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PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL E ESPECIAL. COMPUTO NA PRIMEIRA DER. POSSIBILIDADE. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ...

Data da publicação: 27/05/2022, 07:17:16

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL E ESPECIAL. COMPUTO NA PRIMEIRA DER. POSSIBILIDADE. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. 1. O ato administrativo válido é dotado de presunção de legitimidade e veracidade, devendo ser respeitado o devido processo legal no caso de sua desconstituição. Não é cabível a mera reapreciação da prova sem demonstração de qualquer ilegalidade do ato anterior, pois a alteração de seu conteúdo simplesmente ofende a coisa julgada administrativa, que confere estabilidade aos atos praticados, pautados, ainda que em tese, em lei. 2. Embora o frio não esteja contemplado no elenco dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 como agentes nocivos a ensejar a concessão de aposentadoria especial, o enquadramento da atividade dar-se-á pela verificação da especialidade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos. 3. No caso dos autos, computando-se os períodos rural e especial postulados na primeira DER, o segurado preenche os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição integral já nesta data, fazendo jus ao recebimento dos valores desde então. (TRF4, AC 5010635-15.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 19/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5010635-15.2019.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ITACIR ALVADIR SCAPIN GANZALA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos pela parte autora (evento 2, APELAÇÃO122) e pelo INSS (evento 2, APELAÇÃO126) contra sentença, publicada em 23/01/2019, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial (evento 2, SENT116), nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por Itacir Al- vadir Scapin Ganzala em face do Instituto Nacional do Seguro Social INSS e, emconsequência: a) DECLARO o direito da parte autora ao cômputo e conversão pelo fator 1,4 (um vírgula quatro) do tempo de serviço especial (06/03/1997 a 18/11/2003), nos termos da fundamentação, os quais devem ser averbados pelo INSS; b) DETERMINO ao réu que implante o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a DER (05/06/2014), pelas regras mais vantajosas. As parcelas vencidas deverão ser pagas de uma só vez, observando-se os índices de correção e juros acima indicados. Tendo em vista que o valor da condenação ou do proveito econômico não excederá a 200 (duzentos) salários mínimos por ocasião da liquidação (art. 85, §§3º, inc. I e 4º, inc. II, CPC), condeno o réu ao pagamento das custas processuais pela metade (LC n. 156/97, art. 33, § 1º) e dos honorários advocatícios fixados em10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até esta data, devidamente corrigi- das (Súmula 111/STJ). O réu deverá implementar o benefício no prazo de 30 (trinta) dias a contar da intimação, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) (art. 497, caput, CPC). Oportunamente, expeça-se alvará judicial dos honorários periciais em fa- vor do perito. Sentença não sujeita a remessa necessária, pois, embora ilíquido, o valor da condenação ou proveito econômico obtido na causa jamais ultrapassará 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, § 3º, inc. I, CPC). Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Busca a parte autora reformar a sentença para afastar a preliminar de falta de interesse de agir arguida com relação aos períodos de 07/05/1978 a 31/10/1991 e 19/11/2003 a 25/10/2010 e, posteriormente, que sejam reconhecidas, respectivamente, a atividade rural pleiteada e a especialidade do período, ambos na DER de 05/06/2014.

O INSS, por sua vez, insurge-se contra o reconhecimento do período de 06/03/1997 a 31/12/1999 como especial, destacando: a) No que se refere ao agente agressivo frio, ressalta-se que a possibilidade de enquadramento constava prevista nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 (anexo III - código 1.1.2) e 83.080/79 (anexo I – código 1.1.2) e só perdurou até 05/03/1997, uma vez que o Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 deixou de contemplá-lo no rol de agentes nocivos, em razão da inexistência de dados científicos a atestar seu impacto insalubre na vida útil do trabalhador.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 2, CONTRAZ131 e evento 2, CONTRAZ132).

É o relatório.

VOTO

Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial.

A parte autora busca, em síntese, seja afastada a tese de falta de interesse de agir, reconhecidos os períodos rural (07/05/1978 a 31/10/1991) e especial (19/11/2003 a 25/10/2010 ) na primeira DER e seja concedido o benefício desde então.

O INSS objetiva a exclusão do reconhecimento de especialidade em relação ao período de 06/03/1997 a 18/11/2003, alegando não restarem preenchidos os requisitos legais.

Prescrição

Em se tratando de benefício previdenciário de prestação continuada, a prescrição não atinge o fundo de direito, mas tão somente os créditos relativos às parcelas vencidas há mais de 05 (cinco) anos, contados da data do ajuizamento da ação, consoante a iterativa jurisprudência dos Tribunais. Assim, tendo a parte autora proposto a presente ação em 01/12/2016, e datando o requerimento administrativo de 2014, não há parcelas atingidas pela prescrição.

Interesse de agir

Na sentença o magistrado acolheu a preliminar arguida pela parte contrária, afastando o interesse processual do autor quanto o reconhecimento dos períodos de 07/05/1978 a 31/10/1991 e 19/11/2003 a 25/10/2010, nos seguintes termos:

Inicialmente, reconheço a falta de interesse processual da parte autora quanto ao reconhecimento do período rural (07/05/1978 a 31/10/1991), bem como, parcialmente, do especial (19/11/2003 a 25/10/2010), na medida em que, conforme extratos das fls. 76 e 270/319, o INSS já reconheceu tais períodos na via administrativa. Portanto, cabe aferir apenas se durante o período de 06/03/1997 a 18/11/2003 o autor trabalhou em atividades especiais.

Entretanto, como bem salientou a parte autora em seu recurso, "tais períodos já foram reconhecidos pelo INSS, todavia, tão somente no requerimento administrativo de 24/10/2016, no entanto, o objetivo desta demanda é comprovar que ainda no primeiro requerimento o autor já havia provado ao INSS que fazia jus a tais reconhecimentos, ou seja, desde 05/06/2014. Assim Excelência, o interesse da parte autora consiste em comprovar que na DER de 05/06/2014 a autarquia previdenciária já tinha condições de reconhecer a especialidade do período de 19/11/2003 a 25/10/2010, bem como, a atividade rural desempenhada no período de 07/05/1978 a 31/10/1991, haja vista, que a época o autor juntou provas que tornam legítimo o direito de reconhecimento ainda em via administrativa. Todavia, mesmo estando devidamente instruído, na DER de 05/06/2014, o INSS afastou o direito do autor conforme se depreende do processo administrativo colacionado aos autos".

Examinando atentamente o resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição anexado ao evento 2, OUT33, percebe-se que, de fato, tais períodos não foram reconhecidos pela autarquia.

Assim, evidente a pretensão resistida, não havendo falar, portanto, em falta de condição da ação.

Nesse particular cumpre gizar que o Supremo Tribunal Federal pacificou seu entendimento, em desde de repercussão geral, nos autos do Recurso Extraordinário n. 631.240/MG, pela desnecessidade de exaurimento da via administrativa como pressuposto do interesse de agir em juízo. Com efeito, nesse julgado, o Pretório Excelso assentou entendimento sobre a matéria, no sentido de ser necessário, como regra geral, que tenha apenas havido ingresso de requerimento administrativo antes do ajuizamento de ações de concessão de benefícios previdenciários.

Na hipótese dos autos, em primeiro lugar, constata-se que, ao contrário do que foi consignado pelo julgador monocrático, a parte autora ingressou com requerimento administrativo em 05/06/2014 (evento 2, OUT33).

Além disso, de simples exame de cópia do processo administrativo colacionado aos autos (evento 2, OUT7 a evento 2, OUT16), depreende-se que o segurado apresentou ao INSS os documentos que colaciona em juízo e com quais pretende compor: a) início de prova material de atividade rurícola, na qualidade de segurado especial e em regime de economia familiar, no período de 07/05/1978 a 31/10/1991; b) atividade especial nos períodos de e 19/11/2003 a 25/10/2010;

Ademais, ainda que o segurado não houvesse apresentado na via administrativa os documentos necessários ao reconhecimento de seu direito, cumpre gizar que caberia ao INSS, nos termos do art. 88 da Lei nº 8.213/91, esclarecer e orientar o beneficiário de seus direitos, apontando os elementos necessários à concessão do amparo da forma mais indicada.

Em suma, o apelante tem, sim, interesse de agir quanto aos períodos especificados, restando configurada a pretensão resistida tanto na esfera administrativa como judicial.

Cabível a aplicação, na hipótese, do permissivo previsto no parágrafo 3º, inciso I, do art. 1.013 do CPC, que autoriza o deslinde da causa diretamente pelo Tribunal (teoria da causa madura).

Períodos reconhecidos na esfera administrativa

A autora pleiteia o reconhecimento de período de atividade rural em regime de economia familiar (07/05/1978 a 31/10/1991) e especial (19/11/2003 a 25/10/2010) desde a data do primeiro requerimento administrativo, formulado em 05/06/2014.

Quanto a tais períodos, não cabem maiores digressões.

Num segundo requerimento administrativo, datado de 24/10/2016, tais períodos foram computados pela autarquia, sendo concedido o benefício de aposentadoria por contribuição 172.161.114-0 (evento 2, OUT38) ao segurado.

Não há motivo lógico para não considerar tais períodos como especiais já na primeira DER.

É certo que a Autarquia tem a possibilidade de rever, em princípio, os atos administrativos que concedem benefício ou reconhecem direito aos segurados, a teor do art. 43 da Lei nº 9.784/99 e do art. 103-A da Lei nº 8.213/91. Todavia, esse poder-dever da Administração encontra limites em normas que protegem a situação jurídica do segurado, a fim de se evitar arbitrariedades.

Ora, tendo a autarquia considerado como tempo de serviço rural e especial os sobreditos intervalos, ainda que somente quando do segundo requerimento do benefício, ocorre a coisa julgada adminstrativa, não sendo facultado à Administração desfazer ato de reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado, razão pela qual estes lapsos também serão contabilizados como tempo de serviço diferenciado no cálculo do benefício deferido a contar da data do primeiro requerimento.

Ausente prova de ilegalidade a justificar a anulação do ato, não tem cabimento o seu desfazimento, baseado meramente na mudança de critério interpretativo ou reavaliação da prova, sob pena de violação da segurança jurídica.

Em caso análogo, já decidiu esta Corte que A existência de "coisa julgada administrativa", decorrente do formal reconhecimento pelo INSS do labor exercido pela parte autora, para fins de tempo de serviço, a partir de documentos válidos e valorados como suficientes à época, impede que se reaprecie a situação, sob pena de violação à natureza jurídica. Mera mudança de interpretação ou de critério de análise de provas por parte da Administração não afeta situação jurídica regularmente constituída.(TRF4 5011307-05.2015.4.04.7205, Quinta Turma, Relatora Juiza Federal Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 16/05/2017).

Ao lado disso, destaco que o cômputo administrativo dos períodos rural e especial postulados no presente feito equivale ao reconhecimento jurídico do pedido, nos termos do art. 487, III, "a", do CPC.

Os períodos rural em regime de economia familiar (07/05/1978 a 31/10/1991) e especial (19/11/2003 a 25/10/2010) devem ser computados também na primeira DER, portanto.

Do tempo especial no caso concreto

Período: 06/03/1997 a 18/11/2003

Empresa: BRF Brasil Foods

Atividade/função: transportador aéreo no setor cortes de peito de frango

Agente nocivo: Frio em todo período entre 10 a 12 graus Celsius

Enquadramento legal: Frio: item 1.1.2 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 até 05/03/1997; a partir de então, Súmula 198 do extinto TFR;

Prova/debate: PPP (evento 2, OUT38) e laudo pericial judicial (evento 2, PET62)

O labor deve ser reconhecido como especial em virtude da exposição da parte autora, de forma habitual e permanente, ao agente físico frio.

Embora não contemplado no elenco dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 como agente nocivo a ensejar a concessão de aposentadoria especial, o enquadramento da atividade dar-se-á pela verificação da especialidade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos.

Quanto ao agente nocivo frio, caracterizada a submissão da autora a temperaturas consideradas insalubres, por adentrar em câmaras frias. Cabe registrar que a própria NR15 - Anexo 9, do INSS, prevê a insalubridade das atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada.

Acerca da celeuma, esta Corte pacificou a orientação de que 'a exposição a frio, com temperaturas inferiores a 12ºC, enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial (APELREEX nº 0000977-33.2011.404.9999, Relator Celso Kipper, Sexta Turma, D.E. 13/05/2011). Isso porque, 'Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. (...) Não havendo mais a previsão do frio como agente nocivo nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, o reconhecimento da especialidade das atividades desempenhadas pelo autor deve ter por base a previsão da Súmula 198 do TFR' (APELREEX nº 5000856-70.2010.404.7212, Relator Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Sexta Turma, D.E. 22/05/2014).

No que diz respeito à continuidade, a permanência, em relação ao agente físico frio, deve ser considerada em razão da constante entrada e saída do empregado da câmara fria durante a jornada de trabalho e não como a permanência do segurado na câmara frigorífica. De fato, 'considera-se habitual e permanente a exposição ao agente nocivo frio nas atividades em que o segurado trabalha entrando e saindo de câmaras frias, não sendo razoável exigir que a atividade seja desempenhada integralmente em temperaturas abaixo de 12ºC' (TRF4, APELREEX nº 2000.72.05.002294-0, Turma Suplementar, Relator p/ Acórdão Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 29/08/2008).

Aliás, sobre a habitualidade e a permanência na sujeição aos agentes agressivos, esta Corte, ao julgar os EINF nº 0010314-72.2009.404.7200 (Relator Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, D.E. 07/11/2011), decidiu que Para caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada. De fato, Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente (TRF/4, AC nº 2000.04.01.073799-6/PR, 6ª Turma, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09/05/2001). Deve-se lembrar, ademais, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.

EPI: O Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015).

Especificamente sobre o agente físico ruído, o citado precedente estabelece que, nas hipóteses de submissão a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracterizaria o tempo de serviço especial para aposentadoria. Ainda que haja informação inserta no formulário PPP, de que o empregado utilizou EPI e os efeitos nocivos da atividade foram neutralizados, em se tratando do agente físico ruído, não há falar em descaracterização da especialidade do labor. Isso porque há conclusão na medicina do trabalho de que a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.

Quanto aos demais (formaldeído, hidrocarbonetos aromáticos, umidade e frio), destaque-se que o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. Tal interpretação, aliás, encontra respaldo no próprio regramento administrativo do INSS, conforme se infere da leitura do art. 279, § 6º, da IN nº 77/2015, mantida, neste item, pela subsequente IN nº 85/2016.

No que diz respeito à prova da eficácia dos EPIs/EPCs, a Terceira Seção desta Corte, na sessão de julgamento realizada em 22/11/2017, nos autos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000 (Tema nº 15), decidiu por estabelecer a tese jurídica de que a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário (Relator para acórdão Des. Federal Jorge Antonio Maurique, por maioria). Restou assentada no aresto, ainda, a orientação no sentido de que a simples declaração unilateral do empregador, no Perfil Profissiográfico Previdenciário, de fornecimento de equipamentos de proteção individual, isoladamente, não tem o condão de comprovar a efetiva neutralização do agente nocivo. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório.

Na situação em apreço, não restou demonstrado que a nocividade tenha sido neutralizada pelo uso de EPI eficazes, tendo em vista que não restou demonstrado o cumprimento das diretrizes da NR 6:

6.6.1 Cabe ao empregador quanto ao EPI:

a) adquirir o adequado ao risco de cada atividade;

b) exigir seu uso;

c) fornecer ao trabalhador somente o aprovado pelo órgão nacional competente em matéria de segurança e saúde no trabalho;

d) orientar e treinar o trabalhador sobre o uso adequado, guarda e conservação;

e) substituir imediatamente, quando danificado ou extraviado;

f) responsabilizar-se pela higienização e manutenção periódica; e,

g) comunicar ao MTE qualquer irregularidade observada.

h) registrar o seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados livros, fichas ou sistema eletrônico. (Inserida pela Portaria SIT/DSST 107/2009).

Segundo apontou o perito no laudo, item 7.1.9 a empresa não apresentou documentação indicando fornecimento de EPI

Conclusão: Não merece acolhida o recurso do INSS, devendo ser mantida a sentença que reconheceu o período como especial.

Fator de conversão

Destaco que, quanto ao fator de conversão deve ser observada a relação existente entre os anos de trabalho exigidos para a aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição na data do implemento das condições, e os anos exigidos para a obtenção da aposentadoria especial (15, 20ou 25 anos de tempo de atividade, conforme o caso).

Em se tratando de benefício que a ser deferido a segurado que implementou as condições já na vigência da Lei nº 8.213/91, como sabido, a concessão do benefício depende da comprovação de 35 anos de tempo de serviço ou de contribuição, se homem, e 30 anos, se mulher. Nesse contexto, a relação a ser feita para a obtenção do fator aplicável para a conversão do tempo de serviço especial para comum, quando se trata de enquadramento que justifica a posentadoria aos 25 anos de atividade, é de 25 anos para 35, se homem, e 25anos para 30, se mulher, resultando, assim, num multiplicador de 1,4 paraaquele e 1,2 para esta.

Prestado o serviço sob a égide de legislação que o qualifica como especial, o segurado adquire o direito à consideração como tal até quando possível a conversão. A conversão, todavia, só pode ser disciplinada pela lei vigente à data em que implementados todos os requisitos para a concessão do benefício. Não se pode confundir critério para reconhecimento de especialidade com critério para concessão de benefício, aí incluídas a possibilidade e a sistemática de conversão de tempo especial pretérito.

O Decreto 3.048/99, em seu artigo 70, determina a utilização do fator 1,40 quanto ao homem e 1,20 quanto à mulher para a conversão do tempo especial sob regime de 25 anos, independentemente da data em que desempenhada a atividade.

Do direito do autor no caso concreto

CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

TEMPO DE SERVIÇO COMUM

Data de Nascimento07/05/1966
SexoMasculino
DER05/06/2014

- Tempo já reconhecido pelo INSS:

Marco TemporalTempoCarência
Até a DER (05/06/2014)19 anos, 4 meses e 8 dias225 carências

- Períodos acrescidos:

Nome / AnotaçõesInícioFimFatorTempoCarência
1-07/05/197831/10/19911.0013 anos, 5 meses e 24 dias0
2-19/11/200325/10/20100.40
Especial
6 anos, 11 meses e 7 dias
+ 4 anos, 1 meses e 28 dias
= 2 anos, 9 meses e 9 dias
0
3-06/03/199718/11/20030.40
Especial
6 anos, 8 meses e 13 dias
+ 4 anos, 0 meses e 7 dias
= 2 anos, 8 meses e 6 dias
0

Marco TemporalTempo de contribuiçãoCarênciaIdadePontos (Lei 13.183/2015)
Até a DER (05/06/2014)38 anos, 3 meses e 17 dias22548 anos, 0 meses e 28 diasinaplicável

- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição

Nessas condições, em 05/06/2014 ( primeira DER), a parte autora tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, porque a DER é anterior a 18/06/2015, dia do início da vigência da MP 676/2015, que incluiu o art. 29-C na Lei 8.213/91.

Em decorrência, a parte autora faz jus aos valores q a título de aposentadoria por tempo de contribuição desde a PRIMEIRA DER - 04/02/2014, até a data do segundo requerimento administrativo em 24/10/2016 (quando foi concedida a aposentadoria por tempo de contribuição 172.161.114-0).

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:

- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.

Honorários advocatícios recursais

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da autarquia em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.

Rejeitado o recurso do INSS e acolhido o recurso da parte autora, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC, observada eventual suspensão da exigibilidade em face da concessão de AJG.

Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Conclusão

- Recurso do INSS ao qual se nega provimento;

- Mantido o reconhecimento do período de 06/03/1997 a 18/11/2003 como especial;

- recurso da parte autora acolhido para:

a) reconhecer o interesse de agir da parte autora

b) determinar que o INSS compute os períodos rural (07/05/1978 a 31/10/1991) e especial (19/11/2003 a 25/10/2010) também na primeira DER (05/06/2014).

b) reconhecer que o autor tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição já na PRIMEIRA DER - 05/06/2014 - (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88). Assim, a autora faz jus aos valores do benefício 158.300.072-8 até a data do segundo requerimento - 01/09/2015 (aposentadoria por tempo de contribuição 172.161.114-0), devendo o INSS manter ativo o benefício mais vantajoso.

- honorários advocatícios majorados;

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Dados para cumprimento: ( x ) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão
NB158.300.072-8
Espécieaposentaqdoria por tempo de contribuição
DIB05/06/2014 - DER
DIPNo primeiro dia do mês da implantação do benefício
RMIa apurar
Observaçõesreconhecido que o autor tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição já na PRIMEIRA DER - 05/06/2014 - (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88). Assim, a parte autora faz jus aos valores do benefício 158.300.072-8 até a data do segundo requerimento - 24/10/2016 (aposentadoria por tempo de contribuição 172.161.114-0), devendo o INSS manter ativo o benefício mais vantajoso.

Requisite a Secretaria da Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003204158v21 e do código CRC 96ecf0cb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 18:18:9


5010635-15.2019.4.04.9999
40003204158.V21


Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:17:16.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5010635-15.2019.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ITACIR ALVADIR SCAPIN GANZALA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. atividade rural e ESPECIAL. computo na primeira der. possibilidade. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.

1. O ato administrativo válido é dotado de presunção de legitimidade e veracidade, devendo ser respeitado o devido processo legal no caso de sua desconstituição. Não é cabível a mera reapreciação da prova sem demonstração de qualquer ilegalidade do ato anterior, pois a alteração de seu conteúdo simplesmente ofende a coisa julgada administrativa, que confere estabilidade aos atos praticados, pautados, ainda que em tese, em lei.

2. Embora o frio não esteja contemplado no elenco dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 como agentes nocivos a ensejar a concessão de aposentadoria especial, o enquadramento da atividade dar-se-á pela verificação da especialidade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos.

3. No caso dos autos, computando-se os períodos rural e especial postulados na primeira DER, o segurado preenche os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição integral já nesta data, fazendo jus ao recebimento dos valores desde então.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 17 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003204159v5 e do código CRC 614498e8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 18:18:9


5010635-15.2019.4.04.9999
40003204159 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:17:16.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022

Apelação Cível Nº 5010635-15.2019.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: ITACIR ALVADIR SCAPIN GANZALA

ADVOGADO: DARCISIO ANTONIO MULLER (OAB SC017504)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 188, disponibilizada no DE de 29/04/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:17:16.

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