D.E. Publicado em 15/12/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012017-75.2012.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GRACIOSA PORTELA |
ADVOGADO | : | Eliane Teresinha Dalmas Ganassini e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SARANDI/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. SÚMULA 149 DO STJ. DESCONTINUIDADE.
. Fixada pelo STJ a obrigatoriedade do reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público na REsp 1101727/PR, a previsão do art. 475 do CPC/1973 torna-se regra, admitido o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
. Satisfeitos os requisitos legais de idade mínima e prova do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, é devida a aposentadoria rural por idade.
. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
. Havendo prova da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento por tempo significativo, que comprove que a parte autora passou a sobreviver da agricultura, deve ser admitido o direito à aposentadoria rural por idade com o cômputo de períodos anteriores descontínuos (artigos 24 e 143 da Lei n.º 8.213/91) para fins de implemento de carência.
. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento das custas, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
. Em se tratando de benefício já concedido em sede de antecipação de tutela na sentença ou em agravo de instrumento, dada a provisoriedade do provimento, é de torná-lo definitivo desde logo, em face do seu caráter alimentar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de dezembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8670531v4 e, se solicitado, do código CRC 5EA1FA9F. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
Data e Hora: | 06/12/2016 18:59 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012017-75.2012.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GRACIOSA PORTELA |
ADVOGADO | : | Eliane Teresinha Dalmas Ganassini e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SARANDI/RS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação e remessa oficial contra sentença que julgou procedente o pedido para conceder aposentadoria por idade rural à parte autora, desde a data do requerimento administrativo, condenando o INSS a pagar as parcelas devidas a partir do vencimento de cada uma, corrigidas pelo INPC e acrescidas de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação. A contar da vigência da Lei nº 11.960, em 1º-7-2009, foi determinada a incidência, de uma só vez, de atualização monetária e juros pelos índices oficiais aplicados à caderneta de poupança. Arcará a autarquia, também, com o pagamento das custas processuais, sendo isento das despesas judiciais e de condução e honorários advocatícios, de 10% sobre o valor total da condenação, excluídas as prestações vincendas. Foi deferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, e determinada a implantação imediata do benefício.
Em suas razões, sustenta a entidade previdenciária que não foi provada a atividade rural no período de carência por meio de início de prova material, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal. Alega que a existência de diversos vínculos urbanos registrados em nome do cônjuge da autora afastam a sua condição de segurada especial. Em caso de manutenção da sentença de procedência, requer que a verba honorária seja fixada de acordo com a súmula 111 do STJ.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (preferências legais), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a concessão de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
Quanto à carência, há regra de transição para os segurados obrigatórios previstos no art. 11, I,"a", IV ou VII: (a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".
Assim, àqueles filiados à Previdência quando da edição da Lei nº 8.213/91 que implementarem o requisito idade até quinze anos após a vigência desse dispositivo legal (24-7-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, II, mas a regra de transição antes referida.
Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Caso o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
O benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Da comprovação do tempo de atividade rural
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, salvo caso fortuito ou força maior. Tudo conforme o art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91 e reafirmado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Nesse contexto probatório: (a) a lista dos meios de comprovação do exercício da atividade rural (art. 106 da Lei de Benefícios) é exemplificativa, em face do princípio da proteção social adequada, decorrente do art. 194 da Constituição da República de 1988; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido; (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 980.065/SP, DJU, Seção 1, 17-12-2007; REsp n.º 637.437/PB, DJU, Seção 1, de 13-09-2004; REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.); (d) quanto à contemporaneidade da prova material, inexiste justificativa legal, portanto, para que se exija tal prova contemporânea ao período de carência, por implicar exigência administrativa indevida, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.
As certidões da vida civil, documentos admitidos de modo uníssono pela jurisprudência como início probatório de atividade rural, no mais das vezes, registram fatos muito anteriores à implementação da idade de 55 ou 60 anos, e fora dos prazos constantes do art. 142 da Lei 8.213/91. O período de carência, em se tratando de aposentadoria por idade rural, correspondente a estágio da vida do trabalhador em que os atos da vida passíveis de registro cartorário, tais como casar, ter filhos, prestar serviço militar, ou inscrever-se como eleitor, foram praticados muito antes do início do marco para a contagem da carência prevista para tal benefício.
Nesse sentido, a consideração de certidões é fixada expressamente como orientação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, 3ª Seção, REsp 1.321.493-PR, procedimento dos recurso repetitivos, j.10/10/2012). Concluiu-se imprescindível a prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, cabendo às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador:
"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."
De todo o exposto, consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Registre-se, por fim, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16.04.94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, ocorre após a comprovação junto à entidade pública das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que o próprio INSS já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.
Da prova da atividade rural prestada como boia-fria
No caso de exercício de trabalho rural caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal.
Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Cumpre salientar, também, que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se optar pelas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório.
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Do tempo rural do segurado especial a partir dos 12 anos de idade
No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo recentemente a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo tal questão maiores digressões.
Do caso concreto
Neste feito, o exame recursal abrange a apelação cível e a remessa oficial, expressamente interpostas diante da sentença recorrida (fls. 405/408).
Nessas circunstâncias, havendo recurso de apelação por parte do INSS, onde suscitados os tópicos indicados no relatório, tenho que quanto aos demais fundamentos de mérito a sentença deve ser confirmada por suas próprias razões, uma vez que lançada conforme a legislação aplicável. Tanto que a autarquia previdenciária deles teve expressa ciência e resolveu não se insurgir.
A parte autora, nascida em 05/03/1951 (fls. 18), implementou o requisito etário em 05/03/2006 e requereu o benefício na via administrativa em 19/03/2008 (fls. 74). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 150 meses anteriores à implementação da idade (05/09/1993 - 05/03/2006) ou nos 162 meses que antecederam o requerimento administrativo (19/09/1994 - 19/03/2008); ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Para a comprovação do trabalho rural, foram apresentados os seguintes documentos:
- Certidão de casamento, datada de 21/05/1981, na qual o cônjuge da autora e os pais de ambos foram qualificados como agricultores (fls. 19);
- Declaração de exercício de atividade rural, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campinas do Sul, datada de 01/06/2007, informando que a autora exerceu atividade rural de 1972 a 1981 em regime de economia familiar com Vitório Bonfanti, e de 1981 a 1982 em regime de parceria agrícola com Altair Fistarol (fls. 20/21);
- Declaração firmada por Altair Fistarol, datada de 18/05/2007, afirmando que a autora trabalhou em sua propriedade em regime de parceria agrícola (comodatária), de 1981 a 1982, acompanhada certificado de cadastro de imóvel rural referente aos exercícios de 1993/1994 (fls. 23/23 v);
- Certidão emitida pelo INCRA, datada de 15/02/2007, informando que Vitório Bonfante possuía imóvel rural cadastrado em seu nome nos períodos de 1965 a 1971, 1972 a 1977, 1978 a 1983 (fls. 24);
- Matrícula de imóvel rural em nome de Vitório Bonfante, pai da autora, na qual consta que ele transferiu o imóvel a Osvaldo Gromann em 17/01/1983 (fls. 25/26);
- Certidão de óbito de Vitório Bonfante, pai da autora, datada de 23/02/1988, na qual ele foi qualificado como agricultor (fls. 27);
- Ficha de identificação do pai da autora junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campinas do Sul/RS, com data de admissão em 27/07/1972 e registro de pagamento das mensalidades de 01/1971 a 06/1985, e na qual a autora consta como dependente, acompanhada de ficha de controle de pagamento das mensalidades (fls. 29/30);
- Certidão de nascimento de Altair Bonfante, irmão da autora, ocorrido em 22/07/1965, datada de 07/12/2006, na qual os pais da autora foram qualificados como agricultores (fls. 31);
- Certidão de nascimento de Genoir Ernesto Bonfante, irmão da autora, ocorrido em 09/03/1964, datada de 07/12/2006, na qual os pais da autora foram qualificados como agricultores (fls. 32);
- Ficha de identificação de Pedro Soares Portela, cônjuge da autora junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campinas do Sul/RS, com data de admissão em 08/07/1983 e registro de pagamento das mensalidades de 06/1982 a 05/1987, e na qual a autora consta como dependente, acompanhada de ficha de controle de pagamento das mensalidades (fls. 33/34);
- Certidão de nascimento de Andressa Fátima Portela, filha da autora, datada de 18/08/1982, na qual a autora e seu cônjuge foram qualificados como agricultores (fls. 35);
- Certidão de óbito de Angelina Badia Bonfante, mãe da autora, datada de 19/11/1984, na qual os avós da autora foram qualificados como agricultores (fls. 37);
- Solicitação de baixa e transferência do cônjuge da autora, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campinas do Sul/RS para o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Erechim/RS, datada de 26/08/1983 (fls. 38);
- Certidão de nascimento de Gláucia Portela, filha da autora, datada de 24/11/1995, na qual a autora e seu cônjuge foram qualificados como agricultores (fls. 39);
- Certidão de óbito de Gláucia Portela, filha da autora, datada de 18/11/1996, na qual a autora e seu cônjuge foram qualificados como agricultores (fls. 40);
- Certidão de casamento de Anderson Antônio Portela, filho da autora, e Juliane Paula Soder, datada de 30/11/2001, na qual a autora e seu cônjuge foram qualificados como agricultores (fls. 41);
- Ficha de cadastramento para requisição de talões de nota fiscal de produtor, preenchida em nome da autora, datada de 05/01/1994 (fls. 42/42 v.);
- Contrato de arrendamento, firmado pela autora com Benjamin Chiossi, com duração de 05/11/1999 a 05/11/2000 (fls. 43);
- Contrato de arrendamento, firmado pela autora com Benjamin Chiossi, com duração de 05/11/2000 a 05/11/2001 (fls. 44);
- Notas fiscais de entrada/produtor rural, emitidas em nome da autora, datadas de 16/05/1994, 04/05/1995, 26/04/1996, 29/04/1997, 29/10/1998, 13/08/1999, 04/07/2000, 26/01/2001, 29/05/2002, 19/04/2003, 17/04/2003, 15/06/2005, 31/07/2006, 07/05/2007, 23/04/2008, 19/03/2009, 31/08/2010 (fls. 45/70, 137/141);
- Resumo de documentos pra cálculo de tempo de contribuição, emitido em 24/03/2008, no qual o INSS reconhece a atividade da autora nos períodos de 17/05/1994 a 18/03/2008, totalizando 18 anos, 10 meses e 02 dias, ou 167 meses (fls. 73);
- Carteira de trabalho e previdência social da autora, na qual consta registro de vínculo empregatício no período de 01/05/2002 a 31/05/2004 (fls. 86/87);
- Termo de homologação de atividade rural, datado de 22/12/2009, no qual o INSS reconhece a atividade rural da autora no período de 01/01/1972 a 20/05/1981 (fls. 102);
- Resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição até 20/05/1981, no qual o INSS reconhece a atividade rural da autora no período de 01/01/1972 a 20/05/1981, totalizando 113 meses (fls. 148);
- CNIS da autora, no qual consta registro de vínculo empregatício no período de 01/05/2002 a 01/06/2004, recolhimento como contribuinte individual em 05/2007 e recebimento de benefício de 21/11/1995 a 20/03/1996 (fls. 174/175);
- Informações de benefício, emitida em 29/10/2009, na qual consta que a autora recebeu salário maternidade como trabalhadora rural, na qualidade de segurada especial, no período de 21/11/1995 a 20/03/1996 (fls. 177);
- Resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição até 29/10/2009, datado de 29/10/2009, no qual o INSS reconheceu a atividade rural da autora nos períodos de 01/01/2005 a 31/12/2006 e de 01/01/2008 a 20/10/2009, totalizando 46 meses (fls. 181);
- CNIS do cônjuge da autora, no qual constam registros de vínculos empregatícios nos períodos de 02/02/1981 a 02/04/1983, 01/09/1983 a 12/1984, 22/05/1987 a 01/10/1987, 28/01/1988 a 09/02/1988, 01/03/1988 a 09/12/1991, 01/01/1992 a 15/10/1994, 02/01/1992 a 15/05/1994, 01/06/1994 a 19/05/1997, 05/11/1997 a 31/07/2000, 01/05/2002 a 01/06/2004 (rural), 02/01/2005 a 05/09/2005, 01/11/2005 a 11/01/2006, 01/03/2006 a 01/02/2007 (rural), 28/08/2007 a 11/2009 (fls. 264/265).
A autora não foi ouvida em Juízo.
A prova testemunhal corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais (fls. 403).
A testemunha Jorge Leonel Shus declarou que conhece a autora desde 1987 ou 1988, que ela trabalha na agricultura. Afirmou ter visto a autora plantando para consumo, e que a autora vai a pé ou de carona para a propriedade onde trabalha. Disse que ela trabalha sozinha, em terras arrendadas, mas não sabe qual o tamanho. Referiu que ela planta feijão, milho, soja, sem o auxílio de empregados ou maquinário agrícola. Afirmou que conhece o esposo da autora, e que ele trabalhou na cidade.
A testemunha Adão dos Santos Rodrigues, por sua vez, relatou que a autora trabalha na agricultura pelo menos desde 1994. Ressaltou que a autora trabalha sozinha, em terras arrendadas, que se localizam próximo a casa dela. Disse que o marido da autora trabalhava na cidade.
Por fim, a testemunha Vilson Novaes Saldanha afirmou que a autora trabalha na agricultura desde 1988. Disse que a autora trabalha sozinha, sem ajuda do marido ou de empregados, em terras arrendadas, que medem aproximadamente 2 hectares. Referiu que a autora paga para alguém colher, mas não utiliza maquinário agrícola. Assinalou que o marido da autora trabalha na cidade.
Com relação à interpretação do termo "descontinuidade" (art. 143 da LBPS), encontram-se ao menos três interpretações na jurisprudência deste Regional:
a) a descontinuidade não impede o direito ao benefício desde que o retorno ao campo seja por período razoável, sendo este estabelecido por analogia ao art. 24, parágrafo único, da LBPS (1/3 do período de carência). Exemplo disso é o julgado na APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006832-51.2015.404.9999/RS, rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 19/06/2015)
b) a descontinuidade somente é admitida quando não superados os prazos de período de graça previstos no artigo 15 da Lei 8.213/91 ("O interregno que pode ser considerado como curto período de não exercício do trabalho campesino, para o efeito de não descaracterizar a condição de segurado especial e possibilitar a perfectibilização do período equivalente ao da carência, ficando a interrupção, dessa forma, albergada no conceito de descontinuidade, deve ser associado, por analogia, ao período de graça estabelecido no art. 15 da Lei de Benefícios, podendo chegar, portanto, conforme as circunstâncias, ao máximo de 38 meses [24+12+2]. Essa exegese, no tocante à utilização do período de graça do art. 15 da Lei de Benefícios como parâmetro de aferição do tempo de descontinuidade permitido, tem ressonância no âmbito do STJ.". Exemplo disso é o julgado no APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013645-65.2013.4.04.9999/RS, rel. Celso Kipper, j. 16/12/2015.
c) a descontinuidade não pode ser interpretada judicialmente de modo mais rigoroso que o faz a Administração, que no artigo 145 da IN 45/2010 estabelece tão somente dois pressupostos: (a) completar o número de meses igual ao período de carência exigido para a concessão do benefício e (b) esteja em efetivo exercício da atividade rural à época do requerimento administrativo. Desse modo, o direito ao benefício somente será afastado quando o retorno ao campo se der unicamente com o objetivo de requerer a aposentadoria especial, sendo admitido, contrariamente, sempre que o segurado tiver efetivamente voltado às lides rurais para dele sustentar-se, sem a fixação de um lapso definido. (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0008065-83.2015.4.04.9999/RS, rel. Paulo Afonso, j. 19/05/2016).
A diretriz contemporânea deve ser prestigiada.
Não somente pelo fato de ter sido o posicionamento vencedor em julgamento recente da 3ª Seção, mas porque melhor se coaduna aos princípios constitucionais que regem a relação dos segurados com a Administração Pública.
De fato, não se pode restringir a interpretação administrativa, estabelecida na IN 45/2010, invocando a legalidade estrita por força da aplicação analógica do artigo 24, parágrafo único, da LBPS, diante da incidência dos princípios da boa fé e da segurança jurídica, que asseguram ao cidadão, uma vez observado o regramento administrativo, o respeito aos efeitos prometidos pela própria Administração.
Ademais, milita em favor dessa interpretação não somente o artigo 145 da referida IN, como também os artigos 215 e 216 desse instrumento normativo, que admitem até mesmo a possibilidade de requerimento de aposentadoria especial mesmo que o segurado esteja em atividade urbana, desde que dentro de igual período previsto para a graça. Mais ainda, se estiver voltado para as lides rurais.
Transcrevo:
Art. 215. Para fins de aposentadoria por idade prevista no inciso I do art. 39 e art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 dos segurados empregados, contribuintes individuais e especiais, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e no inciso VII do art. 11 do mesmo diploma legal, não será considerada a perda da qualidade de segurado os intervalos entre as atividades rurícolas, devendo, entretanto, estar o segurado exercendo a atividade rural ou em período de graça na DER ou na data em que implementou todas as condições exigidas para o benefício.
Parágrafo único. Os trabalhadores rurais de que trata o caput enquadrados como empregado e contribuinte individual, poderão, até 31 de dezembro de 2010, requerer a aposentadoria por idade prevista no art. 143 da Lei 8.213, de 1991, no valor de um salário mínimo, observando que o enquadrado como segurado especial poderá requerer o respectivo benefício sem observância ao limite de data, conforme o inciso I do art. 39 da Lei nº 8.213, de 1991.
Art. 216. Na hipótese do art. 215, será devido o benefício ao segurado empregado, contribuinte individual e segurado especial, ainda que a atividade exercida na DER seja de natureza urbana, desde que o segurado tenha preenchido todos os requisitos para a concessão do benefício rural previsto no inciso I do art. 39 e no art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 até a expiração do prazo para manutenção da qualidade, na atividade rural, previsto no art. 15 do mesmo diploma legal e não tenha adquirido a carência necessária na atividade urbana.
Ou seja: a compreensão administrativa do artigo 143 pode ser entendida como interpretação sistemática da LBPS, em que se conjuga a letra do artigo 143 com o artigo 15 da mesma lei, cujo resultado hermenêutico pode ser assim explicitado:
Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no perío]do imediatamente anterior ao requerimento do benefício, (OBSERVADO O PERÍODO DE GRAÇA), em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
No caso em tela, o desempenho de atividade rural no último período rural reconhecido, que vai de 15/06/2005 a 31/08/2010 (notas fiscais de produto rural - fls. 65 e 140) evidencia que a autora de fato voltou a viver exclusivamente do trabalho rural. Concretamente demonstrada, pois, a reaquisição da condição de segurada especial, de modo que viável a concessão do benefício, haja vista que, como também comprovado nos autos, em época pretérita (de 09/03/1964 - certidão de nascimento do irmão da autora, na qual os pais foram qualificados como agricultores - fls. 32 a 05/11/2001 - contrato de arrendamento - fls. 44), a demandante desempenhou atividade rural nos termos exigidos. A soma dos interregnos comprovados excede o tempo equivalente à carência, na data do implemento do requisito etário ou da DER.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material e que a prova testemunhal é precisa quanto ao exercício da atividade rural no período de carência, razão porque a sentença merece confirmação pela Turma.
O INSS alegou que o fato de o cônjuge da autora ter exercido atividades urbanas e ter recebido salários em valores superiores ao do salário mínimo afastaria a sua condição de segurada especial.
Sem razão o apelante.
O fato de o marido da requerente ter exercido atividade urbana não afasta o direito invocado na inicial, nem é relevante para o caso em comento, porque foram apresentados documentos não só no nome do cônjuge, mas também em nome da autora.
O legislador, quando elaborou os dispositivos que regem o tratamento previdenciário ao trabalhador rural, encontrou no campo espécies diversificadas de agricultores, lá não existindo apenas as figuras de patrão e empregado, mas também trabalhadores que refugiam à classificação tradicional de Direito do Trabalho, que labutavam autonomamente. Ao verificar a natureza destes últimos, encontrou, além do produtor, familiares que o auxiliavam, que se agregavam à atividade produtiva. Daí porque contemplou, também, aqueles cuja atividade gravitava em torno do chefe da unidade familiar. Mas não deixou de registrar o termo "individualmente", conforme está no art. 11, inc. VII, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 11.718/2008 :
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (...)
O regime de economia familiar existe, portanto, para que os demais membros da família não restem à margem. No tocante, todavia, ao chefe da unidade familiar, pode ele estar trabalhando individualmente ou em regime de economia familiar, ou seja, com ou sem o auxílio de familiares. A descaracterização do regime de economia familiar, portanto, não afeta aquele que tem a iniciativa da produção, aquele que a dirige, aquele que vende o produto; somente se cogita de economia familiar em relação ao familiar que auxilia na atividade agrícola. Contrario sensu, ter-se-ia marginalizado o trabalhador que lidasse sozinho, que não possuísse família; e esta, evidentemente, não foi a vontade do legislador. Apenas em relação ao regime de economia familiar é que se exige exclusividade de fonte de renda. Ao trabalhador rural individualmente considerado não se lhe veda a concomitância de outro qualquer ganho. O legislador deixa claro, no § 2º do art. 11 supracitado que "todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas". É de toda evidência que possível para o trabalhador rural ter mais de uma fonte de renda; a restrição alcança apenas àquele familiar que trabalha agregado; e o pressuposto fático de guardar uma única fonte de renda dimana da dificuldade de demonstração do exercício do trabalho em família (as notas de compra de insumo e de venda de mercadorias estão, em regra geral, em nome do chefe da unidade familiar), tornando-se menos nítida tal participação quando o cônjuge ou parente detém fonte autônoma de subsistência.
Ademais, não logrou a autarquia demonstrar a condição de prescindibilidade do labor rural da autora para a subsistência do grupo familiar, sendo razoável admitir que o sustento da família não provinha exclusivamente da renda do marido como trabalhador urbano, ou como aposentado.
Cabe referir que o e. Des. Federal Celso Kipper, na fundamentação do voto que proferiu na AC 5008361-74.2012.404.7202, expõe estar consagrada na jurisprudência desta Casa que são aceitáveis, a título de remuneração percebida pelo cônjuge de segurado especial, sem descaracterizar tal condição, valores equivalentes a dois salários mínimos, verbis :
(a) reconhece-se a atividade agrícola desempenhada na condição de segurado especial quando os rendimentos do cônjuge não retiram a indispensabilidade daquela para a subsistência da família (normalmente rendimentos que não superem o valor de dois salários mínimos): Apelação Cível Nº 0007819-29.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, sessão de 14-09-2011, D.E. 26-09-2011; Apelação Cível Nº 0006403-26.2011.404.9999, 6ª Turma, Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, por unanimidade, sessão de 10-08-2011, D.E. 22-08-2011; AC 0000314-84.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, sessão de 08-06-2011, D.E. 16-06-2011; AC 0014562-55.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator Luís Alberto D"azevedo Aurvalle, sessão de 09-11-2011, D.E. 21-11-2011; TRF4, AC 0008495-11.2010.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, sessão de 12-07-2011, D.E. 21/07/2011 (6ª T, julgado em 21/05/2014).
Por fim, esclareço que, em consulta ao CNIS do cônjuge da autora, verificou-se que os valores das remunerações por ele percebidas não eram elevados a ponto de tornar prescindíveis os ganhos auferidos por ela com o trabalho agrícola.
Das custas
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
Dos honorários
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 deste TRF.
Da implantação do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Cumpre esclarecer que, em se tratando de benefício já concedido em sede de antecipação de tutela na sentença ou em agravo de instrumento, dada a provisoriedade do provimento, é de torná-lo definitivo desde logo, em face do seu caráter alimentar.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8670530v4 e, se solicitado, do código CRC A41532FF. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/12/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012017-75.2012.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00017420820118210069
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Cláudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GRACIOSA PORTELA |
ADVOGADO | : | Eliane Teresinha Dalmas Ganassini e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SARANDI/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/12/2016, na seqüência 98, disponibilizada no DE de 16/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8752687v1 e, se solicitado, do código CRC 755FC590. | |
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