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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO AUTOR. ARRENDAMENTO DE PARTE DO IMÓVEL RURAL. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGU...

Data da publicação: 06/07/2024, 07:01:22

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO AUTOR. ARRENDAMENTO DE PARTE DO IMÓVEL RURAL. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. 2. O labor urbano esporádico e em curtos períodos da parte autora, por si só, não afasta a condição de segurado especial do requerente, quando comprovada a indispensabilidade da atividade rural por ele desempenhada. 3. O arrendamento de parte das terras, por si só, não descaracteriza a condição de segurado especial, na medida em que restou demonstrado que o segurado permaneceu cultivando o restante da área em regime de economia familiar e que a renda auferida da atividade rural era essencial a subsistência da família. 4. Os requisitos restaram preenchidos, sendo devida a concessão da aposentadoria por idade rural em favor da parte autora, a contar da DER. (TRF4, AC 5005055-62.2023.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 28/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005055-62.2023.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: RAMAO OMAR SARMENTO ALVES

RELATÓRIO

RAMAO OMAR SARMENTO ALVES propôs ação de procedimento comum em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, desde a data de entrada do requerimento - DER.

Sobreveio sentença (evento 28, SENT1) que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos:

Isso posto, concedo a antecipação de tutela postulada para o efeito de determinar que o réu implemente, em 15 dias, o benefício de aposentadoria em favor do autor e com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos feitos por RAMÃO OMAR SARMENTO ALVES em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para o fim de conceder ao autor o benefício de aposentadoria por idade rural, em valor equivalente a um salário-mínimo nacional, desde da data do requerimento administrativo (07/03/2018), e condenar o réu ao pagamento das parcelas atrasadas, que deverão observar os consectários legais abaixo fixados.

O INSS apelou requerendo a reforma da sentença (evento 35, APELAÇÃO1). Alega, em síntese: i) que a parte autora apresenta vínculos urbanos no período de carência (contribuinte individual), o que descaracteriza sua condição de segurado especial e gera uma descontinuidade no labor rural no período de carência, o que impõe o indeferimento de todos os pedidos elencados na inicial, ii) que a autora declarou que se afastou da atividade rural desde 2012 e que a área rural estava arrendada em 50%, assim resta descaracterizada a condição de segurado especial a partir desta data.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Recurso adequado e tempestivo. INSS isento de custas, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.289/1996.

Aposentadoria Rural por Idade

São requisitos para a concessão de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao igual ao número de meses correspondentes à carência exigida (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.

Quanto à carência, há regra de transição para os segurados obrigatórios previstos no art. 11, I,"a", IV ou VII: a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".

Assim, àqueles filiados à Previdência quando da edição da Lei nº 8.213/91 que implementarem o requisito idade até quinze anos após a vigência desse dispositivo legal (24-7-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, II, mas a regra de transição antes referida.

Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).

Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subsequentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.

Caso o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.

A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.

Atividade rural

O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, salvo caso fortuito ou força maior. Tudo conforme o art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91 e reafirmado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).

Nesse contexto probatório: (a) a lista dos meios de comprovação do exercício da atividade rural (art. 106 da Lei de Benefícios) é exemplificativa, em face do princípio da proteção social adequada, decorrente do art. 194 da Constituição da República de 1988; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido; (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 980.065/SP, DJU, Seção 1, 17-12-2007; REsp n.º 637.437/PB, DJU, Seção 1, de 13-09-2004; REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.); (d) quanto à contemporaneidade da prova material, inexiste justificativa legal, portanto, para que se exija tal prova contemporânea ao período de carência, por implicar exigência administrativa indevida, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.

As certidões da vida civil, documentos admitidos de modo uníssono pela jurisprudência como início probatório de atividade rural, no mais das vezes, registram fatos muito anteriores à implementação da idade de 55 ou 60 anos, e fora dos prazos constantes do art. 142 da Lei 8.213/91. O período de carência, em se tratando de aposentadoria por idade rural, correspondente a estágio da vida do trabalhador em que os atos da vida passíveis de registro cartorário, tais como casar, ter filhos, prestar serviço militar, ou inscrever-se como eleitor, foram praticados muito antes do início do marco para a contagem da carência prevista para tal benefício.

Nesse sentido, a consideração de certidões é fixada expressamente como orientação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, 3ª Seção, REsp 1.321.493-PR, procedimento dos recurso repetitivos, j.10/10/2012). Concluiu-se imprescindível a prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, cabendo às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador:

"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."

De todo o exposto, consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.

Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".

Registre-se, por fim, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16.04.94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, ocorre após a comprovação junto à entidade pública das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que o próprio INSS já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.

Da contemporaneidade da prova material

É importante frisar que a Lei de Benefícios não exige que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê da transcrição do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213, que segue:

A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

Não há justificativa legal, portanto, para que se exija prova material contemporânea ao período a ser reconhecido, nos termos reiteradamente defendidos pela Autarquia Previdenciária; tal exigência administrativa implica a introdução indevida de requisito, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.

Consequentemente, em ações desta natureza devem ser consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, sendo dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.

Da prova da atividade em regime de economia familiar

O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".

A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.

Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.

Caso Concreto

A parte autora, nascida em 16/09/1957, implementou o requisito etário em 16/09/2017 e requereu o benefício na via administrativa em 07/03/2018 (evento 5, INIC1, p.14). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses anteriores à implementação da idade ou nos 180 meses que antecederam o requerimento administrativo; ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.

O INSS em seu apelo alega que restou descaracterizada a qualidade de segurado rural, uma vez que o autor apresenta vínculos urbanos no período de carência (contribuinte individual), bem como que arrendava 50 % do imóvel rural desde 2012.

Sem razão quanto aos pontos.

Da análise dos autos, verifico que a sentença analisou com acerto e propriedade as questões controvertidas dos autos, merecendo ser mantida pelos seus próprios fundamento (evento 28, SENT1):

Fins de início de prova material do exercício rural no período pretendido para formar a carência exigida, a parte autora juntou diversas notas de produtos rurais, as quais remontam ao ano de 2002 e seguem.

Dado o remoto período em que a parte requerente pretende demonstrar o exercício da atividade rural, tenho por possível tomar como início de prova material os documentos da parte requerente no meio rural, de forma a não obstar o pleito veiculado na inicial. Logo, como forma de subsidiar o início de prova material, tenho pela possibilidade de avaliar a prova oral produzida nos autos.

A testemunha Vicente Orizenco declarou que o autor possui um propriedade rural na qual trabalha e que não tem conhecimento de que o autor trabalhe em outra atividade, somente tendo conhecimento que o autor sempre trabalhou na lavoura. Que a área tem 09 ou 10 hectares e o autor possui alguns gados na área. Relatou que o autor sempre morou nesta propriedade e que isso já faz mais de 30 anos. Que o autor não se afastou da atividade rural, somente arrendou parte de sua área um período, permanecendo utilizando a outra parte.

Milton Londero relatou que conhece o autor há 25 anos, porque o requerente mora próximo à propriedade do depoente. Que a área é de propriedade do autor e que o autor cultiva na área, plantando milho, mandioca e cria animais. Relatou que o autor sempre trabalhou no meio rural. Que o autor teve problema de saúde, mas não se afastou da atividade rural.

Orlando Picinin referiu que conhece o autor há 40 anos e que o autor ganhou a propriedade de herança do pai, sempre trabalhando na lavoura. Que o autor trabalha sozinho e que ficou doente, porém, continuou trabalhando na área.

Conforme se pode visualizar, as testemunhas esclareceram que a parte autora nunca se afastou da atividade rural e mesmo quando adoeceu, permaneceu trabalhando em parte da área, somente arrendando uma parcela da propriedade.

O mero recolhimento de poucas contribuições pelo autor, por si só, não afasta a sua qualidade de segurado especial.

Na hipótese, a parte autora demonstrou o exercício da atividade de forma suficiente, não tendo a autarquia feito contraprova.

Assim, tendo a autora completado a idade mínima para se aposentar e comprovado o efetivo exercício de atividade rural mediante início de prova material, corroborado por prova testemunhal idônea, durante o período de carência legalmente exigido, faz jus à concessão da aposentadoria por idade rural.

Como bem analisado pela sentença, os curtos períodos urbanos do autor, como contribuinte individual, não são suficientes para desqualificar uma vida inteira dedicada ao labor rural, mais de 30 anos, conforme comprovado nos autos.

Frise-se, ainda, que conforme o art. 143 da Lei n° 8213/91 e jurisprudência do STJ, o exercício da atividade rural pode ser descontínuo e o trabalho urbano intercalado ou concomitante ao trabalho campesino, não retira a condição de segurado especial.

Do mesmo modo, o arrendamento de até 50% do imóvel rural, por si só, não descaracteriza a qualidade de segurado especial da parte autora.

Nesse sentido, cito as seguintes jurisprudências:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. RESTABELECIMENTO. ARRENDAMENTO AGRÍCOLA. ÁREA INFERIOR A 50% DO IMÓVEL RURAL. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL NÃO DESCARACTERIZADA. 1. O contrato de parceria, meação ou comodato, cujo objeto é inferior a 50% (cinquenta por cento) da área do imóvel rural, não afasta a condição de segurado especial da parte autora, nos termos do que dispõe o inciso I do § 8º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 11.718/2008. 2. O arrendamento de parte da propriedade rural, por si só, não descaracteriza a condição de segurado especial, quando demonstrado que o grupo familiar permaneceu laborando na parte restante do imóvel e que a renda auferida com o arrendamento não era suficiente para a subsistência da família. 3. Hipótese em que mantida a sentença que determinou o restabelecimento da aposentadoria por idade rural desde a indevida cessação. (TRF4, AC 5013987-44.2020.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 17/12/2022)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. MOTORISTA DE TÁXI. ARRENDAMENTO DE PARTE DAS TERRAS. MANUTENÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. HONORÁRIOS. MAJORAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. DIFERIMENTO DE OFÍCIO. 1. Defere-se aposentadoria rural por idade ao segurado que cumpre os requisitos previstos no inciso VII do artigo 11, no parágrafo 1º do artigo 48, e no artigo 142, tudo da Lei 8.213/1991. 2. A utilização de táxi em áreas predominantemente rurais não é frequente, ocorrendo apenas de forma eventual e em caso de necessidade. Dessa forma, não há como afirmar que a atividade de taxista seria a principal fonte de renda do autor, podendo prescindir dos rendimentos obtidos com a atividade agrícola para sobreviver. Manutenção da condição de segurado especial. Imprescindibilidade da renda obtida com a atividade rural. 3. Não há descaracterização da condição de segurado especial do trabalhador rural que arrendar até 50% de imóvel rural cuja área total não seja superior a quatro módulos fiscais. 4. Nos casos em que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC), e que se nega provimento ao recurso, aplica-se a majoração prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. 5. Diferimento de ofício da definição da incidência da correção monetária para a fase de execução, aplicando-se provisoriamente, até a definição final, os índices previstos no art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009. (TRF4 5038085- 98.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ANNE KARINA STIPP AMADOR COSTA, juntado aos autos em 29/05/2019).

De mais a mais, restou demonstrado nos autos que o segurado permaneceu cultivando o restante da área em regime de economia familiar e não há informações nos autos de que a renda auferida com o arrendamento era suficiente ao sustento da família, ao contrário, as provas comprovam a preponderância da atividade rural como meio de subsistência familiar.

Assim sendo, mantém-se a sentença que concedeu aposentadoria rural por idade à parte autora, a contar da DER, em 07/03/2018.

Correção monetária e juros de mora

A partir do julgamento definitivo pelo Supremo Tribunal Federal do tema 810 da repercussão geral (RE 870947), o Superior Tribunal de Justiça firmou tese no julgamento do tema 905 dos recursos repetitivos (REsp 1495146) no sentido de que as condenações judiciais de natureza previdenciária sujeitam-se à atualização monetária e aos juros de mora da seguinte forma:

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

Com base em tal entendimento, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada da seguinte forma:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91) até o advento da EC 113/2021.

Os juros de mora, por sua vez, incidentes desde a citação (súmula 204 do STJ), de forma simples (não capitalizada), devem observar os seguintes índices e períodos:

- 1% ao mês até 29/06/2009;

- a partir de 30/06/2009, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009) até o advento da EC 113/2021.

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente. As eventuais alterações legislativas supervenientes devem ser igualmente observadas.

Ressalte-se, a fim de evitar recorrentes embargos declaratórios, que não há que se cogitar de violação aos Temas 810/STF e 905/STJ em razão da aplicação da SELIC, uma vez que o julgamento da questão pelo tribunais superiores não impede a alteração pelo poder constituinte derivado, cujo poder de reforma está limitado materialmente apenas às hipóteses previstas no art. 60, §4º, da Constituição Federal.

Anote-se que é pacífico no Superior Tribunal de Justiça que a correção monetária e os juros legais, como consectários da condenação, configuram matéria de ordem pública, podendo ser tratada pelo Tribunal sem necessidade de prévia provocação da parte e não lhes sendo aplicados os óbices do julgamento "extra petita" ou da "reformatio in pejus". A propósito: STJ, Primeira Turma, AgRg no REsp 1291244/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 05/03/2013; STJ, Segunda Turma, AgRg no REsp 1440244/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 10/10/2014; STJ, Segunda Turma, REsp 1781992/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 23/04/2019; STJ, Primeira Turma, AgInt no REsp 1663981/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 17/10/2019.

Assim, altero de ofício os consectários legais.

Honorários Recursais

Vencido o INSS tanto em primeira como em segunda instância, majora-se o saldo final dos honorários sucumbenciais que se apurar aplicando os critérios fixados pelo Juízo de origem, para a ele acrescer vinte por cento, nos termos do § 11 do art. 85 do CPC, observados os limites previstos no § 3º do referido artigo.

Prequestionamento

O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal e a análise da legislação aplicável são suficientes para prequestionar, às instâncias superiores, os dispositivos que as fundamentam. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração para esse exclusivo fim, o que evidenciaria finalidade de procrastinação do recurso, passível, inclusive, de cominação de multa, nos termos do art. 1.026, §2º, do CPC.

Tutela Específica

Deixo de determinar a implantação do benefício nesta instância, uma vez que a parte autora possui benefício de aposentadoria por idade rural ativo.

Conclusão

A sentença deve ser integralmente mantida.

De ofício, adequados os consectários legais.

Determinada a implantação do benefício.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, adequar, de ofício, os consectários legais.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004453330v199 e do código CRC e756f027.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 28/6/2024, às 19:46:26


5005055-62.2023.4.04.9999
40004453330.V199


Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:21.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005055-62.2023.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: RAMAO OMAR SARMENTO ALVES

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO AUTOR. arrendamento de parte do imóvel rural. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.

2. O labor urbano esporádico e em curtos períodos da parte autora, por si só, não afasta a condição de segurado especial do requerente, quando comprovada a indispensabilidade da atividade rural por ele desempenhada.

3. O arrendamento de parte das terras, por si só, não descaracteriza a condição de segurado especial, na medida em que restou demonstrado que o segurado permaneceu cultivando o restante da área em regime de economia familiar e que a renda auferida da atividade rural era essencial a subsistência da família.

4. Os requisitos restaram preenchidos, sendo devida a concessão da aposentadoria por idade rural em favor da parte autora, a contar da DER.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e adequar, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de junho de 2024.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004453331v7 e do código CRC 3e8e0556.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 28/6/2024, às 19:46:26


5005055-62.2023.4.04.9999
40004453331 .V7


Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:21.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/06/2024 A 27/06/2024

Apelação Cível Nº 5005055-62.2023.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: RAMAO OMAR SARMENTO ALVES

ADVOGADO(A): EDUARDO HECKLER (OAB RS098067)

ADVOGADO(A): GABRIEL ARAUJO RIBEIRO (OAB RS072165)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/06/2024, às 00:00, a 27/06/2024, às 16:00, na sequência 583, disponibilizada no DE de 11/06/2024.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E ADEQUAR, DE OFÍCIO, OS CONSECTÁRIOS LEGAIS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:21.

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