Apelação Cível Nº 5003151-80.2018.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOAO FRANCISCO DE SIQUEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria rural por idade, em face do exercício de atividades rurais em regime de economia familiar.
Sentenciando, em 13/12/2017, o MM. Juiz julgou improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, suspendendo a exigibilidade tendo em vista a concessão de gratuidade de justiça.
Apela o autor, sustentando, em síntese, que o tamanho da propriedade rural não tem o condão de descaracterizar o regime de economia familiar. Alega, por fim, que o fato da companheira do autor ter vínculos urbanos e propriedades, por si só não descaracteriza a sua condição de segurado especial.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
A concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91), deve observar os seguintes requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres); e (b) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que de forma descontínua, independentemente do recolhimento de contribuições (art. 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III, e 39, I, da Lei nº 8.213/91).
Quanto à carência, o art. 143 da Lei nº 8.213/91, estabeleceu regra de transição para os trabalhadores rurais que passaram a ser enquadrados como segurados obrigatórios, na forma do art. 11, I, "a", IV ou VII, assegurando "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício".
Já o art. 142 da Lei de Benefícios previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".
Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subsequentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Outrossim, nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, por meio da qual foi alterada a redação original do referido art. 143 (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, por um período de 5 anos (60 meses) anterior ao requerimento administrativo, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/91, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser relativizada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido.
Em qualquer dos casos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Registre-se que o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia).
Ainda, quanto à questão da prova, cabe ressaltar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); e (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
CASO CONCRETO
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário em 23/03/2017 e formulou o requerimento administrativo em 24/03/2017. Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou imediatamente anteriores ao requerimento administrativo.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu o processo com, dentre outros, os seguintes documentos:
- Documento de Arrecadação de Receitas Federais - DARF, em nome do autor, com comprovantes de pagamento, referente aos anos de 2008, 2010, 2012, 2013, 2014 e 2016;
- Comprovante de inscrição no Cadastro de Produtor Rural do Estado do Paraná - CICAD - PRO, em nome do autor, emitida em 2010;
- Certificado de Cadastro de Imóvel Rural - CCIR, em nome do autor, referente aos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009;
- Recibos de Entrega da Declaração do ITR, em nome do autor, referente aos anos de 2010, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016;
- Notas Fiscais de produtos agrícolas, em nome do autor e de sua companheira, referentes aos anos de 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017;
- Comprovante de vacinação dos bovinos, em nome do autor, nos anos de 2015 e 2016.
Outrossim, as testemunhas ouvidas em audiência afirmaram que o autor sempre trabalhou na agricultura, o que está em consonância com os documentos juntados ao feito. Confirmaram que conhecem o autor há mais de 40 anos e que o mesmo sempre exerceu atividade em regime de economia familiar. Disseram que o autor plantava milho, feijão e miudezas, além de criar algumas cabeças de gado, vendendo a produção excedente. Alegam, ainda, que o autor continua exercendo labor rural atualmente.
Apesar de robusta a prova material e testemunhal juntada nos autos, estas não lograram êxito em comprovar a qualidade de segurado especial do autor, tendo em vista a extensão do imóvel rural da qual o apelante é proprietário. Verifica-se pelo Comprovante de Inscrição no Cadastro de Produtor Rural do Estado do Paraná - CICAD - PRO, presente no movimento 1.15, que o autor é proprietário de uma área de 103,9 ha, constando ainda que a totalidade da área explorada é de 100%. Logo, a propriedade pertencente ao autor é superior a 4 módulos fiscais, não podendo o mesmo ser enquadrado como segurado especial, conforme disposto no artigo 11, VII da Lei nº 8.213/91.
Assim sendo, o pedido foi indeferido pelo Magistrado a quo, cujos fundamentos, por oportuno transcrevo:
"[...] Embora constem nos autos documentos que evidenciem a atividade rural exercida pelo autor, bem como tendo as declarações prestadas em juízo ido de encontro com a prova material produzida, compulsando os presentes autos, verifica-se do Cadastro de Produtor rural do autor (mov. 1.15), que o mesmo é proprietário de imóvel rural com área total de 103,9 ha, consta ainda do referido cadastro, que a totalidade de área explora é de 100% (cem por cento) dos 103,9ha.
Conforme a tabela disponível em: http://www.iap.pr.gov.br/pagina-1328.html. A propriedade pertencente ao autor é superior a (quatro) módulos fiscais, o que lhe descaracteriza como segurado especial, por estar em desconformidade com o disposto no inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/91.
[...]
Embora, a prova oral declare que o autor reside e labora no meio rural, sua condição de segurado especial restou descaracterizada em razão de ser proprietário de área rural superior à 4 (quatro) módulos fiscais, estando em desconformidade com o que preceitua o artigo 11, inciso VII da Lei nº 8.213/91.
Assim, tendo restada descaracterizada a condição de segurado especial, não há que se falar em concessão de aposentadoria por idade rural. [...]"
Vale ressaltar, que a companheira do autor possui diversos vínculos urbanos, além de possuir propriedades para aluguéis, reforçando o entendimento de que o autor não se trata de um segurado especial.
Logo, não restando comprovada a condição de segurada especial pela parte autora, deve ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre o valor da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do §2º do artigo 85 do NCPC, cuja exigibilidade fica suspensa em face da AJG.
CONCLUSÃO
Apelação improvida e honorários majorados.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5003151-80.2018.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOAO FRANCISCO DE SIQUEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. não comprovados. tamanho da propriedade. honorários advocatícios.
1. Improcede o pedido de aposentadoria rural por idade quando não atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, §1°, e 142, da Lei n° 8.213/1991.
2. Considera-se comprovado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea.
3. Hipótese em que não restou comprovada a condição de segurado especial do autor durante todo o período de carência.
4. A área da propriedade rural, que ultrapassa os 4 módulos fiscais previstos no artigo 11, VII, da Lei nº 8.213/1991.
5. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no §11 do art. 85 do CPC/2015, cuja exigibilidade fica suspensa em vista da concessão de AJG.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 21 de maio de 2019.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001042645v5 e do código CRC 0a638390.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/05/2019
Apelação Cível Nº 5003151-80.2018.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOAO FRANCISCO DE SIQUEIRA
ADVOGADO: VERA DIANA TOMACHESKI (OAB PR042415)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/05/2019, na sequência 95, disponibilizada no DE de 06/05/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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