
Apelação Cível Nº 5021880-57.2018.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO MARIA BRIZOLA
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária intentada por JOÃO MARIA BRIZOLA (nascido em 25/10/1953) contra o INSS em 14/05/2009, pretendendo haver benefício de aposentadoria por idade/tempo de contribuição com averbação de período rural.
Em sua petição inicial (Evento 1 - INIC2) alegou a parte autora que aos 10 anos de idade (25/10/1963) começou a trabalhar como boia-fria em várias fazendas e sítios no interior de Senges/PR até março de 1971, quando passou a estabelecer vínculos empregatícios formais, seja como trabalhador rural, seja como trabalhador urbano. Destacou ainda que trabalhou vários anos em atividades especiais, exposto a condições insalubres, requerendo a conversão do tempo especial para comum. Sustentou que com a soma de todos esses períodos atinge as condições para a concessão da aposentadoria pleiteada a partir da DER (29/09/2008).
A sentença (Evento 1 - SENT15), prolatada em 17/12/2010, julgou procedente a ação, determinando a averbação de todo o tempo no qual o autor teve vínculo formal de emprego e do período rural a partir da data em que este completou 12 anos (de outubro de 1965 até março de 1971), não reconhecendo, assim, o tempo de labor rural no qual o postulante era menor de 12 anos (de 25/10/1963 até 24/10/1965). Entendendo que o autor cumpriu com os requisitos para a aposentadoria requerida, condenou o INSS a implantar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER de forma a fixar o valor da RMI da forma mais benéfica possível. Diante da sucumbência, condenou o INSS a pagar as parcelas vencidas desde o requerimento administrativo monetariamente corrigidas com incidência de juros de mora até a data do efetivo pagamento. Não determinou o índice de correção a ser aplicado. Condenou ainda a autarquia ao pagamento das custas e dos honorários, estes fixados em 10% do valor das parcelas vencidas. A sentença não foi submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação (Evento 1 - PET16) (1) postulando o reconhecimento da remessa oficial, tendo em vista o entendimento de que a sentença seria ilíquida; (2) sustentando a impossibilidade da contagem de tempo de serviço rural em regime de economia familiar antes dos 14 anos de idade; (3) requerendo afastamento da atividade especial nos períodos requeridos entre 1972 e 1980; (4) defendendo a impossibilidade da conversão de tempo especial para comum após 28/05/1998; e (5) afirmando a ausência de tempo de serviço para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Para o caso de ser mantida a sentença, requereu que os honorários advocatícios sejam fixados em percentual incidente sobre as diferenças devidas somente até a data da sentença (Súmula 11 do STJ) e que em relação aos juros e à correção monetária sejam utilizados os parâmetros do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009.
Ao julgar o recurso (Evento 1 - OUT18, p. 2 a 20), esta Turma, reconheceu a necessidade da remessa oficial e deu parcial provimento ao recurso e à remessa oficial, afastando alguns períodos reconhecidos na sentença e concluindo que o autor não totalizaria tempo suficiente para a concessão do benefício, tanto na forma integral como proporcional. Segue a ementa do acórdão:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL E ESPECIAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. 1. O tempo de serviço do trabalhador rural a que se refere o artigo 55, § 2º, da Lei 8.213/81, pode ser comprovado mediante início de prova material contemporânea, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. O tempo de serviço do trabalhador rural anterior ao início de vigência da Lei nº 8.213/91, sem o recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser considerado para a concessão de benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), exceto para efeito de carência, conforme a regra do art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91. 5. Relativamente ao enquadramento de atividade como especial, a jurisprudência é firme no sentido de que as relações jurídicas decorrentes do exercício das atividades especiais devem ser sempre interpretadas de acordo com a legislação vigente à época do exercício da atividade, de forma que a sua prova depende da regra incidente em cada período (tempus regit actum). (STJ, AGRESP nº 662658/MG, 5ª Turma, rel. min. Felix Fischer, DJU: 04/04/05; RESP nº 551917/RS, 6ª Turma, rel. min. Maria Thereza de Assis Moura, DJU: 15/09/2008). 6. O enquadramento do tempo de atividade especial por categoria profissional prevalece somente até 28-04-1995 (lei 9032/95), a partir de quando se exige a efetiva comprovação da exposição a algum agente nocivo, químico, físico ou biológico. 7. O Perfil Profissiográfico Previdenciário corretamente preenchido, cujas informações foram extraídas do laudo técnico de condições ambientais da empresa, supre a falta de juntada aos autos do LTCAT. 8. O código 2.2.1 - trabalhadores na agropecuária - do Decreto nº. 53.831/64 abrange os segurados que, independentemente da função exercida, laboram em empresas agroindustrial ou agrocomercial. 9. A atividade de tratorista deve ser equiparada à de motorista de veículos pesados, em razão das semelhanças existentes entre as duas atividades, enquadrando-se no código 2.4.4 do Decreto nº 53.831/64. 10. Comprovado o exercício de atividades em condições especiais, convertido para comum, e acrescido ao período rural e ao tempo reconhecido pelo INSS, o segurando não totaliza tempo suficiente para obter o benefício integral ou proporcional. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005137-04.2011.404.9999, 5ª TURMA, Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, POR UNANIMIDADE, D.E. 27/10/2011, PUBLICAÇÃO EM 28/10/2011).
Inconformada, a parte autora interpôs embargos de declaração (Evento 1 - OUT18, p. 28 e 29). Em suas razões, sustentou que o limite mínimo imposto de 12 anos para o cômputo em labor rural afronta o artigo 11, inciso VII da Lei 8.213/91. Aduziu, ainda, haver omissão quanto ao exame dos períodos formalizados - de 21/03/1971 a 07/06/1972 (cópia da CTPS em Evento 1 - INIC2, p. 10); 01/07/1986 a 23/06/1988 (cópia da CTPS em Evento 1 - INIC2, p. 12) e 01/03/1990 a 30/09/1991 (guias de contribuição como autônomo em Evento 1 - INIC2, p. 19 a 22).
Os embargos foram acolhidos apenas para fins de prequestionamento, mantendo o acórdão em seus próprios termos (Evento 1 - OUT18, p. 31 a 35).
A parte autora, então, interpôs recurso especial (Evento 1 - OUT18, p. 39 a 65). Em suas razões, afirmou que o acórdão desta Turma contrariou o art. 11, VII c/c art. 55, § 2º, ambos da Lei 8.213/1991. Alega a parte autora que o limite de 14 anos de idade para o trabalho rural de membros da unidade familiar, previsto no citado art. 11, VII não pode ser obstáculo ao reconhecimento do direito de menor que, apesar da vedação legal, realizou de forma efetiva o trabalho. Nesse sentido, argumenta que a norma é protetiva do menor e, portanto, deve ser interpretada em seu benefício. Sustenta ainda que se o Estado foi ineficiente na repressão ao trabalho infantil, não poderia valer-se da prescrição legal protetiva ao menor para lhe prejudicar. Acrescenta ainda que a decisão deste TRF de limitar o reconhecimento da atividade rural apenas a partir dos 12 anos divergiria do entendimento do STJ, Colacionando jurisprudência da Corte Superior. Por esses motivos, requereu a reforma do acórdão para que seja declarado como de trabalho rural o período laborado entre os 10 e os 12 anos de idade, condenando o INSS a averbar tal período.
Ao julgar o recurso especial (Evento 3 - DEC2), entendeu o STJ que este Tribunal dissentiu dos seus precedentes, firmados no sentido de ser possível o cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de 12 anos de idade. Dessa forma, determinou o retorno dos autos para que este órgão julgador prossiga na análise do direito.
VOTO
DA POSSIBILIDADE DE AVERBAÇÃO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL DE MENOR DE 12 ANOS
Como pode ser visto no relatório acima, a controvérsia a ser dirimida nesta nova análise do recurso diz respeito apenas ao reconhecimento de período de labor rural exercido antes dos 12 anos de idade. Não há a necessidade de rever o período de atividade rural posterior aos 12 anos nem tampouco os demais períodos (de trabalho como empregado rural, especial e de contribuição como autônomo) uma vez que não foram objeto do recurso especial.
Em sua decisão, a Ministra Assussete Magalhães entendeu que este Tribunal dissentiu dos precedentes do STJ firmados no sentido de ser possível o "cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de doze anos de idade" nos termos do Agravo Regimental no REsp 1.150.829/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, DJe de 04/10/2010).
Considerando que:
1. o julgado deste Tribunal entendeu haver início de prova do exercício do labor rural em todo período alegado, sendo que o afastamento de parte do período deu-se apenas porque esta Turma definiu que o reconhecimento do tempo só poderia dar-se a partir dos 12 anos de idade;
2. não há recurso do INSS em relação ao exercício da atividade em si, mas apenas em relação ao seu cômputo para fins previdenciários antes de o demandante completar 14 anos;
3. há uma determinação do STJ, baseada na sua jurisprudência, definindo que há a possibilidade de cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de doze anos de idade.
Entendo que deve ser averbado o período de 25/10/1963 a 24/10/1965, acrescentando ao patrimônio jurídico do autor mais dois anos de tempo de serviço.
Alterado o acórdão no sentido de averbar o tempo de serviço acima, resta definir se com esse acréscimo passa a parte autora a cumprir os requisitos para a aposentadoria pleiteada.
DO TEMPO DE SERVIÇO RECONHECIDO
O acordão aqui reanalisado assim definiu o tempo de contribuição do autor que deve ser reconhecido para fins de aposentadoria:
No caso em análise, somando-se o tempo de serviço incontroverso já computado pelo INSS (fls. 49/50) ao período rural reconhecido nesta ação (25/10/1965 a 20/03/1971) e ao acréscimo resultante da conversão de tempo especial em comum dos interregnos também reconhecidos judicialmente (19/09/1972 a 08/03/1974, 01/07/1974 a 30/09/1976 e 01/10/1976 a 19/12/1980 e 03/01/05 a 29/09/08), até a DER 29/09/2008 o autor totalizou 27 anos, 03 meses e 24 dias de contribuição, insuficiente para obter a aposentadoria vindicada, porquanto não somou ao menos trinta anos de contribuição.
Contudo, tem direito de averbar tais interregnos junto à autarquia-previdenciária para computar em futuro requerimento de benefício previdenciário.
Destaco que os períodos de 21/03/71 a 07/06/72 (CTPS - fl. 10); 01/07/86 a 23/06/88 (CTPS - fl. 12) e 01/03/90 a 30/09/91 (autônomo - fls. 19/22), não foram computados no tempo de contribuição acima apurado, porquanto não admitidos pelo INSS (fls. 49/50) e tampouco requerido o cômputo de tais intervalos nesta ação. De fato, na inicial, o demandante postula apenas o reconhecimento de atividades rural e especial, nas quais não estão incluídos os interregnos acima. Assim, como se trata de períodos controvertidos que não estão sendo discutidos nesta ação (tanto que não foi produzida qualquer espécie de prova nesse sentido), não podem ser considerados nesse momento, devendo a parte-autora valer-se da via administrativa para, por meio de Justificação Administrativa, comprovar tais períodos. (grifos no original)
Ao período já reconhecido no acórdão anterior, devem ser somados dois anos de atividade rural aqui reconhecidos em função da decisão do STJ. Dessa forma, o autor passa a contar, até a data do requerimento administrativo, 29 anos, 3 meses e 24 dias de contribuição, tempo ainda insuficiente para a concessão da aposentadoria pleiteada.
Consequentemente, deve ser reformado o acórdão no sentido de determinar a averbação, pelo INSS, do período rural acima referido, mantendo-se, no entanto, o parcial provimento do recurso.
Ressalte-se que, tendo em vista que não foi objeto do recurso especial, mantem-se o entendimento, consignado no acórdão reexaminado, de que para ver reconhecidos os períodos de contribuição constantes na CTPS e não computados, deve a parte autora valer-se da via administrativa para a sua averbação.
DOS CONSECTÁRIOS
O acórdão reanalisado assim definiu os honorários advocatícios e custas:
Considerando a acolhida parcial dos pedidos, condeno as partes no pagamento de custas e honorários advocatícios no valor de 10% sobre o valor da causa, estes reciprocamente compensados, nos termos do artigo 21 do CPC.
A parte autora fica isenta do pagamento das custas em virtude de ser beneficiária de AJG.
Tendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Estado do Paraná, a autarquia responde normalmente pelas custas/despesas processuais.
Considerando que o período de tempo rural reconhecido neste reexame não modifica o mérito da ação, uma vez que ainda não atingido o tempo de contribuição necessário para a concessão da aposentadoria pleiteada, não há alteração substancial em relação à sucumbência. Dessa forma, entendo que deve ser mantido o acórdão reanalisado em relação aos consectários.
CONCLUSÃO
Reexaminado o recurso, deve-se:
1. Manter o parcial provimento do reexame necessário.
2. Manter o dispositivo do acórdão que deu parcial provimento ao recurso, modificando o julgado apenas em relação à averbação do período rural requisitado, que passa a ser reconhecido integralmente;
3. Manter os consectários definidos no acórdão reanalisado, tendo em vista que o tempo rural averbado não alterou substancialmente o mérito da ação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, reexaminado o recurso, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000721008v35 e do código CRC 81810e52.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 23/10/2018, às 19:4:57
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:41:39.

Apelação Cível Nº 5021880-57.2018.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO MARIA BRIZOLA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE DO CÔMPUTO DE TEMPO RURAL DE MENOR DE 12 ANOS. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA STJ.
Consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, o exercício de atividade rural por menor de 12 (doze) anos de idade, pode ser computado para efeitos securitários, desde que comprovado o tempo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de outubro de 2018.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000721009v5 e do código CRC fb134c90.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 5/11/2018, às 15:34:21
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:41:39.

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/10/2018
Apelação Cível Nº 5021880-57.2018.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO MARIA BRIZOLA
ADVOGADO: MARCELO MARTINS DE SOUZA
ADVOGADO: FABRICIO GUIMARÃES VILAS BOAS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/10/2018, na sequência 42, disponibilizada no DE de 16/10/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:41:39.