Apelação Cível Nº 5001375-35.2024.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: MARINES LEANDRA BOHRER
ADVOGADO(A): RAFAEL TICIAN (OAB RS106469)
ADVOGADO(A): DANIEL TICIAN (OAB RS083349)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de recursos contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, em que foram julgados procedentes os pedidos, com dispositivo de seguinte teor:
"III - Dispositivo
Pelo exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados por MARINES LEANDRA BOHRER em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, para o fim de condenar o demandado a:
a) reconhecer e averbar o período de atividade urbana laborada na empresa Realce Calçados, de 06.01.1998 a 12.02.1998, conforme quadro 2 - atividade urbana constante na inicial;
b) reconhecer e averbar a especialidade da atividade desenvolvida pela autora, a ser convertido pelo fator 1,20, os períodos que laborou nas empresas Calçados Wagner, Indústria de Palmilhas Brocker, Calçados Andine e Passos da Moda, conforme quadro 01 da inicial;
c) conceder a aposentadoria por tempo de contribuição ao autor, desde a DER, em 01.02.2018;
d) pagamento das parcelas vencidas desde a DER, corrigidas nos termos da fundamentação acima, descontada eventual parcela já paga; e respeitada a prescrição quinquenal.
Sucumbente, a parte demandada deverá arcar com os ônus sucumbenciais. Em se tratando de Fazenda Pública, esta é isenta da Taxa Única de Serviços Judiciais, na forma do art. 5º, I, da Lei Estadual 14.634/14, devendo, contudo, reembolsar a parte vencedora em eventuais despesas que suportou para estar em juízo, inclusive referente ao eventual pagamento da referida taxa, conforme tese fixada no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, Nº 70081401986, julgado pelo Tribunal Pleno, do Tribunal de Justiça do RS, com relatoria do E. Desembargador Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em: 08-09-2020.
Por outro lado, a autarquia deverá arcar com o pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte adversa, os quais fixo em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até esta sentença, considerando os vetores do §2° e a disciplina do § 3°, inciso I, ambos do artigo 85 do CPC e o enunciado 111 da súmula de jurisprudência Superior Tribunal de Justiça, devendo incidir sobre essa verba correção monetária desde a fixação pelo INPC e, além disso, juros moratórios a partir do trânsito em julgado, na forma do §16, do art. 85, CPC."
Apelou o INSS sustentando não ter sido comprovado o exercício de labor especial nos períodos de 01/04/1998 a 29/08/2006, 01/03/2007 a 29/10/2011, 01/06/2012 a 31/08/2016 e 03/07/2017 a 01/02/2018, uma vez que não informado o nível de concentração dos agentes químicos, bem como porque não demonstrada a permanência da exposição, que, de todo modo, foi elidida pelo uso de EPIs eficazes. Subsidiariamente, requereu o reconhecimento da impossibilidade da continuidade no exercício de atividades especiais após a obtenção da aposentadoria especial, além da adoção da taxa SELIC na atualização do valor da condenação a partir da EC n.º 113/2021.
A parte autora interpôs recurso adesivo requerendo a concessão do benefício de aposentadoria especial a contar da DER.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Deixa-se de conhecer da apelação do INSS, por ausência de interesse recursal, quanto à pretensão de afastamento das atividades especiais para o recebimento da aposentadoria especial, à medida que a sentença recorrida sequer abordou o ponto e se limitou a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à segurada.
Mérito
Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 01/04/1998 a 29/08/2006, 01/03/2007 a 29/10/2011, 01/06/2012 a 31/08/2016 e 03/07/2017 a 01/02/2018;
- à consequente concessão de aposentadoria especial, a contar da DER (01/02/2018).
- aos critérios de correção monetária e juros de mora.
Da atividade especial
A r. sentença proferida pela MM. Juíza de Direito Estadual Vivian Feliciano assim analisou as questões controvertidas, in verbis:
"(...)
Atividade especial
Período de atividade especial
Para o intervalo em que trabalhou na empresa Wagner Calçados foi elaborada prova pericial por similaridade na empresa Calçados Andine, tendo o perito apontado a presença de agentes químicos (cola e solvente a base de hidrocarbonetos), o que caracteriza a atividade como especial.
O formulário PPP apresentado pela empresa Passos da Moda demonstrou a presença de agente químico adesivo durante o desempenho das atividades, o que torna o trabalho especial.
No intervalo que exerceu atividade junto a empresa Industria de Palmilhas Brocker, a parte autora desempenhou atividade junto ao setor de Rebite, tendo o LTCAT apontado a presença de agente químico óleo mineral, configurando a atividade como especial (ev 2, RÉPLICA_IMPUG E DOCS5, fl. 45).
O LTCAT utilizado para a confecção do PPP da empresa Passos da Moda apresenta a presença de agentes químicos no setor de corte, onde a autora trabalhava (ev 2, RÉPLICA_IMPUG E DOCS5, fl. 37), o que também constou no formulário PPP (ev 2, ini1, fl. 28), de modo que é suficiente para caracterizar a atividade como especial.
É possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre sendo necessário restar demonstrado que o segurado estava sujeito, diuturnamente, em condições prejudiciais à sua saúde.
(...)
Destarte, tem-se como períodos de labor especial junto as empresas, nas forma em que indicado no quadro 01 da inicial: Calçados Wagner, Indústria de Palmilhas Brocker, Calçados Andine e Passos da Moda, os quais somados alcançam 25 anos, 1 meses e 18 dias.
Convertendo o período comum em especial, e utilizando-se o fator de conversão 1,20, alcança-se 30 anos, 01 mês e 25 dias, o qual deve ser computado para o fim da aposentadoria por tempo de contribuição.
Conversão do tempo comum em especial
Definida a conversão do tempo de trabalho em condições especiais para o comum, impõe-se examinar o restante do período não reconhecido como especial.
Nesse passo, foram reconhecidos administrativamente 25 anos, 01 mês e 18 dias de tempo de contribuição até a data da DER (01.02.2018), devendo ser somado o período reconhecido como de atividade especial, de 05 anos.
Portanto, somados todos os tempos de contribuição acima apontados, a operação resulta em 30 anos e 02 meses de contribuição, tempo suficiente pra obtenção do benefício postulado, de modo que resta prejudicado o pedido para analisar tempo de contribuição após a DER.
(...)"
Acrescente-se que os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos - tóxicos orgânicos e inorgânicos - , diferentemente do que ocorre com alguns agentes agressivos, como ruído, calor, frio ou eletricidade, não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários, especificamente quando o contato é MANUAL e não apenas AÉREO.
Ainda, a exigência de comprovação da exposição habitual e permanente do segurado a agentes nocivos para fins de caracterização da especialidade de suas atividades foi introduzida pela Lei n.º 9.032/95, razão pela qual, para períodos anteriores a 28-04-1995, a questão perde relevância.
Em relação aos intervalos posteriores a 28/04/1995, registro que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.032/95, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n. 0003929-54.2008.404.7003, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n. 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF n. 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF n. 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Deve-se lembrar, ainda, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.
Por fim, a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é considerada irrelevante para o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas sob exposição a agentes nocivos até 03/12/1998, data da publicação da MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o § 2.º do artigo 58 da Lei 8.213/91.
Para os períodos posteriores, merece observância o decidido pela 3ª Seção desta Corte, ao julgar o IRDR n.º 5054341-77.2016.4.04.0000, em 22/11/2017, quando fixada a seguinte tese jurídica:
“A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário.”
Conforme estabelecido no precedente citado, tem-se que a mera anotação acerca da eficácia dos equipamentos protetivos no PPP apenas pode ser considerada suficiente para o afastamento da especialidade do labor caso não contestada pelo segurado.
Há, também, hipóteses em que é reconhecida a ineficácia dos EPIs ante a determinados agentes nocivos, como em caso de exposição a ruído, a agentes biológicos, a agentes cancerígenos e à periculosidade. Nessas circunstâncias, torna-se despiciendo o exame acerca do fornecimento e da utilização de EPIs.
Nos demais casos, a eficácia dos equipamentos de proteção individual não pode ser avaliada a partir de uma única via de acesso do agente nocivo ao organismo, mas a partir de toda e qualquer forma pela qual o agente agressor externo possa causar danos à saúde física e mental do segurado trabalhador ou risco à sua vida.
No caso dos autos, relativamente ao período a partir de dezembro de 1998, há apenas referências genéricas ao fornecimento e/ou utilização de EPIs, sem afirmação categórica de que os efeitos nocivos do agente insalutífero tenham sido neutralizados ou ao menos reduzidos a níveis aceitáveis, de forma que não resta elidida a natureza especial da atividade.
Quanto aos agentes químicos, a utilização de luvas e cremes de proteção não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposto o segurado.
Os cremes de proteção são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por não ocasionarem perda de tato ou movimentação dos trabalhadores. Considerando-se o desgaste natural da camada protetora proporcionada por esses cremes em virtude do manuseio de equipamentos, ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral em análise, torna-se impossível a avaliação do nível de proteção a que está sujeito o trabalhador.
Assim, não convincente a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, ainda que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos, ainda mais considerando que a exposição do segurado ocorria de forma "contínua e permanente".
Frise-se que tal entendimento vem sendo reiteradamente adotado no âmbito trabalhista, restando caracterizada a insalubridade do labor, em grau máximo, desempenhado por trabalhadores da área de mecânica de manutenção, ainda que demonstrada, por meio de prova técnica, a adequada utilização de cremes protetores. Nesse sentido:
RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CREME DE PROTEÇÃO. Em que pese a conclusão do perito engenheiro, no sentido de não serem insalubres as atividades laborais da reclamante, pelo uso adequado do creme de proteção para as mãos, esta Turma Julgadora, na sua atual composição, adota o entendimento de que os cremes de proteção, mesmo com Certificado de Aprovação, e utilização regular pelo trabalhador, não são eficazes para neutralizar de forma eficiente a ação dos agentes insalubres, porquanto não formam uma barreira de proteção uniforme sobre as mãos e antebraços, a qual não permanece íntegra após o atrito das mãos com as peças manuseadas. Adicional de insalubridade devido. (TRT4, RO 0002111-72.2012.5.04.0333; 9ª Turma; Relatora Desa. Maria da Graça Ribeiro Centeno. 22/05/2014).
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CONTATO COM PRODUTOS QUÍMICOS DE ORIGEM MINERAL. "LUVA INVISÍVEL". GRAU MÁXIMO. O fornecimento e o uso do creme protetor, ainda que o obreiro o reaplique de forma periódica, consiste em uma "luva invisível" que vai sendo retirada com o manuseio, expondo o empregado ao contato direto com o agente insalubre. A proteção insuficiente é fator de aumento do risco, pois o trabalhador, acreditando estar imune, age com menor cautela do que quando não está usando nenhum equipamento de proteção individual. (TRT4, RO 0000145-35.2013.5.04.0561; 6ª Turma; Relator Des. Raul Zoratto Sanvicente. 26/02/2014).
Por conseguinte, considerando que a caracterização da especialidade do labor em decorrência da exposição do segurado a agentes químicos prescinde de análise quantitativa, bem como demonstrada a impossibilidade de total neutralização dos efeitos de tais agentes pelo uso dos EPIs fornecidos à parte autora, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.
Assim, fica mantida a sentença.
Direito à aposentadoria especial no caso concreto
Mantido o tempo de serviço, no caso em exame, a parte autora alcança, na DER (01/02/2018), 25 anos, 1 mês e 18 dias de tempo de serviço especial.
A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2018 (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida, tendo em vista que a parte autora possuía mais de 180 contribuições na DER.
Assim, tem a parte autora direito à aposentadoria especial, a contar da DER.
Dá-se provimento ao recurso adesivo da parte autora, no ponto.
Transcorridos menos de cinco anos entre a DER e o ajuizamento da ação, não há prescrição quinquenal.
Da necessidade de afastamento da atividade especial
No julgamento do Tema 709, em sede de embargos de declaração julgados em 23/02/2021, o STF fixou a seguinte tese:
"I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão"
Definida, em decisão com efeitos vinculantes, a questão da constitucionalidade da norma que veda a percepção de aposentadoria especial pelo segurado que permanece em atividade classificada como especial ou que a ela retorna, e estabelecida a eficácia da decisão, impõe-se assegurar à Autarquia previdenciária a possibilidade de proceder à verificação quanto à permanência do segurado no exercício de atividade classificada como especial ou quanto ao seu retorno. Uma vez verificada a continuidade ou o retorno do labor especial, poderá cessar (suspender) o pagamento do benefício previdenciário em questão, sem prejuízo do pagamento dos valores vencidos desde o termo inicial do benefício até a data da cessação.
Ressalte-se que, nos casos específicos de profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, encontram-se suspensos os efeitos do decidido pelo STF no caso, nos termos da decisão liminar proferida pelo Exmo. Min. Relator Dias Toffoli. Em tais casos, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.
Consectários e provimentos finais
- Correção monetária e juros de mora
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.
Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema xEspecial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.
Honorários advocatícios
Considerando que houve ampliação da condenação por este julgamento, faz jus a parte autora aos honorários, no percentual já estipulado em
sentença, incidente sobre os valores devidos até o acórdão (Súm. 111 do STJ).
Em 26/08/2020, foi afetado pelo STJ o Tema 1059, com a seguinte questão submetida a julgamento: "(Im)possibilidade da majoração, em grau recursal, da verba honorária estabelecida na instância recorrida, quando o recurso for provido total ou parcialmente, ainda que em relação apenas aos consectários da condenação".
Ainda que não determinada a suspensão dos feitos neste grau de jurisdição, mas considerando a necessidade de evitar prejuízo à razoável duração do processo, a melhor alternativa, no caso, é diferir, para momento posterior ao julgamento do tema, a decisão sobre a questão infraconstitucional afetada, sem prejuízo do prosseguimento do feito quanto aos demais temas, evitando-se que a controvérsia sobre consectários possa produzir impactos à prestação jurisdicional principal.
Assim, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.
Tutela específica - implantação do benefício
Possível desde logo a determinação de implantação do benefício, sem prejuízo da respectiva cessação, caso o INSS verifique que o segurado permaneceu ou retornou ao exercício de atividade especial, nos termos da decisão do STF no tema 709.
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.
TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
---|---|
CUMPRIMENTO | Implantar Benefício |
NB | 1860249822 |
ESPÉCIE | Aposentadoria Especial |
DIB | 01/02/2018 |
DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
DCB | |
RMI | A apurar |
OBSERVAÇÕES |
Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
Conclusão
Parcialmente provida a apelação do INSS para adequar os critérios de juros de mora e de correção monetária. Provido o recurso adesivo da parte autora para determinar a concessão de aposentadoria especial. Majoração da verba honorária diferida, nos termos da fundamentação. Nos demais pontos, mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, voto por conhecer em parte da apelação do INSS e, nesta extensão dar-lhe parcial provimento, dar provimento ao recurso adesivo da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004414419v72 e do código CRC 93231753.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 26/4/2024, às 14:18:37
Conferência de autenticidade emitida em 03/05/2024 08:01:28.
Apelação Cível Nº 5001375-35.2024.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: MARINES LEANDRA BOHRER
ADVOGADO(A): RAFAEL TICIAN (OAB RS106469)
ADVOGADO(A): DANIEL TICIAN (OAB RS083349)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS HIDROCARBONETOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EPIS. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO.
1. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.
2. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários.
3. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte.
4. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. A eficácia dos equipamentos de proteção individual não pode ser avaliada a partir de uma única via de acesso do agente nocivo ao organismo, como luvas, máscaras e protetores auriculares, mas a partir de todo e qualquer meio pelo qual o agente agressor externo possa causar danos à saúde física e mental do segurado trabalhador ou risco à sua vida.
5. Preenchidos os requisitos legais, tem a segurada direito à obtenção de aposentadoria especial.
6. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos.
7. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
8. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
9. A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, nos termos do art. 3º da EC 113/2021, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer em parte da apelação do INSS e, nesta extensão dar-lhe parcial provimento, dar provimento ao recurso adesivo da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de abril de 2024.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004414420v11 e do código CRC f0682a5c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 26/4/2024, às 14:18:37
Conferência de autenticidade emitida em 03/05/2024 08:01:28.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/04/2024 A 24/04/2024
Apelação Cível Nº 5001375-35.2024.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: MARINES LEANDRA BOHRER
ADVOGADO(A): RAFAEL TICIAN (OAB RS106469)
ADVOGADO(A): DANIEL TICIAN (OAB RS083349)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/04/2024, às 00:00, a 24/04/2024, às 16:00, na sequência 403, disponibilizada no DE de 08/04/2024.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DA APELAÇÃO DO INSS E, NESTA EXTENSÃO DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, DAR PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 03/05/2024 08:01:28.