Apelação Cível Nº 5013214-25.2018.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: HERCILIO DE OLIVEIRA BEZ (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora (evento 71) contra sentença, publicada em 11/06/19, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos (evento 67):
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES EM PARTE OS PEDIDOS formulados na inicial e extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para condenar o INSS a:
a) AVERBAR como tempo de serviço especial o período de 01-09-1986 a 28-04-1995, com o acréscimo de 40%;
b) IMPLANTAR em favor do autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da data do requerimento administrativo (DER 09-02-2018);
c) PAGAR os valores atrasados, respeitada a prescrição quinquenal, conforme cálculos a serem realizados em fase de execução.
Em razão da decisão do STF nos Embargos de Declaração do RE 870.947, em 24-09-2018, em que foi deferido efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas", fixo atualização monetária pela TR e juros moratórios segundo a remuneração da caderneta de poupança, a partir da citação, com incidência uma única vez (juros não capitalizados), conforme art. 1º.-F, da Lei nº 9.494-1997, na redação da Lei nº 11.960-2009, devendo eventuais diferenças decorrentes da aplicação do índice de correção monetária ser pagas após e conforme o julgamento dos Embargos de Declaração no tema 810 pelo STF.
Havendo sucumbência recíproca, condeno as parte ao pagamento dos honorários periciais fixados no evento 14, na proporção de 50% para cada, na forma do art. 373, I (ou II) do CPC. Por ter sido deferido o benefício da assistência judiciária gratuita, requisite-se à Justiça Federal.
Do mesmo modo, havendo sucumbência recíproca, com base no art. 85, §§ 2º, 3º, 4º, 8º, e 14 e no art. 86, ambos do CPC, fixo os honorários para cada um dos patronos. Sendo assim, considerando o mínimo proveito econômico auferido na demanda: [a] condeno o autor a pagar ao INSS honorários sucumbenciais que fixo em R$1.000,00 (um mil reais); e, [b] condeno o INSS a pagar ao autor honorários sucumbenciais no mesmo valor. Por ter sido deferido o benefício da assistência judiciária à parte autora, fica suspensa a exigibilidade enquanto perdurar o benefício.
Publicação e registro eletrônicos. Intimem-se.
Sem reexame necessário, forte no art. 496, § 3º, I, do CPC. Interposto recurso voluntário, intime-se a parte apelada para contrarrazões e, oportunamente, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade, nos termos do artigo 1.010, §§1º e 3º do CPC.
Certificado o trânsito em julgado da ação e não remanescendo quaisquer providências a serem adotadas, arquivem-se os autos.
O apelante destaca os seguintes argumentos: a) reformar a r. sentença, julgando procedente o pedido de reconhecimento de tempo especial dos períodos requeridos na inicial (29-04-1995 a 08-02-18), bem como a conversão do tempo de serviço comum, nos períodos de 01/08/1981 a 30/06/1982 de 30/06/1982 a 01/03/1984, para tempo especial, com o fator de conversão 0.70, para efeitos de aposentadoria especial (Espécie 46). b) Determinar ao INSS que conceda ao Apelante o BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA ESPECIAL (ESPÉCIE 46), a contar do requerimento administrativo (09/02/2018 – NB: 42/180.729.760-5), com renda mensal equivalente a 100% do salário de benefício, corrigida e aplicando-se os reajustes legais posteriores, eis que o requerente, já contava na DER (09/02/2018) com 33 anos, 04 meses e 07 dias de tempo de atividade especial, que convertido equivale a 46 anos, 06 meses e 24 dias de tempo de trabalho exercido sob condições especiais e comum. c) Subsidiariamente requer-se a concessão da APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – pela regra 85/95, desde que a mesma alcance a renda mensal inicial de 100% do Salário de Benefício, a partir da data do requerimento administrativo; d) Requer ainda, a condenação ao pagamento das diferenças de todas as parcelas vencidas e vincendas, a contar da data do pedido administrativo do benefício (09/02/2018), atualizada monetariamente e acrescidas de juros legais.
É o relatório.
VOTO
A controvérsia restringe-se ao reconhecimento do tempo de serviço prestado sob condições especiais, no intervalo de 29-04-1995 a 08-02-18, devidamente convertido para tempo comum, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Conversão de tempo comum para especial - impossibilidade
Busca a parte autora a conversão do tempo de serviço comum, nos períodos de 01/08/1981 a 30/06/1982 de 30/06/1982 a 01/03/1984, para tempo especial, com o fator de conversão 0.70, para efeitos de aposentadoria especial (Espécie 46).
No que diz respeito à conversão do tempo de serviço comum para especial, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, no RESP nº 1.310.034, representativo de controvérsia, deixou assentado que, após a Lei nº 9.032, somente se admite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço em condições especiais. Assim, a conversão somente é permitida para o caso de implemento de todos os requisitos para o benefício de aposentadoria especial até 28/04/1995.
Assim, não procede o pedido de conversão do período comum em atividade especial, tendo em vista que o segurado não implementou as condições para o benefício até 28.04.95.
Do tempo especial no caso concreto
Período: 29-04-1995 a 08/02/18
Empresa: Instituto de Metrologia de Santa Catarina
Função:
A- 29/04/95 a 30/04/2006, Metrologista;
B- 01/05/2006 a 01/03/2015, Metrologista, Inspetor e Ficalização;
C- 02/03/2015 a 17/04/2019, Gerente Metrologia;
Agentes nocivos: Periculosidade
Enquadramento legal: Súmula 198 do TFR
Provas: PPP9 (evento 1), Laudo pericial produzido em processo trabalhista (evento 28) e laudo pericial judicial produzido nos presentes autos (evento 58).
Na hipótese dos autos é inconteste que houve exposição a substâncias altamente inflamáveis, tendo em vista que o autor como Metrologista e como Metrologista, Inspetor e Ficalização, suas atividades eram realizadas na Sede do IMETRO e externas, na fiscalização de Postos de Combustíveis e Indústrias.
Diante disso, tem-se que, em se tratando de atividades em locais em que há armazenamento de inflamáveis, como no caso concreto, é notável o risco de explosão e incêndio, evidenciando a periculosidade da atividade laboral (EIAC n. 2002.71.08.013069-1, Terceira Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto da Silveira, D.E. de 18-08-2008). Cumpre observar que, em se tratando de labor em local perigoso, em que é ínsito o risco potencial de acidente, não é exigível a exposição de forma permanente.
Quanto ao reconhecimento da especialidade da atividade em face da periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis, vejam-se os precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL. MOTORISTA DE CAMINHÃO. PENOSIDADE. TRANSPORTE DE COMBUSTÍVEIS. PERICULOSIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. (...). 4. Havendo a comprovação de que o trabalho foi exercido em condições agressivas à saúde, deverá ser considerado especial, ainda que a atividade não esteja arrolada nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, cujos rol de agentes nocivos é meramente exemplificativo. Hipótese na qual tem incidência a Súmula nº 198 do TFR. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 5. Ao se avaliar a especialidade da atividade de transporte e comercialização de combustíveis, não se pode deixar de considerar o aspecto peculiar da periculosidade que decorre do trabalho envolvendo produtos químicos altamente inflamáveis e explosivos como a gasolina, o álcool e óleo diesel, cujo manuseio deve observar estritamente normas e padrões específicos de segurança e proteção. 6. Comprovada a especialidade da atividade desempenhada nos períodos pugnados, tem a parte autora direito ao benefício pleiteado. (TRF4 5030407-61.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, minha relatoria, juntado aos autos em 20/02/2020)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. USO DE EPI. INFLAMÁVEIS. PERICULOSIDADE. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. PERMANÊNCIA NA ATIVIDADE ESPECIAL APÓS A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 2. O simples fato de a parte autora trabalhar com transporte de combustíveis e produtos inflamáveis, caracteriza a periculosidade decorrente do risco de explosão destes produtos, devendo ser reconhecido o respectivo tempo de serviço como especial. (...). (TRF4, AC 5001752-53.2014.4.04.7122, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 19/10/2018)
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE LABOR EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. HIDROCARBONETOS. PERICULOSIDADE. FRENTISTA (...). 6. Comprovado o exercício de atividade em área de risco (Anexo 2 da NR 16) com a consequente exposição do segurado a agente perigoso - periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis - deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço como especial, dado o risco de explosão desses produtos. 7. Em se tratando de circunstância perigosa, é ínsito o risco potencial de acidente, em virtude do que não é exigível a exposição de forma permanente. Em postos de combustíveis, em que há armazenamento de inflamáveis, é notável o risco de explosão e incêndio, evidenciando a periculosidade da atividade laboral (EIAC n. 2002.71.08.013069-1, Terceira Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto da Silveira, D.E. de 18-08-2008). (AC n. 0002605-18.2015.4.04.9999, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Roger Raupp Rios, D.E. de 22-06-2017)
Contudo, na hipótese dos autos a discussão central refere-se ao requisito da habitualidade e permanência.
O laudo trabalhista realizado, que contempla essencialmente a função de metrologista, assim avaliou:
Durante o ato pericial o Autor declarou que todos os meses executam atividades desta natureza, ou seja, fiscalização em posto de combustível líquido e gasoso, Afirmou também que em várias oportunidades tinha que se dirigir aos postos de gasolina para colher amostra e levar até o imetro. O representante da reclamada não discordou das informações Em relação ao tempo de exposição, tanto o autor quanto o representante da Reclamada foram categóricos em afirmar que tempo vária da quantidade de equipamento instalado em cada posto. Ambos também afirmaram que são fiscalizados em média de 3 a 4 postos por dia. A fiscalização é feita em todo o estado. Deve-se esclarecer sobre atividade habitual. Habitual é aquela atividade programada, conhecida, cuja execução sabe-se que irá ocorrer. Por sua vez, eventual é a tarefa não programada, que não faz parte das atividades comuns do trabalhador, que não se tem previsão de ocorrer. Portanto, no caso do autor as atividades desempenhadas junto aos postos são habituais e com tempo de permanência considerável.
Em sentido oposto o laudo pericial judicial, desfavorável ao autor e acolhido pelo Magistra a quo:
Em 17 anos foram levantados 20030 inspeções e fiscalizações, correspondente a 1178 atividades/ano. Considerando em média 252 dias úteis/ano e descontando 20 dias de férias/ano foi estimado que o autor realizava em média de 5 atividades/dia, de inspeções/fiscalizações (5 bombas/dia). Com existem Postos de Combustíveis com 2 bombas, outros com 4 bombas ou mais, ficou concensado com o autor que este realizava em média uma (01) atividade externa/dia, de inspeções e fiscalizações. Segundo autor, uma inspeção demorava de 2 a 4 horas/dia. Considerando uma média de 3 horas/jornada de trabalho, a exposição do autor em Atividades Perigosas por Inflamáveis era de 37,5 % (arrendondado para 38%), definida por este perito como habitual (todos os dias) e intermitente na jornada de trabalho.
Não é demais dizer que, a teor do art. 479 do CPC, o julgador não está adstrito ao laudo pericial, podendo, inclusive, decidir contrariamente às conclusões do perito, forte no princípio do livre convencimento motivado, consubstanciado no art. 371 do CPC, impondo-se-lhe, contudo, o dever de indicar na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo.
Cabe aqui ressaltar que a perícia judicial é meio de prova que busca propiciar ao órgão jurisdicional a compreensão de determinado fato no processo, mediante a utilização de conhecimento técnico especializado de outrem. Visa à obtenção de laudo sobre a questão técnica individualizada pelo Juízo.
Daí ser totalmente impertinente qualquer avaliação jurídica que o expert venha a empreender no laudo, não devendo o perito avaliar questões externas a sua designação, nem emitir opiniões pessoais que não se relacionem com o fato examinado, nos termos do art. 473 §2º do CPC (É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia).
Ao contrário do que entendeu o julgador, a sujeição ao agente nocivo, para configurar a especialidade da atividade, não necessita ocorrer durante todos os momentos da jornada de trabalho. Basta que seja diuturna e contínua, que o obreiro esteja exposto ao agente agressivo em período razoável da sua prestação laboral, que a desempenhe expondo sua saúde à nocividade das condições ambientais do serviço. Com efeito, a sujeição de forma intermitente a inflamáveis não descaracteriza o risco produzido pela periculosidade, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, por diversas vezes, ainda que não de forma permanente, tem contato com os inflamáveis.
Logo, resta clara a nocividade da atividade desenvolvida nos PERÍODOS A e B, merecendo acolhida o recurso da parte autora no ponto.
Entretanto, no que toca ao período C (02/03/2015 a 17/04/2019), em que o autor exerceu a atividade de gerente de metrologia, efetivamente tenho que evidenciado que a exposição se dava de forma intermitente. Tal atividade não foi retratada no laudo trabalhista do evento 28, mas tão somente no PPP e laudo pericial judicial, que a detalham da seguinte forma:
PPP - O funcionário exerceu a função de gerente de metrologia legal, onde responde pela área administrativa e técnica de gerenciamento das atividades do IMETRO-SC, incluindo as atividades externas de fiscalização e inspeção do trabalho desenvolvido pelos técnicos em atividades de fiscalização nos produtos e serviços em indústrias e comércio, também realiza fiscalização e inspeção de produtos e serviços em indústrias e comércios, inspeção visual, ensaios dos erros nas vazões máximas e mínimas de bobas medidoras instaladas em postos de revenda de combustíveis (...).
LAUDO - 10.3 Período de 02/03/2015 a 17/04/2019 Neste período de 4 anos foram realizadas 173 inspeções/fiscalizações, correspondente a 4,0 atividade/mês, sendo concensado uma (01) atividade/semana, com tempo de exposição médio de 3 horas, definida por este perito como exposição ocasional. (Ver Anexo – 3, anexado aos autos do processo).
A mera descrição das atividades revela que a exposição a inflamáveis era intermitente e quiçá eventual, razão pela qual deixo de acolher o recurso da parte autora quanto a tal período.
Uso de EPI: No que concerne ao uso de equipamento de proteção individual ou coletiva pelo segurado, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) n. 664.335, com repercussão geral reconhecida (Tema n. 555), decidiu que, se comprovada a real efetividade dos equipamentos de proteção, neutralizando a nocividade do(s) agente(s), resta descaracterizado o labor em condições especiais. Para tanto, esclareceu o Relator do mencionado paradigma, deve restar demonstrado no caso concreto que o uso efetivo e permanente de EPI é "suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
Na hipótese, cabe referir que não há equipamento de proteção individual hábil a elidir o risco decorrente da periculosidade (explosão).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos A e B, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, ao agente nocivo acima referido, merecendo parcial acolhida o recurso.
Conclusão quanto ao tempo de atividade especial
O período especial reconhecido no presente acórdão (29/04/95 a 01/03/2015) totaliza 19 anos, 10 meses e 3 dias.
Do direito da parte autora à concessão do benefício
A soma do tempo de serviço especial incontroverso (8 anos, 7 meses e 28 dias) e o reconhecido no presente acórdão (19 anos, 10 meses e 3 dias) totaliza 28 anos, 6 meses e 1 dias, suficientes à concessão da aposentadoria especial, desde a DER (09/02/18), bem como ao pagamento dos valores devidos a partir de então.
Afastamento da atividade
Este Regional, tendo em conta o julgamento do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5001401-77.2012.404.0000, de fato, vinha decidindo pela desnecessidade de afastamento do segurado da atividade que o expunha a agentes nocivos, afirmando a inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 (Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira Do Valle Pereira, Corte Especial, julgado em 24/05/2012).
Ocorre que, recentemente, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do RE nº 791.961/PR, representativo de controvérsia (Tema nº 709), em decisão assim ementada (Relator Ministro Dias Toffoli, Plenário, DJe 19/08/2020):
Direito Previdenciário e Constitucional. Constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91. Percepção do benefício de aposentadoria especial independentemente do afastamento do beneficiário das atividades laborais nocivas a sua saúde. Impossibilidade. Recurso extraordinário parcialmente provido.
1. O art. 57,§ 8º, da Lei nº 8.213/91 é constitucional, inexistindo qualquer tipo de conflito entre ele e os arts. 5º, inciso XIII; 7º, inciso XXXIII; e 201,§ 1º, da Lei Fundamental. A norma se presta, de forma razoável e proporcional, para homenagear o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os direitos à saúde, à vida, ao ambiente de trabalho equilibrado e à redução dos riscos inerentes ao trabalho.
2. É vedada a simultaneidade entre a percepção da aposentadoria especial e o exercício de atividade especial, seja essa última aquela que deu causa à aposentação precoce ou não. A concomitância entre a aposentadoria e o labor especial acarreta a suspensão do pagamento do benefício previdenciário.
3. O tema da data de início da aposentadoria especial é regulado pelo art. 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91, que, por sua vez, remete ao art. 49 do mesmo diploma normativo. O art. 57,§ 8º, da Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social cuida de assunto distinto e, inexistindo incompatibilidade absoluta entre esse dispositivo e aqueles anteriormente citados, os quais também não são inconstitucionais, não há que se falar em fixação da DIB na data de afastamento da atividade, sob pena de violência à vontade e à prerrogativa do legislador, bem como de afronta à separação de Poderes.
4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
5. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento. (Destaquei).
Assim, deve ser observada a imposição inserta no § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, implicando na cessação do pagamento do benefício a permanência do segurado aposentado no exercício da atividade que o sujeite a agentes nocivos ou caso a ela retorne voluntariamente.
Vale ressaltar que o afastamento da atividade se torna exigível tão somente a partir da efetiva implantação do benefício, sem prejuízo às parcelas vencidas no curso do processo que culminou na concessão da aposentadoria especial, seja ele judicial ou administrativo.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo índice oficial e aceito na jurisprudência, qual seja:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-10-2019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula nº 204 do STJ), até 29/06/2009. A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema nº 810 da repercussão geral (RE nº 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe nº 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas processuais: O INSS é isento do pagamento de custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Conclusão
- Recurso da parte autora parcialmente acolhido para (a) reconhecer a nocividade dos períodos de 29/04/95 a 01/03/2015 e (b) condenar o INSS a implantar em favor da parte autora a aposentadoria especial e a pagar as parcelas devidas desde a DER (09/02/2018), acrescidas de correção monetária e juros de mora, na forma da fundamentação, além da verba honorária.
- INSS condenado aos ônus da sucumbência.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5013214-25.2018.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: HERCILIO DE OLIVEIRA BEZ (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. atividade nociva. habitualidade e permanência. reconhecimento. aposentadoria especial. concessão.
1. No que diz respeito à conversão do tempo de serviço comum para especial, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, no RESP nº 1.310.034, representativo de controvérsia, deixou assentado que, após a Lei nº 9.032, somente se admite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço em condições especiais. Assim, a conversão somente é permitida para o caso de implemento de todos os requisitos para o benefício de aposentadoria especial até 28/04/1995.
2. Havendo a comprovação de que o trabalho foi exercido em condições agressivas à saúde, deverá ser considerado especial, ainda que a atividade não esteja arrolada nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, cujos rol de agentes nocivos é meramente exemplificativo. Hipótese na qual tem incidência a Súmula nº 198 do TFR. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
3. Não se pode deixar de considerar o aspecto peculiar da periculosidade que decorre do trabalho envolvendo produtos químicos altamente inflamáveis e explosivos como a gasolina, o álcool e óleo diesel, cujo manuseio deve observar estritamente normas e padrões específicos de segurança e proteção.
4. A sujeição ao agente nocivo, para configurar a especialidade da atividade, não necessita ocorrer durante todos os momentos da jornada de trabalho. Basta que seja diuturna e contínua, que o obreiro esteja exposto ao agente agressivo em período razoável da sua prestação laboral, que a desempenhe expondo sua saúde à nocividade das condições ambientais do serviço.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 19 de abril de 2021.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002451587v4 e do código CRC cec66a4c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/4/2021, às 11:17:55
Conferência de autenticidade emitida em 30/04/2021 08:01:11.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/04/2021 A 19/04/2021
Apelação Cível Nº 5013214-25.2018.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: HERCILIO DE OLIVEIRA BEZ (AUTOR)
ADVOGADO: JOSÉ MARTINS DAS NEVES (OAB SC025681)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/04/2021, às 00:00, a 19/04/2021, às 16:00, na sequência 41, disponibilizada no DE de 29/03/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 30/04/2021 08:01:11.