorizou.
Da mesma forma, não se justifica a determinação de realização de perícia técnica em empresa inativa sem que se saiba, por meio adequado e não de forma unilateral, as incumbências efetivamente desempenhadas pelo segurado e demais especificidades de seu labor.
Em face disso, não vislumbro justa causa para a reabertura da instrução processual e desacolho a alegação da ocorrência de cerceamento de defesa.
I - Do recurso da parte autora.
Da atividade especial
O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18/11/2009; APELREEX 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 30/3/2010; APELREEX 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/3/2010; APELREEX 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 25/1/2010).
Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário inicialmente definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual a legislação que se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;
b) a partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
d) a partir de 01 de janeiro de 2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (art. 148 da Instrução Normativa nº. 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Em relação ao enquadramento diferenciado por categorias profissionais, observo que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).
Utilização de laudo similar
Observo que, muitas vezes, a solução para a busca da melhor resposta às condições ambientais de trabalho, com a presença ou não de agentes nocivos, é a avaliação dessas em estabelecimento de atividade semelhante àquele em que laborou originariamente o segurado, no qual poderão estar presentes os mesmos agentes nocivos, o que pode vir a ensejar um juízo conclusivo a respeito.
Logo, em tese, não há óbice à utilização de laudo pericial elaborado em uma empresa, para comprovar a especialidade do labor em outra do mesmo ramo e no exercício de função semelhante. Nesse sentido, é a jurisprudência dominante deste Tribunal: AC 2006.71.99.000709-7, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU 2/3/2007 e APELREEX 2008.71.08.001075-4, Relator Juiz Federal Guilherme Pinho Machado, D.E. 3/8/2009.
Ademais, a Súmula 106 deste TRF assim estabelece: "Quando não é possível a realização de perícia técnica no local de trabalho do segurado, admite-se a produção desta prova em empresa similar, a fim de aferir a exposição aos agentes nocivos e comprovar a especialidade do labor".
Contudo, importante mencionar que se tratando de empresa ativa, não cabe, em princípio, a utilização de laudo técnico similar.
Da prova emprestada
Nos termos do art. 372, do CPC, é admissível, assegurado o contraditório, a utilização de prova emprestada de processo do qual não participaram as partes do processo para o qual a aludida prova será trasladada, verbis:
Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.
A grande valia da prova emprestada reside na economia processual que proporciona, tendo em vista que se evita a repetição desnecessária da produção de prova de idêntico conteúdo. Igualmente, a economia processual decorrente da utilização da prova emprestada importa em incremento de eficiência, na medida em que garante a obtenção do mesmo resultado útil, em menor período de tempo, em consonância com a garantia constitucional da duração razoável do processo, inserida na CF pela EC 45/2004 (TRF4 5002141-84.2013.4.04.7215, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 11/07/2017)
O STJ entende pela validade da utilização da prova emprestada, desde que observado o contraditório e a ampla defesa:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. OMISSÃO INEXISTENTE. DEVIDO ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES RECURSAIS.
(...)
2. Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica.
3. Em casos análogos, é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à legalidade da prova emprestada, quando esta é produzida com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Recurso especial improvido. (REsp 1397415/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 20/11/2013)
Contudo, nos casos em que constar dos autos formulário PPP e laudo técnico da própria empresa, descabe a utilização de laudo técnico ou de perícia judicial de terceiro a título de prova emprestada.
Do caso concreto
- Período de 22/07/1987 a 02/06/1993 (Seel Equipamentos Elétricos Ltda).
Colho da sentença (
):SEEL EQUIPAMENTOS | ||
Período: | 22/07/1987 a 02/06/1993 | |
Cargo/função: | ajudante A (CTPS) | |
Provas: | DSS-8030/PPP | |
Laudo Técnico | ||
Laudo Similar/ empresa inativa | evento 1 - PROCADM7, fl. 51 | |
Enquadramento: | Atividade | |
Agente Nocivo | ||
Inviabilidade de Enquadramento: | Considerando a inatividade da empresa, foi facultado à parte autora a produção da prova por similaridade, tendo juntado aos autos laudo pericial produzido em ação previdenciária em desconformidade com a orientação deste juízo na decisão de saneamento e organização do processo. |
Conforme se verifica nas anotações da CTPS, o segurado desempenhou o cargo de ajudante (
, fl. 17)Para comprovar a especialidade de seu labor, o demandante apresentou laudo técnico similar, realizado na empresa Metalógica Indústria de Produtos Metalúrgicos Ltda. (
a ).Também trouxe ao feito laudo emprestado (realizado em demanda previdenciária intentada por terceiro), em que houve labor para a mesma empresa empregadora (Seel Equipamentos Elétricos Ltda.). Tal perícia, no entanto, foi elaborada em empresa similar (
, fls. 52-61 e ).Pois bem, consoante já relatado no tópico em que analisada a alegação de cerceamento de defesa, não se pode eventualmente pretender a realização de perícia técnica ou até mesmo a utilização de qualquer prova similar ou emprestada sem que se saiba exatamente as tarefas desempenhadas pelo segurado.
Veja-se que a CTPS informa o exercício da função de ajudante, que, via de regra, pode ser exercida com uma multiplicidade de tarefas e em diversos setores da empresa, ainda que essa seja de um ramo específico de atividade, como ocorre no caso.
Assim, não havendo informações válidas, emitidas pelo empregador, sobre as especifidades do cargo desenvolvido, não há como se acolher a pretensão recursal e utilizar prova que não represente fielmente o ambiente laborativo enfrentado pelo autor.
Destaco que, muito embora o laudo técnico emprestado tenha sido elaborado em favor de segurado que também desempenhou o cargo de ajudante, perante a mesma empregadora, é possível visualizar que a aludida perícia foi elaborada em empresa similar, sem que se soubesse as tarefas desempenhadas pelo segurado em questão. Observa-se que somente o segurado e uma funcionária da empresa paradigma é que prestaram informações ao perito, não havendo qualquer elemento material ou informação do empregador que tenha subsidiado o relato sobre as incumbências tomadas por base para a realização daquela análise técnica. Ou seja, as informações sobre as funções exercidas como ajudante foram prestadas de forma unilateral (
, fls. 54-55).Cumpre salientar, ainda, que não houve comprovação de que a parte autora tenha diligenciado perante a ex-empregadora buscando contatar a empresa eventualmente extinta, a fim de obter a documentação técnica faltante, sendo seu o ônus da prova, nos termos do art. 373, inc. I, do CPC.
Diante desse panorama, penso ser devido destacar o entendimento firmado pelo STJ no julgamento do Tema 629, senão vejamos:
A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Da leitura do referido julgado, constata-se que, de fato, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu o entendimento de que, na hipótese de ajuizamento de ação com pedido de cômputo de tempo, a ausência/insuficiência de início de prova material não é causa de improcedência do pedido, mas sim de extinção do processo, sem resolução de mérito. Assegura-se com isso a oportunidade de ajuizamento de nova ação, sem o risco de ser extinta em razão da coisa julgada formada no processo anterior, caso o segurado venha a obter outros documentos, preservando, assim, o direito fundamental de acesso à Previdência Social.
Creio que o caso em tela se amolda à orientação traçada no julgamento do Recurso Especial acima citado, pois ausente início de prova material em relação as tarefas e/ou especialidade do período postulado, o que é imprescindível à especialidade postulada.
Destarte, voto por dar parcial provimento ao recurso da parte autora, para extinguir o feito, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, quanto a essa parcela do pedido.entido de...
II - Do recurso da parte ré.
Correção monetária e juros de mora
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu o dos respectivos embargos de declaração (que foram rejeitados, tendo sido afirmada a inexistência de modulação de efeitos), deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece, para as condenações judiciais de natureza previdenciária, o seguinte:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)
Os juros de mora devem incidir a contar da citação (Súmula 204 do STJ), exceto no caso de concessão de benefício mediante reafirmação da DER para data após o ajuizamento da ação, hipótese em que, conforme decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 1.727.063/SP, publicação de 21/5/2020), a incidência de juros de mora dar-se-á sobre o montante das parcelas vencidas e não pagas a partir do prazo de 45 dias para a implantação do benefício (TRF4, AC 5048576-34.2017.4.04.7100, Quinta Turma, Relator Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10/8/2021; TRF4, AC 5004167-24.2014.4.04.7117, Sexta Turma, Relatora Juíza Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 6/8/2021).
Até 29 de junho de 2009, a taxa de juros é de 1% (um por cento) ao mês. A partir de 30 de junho de 2009, eles serão computados uma única vez, sem capitalização, segundo percentual aplicável à caderneta de poupança (inclusive com a modificação da Lei 12.703/12, a partir de sua vigência), conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, considerado constitucional pelo STF (RE 870947, com repercussão geral).
A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.
Dessa forma, dou parcial provimento ao recurso do INSS, para adequar os juros moratórios aos critérios acima descritos.
Honorários sucumbenciais
Provido em parte o apelo da parte sucumbente, não cabe majoração dos honorários advocatícios em sede recursal, restando mantida a sucumbência recíproca, nos termos em que fixado na sentença.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (artigo 4, inciso I, da Lei 9.289/1996).
Revisão imediata do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497, caput, do Código de Processo Civil e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/8/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à revisão do benefício atualmente percebido pela parte autora (NB 177.327.892-1), a contar da competência da publicação do acórdão, a ser efetivada em 45 (quarenta e cinco) dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for mais vantajoso.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, inc. I, do CPC/1973, e 37 da CF, impende esclarecer que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
Reformada a sentença para, provendo-se em parte os recursos de apelação, extinguir o feito, sem resolução de mérito, quanto ao pedido de reconhecimento do tempo de serviço especial no intervalo de 22/07/1987 a 02/06/1993 e adequar a forma de incidência dos juros de mora.
De ofício, determinar a imediata revisão da aposentadoria por tempo de contribuição de titularidade da parte autora.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento a ambos os apelos e, de ofício, determinar a imediata revisão do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003670961v18 e do código CRC 57914b9f.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5005955-19.2018.4.04.7122/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
APELANTE: PAULO ROBERTO COLLIONI DE FRAGA (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. tempo de serviço especial. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. utilização de laudo similar/emprestado. impossibilidade. juros de mora.
1. O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, de modo que, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
2. A juntada de CTPS com descrição de função genérica (serviços gerais, servente, auxiliar, ajudante ou outras similares), desempenhada em empresa inativa, não constitui início de prova material sobre as tarefas efetivamente desempenhadas pelo segurado e/ou sobre a atividade especial, não se podendo, em face disso, autorizar a produção de prova testemunhal e/ou de perícia técnica para suprir a sua ausência.
3. Até 29 de junho de 2009, a taxa de juros é de 1% (um por cento) ao mês. A partir de 30 de junho de 2009, eles serão computados uma única vez, sem capitalização, segundo percentual aplicável à caderneta de poupança (inclusive com a modificação da Lei 12.703/12, a partir de sua vigência), conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, considerado constitucional pelo STF (RE 870947, com repercussão geral).
4. A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento a ambos os apelos e, de ofício, determinar a imediata revisão do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de fevereiro de 2023.
Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003670962v6 e do código CRC 2b23302b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA FERRO BLASI
Data e Hora: 27/2/2023, às 10:30:12
Conferência de autenticidade emitida em 07/03/2023 04:17:11.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/02/2023 A 17/02/2023
Apelação Cível Nº 5005955-19.2018.4.04.7122/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PRESIDENTE: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: PAULO ROBERTO COLLIONI DE FRAGA (AUTOR)
ADVOGADO(A): RENATA DA VEIGA LIMA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO A AMBOS OS APELOS E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMEDIATA REVISÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/03/2023 04:17:11.