Apelação Cível Nº 5025898-24.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO SERGIO DE CAMARGO
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 09/08/2012 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando a concessão do benefício de auxílio-acidente, a contar do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença NB 31/508266735-8, em 12/04/2010.
O juízo a quo, em sentença publicada em 02/08/2018, julgou parcialmente procedente os pedidos, determinando ao INSS a concessão de auxílio-acidente em favor da parte autora, a contar do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença NB 31/508266735-8, em 12/04/2010 até o dia anterior à vigência de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito. Condenou o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora, estes desde a citação. Condenou o INSS, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% dos valores vencidos até a data da sentença, bem como ao pagamento das custas processuais, pela metade.
O INSS recorreu sustentando que não se encontram presentes os requisitos legais para a concessão do benefício de auxilio-acidente postulado. Refere que não existe previsão de concessão para contribuinte individual, consoante o disposto noa artigo 18, §1º c/c o artigo 11 da Lei 8213/91. Sustenta ainda a inexistência de redução da capacidade laborativa ante o fato de que após a cessação do auxílio-doença o autor voltou a exercer atividades laborativas. Aduz ainda que a data de início da concessão do benefício deve coincidir com a do laudo pericial e não a partir da data da cessação do benefício de auxílio-doença. Subsidiariamente, requereu a aplicação da Lei 11.960/09 para fins de atualização monetária e juros de mora a incidir sobre as parcelas devidas, bem como a isenção no pagamento das custas nos termos da Lei estadual 14634/14. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Benefício por redução da capacidade laboral
O benefício de auxílio-acidente é assim disciplinado na Lei nº 8.213/1991:
"Art. 86 - O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia."
Verifica-se que quatro são os requisitos para a concessão desse benefício: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial e permanente da capacidade para o trabalho habitual, e (d) o nexo causal entre o acidente a redução da capacidade.
O auxílio-acidente é benefício de natureza indenizatória, por dirigir-se a compensar o segurado por perda funcional parcial em decorrência de acidente. Não é cumulável com o benefício de auxílio-doença ou com qualquer aposentadoria, sendo devido apenas após a consolidação das lesões decorrentes do acidente.
Nos termos do art. 26, inc. I, da Lei nº 8.213/91, o auxílio-acidente independe de carência.
Caso concreto
- Qualidade de segurado
A qualidade de segurado é inconteste, pois estava recebendo o auxílio-doença no período da incapacidade reconhecida, razão pela qual considero atendido este requisito.
A alegação de que o autor não faria jus ao benefício de auxílio acidente por tratar-se de contribuinte individual não merece prosperar. Na data da ocorrência do acidente de trânsito o segurado encontrava-se empregado e recolhendo as contribuições previdenciárias devidas. As contribuições recolhidas na qualidade de contribuinte individual não são contemporâneas à data do evento que resultou na concessão do benefício de auxílio-doença. Quanto à atividade que exerce atualmente o autor, não é relevante para o deslinde da controvérsia.
- Redução da capacidade
A prova pericial é fundamental nos casos de benefício por incapacidade e tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação (art. 473 do CPC) e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
Durante a instrução processual foi realizada perícia médica pelo Dr. Fernando Rossi Mielke, especialista em ortopedia (evento 3 - LAUDPERI26), em 15/02/2017, cujo laudo técnico explicita e conclui que:
"Conclusão:
O periciado trabalhava como metalúrgico. Em maio de 2004, sofreu acidente de trânsito, com consequente fratura da mão esquerda e fratura complexa do planalto tibial esquerdo com lesão ligamentar, as quais foram motivo de tratamento cirúrgico e de fisioterapia motora complementar.
Atualmente, as lesões estão consolidadas, restando sequelas no membro inferior esquerdo que são causa de redução de capacidade laboral, com enquadramento do decreto 3048/199, quadro número 6, letra "g". A redução da capacidade laboral está presente desde a alta do INSS, ocorrida em 2010. Não há invalidez."
Conforme conclusão sentencial, presentes os requisitos ao benefício postulado: (a) a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, (b) a redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia o segurado e (c) o nexo causal entre a consolidação das lesões e a redução da capacidade laborativa.
A sequela que autoriza o deferimento do benefício de auxílio-acidente é aquela da qual resulta redução, ainda que mínima, da capacidade laboral.
Dessa forma, deve ser mantida a sentença de procedência.
- Termo inicial
A perícia constatou que a incapacidade teve início na data do acidente (21/05/2004), sendo que, quando cessado o auxílio-doença, tal sequela permaneceu. Portanto, em 12/04/2010, ao ver frustrada a sua expectativa de restabelecimento do benefício de auxílio-doença, a parte autora já se encontrava com sua capacidade laboral reduzida, devendo o dia seguinte à cessação do auxílio-doença ser fixado como termo a quo do auxílio-acidente ora deferido.
Consectários e provimentos finais
- Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".
Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável - INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios. Se esta fase tiver início antes da decisão, deverá ser utilizada, provisoriamente, a TR, sem prejuízo de eventual complementação.
- Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
- Custas processuais
O TJRS, nos autos do incidente de inconstitucionalidade 7004334053, concluiu pela inconstitucionalidade da Lei Estadual 13.471/2010, a qual dispensava as pessoas jurídicas de direito público do pagamento de custas e despesas processuais. Na ADIN estadual 70038755864, entretanto, a inconstitucionalidade reconhecida restringiu-se à dispensa, pela mesma lei, do pagamento de despesas processuais, não alcançando as custas. Em tais condições, e não havendo vinculação da Corte ao entendimento adotado pelo TJRS em incidente de inconstitucionalidade, mantido o entendimento anteriormente adotado, já consagrado pelas Turmas de Direito Previdenciário, para reconhecer o direito da autarquia à isenção das custas, nos termos da Lei 13.471/2010.
Acolho, portanto, a irresignação do INSS neste tópico.
Conclusão
Alterada a sentença quanto à isenção ao pagamento das custas processuais. Correção monetária adaptada ao entendimento do STF em precedente vinculante (REsp 1495146).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS.
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Apelação Cível Nº 5025898-24.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO SERGIO DE CAMARGO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA EM CARÁTER DEFINITIVO. comprovação. Termo inicial. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
1. O benefício de auxílio-acidente é devido quando demonstrados: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial e permanente da capacidade para o trabalho habitual, e (d) o nexo causal entre o acidente a redução da capacidade.
2. A sequela que autoriza o deferimento do benefício de auxílio-acidente é aquela da qual resulta redução, ainda que mínima, da capacidade laboral.
3. Preenchidos os requisitos, o benefício de auxílio-acidente é devido a contar da cessação do auxílio-doença.
4. Deliberação sobre índices de correção monetária diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de janeiro de 2019.
Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000772662v7 e do código CRC 8e10b54a.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/01/2019
Apelação Cível Nº 5025898-24.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO SERGIO DE CAMARGO
ADVOGADO: ELIANE PATRICIA BOFF
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/01/2019, na sequência 636, disponibilizada no DE de 14/01/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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