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PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. COISA JULGADA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. TRF4. 5038589-71.2017.4.04.7100...

Data da publicação: 07/07/2020, 07:33:26

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. COISA JULGADA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. 1. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela não deve ser considerada suficiente, especialmente quando o laudo não responde, com segurança, aos quesitos necessários para a formação do convencimento judicial. 2. Hipótese em que se reconhece a coisa julgada apenas no que pertine ao pedido de reconhecimento da incapacidade decorrente de moléstias ortopédicas. 3. Anulada a sentença e se reabre a instrução para a complementação da perícia realizada por médico especialista em Psiquiatria. (TRF4, AC 5038589-71.2017.4.04.7100, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 25/07/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5038589-71.2017.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: VERA MARIA BORBA DE SOUZA (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

VERA MARIA BORBA DE SOUZA ajuíza a ação previdenciária contra o INSS, visando à obtenção de provimento jurisdicional que, inclusive em sede de antecipação dos efeitos da tutela, condene a autarquia-ré a restabelecer seu benefício de auxílio-doença (NB 550.689.256-6), recebido até 16/10/2014 e não mantido ativo em razão de conclusão contrária da perícia médica realizada administrativamente.

Relata a autora que: (a) está acometida de moléstias de cunho psiquiátrico, neurológico e ortopédico que a incapacitam para o trabalho (auxiliar de limpeza) desde o ano de 2012; (b) sua condição incapacitante decorre do fato de ter sido vítima de atropelamento por veículo de transporte coletivo em 09/03/2012; (c) já houve o ajuizamento de ação judicial em 13/03/2015 (processo nº 501549650201654047100, baixado desde 29/10/2015) buscando o restabelecimento do benefício, mas que não se pode reconhecer a coisa julgada em relação ao presente feito porque a decisão de improcedência tomou por base exame pericial que ressalvou que havia capacidade apenas sob o aspecto ortopédico (evento 02 - LAUDO2); (d) houve, ainda, ajuizamento de demanda na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (processo nº 11500744876, em trâmite junto à 5ª Vara Cível de Porto Alegre), cuja prova pericial, realizada em setembro de 2016, reconheceu a limitação funcional da demandante, o que afastaria a conclusões da perícia ortopédica destes autos (evento 62). Pleiteia o restabelecimento do benefício e convertida essa prestação em aposentadoria por invalidez, com o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) de que trata o artigo 45 da LBPS, ou, alternativamente, a concessão do benefício assistencial devido ao deficiente físico e ao idoso, bem assim a indenizar o dano moral decorrente do cancelamento da prestação.

Sobreveio sentença, datada de 08/01/2019, que julgou improcedentes os pedidos, nos termos do inciso I do artigo 487 do CPC. A parte autora restou condenada ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência, fixados em 10% do valor da causa, além do ressarcimento de honorários periciais. Não houve condenação ao pagamento de custas.

Em suas razões de recurso, a demandante alega cerceamento de defesa, uma vez que não realizada perícia com especialista em psiquiatria, mesmo havendo indicação por parte do profissional médico da área da neurologia de que a segurada está acometida de Episódio Depressivo não Especificado (CID F 32.9). Além disso, sustenta que a perícia ortopédica sequer faz menção às conclusões de laudo pericial realizado em feito mais recente, cujo trâmite se deu na Justiça Estadual, e que certifica a existência de limitação/redução da capacidade funcional por parte da segurada (laudo juntado na réplica à contestação).

Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Do Auxílio-Doença e da Aposentadoria por Invalidez

Os requisitos para a concessão dos benefícios acima requeridos são os seguintes: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, prevista no art. 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24 c/c o art. 27-A da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).

Em se tratando de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial, porquanto o profissional de medicina é que possui as melhores condições técnicas para avaliar a existência de incapacidade da parte requerente, classificando-a como parcial ou total e/ou permanente ou temporária.

Cabível ressaltar-se, ainda, que a natureza da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliada conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar que fatores relevantes - como a faixa etária da postulante e o grau de escolaridade, dentre outros - sejam essenciais para a constatação do impedimento laboral.

Doença preexistente - Importa referir que não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao RGPS já portador de doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da enfermidade, conforme disposto na Lei 8.213/91, no art. 42, § 2º (aposentadoria por invalidez) e no art. 59, § único (auxílio-doença).

Carência - Conforme já referido, os benefícios por incapacidade exigem cumprimento de período de carência de 12 contribuições mensais (art. 25, I, e 24 da Lei 8.213/91).

Do Auxílio-Acidente

A concessão de auxílio-acidente está disciplinada no art. 86 da Lei nº 8.213/1991, que assim dispõe:

Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.

§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinquenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado.

§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria.

A concessão do auxílio-acidente se dará pelo cumprimento de três requisitos: a) consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza; b) redução permanente da capacidade de trabalho, e c) a demonstração do nexo de causalidade entre os requisitos anteriores.

Conforme jurisprudência estabelecida pelo STJ em julgamento de recursos representativos de controvérsia, o benefício será devido mesmo que mínima a lesão, e independentemente da irreversibilidade da doença:

Tema 416: Exige-se, para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão.

Tema 156: Será devido o auxílio-acidente quando demonstrado o nexo de causalidade entre a redução de natureza permanente da capacidade laborativa e a atividade profissional desenvolvida, sendo irrelevante a possibilidade de reversibilidade da doença.

Por fim, frise-se que há entendimento jurisprudencial no sentido de serem os benefícios por incapacidade dotados de certa fungibilidade, admitindo apreciação judicial mais ampla sem que isso caracterize julgamento extra petita (TRF4, APELREEX 0021467-08.2013.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogério Favreto, D.E. 31/01/2014).

Caso Concreto

Da Coisa Julgada

Faz-se necessário, de início, examinar-se a possibilidade de reconhecimento da coisa julgada em relação aos autos n. 5015496-50.2015.4.04.7100, processo que tramitou perante a 25ª Vara Federal de Porto Alegre, com trânsito em julgado em 29/10/2015.

Naquele feito em epígrafe, a parte demandante buscava o restabelecimento do mesmo benefício que busca restabelecer nestes autos (NB 550.689.256-6), o qual fora recebido até 16/10/2014 e não mantido ativo em razão de conclusão contrária da perícia médica realizada administrativamente.

O fundamento do pedido de restabelecimento funda-se na condição incapacitante decorrente das seguintes moléstias: Bursite do ombro (CID 10 – M75.5), Pedestre Traumatizado em Colisão Com um Veículo de Transporte Pesado ou Com um Ônibus maxilares (CID 10 – V04), Fratura dos ossos malares (CID 10 - S02.4) e Fratura de costela (CID 10 - S22.3).

A perícia, realizada em 12/05/2015 (evento 02 destes autos e 16 dos autos originais), constatou o seguinte:

[...] Data de nascimento: 27/03/1971

Escolaridade: Ens. Fund. Incompleto

Complemento Escolaridade: 1° série

Profissão: faxineira/diarista

Data Última Atividade: MARÇO DE 2012

Motivo alegado da incapacidade: DOR NA CABEÇA E ROSTO . TAMBÉM COM DOR A NÍVEL DOS MEMBROS SUPERIORES E INFERIORES

Histórico da doença atual: PACIENTE REFERE QUE TRABALHAVA COMO FAXINEIRA. REFERE QUE SOFREU ACIDENTE EM MARÇO DE 2012. FOI ATROPELADA. SOFREU FRATURA A NÍVEL DA FACE E ARCOS COSTAIS. NA ÉPOCA, FOI ENCAMINHADA PARA O HOSPITAL CRISTO REDENTOR E ATENDIDA PELA EQUIPE DA BUCOMAXILO, CIRURGIA GERAL E NEUROLOGIA. APRESENTOU QUADRO DE PNEUMOTÓRAX, FRATURA DE ARCOS COSTAIS E FRATURAS A NÍVEL DA FACE. FOI OPERADA PELA EQUIPE DA BUCOMAXILO APÓS ALTA DA DRENAGEM E ACOMPANHAMENTO DA CIRURGIA GERAL. ATUALMENTE COM DOR NA FACE E DOR NOS MEMBRO. FAZ ACOMPANHAMENTO MÉDICO COM NEUROLOGISTA E FOI ENCAMINHADA PARA PSIQUIATRA. SEM TRATAMENTO NO MOMENTO.

Diagnóstico/CID: - Fraturas múltiplas envolvendo os ossos do crânio e da face (CID 10 S027)

Justificativa/conclusão: PACIENTE COM HISTÓRIA DE FRATURA JÁ CONSOLIDADAS A NÍVEL [sic] DA FACE E TÓRAX. SEM PATOLOGIAS ORTOPÉDICAS NO ACIDENTE E ATUALMENTE. NÃO ENCONTRO SINAIS OU SINTOMAS QUE REMETAM A PACIENTE A UM QUADRO DE INCAPACIDADE, AO PRESENTE EXAME, DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO.

Data de Início da Doença: marco de 2012

Data de Início da Incapacidade: Sem incapacidade [...]

Quesitos da parte autora:

1. O(A) Autor(a) apresenta alguma enfermidade? Qual(is)?

PACIENTE APRESENTOU QUADRO DE FRATURA DOS OSSOS DA FACE E TÓRAX NO PASSADO, VÍTIMA DE ACIDENTE. REFERE QUE FOI ATROPELADA. NO MOMENTO, SEM PATOLOGIAS ORTOPÉDICAS .

2. A deficiência apresentada pelo(a) Autor(a) é a mesma que ensejou a concessão do benefício de auxílio-doença?

PREJUDICADO; [...]

4. Ele(a) apresenta capacidade laborativa? Por quê?

APRESENTA CAPACIDADE LABORATIVA, DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO. [...]

6. Em havendo capacidade para o trabalho, quais as dificuldades que o(a)Autor(a) enfrentaria para conseguir se inserir no mercado de trabalho e quais atividades poderia desempenhar?

PACIENTE MANTEVE ACOMPANHAMENTO COM NEUROLOGISTA E BUCOMAXILO. DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO, NÃO ENCONTRO DOENÇAS INCAPACITANTES. [...]

8. Os problemas de saúde apresentados pelo(a) Autor(a) exigem algum cuidado/tratamento especial? Em sendo a resposta positiva, quais seriam esses cuidados/tratamentos?

ACOMPANHAMENTO COM NEUROLOGISTA; [...]

10. Em face da análise da doença/deficiência que acomete o(a) Autor(a), é possível dizer tratar-se de pessoa portadora de anomalia adquirida que a incapacita para sua função habitual?

NÃO, DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO [...]

12. Caso as duas últimas respostas sejam negativas, indaga-se até quando perdurou a sua incapacidade, ou seja, teria recuperado a sua capacidade de retornar às suas funções habituais na data da cessação do benefício ou posteriormente (quando)?

PACIENTE SOFREU FRATURA A NÍVEL DOS ARCOS COSTAIS E FACE. AMBOS SÃO ÁREAS NÃO ORTOPÉDICAS DE CUIDADOS. DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO, NÃO HOUVE INCAPACIDADE.

13. O(A) Autor(a) necessita de auxílio permanente de outra pessoa?

NÃO, DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO;

14. Esclareça outros fatos que entenda necessário e relevante para o julgamento da presente lide, no que tange à saúde do(a) Autor(a).

PACIENTE NÃO SOFREU LESÕES QUE CAUSEM INCAPACIDADE DO PONTO DE VISTA ORTOPÉDICO. [...]

Não houve interposição de recurso contra a sentença de improcedência (proferida em 05/10/2015) e a referida decisão transitou em julgado em outubro de 2015 (cf. consulta ao site da JFRS na internet), quase dois anos anos do ajuizamento deste feito

Como se pode observar, ainda que haja certa similitude entre a causa de pedir destes autos e a do processo anterior em razão de moléstia ortopédica, cabe frisar que, neste feito, há pedido de reconhecimento de incapacidade também decorrente de moléstia psiquiátrica e neurológica, com o que deve ser reconhecida a coisa julgada somente no que diz respeito à incapacidade decorrente de moléstia ortopédica, mesmo porque não há alegação de agravamento da doença. Deve ser examinada nestes autos somente a incapacidade decorrente de moléstia neurológica e psiquiátrica.

Passo, então, ao exame do mérito, excluídos os efeitos clínicos sob o ponto de vista ortopédico.

Incapacidade

A aferição da incapacidade, na hipótese em julgamento, foi realizada por meio de perícias neurológicas (eventos 25 e 29) e ortopédicas (evento 62).

A perícia neurológica, de 04/10/2017, trouxe os seguintes elementos acerca da condição clínica da demandante:

[...] Data de nascimento: 27/03/1971

Escolaridade: Ens. Fund. Incompleto

Profissão: do lar

Última Atividade: mesma

Motivo alegado da incapacidade: cefalea

Histórico da doença atual: Periciada informa que em 2012 sofreu atropelamento, foi internada no Hospital Cristo Redentor com fratura da face,fez cirurgia . Desde então sente muitas dores na cabeça e tonturas quando faz algum esforço, diz que as vistas escurecem. Relata que vem em acompanhamento com neurologista por dores na cabeça, faz uso de nortriptilina, acido valproico e fluoxetina. Nega crises convulsivas , nega cirurgias ou internações depois de 2012. Nega tabagismo ou uso de álcool. Informa que não exerce atividade formal, é dona de casa, continua fazendo as atividades de rotina quando sente-se melhor. Mora com o esposo e filho de dez anos.

Exames físicos e complementares:

Inspeção:obesaExame Neurológico:sem déficits na força dos quatro membros, sem assimetria de reflexos,coordenação preservada, seleciona documentos e manuseia objetos com precisão. Deambula bem sem apoio, alerta, coerente, orientada no tempo e no espaço, informa fatos recentes e pregressos com detalhes, sem prejuízo objetivo de memória. Conduta calma, linguagem sem alterações. [...]

Diagnóstico/CID:

- Episódio depressivo não especificado (F329)

- Cefaleia (R51)

Justificativa/conclusão: Periciada com queixas de cefaleia crônica após fratura de face e arcos costais em 2012, sem comprometimento cognitivo ou motor segundo registros médicos do Hospital Cristo Redentor. Não houve outros eventos traumáticos ou clínicos neurológicos desde então. Manifesta sintomas depressivos com boa resposta ao tratamento, segundo atestado médico do HCPA. Sem alterações funcionais do ponto de vista neurológico que justifiquem incapacidade para a atividade declarada. Está lúcida e orientada, capacitada para exercer os atos de vida civil.

Data de Início da Doença: 10/03/2012

Data de Início da Incapacidade:

Data de Cancelamento do Benefício:

- Sem incapacidade

Em complemento de perícia neurológica anterior (evento 29), a perita médica complementou as respostas aos quesitos da autora (evento 06- PET3): aponta que a Cefaleia remonta a 2012, mas que não produz incapacidade atual. Reconhecida a incapacidade pretérita, de março a junho de 2012, prazo considerado adequado para recuperação.

A pericia ortopédica (evento 62) não atesta a existência de moléstia ortopédica incapacitante e, ao fazer referência à necessidade de avaliação por outro especialista, fez menção ao fato de a segurada já ter sido avaliada anteriormente. De qualquer modo, como dito supra, há coisa julgada no que se refere à moléstia ortopédica.

Ao analisar a prova dos autos, a sentença foi prolatada nos seguintes termos:

INTERESSE PROCESSUAL

[...] No caso dos autos, o(a) requerente não comprovou que ocorrera o indeferimento administrativo de benefício assistencial devido ao deficiente físico e ao idoso. Dessa forma, inexiste litígio, razão pela qual carece de interesse processual a parte autora, devendo ser o presente feito extinto sem exame do mérito quando ao pleito. [...]

Ademais, cabe consignar que, embora previamente sabedor o(a) autor(a) de que não preenche - na visão da Administração - um dos requisitos à concessão do benefício pretendido, tal fato não retira a exigência de protocolo administrativo do pedido, até porque necessário, no mínimo, que se saiba se aquele é o único empecilho imposto pelo agente administrativo ou se possui ele outras razões para sustentar o descabimento do benefício, do que somente se terá conhecimento mediante o ingresso prévio na via administrativa.

Se é certa, outrossim, a desnecessidade de esgotamento da via administrativa, correto também é afirmar a necessidade de prévio ingresso na mesma e obtenção de uma decisão não sendo necessário, porém, manejar os recursos cabíveis para esgotar tal procedimento.

Tal questão restou pacificada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 631240, com repercussão geral reconhecida. [...]

PRELIMINAR – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL

Por conseguinte, tendo sido ajuizado o feito em 27-07-2017, e o benefício cancelado em 16-10-2014, não há quaisquer parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.

Rejeito, pois, tal prefacial e passo a analisar o mérito.

AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ

[...] O cancelamento do benefício anteriormente recebido pelo(a) autor(a) foi consubstanciado na conclusão dos peritos-médicos da Autarquia-ré, cujo parecer afirmou que não estava mais incapacitado(a) para o trabalho ou para a sua atividade habitual. [...]

A parte autora alegou sofrer de moléstia(s) incapacitante(s) de cunho psiquiátrico, neurológico e ortopédico, que a impedem de exercer atividades laborais que lhe assegurem a subsistência.

Ocorre que a prova produzida nos autos não leva a tal conclusão.

Verifico de posse do laudo pericial (eventos 25 e 29), que o(a) autor(a) não apresenta moléstia neurológica incapacitante para o trabalho. O(A) Sr(a). Perito(a) esclarece que o(a) demandante apresenta episódio depressivo não especificado e cefaléia (CID/10 F32.9 e R51, respectivamente), no entanto tal(is) moléstia(s) não se mostra incapacitante, não havendo qualquer restrição a seu retorno imediato ao exercício de suas atividades profissionais habituais. Referiu, ainda, o vistor judicial que, apesar de apresentar a(s) referida(s) enfermidade(s) desde 2012, com a adoção do tratamento indicado para o caso clínico, houve a recuperação da capacidade laborativa, o que inviabiliza o restabelecimento do auxílio-doença pleiteado. Ainda conforme conclusão pericial, a autora apresentou incapacidade, apenas, no interregno de março a junho/2012 (evento 29, LAUDO1, p. 01), não havendo, desde aquela época, qualquer incapacidade laborativa do ponto de vista neurológico.

De outra parte, autorizada a produção de prova pericial com especialista em ortopedia (evento 62), foi esta mais uma vez contrária à pretensão da parte autora. O Sr. Perito referiu que, apesar de ter sofrido múltiplas fraturas em decorrência de atropelamento sofrido em 09-03-2012, com a adoção do tratamento, inclusive cirúrgico, indicado para o caso clínico houve a completa consolidação daquelas fraturas, sem qualquer restrição atual para o desempenho de atividade profissional produtiva e regular que assegure a subsistência da requerente. [...]

Cabe ponderar, ainda, especialmente tendo em conta as alegações da parte autora na petição do evento 70, invocando o laudo produzido perante a Justiça Comum Estadual, que são diversos os fundamentos e concessão dos benefícios por incapacidade previdenciários (ambos fundados em incapacidade total, temporária ou permanente) e a indenização do DPVAT, que possui tabela própria de aferição e autoriza, inclusive, indenização em se tratando de redução da capacidade laborativa.

A redução ou limitação enseja, no âmbito do RGPS, o auxílio-acidente, sendo benefício diverso e com requisitos diferentes da aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença. Se a parte autora pretender discutir a ocorrência de diminuição ou restrição funcional na capacidade laboral, poderá - e deverá - mover o competente e específico pleito de auxílio-acidente.

Em relação às alegações quanto à necessidade de perícia psiquiátrica, já foram refutadas na decisão do evento 72, especialmente pelo fato da documentação datar de 2017 e a apreciação quanto ao direito aos benefícios se basear no ano do cancelamento (2014). [...]

Pois bem.

É sabido que a prova é destinada ao julgador, cabendo, pois, a este avaliar a necessidade de produção de novas provas, sendo perfeitamente possível, indeferir complementação ou substituição de prova pericial se estiver satisfeito com o conjunto probatório.

No caso em exame, quando confrontado com o pedido de realização de perícia psiquiátrica, o julgador de primeiro grau manteve indeferimento anterior (decisão de evento 35), sob o argumento os problemas dessa origem já foram avaliados no laudo elaborado pela neurologista (evento 25 - LAUDOPERI1 e 29 - LAUDO1). Demais disso, considerou também que "as questões psiquiátricas, seriam de 2017 em diante, muito posteriores, portanto, ao benefício cujo restabelecimento pretende o laudo pericial elaborado nestes autos".

Com a devida vênia tenho entendimento divergente no ponto. Em primeiro lugar, a partir da leitura das considerações exaradas pelo perito neurologista não se verifica uma apreciação definitiva acerca da patologia psiquiátrica. O médico neurologista pontuou que a segurada encontrava-se submetida a tratamento e que estava sendo medicada, com boa resposta a tratamento, segundo atestado oriundo do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). A meu ver, isso não pode ser considerado como uma avaliação médica completa acerca do quadro clínico da autora, mormente pela notória complexidade que é ínsita a questões psiquiátricas, cujo exame cabe, tão somente, a um especialista na área específica avaliar. Não se pode, portanto, peremptoriamente, considerar que o acidente sofrido em 2012 não trouxe sequelas psiquiátricas à segurada sem a palavra de um especialista nomeado pelo juízo. Vale anotar que a perícia psiquiátrica foi requerida já na petição inicial.

Assim, tenho por necessária a realização de prova técnica adequada.

Nesse sentido, a jurisprudência deste Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA PARA PRODUÇÃO DE NOVO LAUDO MÉDICO PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. Insuficiente a perícia médica, elemento essencial para a verificação da incapacidade da postulante ao benefício de prestação continuada, determinada a anulação da sentença, com a reabertura da instrução para que seja produzido novo laudo médico pericial, com levantamento detalhado da moléstia, a ser elaborado por médico especialista, bem como as demais provas que as partes entenderem pertinentes. (AC nº 0019515-91.2013.404.9999, 5ª TURMA, Rel. Des. Federal ROGERIO FAVRETO, unânime, D.E. 28-01-2014).

Por conseguinte, deve ser provida a apelação, a fim de ser, excepcionalmente, anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia judicial na área da psiquiatria.

Conclusão

Anulada a sentença de ofício. Determinada remessa dos autos a origem para que seja realizada perícia por especialista em psiquiatria. Determinado o retorno dos autos o juízo de origem.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação para anular a sentença, determinando-se o retorno dos autos o juízo de origem.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001174830v46 e do código CRC d8d3c9a8.Informações adicionais da assinatura:
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5038589-71.2017.4.04.7100
40001174830.V46


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:26.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5038589-71.2017.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: VERA MARIA BORBA DE SOUZA (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. COISA JULGADA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA.

1. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela não deve ser considerada suficiente, especialmente quando o laudo não responde, com segurança, aos quesitos necessários para a formação do convencimento judicial.

2. Hipótese em que se reconhece a coisa julgada apenas no que pertine ao pedido de reconhecimento da incapacidade decorrente de moléstias ortopédicas.

3. Anulada a sentença e se reabre a instrução para a complementação da perícia realizada por médico especialista em Psiquiatria.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação para anular a sentença, determinando-se o retorno dos autos o juízo de origem, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de julho de 2019.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001174831v6 e do código CRC ec5240e8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 25/7/2019, às 14:56:15


5038589-71.2017.4.04.7100
40001174831 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:26.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 23/07/2019

Apelação Cível Nº 5038589-71.2017.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: VERA MARIA BORBA DE SOUZA (AUTOR)

ADVOGADO: RICARDO LUNKES PELIZZARO (OAB RS072083)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 23/07/2019, na sequência 29, disponibilizada no DE de 11/07/2019.

Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO PARA ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO-SE O RETORNO DOS AUTOS O JUÍZO DE ORIGEM.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:26.

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