Apelação Cível Nº 5009379-03.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: MARISTELA RODRIGUES DE SOUZA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de beneficio por incapacidade.
A parte autora apelou sustentando que se encontra impossibilitada de trabalhar, pois suas atividades demandam grande esforço físico (rec6).
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nessa condição, nos termos do art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece que a carência exigida para a obtenção desses benefícios é de 12 (doze) contribuições mensais (art. 25, I), salvo nos casos legalmente previstos.
Em sendo a incapacidade anterior à filiação ao RGPS, ou à recuperação da condição de segurado, resulta afastada a cobertura previdenciária (art. 42, §2º e art. 59, §1º).
Caso concreto
A autora, agricultora, 42 anos de idade, ajuizou ação em 03/11/15, objetivando a concessão de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez em decorrência de incapacidade causada por plaquetopenia severa de etiologia a definir.
Do CNIS da autora, extrai-se:
1 | 1.141.836.771-5 | 1094867184 | 80 - AUXILIO SALARIO MATERNIDADE | Não Informado | 07/02/1998 | 07/06/1998 | ||||
2 | 1.141.836.771-5 | 1235499976 | 80 - AUXILIO SALARIO MATERNIDADE | Não Informado | 28/09/2002 | 25/01/2003 | ||||
3 | 1.141.836.771-5 | 1351991539 | 80 - AUXILIO SALARIO MATERNIDADE | Não Informado | 29/04/2005 | 26/08/2005 | ||||
4 | 1.141.836.771-5 | 1401904456 | 80 - AUXILIO SALARIO MATERNIDADE | Não Informado | 16/03/2007 | 13/07/2007 | ||||
5 | 1.141.836.771-5 | 1441557617 | 80 - AUXILIO SALARIO MATERNIDADE | Não Informado | 15/05/2009 | 11/09/2009 | ||||
6 | 1.141.836.771-5 | 6068524560 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | 23/06/2014 | 22/08/2014 | ||||
7 | 1.141.836.771-5 | 6095769420 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | 06/02/2015 | 25/06/2015 |
- Incapacidade
A prova pericial, nos casos de benefício por incapacidade, tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do art. 479 do CPC, mas se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, deverá indicar os motivos que o levam a entendimento diverso.
Durante a instrução processual, em 12/01/18, foi realizada perícia por médico do trabalho que afastou incapacidade em decorrência do quadro de plequetopenia iniciado em 2015 e estabilizado (p. 46, manifestMPF4). Da perícia, extrai-se:
Autora com quadro de plaquetopenia grave por PTI iniciado em 2015, à época com 14mil plaquetas (normal de 150mil a 400mil). Fez tratamento medicamentoso com boa resposta clínica. Hemograma recente mostra recuperação das plaquetas com valor próximo ao limite inferior da normalidade e exame físico não mostra alterações cutâneas da doença (esquimoses). Apesar do tempo de coagulação alterado, este se mostra importante apenas em casos de ferimentos, não sendo causa de incapacidade. O fato da autora estar há três meses sem uso de medicação e mesmo assim apresentar palquetometria com bom valor mostra que a doença está sob controle. Não há relação da doença com dores musculares difusas ou sensibilidade cutânea à exposição solar e não há incapacidade laboral.
Cumpre ressaltar que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora o juiz não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente feito relativamente à incapacidade atual.
Os atestados médicos juntados à inicial são contemporâneos e próximos ao recebimento de auxílio-doença em 2015, inexistindo documentos recentes que possam infirmar o laudo pericial.
Assim, não tendo sido comprovada incapacidade atual para o exercício de atividades laborais, não há direito ao benefício postulado.
Por outro lado, considerando-se que o perito constatou estabilização do quadro iniciado em 2015, após o tratamento e constando, dos autos, atestados de jul/2015 (vol1), indicando incapacidade, inclusive um de 31/07/15, dando conta de plaquetas em 93.000 (p. 28, vol1), constata-se que houve incapacidade em momento anterior à perícia.
Assim, deve ser restabelecido o benefício de auxílio-doença até a data da perícia judicial, quando constatada estabilização da doença.
Consectários e provimento finais
- Correção monetária
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, com trânsito em julgado em 03/03/2020.
No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, transitado em julgado em 11/02/2020, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Honorários Advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência ( acórdão).
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002114621v10 e do código CRC e7681714.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5009379-03.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: MARISTELA RODRIGUES DE SOUZA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE ATUAL NÃO COMPROVADA. INCAPACIDADE PRETÉRITA. BENEFÍCIO DEVIDO ATÉ PERÍCIA.
1. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
2. Tendo o laudo médico oficial concluído pela inexistência de incapacidade para o exercício de atividades laborais habituais, e não havendo prova substancial em contrário, não há direito ao auxílio-doença ou à aposentadoria por invalidez.
3. Constatada, do cotejo probatório, incapacidade no período anterior à perícia, deve ser concedido o benefício desde a cessação até a data do exame pericial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de outubro de 2020.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002114622v4 e do código CRC 78f9ba2c.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 19/10/2020
Apelação Cível Nº 5009379-03.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
APELANTE: MARISTELA RODRIGUES DE SOUZA
ADVOGADO: KATIUCIA RECH (OAB RS058219)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 19/10/2020, na sequência 475, disponibilizada no DE de 07/10/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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