Apelação Cível Nº 5002874-47.2017.4.04.7106/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: MARIA CELINA MAGALHAES IBARRA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
No presente feito, houve sentença de improcedência do pedido de concessão do benefício por incapacidade, tendo sido a parte autora condenada ao pagamento dos honorários advocatícios ao procurador do réu arbitrados estes em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 4º, III, do Código de Processo Civil. A exigibilidade da referida verba foi suspensa por se tratar de beneficiária da assistência judiciária gratuita (Ev. 21, SENT1 do processo 5002874-47.2017.4.04.7106).
A parte autora interpôs apelação, requerendo anulação da sentença a fim de ser designado exame pericial. Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal. Em julgamento da apelação, foi anulada a sentença para a realização de perícia com Oncologista (Ev. 5, RELVOTO2). Após a realização da perícia e intimação das partes, sobreveio nova sentença de improcedência, tendo sido a parte autora condenada ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador do réu fixados em 10% sobre o valor da condenação. A exigibilidade do pagamento de tal verba foi suspenso em razão da concessão de AJG (Ev. 48, SENT1 do processo 5002874-47.2017.4.04.7106).
Da referida sentença, a demandante interpôs nova apelação, alegando que a incapacidade decorreu de agravamento da moléstia, posterior à refiliação da autora, requerendo a concessão do auxílio-doença desde a Data de Entrada do Requerimento (DER), 09.06.2010.
Com contrarrazões, retornaram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Do benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprido, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe pago enquanto permanecer nesta condição, nos termos do 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece, ainda, que para a concessão dos benefícios em questão se exige o cumprimento da carência correspondente à 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), salvo nos casos legalmente previstos.
Na eventualidade de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições exigidas, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 um período de graça, prorrogando-se, por assim dizer, a qualidade de segurado durante determinado período. Decorrido o período de graça, o que acarreta na perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores poderão ser computadas para efeito de carência. Exige-se, contudo, um mínimo de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, conforme se extrai da leitura do art. 24 da Lei nº 8.213/91. Dessa forma, cessado o vínculo, eventuais contribuições anteriores à perda da condição de segurado somente poderão ser computadas se cumpridos mais quatro meses.
É importante destacar que o pressuposto para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, é a existência de incapacidade (temporária ou total) para o trabalho. Isso quer dizer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor decorre delas.
De outra parte, tratando-se de doença ou lesão anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, não será conferido o direito à aposentadoria por invalidez/auxílio-doença, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão (§ 2º do art. 42).
Em resumo, a concessão de benefícios por incapacidade pressupõe a demonstração dos seguintes requisitos: a) a qualidade de segurado; b) cumprimento do prazo de carência de 12 (doze) contribuições mensais (quando exigível); c) incapacidade para o trabalho de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
No mais, deve ser ressaltado que, conforme jurisprudência dominante, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria porinvalidez o julgador firma seu convencimento, de regra, através da prova pericial. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA.INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. BAIXA DOS AUTOS À ORIGEM. REABERTURA DE INSTRUÇÃO. REALIZAÇÃO DE LAUDO. 1. Nas ações em que se objetiva a aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento, via de regra, com base na prova pericial. 2. Inexistindo prova pericial em caso no qual se faz necessária para a solução do litígio, reabre-se a instrução processual para que se realiza laudo judicial. 3. Sentença anulada para determinar a reabertura da instrução processual e a realização de perícia médica (TRF4ª, AC n.º 0009064-12.2010.404.9999/RS; Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira; DJ de 27/08/2010).
Quanto a isso, José Antônio Savaris, em sua obra "Direito Processual Previdenciário", 03ª ed., Juruá, 2011, p. 239, leciona que "a prova decisiva nos processos em que se discute a existência ou persistência da incapacidade para o trabalho é, em regra, a prova pericial realizada em juízo compreendida, então, à luz da realidade de vida do segurado".
Por fim, é importante ressaltar que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo na eventualidade de motivo relevante constante dos autos, uma vez que o perito judicial encontra-se em posição equidistante das partes, mostrando-se, portanto imparcial e com mais credibilidade. Nesse sentido, os julgados desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013417-82.2012.404.7107, 5ª TURMA, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/04/2013 e APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5007389-38.2011.404.7009, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/02/2013.
CASO CONCRETO
A controvérsia recursal envolve a comprovação da incapacidade laborativa da autora para fins de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez com acréscimo de 25% desde a data da DER em 09.06.2010, conforme descrito na exordial.
No caso sob exame, foi realizada perícia médica na autora a fim de que fosse esclarecido o seu estado de saúde e a sua capacidade laborativa. Na perícia realizada em 29 de agosto de 2018 (Ev. 40, LAUDO1), a autora teve o diagnóstico de Neoplasia Maligna da Mama (CID C 50.4), concluindo o perito médico pela incapacidade temporária para o exercício de suas atividades habituais, conforme se transcreve algumas respostas aos quesitos do Juízo a seguir (Ev. 40, LAUDO1):
(Quesito b) O perito tem condições de precisar desde quando o autor está incapaz? Qual a data?
Desde 03/12/2009 cirurgia de mastectomia radical
(Quesito c) A incapacidade do autor, se houver, é temporária ou permanente? Sendo a incapacidade temporária, qual o prazo estimado para a recuperação?
Incapacidade temporária, prazo de 01 ano para reabilitação motora para tratamento fisioterápico e para depressão leve.
(Quesito f) Foram considerados os contextos laborativo, (função que exerce), etário, social e de formação profissional?
A autora era doméstica e faxineira antes da cirurgia. Ensino fundamental completo, com dificuldade de mobilização do membro superior esquerdo desde a cirurgia radical. Necessita reabilitação funcional com fisioterapia motora, por várias sessões para voltar a ser avaliada para exercer suas atividades anteriores a cirurgia. Incapacidade temporária por 01 ano para reabilitação motora e acompanhamento fisioterápico e oncológico. Quadro de depressão leve.
Destaque-se que o perito judicial detém o conhecimento científico necessário ao exame do segurado, ficando ao seu cargo a análise dos exames laboratoriais ou físicos para exarar o seu diagnóstico. A desconsideração do laudo pericial somente se justificaria com base em robusto contexto probatório, constituído por exames que sejam seguramente indicativos da incapacidade para o exercício de atividade laborativa e que coloque, efetivamente, em dúvida a conclusão do expert do juízo.
Embora o julgador não esteja adstrito à perícia judicial, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo se houver motivo relevante, uma vez que o perito judicial se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade. Dessa forma, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente caso. (Fora juntado apenas um atestado médico, conforme Ev. 1, LAUDO9).
Além disso, a existência de patologia ou lesão nem sempre significa incapacidade para o trabalho. Doença e incapacidade podem coincidir ou não, dependendo da gravidade da moléstia, das atividades inerentes ao exercício laboral e da sujeição e resposta ao tratamento indicado.
Portanto, deve ser prestigiada data de início de incapacidade (DII) fixada pelo perito judicial, qual seja, 03.12.2009. Contudo, conforme decidido no juízo de origem, verifica-se que a autora não detinha o requisito da qualidade de segurado à época da DII. Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), a parte autora possui os seguintes registros de recolhimento de contribuição: 01.12.1989 a 12.03.1991, 01.10.1992 a 10.08.1993, 01.06.1994 a 31.12.1994 e 25.09.1996 a 30.11.1999 como empregado, 01.03.2010 a 30.06.2010 como facultativo e 01.04.2016 a 30.04.2016 e 01.09.2016 a 30.09.2016 como contribuinte individual. Todavia, há vínculo empregatício registrado em CTPS no período de 19.04.2006 a 19.09.2006 (Ev. 1, CTPS5), o que fez manter a qualidade de segurado apenas até novembro de 2008.
Nesse contexto, o artigo 15 da Lei nº 8.213/91 disciplina os casos em que é mantida a qualidade de segurado, independentemente de contribuições. De acordo com o inciso II desse mesmo artigo, a qualidade de segurado é mantida até 12 meses após a cessação das contribuições para o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração.
O artigo 15, § 2º, da Lei nº 8.213/91 prevê a ampliação desse prazo, com o acréscimo de outros 12 meses, no caso de segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Nesse sentido, cite-se os seguintes dispositivos, in verbis:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
(...)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
(...)
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
A qualidade de segurado, então, foi mantida até, no máximo, novembro de 2008, uma vez que não está caracterizada a hipótese do artigo 15, §1º. Portanto, na DII fixada pelo perito, 03.12.2009, a parte autora não detinha o requisito de qualidade de segurado. Dessa forma, há que ser mantida a sentença do juízo de primeiro grau.
Honorários advocatícios
Desprovida a apelação, devem ser majorados, por força do § 11 do artigo 85, do CPC, os honorários advocatícios devidos ao patrono do réu para 15% sobre o valor atribuído à causa, a serem atualizados na forma prevista no Manual de Cálculos da Justiça Federal.
No entanto, permanece suspensa a exigibilidade da referida verba em razão da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC, comprovar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001025325v30 e do código CRC 94e5d416.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5002874-47.2017.4.04.7106/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: MARIA CELINA MAGALHAES IBARRA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE DEMONSTRADA. FALTA DE QUALIDADE DE SEGURADO. HONORÁRIOS.
1. De modo geral, o direito à aposentadoria por invalidez e ao auxílio-doença pressupõe a presença de três requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 (doze) contribuições mensais, ressalvadas as situações previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, e (3) especificamente, a observação quanto à existência de incapacidade impeditiva para o trabalho habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a decorrente de doença precedente, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, §2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213.
2. Embora presente o requisito da incapacidade laboral, incabível a concessão de benefício por incapacidade diante da falta de qualidade de segurado.
3. Honorários advoctícios majorados (art. 85, §11, do CPC)
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de maio de 2019.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001025326v3 e do código CRC f7f8956e.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/05/2019
Apelação Cível Nº 5002874-47.2017.4.04.7106/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: MARIA CELINA MAGALHAES IBARRA (AUTOR)
ADVOGADO: LEANDRO NUNES LOPES (OAB RS088480)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/05/2019, na sequência 119, disponibilizada no DE de 26/04/2019.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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